(RESENHA) LOGAN (2017)

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20/03/2017

CRÍTICA DO FILME | LOGAN (2017) – CultEcléticos

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CRÍTICA DO FILME | LOGAN (2017)  12 de março de 2017 (http://www.cultecleticos.com.br/critica-do-⚓lme-logan-2017/) http://www.cultecleticos.com.br/critica­do­filme­logan­2017/

 Carlos Frederico (http://www.cultecleticos.com.br/author/carlosf/) 2/9

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CRÍTICA DO FILME | LOGAN (2017) – CultEcléticos 2

Logan: um 韛�lme no meio de caminhos misturados por: Carlos Frederico Pereira da Silva Gama  

  Na terceira década do século XXI, a ação ocorre basicamente em dois lugares. Por um lado, ambientes fechados que oferecem abrigo, mas não intimidade – casas, hotéis, cassinos, silos abandonados, hospitais, bares. Lá dentro, a vida é o intervalo precário entre duas ou mais violências, mediada por uma variedade de substâncias – cerveja, xarope de milho, adamantium líquido… Os espaços fechados são espaços de apreensão. Por outro lado, ambientes abertos oferecem caminhos, mas a liberdade é vigiada e os pontos de chegada, ambíguos. Desertos, 燩�orestas, cortados por highways, delimitados por postos de fronteira, monitorados por câmeras, sobrevoados por aeronaves e drones. O controle é prelúdio da violência, sinaliza o processo de fechamento. Os espaços abertos são rotas de fuga (“escapes”, segundo Arjun Appadurai). A relação entre espaços abertos e fechados poderia ser dialética, abrir uma comunicação inédita, por em cheque aberturas e fechamentos a priori. Poderia ser turbulenta e imprevisível, na emergência de subjetividades que se tornam, se projetam, se questionam mutuamente. Um novo mundo? Pontas soltas entre os espaços deixam visíveis uma rede de entrelaçamentos: violência, movimento, controle, reprodução. Essas quatro características do capitalismo contemporâneo articulam as práticas, as concepções de mundo e de pertencimento. Um mundo líquido (Zygmunt Bauman), turbulento (James Rosenau) e parcialmente globalizado (Joseph Nye/Robert Keohane) se torna visível nas aporias das trajetórias de (pre)tensas liberdades em busca de soluções que o seu próprio (ou apropriado) caminhar inviabiliza. Entre apreensão e fuga, encontros e desencontros se sucedem, violentos, sem resolução. Logan combina porções desiguais de Western, Road Movie, Terror Gore e Peter Pan. No meio de caminhos misturados, tenta falar dos X-Men no day after. Após um silencioso genocídio mutante, Charles Xavier deixou de ser um profeta da coexistência pací⚓ca para se tornar uma arma de destruição em massa – um valioso objeto de disputa entre governos (Estados Unidos, México) e corporações. A passagem do controle dos poderes do visionário Xavier para as convulsões mentais e materiais de um mundo pós-mutante e pós-multilateral é o centro do argumento dos estúdios Disney. http://www.cultecleticos.com.br/critica­do­filme­logan­2017/

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Na impossibilidade de resolver as convulsões trazidas à tona, o roteiro trágico espelha o curso da crise de 2008. As tentativas de responder à crise rea⚓rmando os pilares da ordem capitalista liberal e multilateral do pós-Segunda Guerra Mundial não foram capazes de sufocar a desilusão com os pilares dessa ordem (como elementos centrais da própria crise). O ⚓o condutor dessa desilusão é Logan, ex-Wolwerine, agora motorista de Uber num Texas apartado ⚓sicamente do México pelo muro de Trump. O Texas é caracterizado como espaço hermeticamente fechado (em contraste com o México), porém poroso. O principal vilão da narrativa, sintomaticamente, se chama Donald.  

  Nesse momento, outro ponto de tensão desponta. O embate entre os modos de enunciação de Logan e Xavier. Logan expõe o ressurgimento forçoso da ordem pós-catástrofe – violento, que traga no seu curso as esperanças de que outros agentes tragam redenção. Xavier acena com o que restou de lucidez e aspirações de coexistência pací⚓ca, transferidas para uma nova geração de mutantes.  

  A voz de Xavier é mediada para Logan por sua própria (e inédita) re燩�exão sobre a mortalidade. A fragilidade corpórea fornece um ponto de contato entre a crítica e a aceitação, torna audível o registro do ex-professor e mentor dos X-Men em termos que Logan paulatinamente reconhece como aceitáveis. Laura, posteriormente revelada como ⚓lha de Logan, sintetiza essa tensão de outro modo, traz à tona a violência como descontinuidade. A luta de Laura para se tornar protagonista de um jogo já de⚓nido (literalmente) antes de nascer se torna uma luta para ter voz, diante de um Logan resoluto e conformado, imerso em violência cíclica e inexorável. http://www.cultecleticos.com.br/critica­do­filme­logan­2017/

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  Ao mesmo tempo, vozes relutam: a passagem entre o inglês das ⚓guras masculinas e o espanhol das ⚓guras femininas é ruidosa, quebra o ciclo da violência inexorável (pode a subalterna falar?, perguntou Gayatri Spivak). Outras personagens (como a enfermeira Gabriela) aceitam o registro privilegiado do inglês, permanecem na penumbra narrativa. Mas são mulheres quem entrelaçam as diferentes narrativas (dos quadrinhos para a telona, do inglês para o espanhol), ainda que permaneçam associadas a motivos edênicos (literalmente, a busca do Éden mutante). A emergência da voz de Laura transpõe a violência entre espaços, criando intimidade. A relação entre ⚓lha e pai recém-descobertos não é de subordinação automática. Laura leva Logan do Texas para Dakota e desloca Wolwerine para um papel subordinado: de ex-X-Men e anti-herói “No Future” para guardião de algo que não compreende e não legitima. Apenas a morte de Logan redime seu ceticismo: essa é a resolução possível para a Disney.  

  No Retorno de Jedi os Ewoks são a última esperança dos rebeldes em apuros contra o Império. Mas no ⚓m, o herói (qual Édipo) cumpre seu destino trágico. Os meninos perdidos de Logan atualizam esse desespero. Quem ia mudar o mundo quer apenas sair (literalmente) de cima do muro e se safar de uma história que já vem malhada antes de nascer. Corra, Laura, corra.   http://www.cultecleticos.com.br/critica­do­filme­logan­2017/

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  O heroísmo e carni⚓cina ⚓cam para quem é “o melhor no que faz, mas o que faz não é bom”. “All the world is a stage, and everyone has their part” (William Shakespeare, atualizado por Madonna). Nesse trajeto, alusões a controvérsias políticas do presente ⚓cam pelo caminho – menos interessantes do que o medo do “estado islâmico” em Apocalypse e (bem menos) que a Guerra ao Terror em Days of Future Past. O futuro não traz novidades, novos agentes se juntem ao roteiro pré-estabelecido. Porém, no mundo da crise de 2008, velhos conhecidos retornam com data de validade pré-estabelecida. Após a morte de Han Solo, temos o ⚓m da saga X-Men. No rescaldo da crise, essa inevitabilidade ⚓ngida é essencial – o surgimento de novas trilogias não é impossível, mas se torna impensável. O futuro já está prescrito de antemão. A mudança é apenas um solavanco na ordem que se reproduz através das violências de um presente nostálgico do passado apreendido.  

  As mortes em Logan superam todos os episódios da saga. O encontro com uma família negra de trabalhadores numa highway de caminhões mecanizados em Oklahoma é o clímax do encontro face a face com o grande capital – a impossibilidade de vitória ⚓ca patente. Contra o pano de fundo dessa violência estrutural, atos de violência abundantes são sublimados. Não há alternativas (qual dizia Margareth Thatcher). Nem mesmo a novidade trazida por ⚓guras femininas questionadoras é capaz de sacudir o trauma pós-crise. A câmara de compensação desse impasse é o sacrifício heroico masculino. Outros ⚓lmes da safra recente (como Hell or High Water) beberam em fontes similares e trouxeram um desfecho mais interessante e bem menos linear.  

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CRÍTICA DO FILME | LOGAN (2017) – CultEcléticos

  A morte de Logan salva a vida de Laura e prolonga, por vias tortas, o sonho de Charles Xavier.  

  NOTA DO FILME: 7 DE 10   FICHA TÉCNICA: Gênero: Ação Direção: James Mangold Roteiro: David James Kelly Elenco: Hugh Jackman, Patrick Stewart, Dafne Keen, Boyd Holbrook, Stephen Merchant, Elizabeth Rodriguez, Richard E. Grant, Eriq La Salle Produção: Hutch Parker Fotogra⚓a: John Berrie Montador: Micharl McCusker Trilha Sonora: Marco Beltrami

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