Trabalho e Burocracia

July 24, 2017 | Autor: A. Rodrigues de M... | Categoría: PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL, Psicología Social, Political Sciencia, Social Psicology, Philosphy
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
CAMPUS CATALÃO

TRABALHO E BUROCRACIA:
ASPECTOS DO SERVIÇO PÚBLICO E ALIENAÇÃO INSTITUCIONAL

Autor: Amom Rodrigues de Morais

RESUMO
O presente estudo teve como objetivo investigar como se caracteriza e se constitui o trabalho, categoria fundante do ser social, na dinâmica da burocracia presente no funcionalismo público. Desse modo, pretendeu-se descrever e analisar os aspectos que perpassam a prática no serviço público a partir de uma perspectiva crítica e sócio-histórica, refletiu-se assim os dados colhidos em entrevistas feitas com servidores técnico-administrativos da Universidade Federal de Goiás, Campus Catalão. Feita a discussão, o que aparece como um problema mais notório é a forma ou aparência do discurso convincente que apesar de se manifestar como ideológico e com uma roupagem de prática "eficiente", a burocracia na sua essência e nos seus efeitos reais apresenta antagonismos sérios que se manifestam nos problemas desencadeados pela lei, pela burocracia, impactando até na saúde do trabalhador.
Palavras-chave: Trabalho; Burocracia: Alienação






Catalão, 24 de Outubro de 2012

INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objeto de estudo o fenômeno do trabalho interligado com o fenômeno da burocracia, entendendo ambos de forma associada e que se constituem mutuamente. O trabalho burocrático é definido e caracterizado pelo fenômeno da burocracia, e esta por sua vez se constitui na prática pelo esforço dos trabalhadores, no caso, os servidores públicos.
A burocracia é um tema amplo que se insere num plano socioeconômico de produção capitalista e tem como função regulamentar, administrar e gerir as relações materiais de produção e sociais. Ela historicamente surge como processo complexo de gerência das relações da empresa privada e com o surgimento do Estado moderno republicano, surge a burocracia estatal como mecanismo de mediação da administração da coisa pública. Portanto, atualmente somos, de uma forma ou de outra, afetados pela burocracia estatal, uma vez, que nos relacionamos necessariamente com a coisa pública.
Objetivou-se nesse estudo investigar como se caracteriza e se constitui o trabalho, concebido como dimensão significativa do homem, inserido na burocracia pública. Assim, pretendeu-se descrever os aspectos que perpassam a prática do serviço público. E a partir de uma perspectiva crítica que parte da premissa de que todo trabalho na sociedade capitalista é um trabalho alienado, propusemos a hipótese de existir uma alienação específica na burocracia, que se trata de uma alienação institucional. "Essa questão da alienação se coloca aqui pela sua importância relativa no desenvolvimento institucional das organizações públicas, e particularmente pela estratificação e hipertrofia que produz nas estruturas de dominação do instituto, em prejuízo do processo social e da autonomia dos indivíduos" (Matos, sd).
Em uma tentativa de problematizar a questão geral e ampla do trabalho na burocracia pública foi necessário escolher um lócus específico como forma exemplar, de modo a entrar em contato com dados objetivos através da ida a campo. Escolhemos uma unidade da universidade federal de Goiás, campus da cidade de Catalão, por ser uma instituição de administração indireta. Realizou -se entrevistas com trabalhadores do setor administrativo , por ser considerado mais burocratizado.
As informações foram analisadas à luz das teorias referenciadas na fundamentação teórica que se constituíram nos últimos anos como pesquisas do fenômeno da burocracia. Conjuntamente as reflexões se orientam a partir de uma perspectiva crítica sócio-histórica ao lado de noções filosóficas metodológicas do materialismo dialético.
Se é que podemos falar de resultados encontrados, ou conclusões propriamente ditas, de modo geral, é que apesar da forma ou aparência do discurso convincente e ideológico e da prática "eficiente" da burocracia, a sua essência, no nível do conteúdo e seus efeitos reais apresentam antagonismos sérios que se manifestam nos problemas desencadeados pela lei, pela burocracia, culminando também na questão da saúde, dentre outros que poderiam ser também abordados.



REFERENCIAL TEÓRICO


De acordo com a lei Número 8112/90 de Dezembro de 1990, servidor público é a pessoa legalmente investida em cargo público e se constitui como um conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.
Também chamados de agentes administrativos ou servidores públicos, são os cidadãos que fazem parte da estrutura da administração com uma relação de emprego. Podem ser estes temporários com vínculo apenas contratual tendo como regimento os códigos e leis trabalhistas ou mesmo efetivos admitidos via concurso público.
Ao estar investido no cargo por concurso público, o servidor deve cumprir sua função de acordo com um conjunto de competências que lhe são legalmente atribuídas. No exercício de sua função ele está sujeito ao cumprimento de deveres sendo-lhe proibida determinadas condutas.
Durante décadas o administrador público se limitou a lidar com processos burocráticos, normalmente rotineiros e limitados. Para executar suas tarefas, bastava conhecer as regras e as leis. Atualmente, sua função está recebendo novas atribuições. O governo brasileiro vive um processo de mudança, reconhecendo que a administração pública ainda tem muito de cartorial e burocrática, em que pese o grande esforço do governo em avançar em sentido contrário (AFONSO, 2010). Já que a modernização econômica e administrativa é medida que se impõe ao Estado contemporâneo. A seguir se faz presente a descrição do contexto histórico em que surge o serviço público no Brasil.



Contexto Histórico
O processo de constituição do serviço público no Brasil deve ser entendido juntamente com a formação histórica do Estado no país, para assim compreender as formas de burocracia moderna. Deve-se levar em consideração o desenvolvimento e características da administração pública desde a era colonial, imperial e inclusive a formação estatal do início da República que transmitiram um legado de modo a influenciar profundamente os momentos posteriores (OLIVEIRA, 2007).
Desses tempos, características como Patrimonialismo, relações clientelistas e enpreguistas que permeavam a elite dirigente do Estado marcam o perfil da formação da administração pública. Somente a partir da nova República é que se tem uma preocupação maior na formação e profissionalização do burocrata público. Em 1936 é criado o Conselho Federal do Serviço Público Civil, que se transformou em 1938 em Departamento do Serviço Público (DASP), e sobreviveu até 1986. Durante esse tempo, foram implantados concursos públicos com características meritocráticas e foram criados órgãos para atuar em vários setores, normas e estatutos (OlIVEIRA, 2007).
No entanto, apesar da tentativa de profissionalização e formação técnica do servidor público, ainda persistira formas de admissão apadrinhadas desses profissionais, efeito do remanescente patrimonialismo típico de uma relação clientelista entre Estado e sociedade civil.
Assim, instalado um modelo de administração estatal nos moldes da burocracia clássica, no período Vargas vai haver a necessidade de uma ampliação desse Estado, uma vez que, este passa a ser um administrador com características gerenciais de um projeto de desenvolvimentismo nacionalista. Logo, o desenvolvimento econômico exige do Estado uma postura de propulsor e principal gerente incentivador desse crescimento. O que implicaria numa reorganização do aparelho administrativo com flexibilização de normas e uma maior eficiência. (GOUVEA, 1994).
Por conseguinte, houve tentativas de uma desburocratização nesse período, assim como, no regime militar. E essas reorganizações na aparelhagem administrativa vão causar impacto no funcionário público, de diferentes formas, de modo geral, emerge cada vez mais a possibilidade do servidor ter ampliada sua formação técnica, o prestígio pelo mérito (os concursados), uma vez que se tem mais a substituição do empreguismo pelo concurso público, e uma maior especialização.
Já na década de 80, a burocracia entra em descrédito total. É um período de recessão na economia mundial, de uma emergente reformulação dos Estados-Nação e, sobretudo no caso brasileiro, um fracasso das políticas públicas com um marcante déficit social que contribuem para debilitar a imagem de quem trabalha no setor público (OLIVEIRA, 2007).
Por conseguinte, nos anos 90 surge inevitavelmente o debate, principalmente na literatura, sobre a ineficiência da administração calcada na burocracia clássica incapaz de resultados e dificultosa para um bom desempenho dos agentes públicos. Entra assim, em voga as ideias de transparência, responsabilização, cidadão-cliente ganham projeção. (OLIVEIRA, 2007). Contudo, vale ressaltar que mesmo através dos esforços de implementação de um modelo gerencial durante esse percurso, persistiram práticas burocráticas racionais legais nos moldes Weberianos, tanto quanto, práticas patrimonialistas, simultaneamente. (TORRES, 2004).
A reforma administrativa pública do governo Federal de 1995, estava apoiada na proposta de um modelo gerencial como uma resposta à grande crise do Estado nos anos 80 e à globalização da economia. Estes fenômenos que estão impondo, em todo o mundo a redefinição das funções do Estado e da sua burocracia. (PEREIRA, 1996). Esse novo Estado é concebido como aquele que deve ser o facilitador da economia tornando-a competitiva no mercado internacional.
Essas propostas e reformas foram amplamente aderidas e aceitas em virtude das necessidades de uma reconfiguração do papel do Estado concebido agora como um gestor das políticas públicas e serviços prestados à sociedade. Os meios administrativos junto com o servidor público deveriam se adaptar à lógica de uma racionalização eficiente descentralizadora, pragmática e voltada para os resultados e para o cidadão- cliente, que garantissem rapidez, boa qualidade, custos baixos. No que tange ao âmbito das repartições públicas ou departamentos ouve uma aproximação das funções administrativas com a cultura e lógica de resultados das organizações privadas.
Visto agora como um prestador de serviços, o Estado, tem de utilizar-se de instrumentos de mercado para garantir a eficiência de suas organizações, este, está gradativamente forçado a enfatizar o atendimento da necessidade, tanto de regulação quanto dos serviços de seus clientes/cidadãos através de incentivos a programas de flexibilização da gestão pública, tornando sua máquina administrativa mais barata, ágil e receptiva à inovação e à autonomia administrativa. (SILVA, 1994).
Contudo, este modelo de gestão tem limitações e um problema com o caráter do gerencialismo puro, qual seja, certa subestimação e esvaziamento do conteúdo político que tem e deve sempre ter a administração pública. Além disso, a valoração de princípios fundamentais como a equidade e da justiça não podem ser medidos por intermédio do gerencialismo mercadológico.
Ademais, esse novo paradigma modernizante da administração pública revela de modo mais geral o quadro da geopolítica global orientada pelas reformas de cunho neoliberal, pela mundialização do capital e a consequente transformação do Estado de bem estar social em Estado Mínimo, a serviço cada vez mais dos interesses de mercado e do capital corporativo em detrimento da dimensão dos direitos públicos.
Além disso, a natureza do serviço público não é redutível àquela de uma empresa privada. Segundo Chanlat (2002), ela remete a embates sociais que interessam à ética do bem comum, cujo objeto é a riqueza comum, a saber, o conjunto dos princípios, das regras, das instituições e dos meios que permitem promover e garantir a existência de todos os membros de uma sociedade humana.
Por fim cabe ressaltar, que a história do serviço público no Brasil é marcada por altos e baixos. Não há homogeneidade na administração pública e como observa Torres (2004), a burocracia brasileira convive com três modelos administrativos: o modelo patrimonialista, o modelo burocrático weberiano, e o modelo gerencial. Constata-se assim, que apesar, dos esforços de uma efetivação plena do modelo gerencial, práticas patrimonialistas de administrar e governar ainda persistem e são comuns. A verdade, afirma Torres (2004), é que nem mesmo o modelo burocrático foi implantado plenamente no Estado brasileiro que permanece sendo ainda administrado através de práticas que desconhecem ou ignoram os princípios da impessoalidade, da publicidade, especialização, profissionalismo etc. Tendo estas considerações a respeito da história da constituição do serviço público no Brasil, também se faz necessário a exposição de algumas teorias sobre a natureza do fenômeno da burocracia.

Teorias da Burocracia
Estudos sobre o fenômeno da burocracia são realizados por diversos enfoques teóricos e como via de regra, sempre retomam ao grande estudioso clássico da burocracia que foi Max Weber. O burocrata weberiano como um "tipo ideal" é um ser disciplinado que trabalha seguindo regras claras e legalmente definidas, respeita a hierarquia e goza de estima social. Encarnaria o primado da racionalidade administrativa. Além disso, por conta de seu conhecimento especializado detém informações profissionais. No limite isso implica "a administração burocrática tende sempre a ser uma administração de sessões secretas: na medida em que pode, oculta seu conhecimento e ação da crítica" (WEBER, 1982).
Além do conceito de tipo ideal de burocracia, o individualismo metodológico de Weber estabeleceu os fundamentos da racionalidade, conectando a ação do indivíduo dotada de um sentido, com o fim para o qual está orientada.
Weber define a organização burocrática com, um certo, número de traços característicos. Um elemento importante é que ele salienta igualmente os traços da personalidade burocrática: "a burocratização separa radicalmente a atividade oficial do domínio da vida privada. Os recursos e equipamentos públicos são nitidamente separados do patrimônio particular do funcionário... O princípio estende-se até o chefe da empresa: a vida profissional separa-se da vida doméstica, a correspondência administrativa separa-se da correspondência privada..." (LAPASSADE, 1977).
A burocracia é também colocada em xeque, uma vez que, é ela é concebida como um problema, isto nos faz retomar ainda a Karl Marx, a noção negativa dada por ele ao fenômeno burocrático. Ao contrário de Hegel e Weber, Marx não entende a burocracia como reflexo do triunfo da Razão e ato no mundo (LAPASSADE,1977). Ele Mostra a sua dimensão irracional; a burocracia do Estado não é o que parece ser e conclui, enfim que ela deve ser destruída.
A burocracia é o corpo administrativo do Estado, o seu recrutamento e a sua formação são assegurados pelo Governo: "os indivíduos são obrigados a passar por exames" e cabe ao governo selecioná-los. Esse corpo de funcionários constitui uma "classe média" que é a "classe da cultura". (LAPASSADE, 1977).
Em poucas palavras, Marx não constrói uma teoria sistemática da burocracia, mas sim parte de uma crítica da filosofia do direito e do Estado de Hegel em 1845. O que se pode sintetizar de sua crítica é a análise do momento em que a organização se torna propriedade privada, os organizadores tomaram o poder e a burocracia tornou-se uma classe dominante. Isso Marx não diz claramente, certos marxistas o dirão muito mais tarde (LAPASSADE, 1977).
Vale ressaltar, que a administração burocrática clássica tanto como suas teorias sociológicas e suas respectivas críticas estão contextualizadas e partem dos princípios da administração do exército prussiano. Esse modelo de administração foi implantado nos principais países europeus no final do século dezenove e nos Estados Unidos no começo do século vinte. (PEREIRA, 1996).
Nesse sentido, para além da análise sociológica clássica foram desenvolvidas perspectivas teóricas da burocracia a partir do enfoque no estudo psicológico e psicossociológico, com ênfase nos fenômenos do comportamento e na personalidade. Para Motta (1993), Robert Merton é um dos representantes dessa abordagem.
Ele descreve comportamentos individuais no sistema burocrático; mostra a elaboração de uma personalidade num quadro institucional que tende a recusar a criatividade e a inovação.
A Burocracia na visão de Merton (MOTTA,1993) é portadora de funções e também de disfunções, isto ajuda a perceber as diferenças entre o "tipo ideal" e a realidade. A sua análise parte da exigência de controle por parte da burocracia, para o funcionamento satisfatório. Assim o funcionário sofre pressão em termos de comportamento "metódico" prudente e disciplinado. Esta disciplina só se realiza se os padrões estabelecidos forem sustentados por sentimentos que garantam a dedicação dos funcionários aos deveres burocráticos. Portanto, a eficácia da burocracia, em última instância, depende da inculcação de atitudes e sentimentos apropriados a seu funcionamento. Ao funcionário cabe a adaptação de pensamentos, sentimentos e ações (MOTTA, 1993).
Nessa linha de pensamento, a principal consequência da rigidez de comportamento é o surgimento de uma organização informal defensiva em face de qualquer ameaça à integridade do grupo. Não obstante, nos anos oitenta e noventa tem-se o emergente desenvolvimento das organizações com foco na chamada "cultura de qualidade" próxima ao conceito de administração gerencial, caracterizada com a diminuição de níveis hierárquicos, desburocratização, a fim de processar melhor as informações, agindo sobre o ambiente. Esta descrição corresponde ao paradigma pós- industrial. Esse tipo de empresa defende a criatividade e a inovação (MOTTA, 1993). Uma vez estabelecida estas novas condições, a pressão se desloca para a obtenção de resultados em curtos períodos de tempo e as formas de controle se transmutam para formas mais sutis e simbólicas a onde o fluxo de valores e percepções envolve e condicionam a identificação do funcionário com a corporação/departamento.
Diante da apresentação da constituição histórica da burocracia no Brasil, seguido das teorias que buscam compreender melhor este fenômeno, cabe ressaltar de modo sucinto e geral como aparece a condição real e objetiva do funcionário público.

A Condição do Funcionário Público
O trabalho na burocracia pública apresenta aspectos e problemas como a maioria das outras formas de trabalho, apesar de muitas pessoas pensarem o contrário. Aspectos como o da motivação ao trabalho, a saúde, o aparecimento de doenças e também a alienação estão presentes e requerem atenção também nesse setor.
Para muita gente, os servidores públicos estão associados à imagem de funcionários pouco inclinados a trabalhar e preocupados com suas vantagens e privilégios (CHANLAT,2002). Ideia que é bastante difundida. Esta representação de funcionários ociosos requer se perguntar sobre a questão da motivação e também consequentemente se interrogar sobre o mal-estar profissional que se observa em nossos dias num grande número de serviços públicos.
Como pudemos observar a evolução da burocracia pública no país acompanhada de várias transformações e reformas, há um impacto de tudo isso na dinâmica e na condição do atual servidor público. Um primeiro impacto segundo CHANLAT (2002) é o aumento da carga horária que parece compartilhada por muitos empregados do setor público em razão da redução de pessoal e dos novos imperativos de desempenho e produtividade. Em estreita relação com a carga de trabalho, notadamente para aqueles que estão em contato direto com o público, nota-se uma pressão maior por parte dos usuários dos serviços oferecidos. Esta pressão tem várias origens: discurso sobre a importância do cidadão-cliente, exigências crescentes dos cidadãos para com sua administração, dificuldades sociais crescentes (desemprego, miséria precariedade, etc.).
Além dos problemas referidos à carga de trabalho e redução de pessoal existe o elemento da autonomia como fator de motivação. Sabe-se que em um ambiente de decisões centralizadas, rígido normativamente haverá tensão com as demandas por parte dos cidadãos com funcionários amputados de sua autonomia frente a hierarquização deliberativa e isso se constitui como fator também de desmotivação segundo CHANLAT (2002).
Um terceiro elemento de desmotivação se relaciona com o aspecto do reconhecimento. No decorrer dos últimos vinte anos os funcionários do setor público sofreram mais ou menos o discurso sobre sua suposta ineficiência sua fraca produtividade e até mesmo sua utilidade (CHANLAT, 2002). É comum se ouvir queixas por parte destes mesmos servidores sobre a precariedade da questão do salário e sobretudo, do plano de carreira como fator preponderante de reconhecimento e valorização.
A desmotivação do servidor público pode ser uma expressão (sintoma) da patologia organizacional (FILHO, 2004) que não é apenas comum às organizações privadas, mas também se faz presente na dinâmica burocrática dos departamentos de serviço público. Tanto é que o governo federal admite a relação entre o adoecimento dos servidores públicos e suas condições de trabalho ao afirmar que 24,7% das aposentadorias de servidores se devem a problemas de saúde decorrentes de condições de trabalho (FILHO, 2004).
A precariedade das condições de trabalho caracterizada por meios e equipamentos insuficientes e inadequados, espaços mal adequados, práticas gerenciais distantes da realidade, além do fato dos serviços públicos se submeterem assim como no setor privado ao um processo de intensificação do trabalho e a diferentes formas de racionalização tem sido fatores de adoecimento e geradoras de sofrimento psíquico (stress), bem como problemas físicos do tipo LER/DORT (FILHO, 2004).
Tendo em vista, estes apontamentos sobre as condições que o funcionário público enfrenta no seu ambiente e formas de trabalho, nos sugere que as questões relacionadas à saúde, via de regra, não fazem parte das pautas dos projetos de capacitação gerencial da administração pública, que geralmente opta por organizar serviços médicos que funcionam de modo isolado das políticas de recursos humanos. Sendo assim, o espaço público precisa ser reconhecido como um ambiente de trabalho que requer intervenções típicas em saúde (CARNEIRO, 2006).
Por conseguinte, o trabalho em que o trabalhador se reconhece como criador ou como parte integrante produz menos adoecimento. "As instituições rígidas, com processos criativos reprimidos e baseados na obediência são geralmente geradoras de sofrimento decorrentes de exigências maiores (CARNEIRO, 2006). Isto nos permite falar em alienação no serviço público, um aspecto também marcante nesses ambientes e nas práticas burocráticas.
A alienação tratada aqui é tida como "um fenômeno, cuja, a etiologia remete a processos complexos, que se reproduzem pela a articulação entre instancias psíquicas e institucionais, que se estruturam na cultura e se impõe aos indivíduos como violência simbólica" (MATOS, sd). Nesse sentido pode-se falar em alienação institucional dentro das organizações públicas justamente pelo seu caráter institucionalizado, legal, normativo e centralizado. Assim, nessa perspectiva a alienação no serviço público é entendida no seu modo de ação, no seu significado objetivo para sociedade e para o próprio funcionário, o trabalho na dimensão social da autonomia, o trabalho de afirmação social da individualidade.
A alienação do servidor público se caracteriza no âmbito da autonomia político-administrativa e de sua inserção social. De Acordo com MATOS (sd), observa-se que profissionalmente a participação dos servidores nas decisões de políticas públicas, só acontece enquanto representantes da administração, em comissões ou grupos de trabalho onde se deve seguir o pensamento dos dirigentes. Dessa forma, fica comprometida a autonomia deliberativa, a participação e integração na organização que são transferidas a outrem.
Além do mais, esta alienação psíquica-institucional se reflete nos hábitos cotidianos do trabalho que frequentemente no funcionalismo público "se resume a despachos formais de documento, um passo na tramitação de um processo, uma gota no oceano da gigantesca máquina do Estado" (MATOS, sd).
Outro ponto a ser observado é o esvaziamento de significados do trabalho a partir de modos de gestão das organizações públicas, principalmente no que diz respeito à hierarquia e na centralização das decisões na figura de autoridade o que resulta dentre outros problemas na fragmentação do trabalho (MATTOS, sd).
Em síntese, segundo MATOS (sd), a alienação do servidor é resultado de mediações oriundas das contradições socioeconômicas e político-institucionais, da tensão entre os interesses da sociedade e a privatização do Estado a serviço das elites econômicas, contradição que aparece entre a submissão ao poder discricionário dos dirigentes, baixos salários, valores éticos, corporativismo, estereótipos negativos em relação à figura do servidor. Esta alienação psíquico-institucional , também se constitui como deslocamento das vivências conscientes para as produções simbólicas do controle ideológico e daí para o imaginário. É um processo complexo que envolve dispositivos e processos de diversas etiologias, integrando instancias políticas, ideológicas, econômicas e psíquicas (MATOS, sd).









METODOLOGIA
O presente estudo teve como procedimento metodológico a realização de uma busca bibliográfica que fundamentasse teoricamente a problematização do fenômeno da burocracia, bem como, o estudo feito a campo. Para tanto, requer como em qualquer outra investigação científica, um levantamento de dados. Para esse levantamento é necessário, que se faça uma pesquisa bibliográfica (Boni, Quaresma, 2005).
Feito a pesquisa bibliográfica, optou-se pela ida a campo, o lócus escolhido foi os departamentos administrativos do campus Catalão da Universidade Federal de Goiás de modo que foram feitas três entrevistas com servidores desses departamentos. As entrevistas foram orientadas por um questionário de questões semi-abertas constituindo então uma entrevista de caráter semi-estruturada. Estas entrevistas combinam perguntas abertas e fechadas, onde o informante tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto. Nesse sentido o pesquisador deve seguir um conjunto de questões previamente definidas, mas ele o faz em um contexto muito semelhante ao de uma conversa informal. Este tipo de entrevista colabora muito na investigação dos aspectos afetivos e valorativos dos informantes que determinam significados pessoais de suas atitudes e comportamentos (Boni, Quaresma, 2005).
As questões se estruturaram em torno de alguns eixos, a saber, a vida precedente do entrevistado que inclui atuações profissionais antes do serviço público, formação educacional, além dos aspectos atuais como continuação de formação educacional ou profissional, quanto tempo de serviço público e quais motivações os levaram para o serviço público, os objetivos ali pretendidos, além dos aspectos práticos da rotina do trabalho como a relação do entrevistado com seu trabalho específico, se cumpre as regras e normas estritamente, se tem interesse real nessas atuações e se alguma vez já se sentiu desinteressado em atividades operacionais e administrativas. Perguntou-se também se há dificuldades ou problemas nesse tipo de trabalho, e como é a relação com as pessoas e suas demandas da comunidade acadêmica e por final a pergunta sobre a existência de cansaço físico ou psíquico gerado pelo trabalho de modo a influenciar na vida pessoal.
Após realizada as entrevistas foi feita a análise das informações pela método de análise de conteúdo, que consiste basicamente na iniciativa de explicação, sistematização e expressão do conteúdo de mensagens, com finalidade de se efetuarem deduções lógicas e justificadas a respeito da origem dessas mensagens. Este procedimento envolve o rigor da objetividade e também a fecundidade da subjetividade (Cappelle, sd). Assim, pretendeu-se buscar diferentes significados de natureza psicológica, sociológica, política, histórica dentre outros.



DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Foram realizadas três entrevistas sendo, três técnicos administrativos. Um em atuação no Protocolo geral de graduação e outros dois em atuação no Centro de Gestão Acadêmica da unidade do Campus Catalão da Universidade Federal de Goiás.
Identificaremos os entrevistados em ordem numérica, primeiro, segundo e terceiro. Com relação às primeiras perguntas referentes à formação educacional, o primeiro entrevistado possui graduação em ciências biológicas, e tem em vista um mestrado em educação como uma forma de complemento da sua formação de origem além de somar como técnico em assuntos educacionais. Está no serviço público há cinco anos e sua maior motivação para a entrada no serviço público foi o fator salário. A segunda possui graduação em pedagogia e mestrado em educação e pretende continuar a formação. Ela está no serviço público há pouco tempo, apenas dezenove meses e sua motivação para a entrada no serviço público foi a estabilidade e a possibilidade de trabalho na sua área de formação. O terceiro entrevistado possui graduação em pedagogia e pretende fazer mestrado em educação. Este possui 20 anos de serviço público e teve como motivo para a entrada no serviço público o fator estabilidade.
Tendo descrito as características educacionais e profissionais dos entrevistados, analisaremos as informações que dizem respeito aos objetivos atuais no exercício do cargo, os aspectos da relação com as normas e regras, e suas dificuldades de modo geral com a burocracia das atividades operacionais e administrativas na organizacão/departamento. Bem como a existência de cansaço físico ou psíquico oriundos do trabalho. Dessa forma, lançaremos mão de uma análise temática ou categorial, que consiste, em operações de desmembramento do texto em unidades, (categorias). Essas operações visam a descobrir o núcleo de sentido que compõem uma comunicação, preocupando-se com a frequência desses núcleos, além de dar atenção ao aspecto representacional, ou seja, analisar a intensidade dos juízos e opiniões que refletem as representações pessoais a respeito do fenômeno estudado. Nesse sentido escolhemos três categorias que mais aparecem com ênfase e veemência nas falas dos entrevistados que correspondem mais especificamente aos objetivos do presente estudo, quais sejam, as categorias Lei, Burocracia e Saúde. A baixo segue a relação dos três entrevistados com esses aspectos.
Lei
O primeiro entrevistado desempenha a função no protocolo geral de graduação de controle de toda a documentação do campus, bem como do trâmite entre acadêmicos e instituição, além, de repassar informações sobre o procedimento dos processos administrativos. Segundo ele: "cumpro as regras sim, de acordo com a lei 8112, juntamente com as normas de regimento interno da universidade". Quando perguntado sobre o interesse, eficiência e dificuldades no trabalho ele diz: "tanto o artigo 37, quanto, a lei 8112 prevê que sejamos fieis a isso". "os trâmites burocráticos quando bem aplicados, são tranquilos, sem desvio burocrático, ela é 100% mesmo."
A partir dessas falas, pode-se observar constantemente o entrevistado recorrendo à justificativa legal de suas práticas sempre legitimadas pelas normas a onde ele faz questão de explicitar sua rígida obediência à burocracia e suas leis. De acordo com sua representação implícita, o problema não é necessariamente de haver burocracia, mas sim o de existir o desvio burocrático ou qualquer flexibilização das normas ocorrendo em práticas ilícitas, isso expresso na sua constante reiteração de que as práticas burocráticas se processam rigidamente sem quaisquer desvios. Portanto, o primeiro entrevistado possui uma relação estreita, de simpatia e de identificação com a lei.
O segundo entrevistado trabalha no Centro de Gestão Acadêmica (CGA) onde, de modo geral, se organiza a vida acadêmica do aluno e sua tarefa específica é analisar o processo pedagógico dos cursos e verificar se eles estão de acordo com as diretrizes nacionais. Ele diz cumprir as regras ao "pé da letra" e desempenha de modo eficiente seu trabalho para poder colaborar com todo o grupo.
O terceiro entrevistado também trabalha do CGA e ali dá assistência a todos, atende no balcão, atende telefone, orienta alunos, e dá-lhes assistência, de modo geral, ajuda no funcionamento da dinâmica rotineira do departamento. Ele diz: "aqui tem que seguir a regra ao pé da letra, o que se diz aqui, por aqui fica, não pode entrar alunos, não se pode passar informações a terceiros, etc".
Burocracia
A questão da burocracia se relaciona intimamente com institucionalidade da lei, uma vez que aquela acaba sendo um desdobramento necessário desta. Sendo assim, pode-se perceber logo a cima como o primeiro entrevistado se envolve de modo fielmente submisso ao aparato burocrático e como este recorre constantemente à citação da lei para legitimá-la.
Já a segundo entrevistado relata uma dificuldade, que, de modo geral, nas instituições existe muita burocracia, onde as coisas passam por várias instâncias, porém, diz ele, é a favor de tal procedimento, pois acha que é um preço a se pagar por querermos democracia, esta entendida por ela no sentido de transparência da coisa pública.
O terceiro entrevistado relata que o ambiente é burocrático dependendo do ponto de vista. Do ponto vista dele, não é burocrático, pois as normas visam proteger as informações, principalmente pessoais, ele descreve apenas nesse sentido. Sendo assim, ele acaba atribuindo conotação e juízo positivo a esse tipo de procedimento e atividade e entende por burocracia vulgarmente como algo negativo e pejorativo não se tratando do que acontece ali no ambiente/departamento.
Nesse sentido, nos lembra Motta(1993), da necessária exigência de controle por parte da burocracia, para o funcionamento satisfatório. Assim o funcionário sofre pressão em termos de comportamento "metódico" prudente e disciplinado. Esta disciplina só se realiza se os padrões estabelecidos forem sustentados por sentimentos que garantam a dedicação dos funcionários aos deveres burocráticos. Portanto, a eficácia da burocracia, em última instância, depende da inculcação de atitudes e sentimentos apropriados a seu funcionamento. Ao funcionário cabe a adaptação de pensamentos, sentimentos e ações.
Ademais, segundo Carneiro (2006) as instituições rígidas, com processos criativos reprimidos e baseados na obediência são geralmente geradoras de sofrimento decorrentes de exigências maiores, além de favorecer a alienação institucional que se justifica pelo seu caráter tecnicista, normativo e institucionalizado observado nesses ambientes.
Desse modo, a alienação no serviço público burocrático se manifesta no seu modo de ação, no seu significado objetivo para a sociedade e sobretudo, para o próprio funcionário público, privado do trabalho enquanto afirmação social da individualidade, e simultaneamente à mercê do esvaziamento de significado do trabalho a partir dos modos de gestão das organizações públicas, principalmente no que diz respeito à hierarquia e na centralização das decisões na figura de autoridade o que resulta dentre outros problemas na fragmentação do trabalho (MATTOS, sd). Por esse argumento talvez seja possível responder as razões de práticas fragmentadas e mecanizadas de tramitação administrativa, mediadas pela normatividade da lei transformando o trabalhador em mero aplicador de técnicas e que transfere a outrem o significado da totalidade do seu universo de trabalho.
No que tange ainda às questões da lei e da burocracia, nos lembra, Lapassade (1977), a noção negativa dada por Marx a estes fenômenos. Ele ressalta a dimensão irracional da burocracia ao contrário de como colocam Weber e Hegel, que caracterizam a burocracia como um processo que separa radicalmente a atividade oficial do domínio da vida privada e a burocracia como triunfo da Razão e ato no mundo. Marx denuncia que a burocracia do Estado não parece ser o que é e na verdade, ela possui incoerências e contradições.
Apesar das regras escritas e de toda transparência do texto público o que se revela por detrás da prática legalista é a obscenidade da violência que sustenta a face pública da lei e da ordem, ou seja, há uma lacuna entre o texto oficial, práticas e ritos oficiais e seu complemento obsceno (ZIZEK, 2012), que se traduz em hábitos secretos, privados e informais, desdobrando-se às vezes em corporativismos que servem como suplemento para a o convencimento seguro da lei vista como intacta e absoluta.
Nesse bojo TRAGTENBERG (1992) destaca o problema geral entre dominação e saber dentro da universidade, uma administração indireta da burocracia do Estado e que é nosso lócus de estudo. Segundo ele a universidade é uma instituição dominante e está ligada à dominação, uma ideologia dominante que a perpassa é que se objetiva na burocracia universitária composta também por tecnocratas orientados por critérios lucrativos da empresa privada. Para além das relações visíveis, públicas e transparentes que se estabelecem na universidade há aquelas invisíveis de posse da chamada "informação" nas soluções de gabinete, nas relações "amistosas" que tem espaço na universidade. Soma-se a isso a existência de estruturas de ensino e administrativas onde os meios (técnicas) se tornam fins; a criação do conhecimento e a prioridade da função social cedem lugar ao controle burocrático de sua produção como suprema virtude.
Aliás, nos lembra ainda TRAGTENBERG (1992) sobre a relação da burocracia e dominação: " a burocracia age antiteticamente. De um lado responde à sociedade de massas e convida a participação de todos, de outro com sua hierarquia, monocracia, formalismo e opressão afirma alienação de todos..."
Tendo essas explanações em vista passemos ao aspecto da saúde que se faz inerente nessas estruturas burocráticas.

Saúde
O primeiro entrevistado quando indagado a respeito da existência de cansaço físico ou mental originados do trabalho relata não haver nenhum. Segundo ele "o tempo de serviço é gasto exclusivamente no interior do departamento". Qualquer estresse que venha ocorrer é resolvido ali mesmo.
Já o segundo entrevistado diz existir cansaço físico e mental gerado de suas muitas leituras, inclusive leituras na tela do computador e por isso demanda muita atenção e certo cansaço. Segundo ele é difícil distinguir e separar radicalmente o trabalho e vida pessoal, mas há tentativa de restringir o trabalho e suas consequências ao seu local específico.
O terceiro entrevistado afirma existir cansaço físico e psíquico oriundos do trabalho. Inclusive o entrevistado ficou internado por três dias devido ao estresse dali decorrente. Mas que a relação entre trabalho e vida pessoal é boa, segunda ela, eles aprenderam a se envolverem com o trabalho apenas no ambiente determinado, no entanto, ela relata que uma colega dele acaba levando trabalho para casa constantemente.
As falas do segundo e terceiro entrevistado são emblemáticas para a discussão e problematização da questão da saúde nos ambientes burocratizados. Portanto, a desmotivação do servidor público, a precariedade das condições de trabalho, espaços físicos mal planejados e a dinâmica rotineira alienada das instituições são pré-condições que favorecem o adoecimento das organizações e geradoras de sofrimento psíquico (estresse), bem como, de problemas físicos iguais aos apontados nas entrevistas.
Esses apontamentos nos ajudam e pensar sobre os problemas relacionados à saúde, que geralmente não fazem parte das pautas dos projetos de saúde vinculados a políticas de recursos humanos. E que se faz necessário segundo Carneiro (2006), reconhecer o espaço público, como um ambiente de trabalho que requer intervenções típicas em saúde.



COSIDERAÇÔES FINAIS
Logo no início do trabalho foi descrito a constituição histórica da burocracia estatal brasileira em que pode-se observar segundo as análises tragas à baila, o caráter heterogêneo de formas de ser e de se praticar a administração burocrática assumidas ao longo do tempo, tendo passada por várias reformas. Apesar de tentativas de implementação de um modelo gerencial, que postula, uma certa desburocratização e descentralização dos serviços a burocracia brasileira, convive com práticas patrimonialistas, com o modelo burocrático clássico weberiano e com o recente modelo gerencial. Há de se levar em consideração algumas variáveis determinantes no estabelecimento de quais características assumem a administração pública, a saber, a própria especificidade de administração, ou seja, ser direta ou indireta, autarquias ou fundações, de direito privado e etc. Bem como a característica política/regional na qual se analisa a unidade ou departamento. No caso do presente trabalho a unidade se trata de administração indireta (uma universidade federal) com certa autonomia frente à administração direta/estatal, e que pode auto-organizar suas formas de gestão da burocracia político-administrativa. No caso específico estudado, a universidade enfrenta impasses diante da configuração da burocracia administrativa tendo em vista um novo estatuto regimento sendo atualmente elaborado como alternativa aos problemas de deliberação político-administrativos. Em função disso podemos classificá-la como ainda burocrática na forma clássica, lenta, apesar do principio de eficiência instalado na administração pública.
Nota-se a uma vasta bibliografia referente ao fenômeno da burocracia crescente nos últimos anos, a onde foi possível fazer uma busca das teorias que se dedicam a pensar o assunto. Descrevemos as mais importantes em relação à particularidade do tema aqui escolhido. Privilegiamos lembrar os clássicos como Weber e Marx, que trazem noções fundamentais aos posteriores estudos. Para contemplar a psicologia do trabalho escolhemos estudos da burocracia a partir da psicossociologia, que tende a dar uma maior ênfase nos comportamentos e na personalidade. Assim , percebe-se que os ambientes burocráticos em certa medida moldam e influenciam um tipo de personalidade condicionada à submissão e ao controle de comportamento normativo. Esses mesmo ambientes necessitam de um certo, compartilhamento de ideias e sentimentos pelos seus agentes para a manutenção da rigidez de comportamento.
Essas mesmas teorias ajudaram a refletir sobre os dados obtidos nas entrevistas que foram analisadas sobre o recorte das categorias lei, burocracia e saúde, onde pudemos observar como os entrevistados lidam com a questão da legalidade que norteia todo seu trabalho desde a questão da técnica ao aspecto ético. Esta dimensão da lei desdobra-se no problema da burocracia, assim, notou-se como os entrevistados lidam com esta e suas respectivas representações e juízos de valor puderam também ser observadas. Pode-se dizer que é paradoxal as representações desses agentes públicos, uma vez, que eles mesmos fazem apologia ao processo burocrático, no entanto, relatam suas queixas sem mesmo perceber que os problemas objetivos enfrentados são direta ou indiretamente associados ao fenômeno que defendem.
A alienação institucional ajuda a explicar esse obstáculo na tomada de consciência da totalidade do fenômeno da burocracia. A onde o elemento da desmotivação do servidor público, as condições precarizadas do trabalho, o surgimento de doenças, a não prevenção da saúde do trabalhador e toda uma gama de impasses, também para toda a sociedade, relacionados às contradições que aparecem por trás da ideologia aparentemente coesa da burocracia, são relevantes e necessitam de serem aprofundadas, analisadas pormenorizadamente por mais estudos e investigações críticas do fenômeno.

















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