RELATORIO DE ESTAGIO

May 24, 2017 | Autor: L. Cristina Trevi... | Categoría: Portuguese and Brazilian Literature, Education, Educação, Relatório de Estágio
Share Embed


Descripción


UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO " USP
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
EDM0406 - METODOLOGIA DO ENSINO DE PORTUGUÊS II
DOCENTE RESPONSÁVEL: PROFª. DRA. NEIDE LUZIA DE REZENDE
ACOMPANHAMENTO: NÚBIA RINALDINI






RELATÓRIO DE ESTÁGIO: E.E. ROMEU DE MORAES




LAÍS CRISTINA TREVISAN REIS DE OLIVEIRA
7281417






SÃO PAULO – SP
2015 – 2º SEMESTRE


Sumário

1Introdução: 3
2Descrição Da Escola: 4
3Observação Na Sala De Aula: 4
4Conselho de Classe: 8
5Regência Na Sala de Aula: 9
6Comentários Finais: 13
7Bibliografia 14
8Filmografia 14


Introdução:


O presente relatório tem como premissa o acompanhamento das aulas da disciplina de Português, do segundo ano do Ensino Médio da Escola Estadual Romeu de Moraes, situada na Vila Ipojuca, na região da Lapa, cidade de São Paulo/SP.
Além do acompanhamento das aulas, que cumpriram uma carga de observação de 20 horas, o estágio concerniu, na mesma proporção de horas, regência e a proposta de outras atividades, que foram utilizadas para o acompanhamento do Conselho Escolar. O período para a conclusão de todas as tarefas aqui relatadas foi entre os dias 05 de Outubro a de 24 Novembro de 2015.
Ao chegar à secretaria da escola, em busca de uma oportunidade de estágio, fui muito bem recebida pelos funcionários, que atendendo a minha solicitação assinaram prontamente a minha permissão para estagiar e me apresentaram a coordenação e direção.
A diretora da escola conduziu-me a sala de professores onde a professora F estava. Tal professora foi com quem realizei todas as tarefas descritas neste relatório.
Apesar de ter uma idade avançada, F não possui muita experiência na área de ensino, pois decidiu recentemente dedicar-se a esta profissão. É formada pela PUC e nascida na Ilha da Madeira, embora tenha vindo muito jovem para o Brasil. Tem um livro publicado de haicais e gosta bastante de poesia. Perguntei sobre a metodologia que utilizava em suas aulas, mas ela afirmou não ter uma linha definida, bem como não se servia nem do caderno oferecido pelo governo e nem de apoio de livro didático.
Contou-me que suas aulas tinham uma proposta reflexiva e que ela não se deixava formatar por questões político-pedagógicas, pois o seu objetivo era formar os alunos para o mundo e não para os vestibulares. Perguntei se ela oferecia aos alunos informações sobre autores do romantismo e realismo, pois segundo PCN vigente esse seria o plano de aula para aquele nível de ensino. Ela reafirmou não estar preocupada com essas questões e que costuma passar de tudo um pouco aos alunos, especialmente Haicais, que eram a sua paixão.
Em relação ao sistema de avaliação, ela contou que valorizava os alunos por sua criação e participação e que raramente passava provas, entretanto havia solicitado aos alunos que, como trabalho de conclusão, escrevessem um livro, em qualquer gênero para ser entregue em cerca de um mês e perguntou se eu poderia ajudá-la nesta tarefa.
Atendendo a proposta da professora e, baseando-me nos conhecimentos adquiridos durante as aulas e Metodologia, utilizei como recorte para a regência uma sequencia de aulas baseada em criação literária, que pontuasse os passos necessários para a criação de uma história com principal foco em personagem, tempo e espaço, narração e enredo.
Embora ciente da linguagem acadêmica que devo utilizar neste relatório, pretendo aqui descrever a minha experiência de estágio segundo um dos preceitos fundamentados pela Dra. Neide Rezende em suas aulas, de que se o professor quer que o aluno crie um texto, ele deverá experimentar escrevê-lo primeiro, para entender quais poderão ser as dificuldades que os alunos enfrentarão em suas composições. Portanto, baseando-me nesse pressuposto, assumi um papel de estagiária/escritora, com a pretensão de aproximar os alunos desse universo e assim poder incentivá-los a participar da oficina literária que planeei para a regência.

Descrição Da Escola:

A Escola Estadual Romeu de Moraes, fica situada na Rua Tonelero, 407, Vila Ipojuca. São Paulo/SP e compreende as etapas de Ensino Médio e Fundamental.
Contando com 14 salas de aula, sala de professores, diretoria, secretaria, refeitório, banheiros (inclusive adaptados para alunos portadores de deficiência), pátio coberto e descoberto, sala de leitura (não há biblioteca na escola), bem como uma sala especialmente equipada com retroprojetor, palco e cadeiras estofadas para atividades multimídias, localiza-se em uma região arborizada e tranquila na qual grande parte dos alunos habita e tem a possibilidade de ir caminhando para a escola.
O quadro de professores é bastante extenso, mas poucos são os que lecionam a mais de cinco anos nesta mesma escola. A direção também foi recentemente alterada. Em conversas informais com professores, descobri que em sua maioria, eles lecionam em outras escolas, noutro período. A professora de Filosofia e o professor de Sociologia tem formação pela Universidade de São Paulo, outros professores tem formação em faculdades particulares.

Observação Na Sala De Aula:

Para o trabalho de observação, regência e outras atividades relacionadas ao estágio foi-me avisado, pela professora F, que Segundas e Terças-feiras eram os dias com maior número de aulas desta disciplina e, portanto, destinei as minhas manhãs destes dias exclusivamente para estas tarefas. Embora, tenha realizado 20 horas de observação, pretendo aqui descrever de modo completo uma única aula, pois ela reflete, no geral, o comportamento dos alunos e da professora.
Ainda que tenha avisado F que eu gostaria de estar sentada ao fundo da sala, apenas a observar o modo como ela conduzia suas aulas, a professora pediu-me gentilmente se eu poderia me apresentar aos alunos dizendo qual foi o meu percurso escolar, para assim, quem sabe, incentivá-los a prestar o vestibular da USP.
Assim, logo no primeiro dia, entre os olhares curiosos dos alunos do segundo ano A (e depois experimentei a cansativa tarefa de reproduzir o mesmo discurso três vezes aos alunos dos segundo ano B, C e D), contei que, bem como grande parte deles, também fiz todo o meu percurso escolar em escola pública. A maior parte deles perguntou-me se eu sentia alguma defasagem na faculdade em relação aos meus colegas e pontuei que, embora alguns alunos entrassem com uma bagagem de conhecimento superior, ao longo dos anos sentia que todos íamos construindo um conhecimento especifico naquilo que sentíamos maior prazer em realizar.
Claramente eufórica com a minha presença, a professora interrompeu meu discurso para dizer que eu, segundo ela, "havia ido a Portugal com tudo pago pela USP e que estudava latim". Senti-me um bocado incomodada com isso, pois não sabia em que proporção essa informação poderia me afastar dos alunos e fazer com que ele se sentissem intimidados com a minha presença. De fato, notei que alguns alunos reviravam os olhos nesse momento e pedi a professora, nas aulas seguintes, para que ela não passasse essa informação, pois não julgava exatamente pertinente, além disso, a bolsa não era da USP e sim da Capes, sendo que no Programa de Licenciatura Internacional havia alunos de outras universidades brasileiras.
Quando me dirigi ao fundo da sala para sentar, um grupo de alunas, de outro segundo ano, rompeu pela sala para mobilizar os demais estudantes a uma passeata contra o fechamento das escolas. O ponto de encontro seria às sete horas da manhã no vão do MASP, Avenida Paulista. Enquanto as meninas falavam, a professora escreveu na lousa "Ditadura-Dura" e um dos alunos, que estava sentado no fundo, gritou para o grupo que: "Vocês podem ir nessa passeata, porque os policiais não batem nas meninas".
Nesse momento a sala descontrolou-se em prol do tema levantado, uma das alunas do grupo que mobilizava os demais estudantes tentava afirmar que: "O governo fez uma escolha e não perguntou para os maiores interessados, que somos nós". Essas mesmas alunas tentavam conscientizar os demais que com o fechamento de algumas escolas, as demais iriam ficar superlotadas, além disso, no caso deles, iriam perder o Ensino Médio e por isso eles iriam se separar no último ano. Alguns alunos louvaram a Deus pela separação, então os próprios colegas mandavam uns aos outros "calarem a boca" ou "tomar no cú".
A professora tentou retomar o controle da sala a usar como exemplo a superlotação das cadeias a qual um aluno respondeu: "Aqui já é a cadeia". Visivelmente enfurecida com o comentário, a professora se dirigiu ao aluno e perguntou se ele já havia estado na prisão e, sem dar oportunidade ao aluno, respondeu a própria pergunta afirmando que: "não, pois você tivesse sido preso algum dia, não se portaria desse modo, cheio de mordomias". O grupo de alunas vai embora e a professora pede que, se houver algum aluno contra a manifestação, que vá a frente da lousa expor os seus motivos, bem como as colegas haviam feito. Uma aluna completa o discurso da professora afirmando que ela: "quer ver o circo pegando fogo".
Notei que durante a aula muitos alunos circulavam pela sala e saiam sem permissão, indaguei a professora a respeito desse comportamento na hora do intervalo e ela respondeu-me que era bastante normal em sua aula, porque ela era uma professora, segundo suas próprias palavras: "meio maluquinha".
A primeira aula foi dupla e, passados 50 minutos na discussão descrita, a professora inicia a chamada e começa a copiar na lousa o poema de Fernando Pessoa, "Não sei quantas almas tenho". Um dos alunos que está ao meu lado pergunta a outro: "Caraí, tem que copiar esse poema", a resposta vem em um segundo: "Que nada! Ela nunca corrige o caderno".
Após finalizar a copia, a professora pede que todos leiam, afirmando que é importante para entender o ritmo e perceber a coerência. Começa a ler sozinha, para, olha em volta que ninguém a acompanha e então ameaça que quem não ler ela irá "tirar um ponto da nota".
A leitura do poema é realizada e um aluno afirma: "Essa leitura tá pior que canto em igreja". De fato a leitura não foi especialmente bela, uma vez que cada aluno lia em seu próprio ritmo, alguns mais acelerados, outros mais vagarosos.
A professora pergunta qual o verso que os alunos gostaram mais do poema lido. Um aluno ironiza que tinha gostado mais do último, porque ele era o fim do poema. Ela continua a perguntar quem mais gostou do último verso, não sei dizer se por não ter percebido a ironia do aluno ou porque simplesmente ignorou a última parte da fala do mesmo.
Pede então aos alunos que criem um poema baseados no de Fernando Pessoa. Enquanto alguns poucos alunos realizam a tarefa, outros circulam pela sala, alguns dormem, outros realizam atividades de outros professores e em meio a isso ouço um aluno próximo de mim, que não estava a realizar a tarefa, gritar para outro do outro lado da sala "biscate, bisturi, abismado, abstinência" a professora ignora tudo e vai falando para um pequeno grupo na frente sobre o conceito de paródia e sobre os heterônimos pessoanos.
Levanto-me, vou até a frente da sala e pergunto a professora se posso ler um poema que compus naquele momento para os alunos do segundo A. Ela se anima e avisa a todos que eu fiz um poema para eles. Quando me posiciono em frente à sala, entre olhares curiosos e cochichos, os alunos que durante 90 minutos estavam agitados ficaram, pela primeira vez, em silencio. Recito o poema (transcrevo aqui):

Poema ao 2ª A
Hoje desperto no passado
Ao som de vozes que outrora
Também já me pertenceram
Reflito sobre aquilo que fui

Biscate, bisturi, abismado, abstinência
O colega brinca com aliterações
E nem vê que é poeta

A senhora que ver o
Circo pegando fogo!
Mas o governo fez uma
Escolha e não perguntou
Para os maiores interessados.

Ainda estou atrasado,
Eu não copio porque ela
Não corrige o caderno
Estou certo?

Você conhece a prisão?
Aprisionado no sistema,
Está correto, mas
A única chave é
Ser você mesmo.

Se eu leio Fernando Pessoa
Eu me transformo em uma pessoa?
Isso é o que ressoa
Na voz da fessora
Mas te pergunto na boa
Qual é a tua escolha?


Conselho de Classe:

"Quem manda na sala sou eu". Esta foi uma das primeiras frases proferidas por outra professora de português durante o Conselho de Classe realizado na escola, com os pais e alunos do Ensino Médio, que completa: "Querem falar mais alto do que eu, comem na sala, saem a todo o momento sem permissão e pensam que me enganam, mas eu vejo tudo".
O objetivo do Conselho era apresentar aos pais o desempenho dos alunos e determinar a qual o destino daqueles que estavam ameaçados de serem retidos. Apesar da postura dura apresentada por alguns professores, os alunos presentes passaram a maior parte a rir. "Alunos são crianças mal-informadas que acham que podem ameaçar o professor. Eles acham que podem reunir dois ou três colegas e ir até a delegacia de ensino falar mal do professor só porque os chamei de idiotas. Eu duvido que eles possam conseguir alguma coisa, porque lá o meu nome é consagrado", continuou a mesma professora.
Durante o Conselho pude perceber que, quando algum professor não atribuiu nota, o grupo de professores é soberano na decisão sobre se aquele aluno será retido ou não.
O resultado deste primeiro dia de Conselho foi bastante negativo, segundo a direção da escola, pois enquanto no ano passo houveram nove retensões em todo o Ensino Médio, neste houveram nove apenas em uma única classe de primeiro ano. Após esse resultado um professor de Física afirmou que era: "Melhor fechar todas as escolas e construir presídios", enquanto que outra professora pondera e diz que era: "Preciso atentar as defasagens dos alunos e dar oportunidades para que eles pudessem melhorar".
A direção pontuou que a culpa não era inteiramente do aluno e que "Não há organização, alguns professores tiram 90 dias de licença e os alunos não respeitam o eventual, porque ele não prossegue com a matéria e isso acaba os prejudicando".
Um dos pontos altos da discussão no conselho de classe, relembrando, mais uma vez que além dos alunos, havia pais presentes foi um desacordo entre os professores sobre a forma de como chamar a atenção em sala de aula. Alguns professores disseram que o ideal era chamar o aluno "de canto" (a professora F cita Mario Sérgio Cortella), enquanto a coordenadora diz que alguns jovens pedem para ser expostos perante os demais colegas.
Outro ponto que gostaria de pontuar foi em um momento em que a professora de Educação Física, percebendo que um aluno dormia muito durante as aulas questionou o pai, que estava presente, se o rapaz trabalhava. O pai deste aluno, um bocado acanhado, afirmou que sim, que depois de sair da escola ele ia direto para o trabalho e sempre chagava mais de meia noite em casa. O aluno tinha 15 anos. Pude perceber um certo desconforto por partes dos professores e, ao fim do Conselho, os professores comentaram que não imaginavam que era isso que acontecia com este aluno.

Regência Na Sala de Aula:

Enfim, a regência de sala de aula, como já descrito na introdução, foi destinada a uma oficina de criação literária. No primeiro dia, a proposta foi uma discussão sobre o conceito de Arte. Perguntei aos alunos o que eles consideravam arte e obtive as mais diferentes respostas, desde objetos concretos como quadros e esculturas, até ideias como criatividade, liberdade e indefinível. Neste momento desenhei aos alunos um cacho de uvas na lousa e perguntei a eles se eles sabiam o que era aquilo. Muitos responderam prontamente que era um cacho de uvas, mas um aluno surpreendeu-me a responder que aquilo era a representação de um cacho de uva. Comentei então, a respeito da obra do artista belga René Magritte (1898-1967) Isto não é um Cachimbo (Ceci n'est pas une Pipe), alguns alunos afirmaram conhecer através da aula de artes. A seguir passei uma série de vídeos do documentário À Margem do Infinito, que retrata o processo de produção de jovens escritores paulistanos independentes. A recepção foi muito boa por parte dos alunos, entretanto, outros se mostram bastantes arredios em relação à atividade. Para me comunicar diretamente com os alunos, desenvolvi um grupo através do Facebook para postar mais informações em relação à oficina e as propostas de trabalho que vim desenvolvendo na escola. Transcrevo o texto, do qual tive bastante aceitação por parte dos alunos e que também retrata a minha experiência em relação a regência:
"Esse professor é complicado", apontaram-me de canto, na sala de professores. "–Eu não estou nem aí para nota. Se tenho um aluno com deficiência e sei que ele se esforçou ao máximo, não vou dar 5!". Acaloradas discussões sufocadas pelas grades das janelas. Gritos no pátio que cagam para toda essa política educacional, porque afinal a estagiária está com uma blusa cavada em que se vê o biquíni.
"Não sou super-heroi", dispara a boca que se calou perante à eminência do disparo de uma arma as 5h30 da manhã. Arrastão, quatro armados. No ponto de ônibus sete mulheres e o professor. Levaram-lhe tudo, menos a vontade de estar aquela manhã a tentar enfiar na cabeça de uma outra professora, que nota não quer dizer nada.
Tchecov diz que se no início de um conto ou drama mostra-se uma arma, antes do final ele terá que disparar. "Mas quem é Tchecov, fessora?" Aí os cânones. Assis, Bandeira, Camões, Dias... até chegar no T demora demais. Também não conta, porque no ensino público brasileiro só se podem ensinar os autores de língua portuguesa. O engraçado é eu nunca vi Agualusa, Lima, Couto ou Noronha.
Questionei na minha faculdade o motivo.
Tchecov acertou, fui fuzilada por muitos olhares. Mas, o importante não é agradar ou desagradar.
É ter foco no objetivo.
Como trabalhar com uma geração que tem a facilidade de fotografar o quadro negro, enquanto professores talham a pedra com gizes brancos? Que sabem as notícias através do grupo do whats e que só perde tempo lendo alguma coisa maior, porque pode ser que dê polêmica. Marcam "AC" e correm para a pipoquinha.
Eu sou reclamona. Travei guerras com meus colegas na faculdade porque sempre defendi um ensino menos tradicional e muito mais conectado as gerações mais novas. Sempre disse que o salto geracional foi muito grande e que era preciso reformular tudo a partir da cultura desses jovens. Dessa geração que não perde tempo.
Mas gosto de ouvir primeiro. Quis ouvir os alunos:
"Tem que copiar?". "Vai valer nota?". "Que cê vai dar pra gente?".
Pornô.
"Aié? Pornô?".
Sim, gostas?
"Com a senhora?".
Estas a sugerir que façamos um pornô?
Silencio.
O colega dá um tapa na nuca e chama "panguão". "Respeita aí a fessora!". O auditório é bem diferente do que eu tinha na minha época. Parece uma salinha de cinema no Largo Payssandú, no centro. Na minha época nem tinha auditório. Tinha que carregar a televisão de tubo de um lado para o outro. Na minha época não tinha internet e eu fazia os trabalhos pesquisando em enciclopédias e escrevendo em folha almaço. Era um saco, tinha que fazer letra bonita porque o professor reclamava e tirava nota. Nota para letra!
Quando eu estava no segundo ano do colegial eu tinha um colega na sala que todo mundo dizia que era chato. Chato porque ele se apegava muito, se você dava um bocadinho de atenção ele ficava te seguindo. Não. Aqui não é seguir no Twitter, no Instagram, no Face nem nada. Era seguir de ficar no pé. De querer sentar contigo no intervalo. Ou de ficar sobrando no grupo porque destoava completamente de todos.
Ele não era chato comigo.
Encontrei com ele no supermercado um dia antes do final das férias. Ele estava com calções de banho e rimos juntos, porque sempre o vi de jeans na escola. Perguntei das férias e relembrei que estaríamos finalmente no 3º colegial. No último ano! Ficamos felizes. Ele estava acompanhado de alguns rapazes que eu não conhecia e que logo o chamaram. Meu colega disse que eles iriam tomar banho no rio. Eu falei para que aproveitassem e fui embora para casa.
No primeiro dia de aula todos cochichavam. Entendi que havia um ambiente estranho, mas não sabia o que era. Na primeira aula, com fúnebre olhar, o professor de Matemática anunciava que esse colega havia morrido afogado. O motivo. Ele não sabia nadar.
Ou será a rejeição?
E esse? Luís Fernando Veríssimo. Conhecem? As mentiras que os homens contam. Risadas boas dos alunos que acompanharam. Iniciativa boa de lerem, ou de serem coagidos a ler. Energia que deixa feliz. Que me deixa impressionada na fluência que quase todos tiveram ao ler.
"Posso ler?". "Eu fiquei viciada em escrever agora". "Gostei da aula professora!". "Esse tema vai de encontro ao documentário sobre o Grafite que outro professor nos passou". "Desculpa aí, fessora, a bagunça". "Até amanhã". "Eu gostei mais do primeiro". "Mais do segundo". "Mais do terceiro". "Mais do quarto vídeo".
E tu? Porque é que não podes ler? Não fizeste o questionário. Não fizeste a redação. Nem sequer prestaste atenção ao documentário e a te recusas a ler? Porque é que não fazes nada?
"Eu não faço nada? Então olha as minhas notas".
Nota? O professor lá em cima já dizia... acho que por isso que ele é complicado. Mas eu concordo com ele. Que é uma nota perto de quem foi gentil em subir na cadeira para ligar o projetor? De quem foi solicito quando eu pedi ajuda. De quem se esforçou para não atrapalhar os colegas que queriam prestar atenção. Que não negou responder a uma pergunta, mesmo sem saber, mas que se esforçou. Que disse uma opinião sem medo de ser julgado pelos colegas em nossos debates. Que gastou 50 minutos escrevendo uma redação. Ou respondeu a um questionário para que eu defendesse o ponto de vista do alunado..
À Margem do Infinito. "O processo de criação, o ritual interno, e também técnico, o confronto do fazedor e de seu feito: essa é a abordagem que o fez no ano de 2014 sobre 4 escritores que batalham na luta das letras. Com ares documentais, partilhamos suas motivações, inspirações e frustrações". "VAI, Prefeitura de São Paulo:
http://www.prefeitura.sp.gov.br/…/cultu…/fomentos/index.php…
"Terminou. Pode ir embora?".
Podia ir desde o princípio. Ninguém é obrigado a estar aqui". REIS_Laís

Como havia citado logo acima. O texto foi muito bem recebido pelos alunos e eles se sentiram prestigiados em serem personagens de uma história. Desta forma abri espaço para uma discussão sobre criação literária, assim, as aulas seguintes foram concentradas em um conceito chamado PENTE (Personagem, Enredo, Narração, Tempo e Espaço). Para a criação de personagens (anexo a tabela utilizada posteriormente para a atividade), sugeri aos alunos que pensassem no personagem que mais gostassem e depois, realizando a tarefa juntamente na lousa fomos traçando o perfil físico, psicológico e a relação da personagem dentro da e história.
Para a questão de tempo e de espaço, já em outra aula, mostrei uma imagem que desenhei composta por uma borboleta e flores que em sua totalidade representavam um rosto feminino. Dialogamos a respeito da relatividade do tempo e em seguida li um conto de Edgar Allan Poe, chamado O Retrato Oval, perguntando em seguida o que eles haviam entendido. Mais uma vez me surpreendi com alguns alunos que, na maior parte do tempo pareciam desinteressado, mas que em silencio absoluto prestaram atenção e depois souberam explicar com precisão aquilo que acontecia no conto. Realizamos uma comparação entre a descrição de um retrato dentro do conto e o próprio retrato que trouxe para eles.
Por último, a aula final foi focada em narração e enredo. Levei o Auto da Compadecida de Ariano Suassuna para realizar uma leitura compartilhada em sala de aula. Os alunos, neste momento estavam em uma quantidade bastante menor, pois neste dia havia sido aplicada a prova do SARESP na escola. Entretanto, a leitura foi bastante fluida e os alunos pareceram se divertir com a atividade proposta.


Comentários Finais:

A escola como um microcosmo da sociedade. Este foi o conceito que permaneceu em mim durante e depois da experiência de estágio. Como fiz a licenciatura na Universidade de Coimbra, tive a oportunidade de acompanhar os alunos de lá e posso garantir, como todas as certezas, que não temos um problema fundamentado no modelo escolar e sim no modelo de jovens que temos. Diferentemente do que diria Gonçalves Dias, as aves que gorjeiam por aqui, gorjeiam sim como lá. A cultura jovem é única e as possibilidades de comunicação que advém da globalização acaba sim, por padronizá-los de alguma forma.
Entretanto o processo de aprendizado está baseado nas relações construídas dentro da escola; Em sala de aula o foco é a relação aluno/professor, mas o principal responsável desta relação, quem deverá cuidar deste processo será o professor.
Ensinar é uma atividade nobre. Um professor ensina sem saber exatamente a contrapartida, não sabe de que maneira os alunos estão adquirindo tudo aquilo, ou como coloca ECO no discurso proferido em Mantua no Festival de Escritores (Set,2000) "o mundo da literatura nos oferece um modelo imaginário de verdades hermenêuticas". Em outras palavras, seja um autor, seja um professor, o que está sendo dito será interpretado pelos alunos através de suas experiências de vida e por isso a preocupação em adaptar o discurso dos professores a uma realidade mais próxima aos alunos que tem contato.
Por isso, a escola não foi feita para os professores ensinarem, para aplicarem as tabelas e fórmulas impostas por esta ou aquela faculdade, por um ou outro modelo. A escola foi feita sim, para os alunos aprenderem. "Educação ao fado e à morte", como ECO finaliza.












Bibliografia

CANDIDO, Antonio. "Literatura e formação do homem". Ciência e Cultura, 24(9), p.803-9, set. 1972. _____. "O Direito à literatura". In: Várias escritos [ed. rev. e ampliada]. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
BARTHES, Roland. "O discurso da História". In: O Rumor na Língua. São Paulo,
Brasiliense: 1988.
DOLZ , J. e SCHNEUWLY, B. Gêneros e progressão em expressão oral e escrita. Elementos para reflexões sobre uma experiência suíça (francófona). In "Gêneros Orais e escritos na escola". Campinas(SP): Mercado de Letras; 2004.
REZENDE, Neide. Gêneros confessionais. In GREGORIN FILHO (org.). José N. Literatura infantil em gêneros. São Paulo, Editora Mundo Mirim, 2012. p. 78-90 _____. O ideal de formação pela literatura em conflito com as práticas de leitura contemporâneas.
ROCHA, SILVIA PIMENTA VELLOSO. "Tornar-se quem se é: educação como formação, educação como transformação".In:MARTINS, A.M.M. et alli. Nietzsche e os Gregos: Arte, Memória e Educação. Rio de Janeiro: DP&A; FAPERJ; Brasília: CAPES, 2006. pp. 267-278.

Filmografia

À MARGEM do infinito. https://vimeo.com/amargemdoinfinito




Lihat lebih banyak...

Comentarios

Copyright © 2017 DATOSPDF Inc.