INTELIGÊNCIA COLETIVA: ANÁLISE DE UM PROJETO COMPETITIVO DE ROBÓTICA

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Descripción

Senra, C., Braga, M. (2016) INTELIGÊNCIA COLETIVA: ANÁLISE DE UM
PROJETO COMPETITIVO DE ROBÓTICA, TICEDUCA 2016, Universidade de Lisboa,
Lisboa.


INTELIGÊNCIA COLETIVA: ANÁLISE DE UM PROJETO COMPETITIVO DE ROBÓTICA

Clarice Parreira Senra, Marco Braga
Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF, Faculdade de Educação; Centro
Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca – CEFET-RJ Programa
de Pós-graduação em Ciência, Tecnologia e Educação;
[email protected]; [email protected]


Resumo
A inteligência coletiva tem como proposta a valorização das capacidades
indivuduais, a qual propõem favorecer a cooperação dos indivíduos, podendo
compartilhar sua inteligência. Nessa pesquisa procurou-se investigar um
grupo de 8 estudantes inseridos em um projeto de robótica educacional, ao
longo do projeto foram analisadas as conversas enviadas por meio do
aplicativo whatsApp a fim de verificar como ocorre o fluxo de informações
entre os participantes, assim como as observações feitas durante as
reuniões semanais do grupo, registrando como os alunos solucionam os
problemas que surgem, onde buscam informações e como compartilham seus
saberes entre si. Formou-se uma rede de aprendizagem entre os alunos,
percebemos uma liderança por parte de um integrante e um aprendizado
mediante aos erros cometidos durante o processo de programação e construção
do robô, nesse projeto os alunos puderam compartilhar seu conhecimento uns
com os outros, o que de fato enriqueceu o aprendizado de cada um.

Palavras-chave:robótica educativa; projetos de investigação; inteligência
coletiva
Keywords: educational robotics, research projects, collective intelligence





1. INTRODUÇÃO

Com o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação
(TICs) muda-se a maneira de comunicar e interagir entre as pessoas, ampliam-
se a troca de informações e os modos de comunicação. Por outro lado, quando
analisamos a configuração e o processo de ensino em nossas escolas, o
modelo ainda permanece praticamente inalterado. Ou seja, cabe ao professor
falar, escrever e ensinar e ao aluno escutar e reproduzir. De acordo com
Pireddu (2015) a tecnologia por si só não enriquece o sujeito da
aprendizagem, elas podem propiciar pedagogias inovadoras. Existem muitas
atividades que as mídias digitais não conseguem fazer, assim como existem
atividades que só são possíveis de serem feitas em rede, como: interação
de todos com todos, a simulação, o compartilhamento de um mesmo ambiente de
trabalho, entre outras.
Para Bonila e Pretto (2015) precisamos compreender a formação cidadã
nos tempos atuais, além dos campos específicos de cada matéria ou dos
campos dos saberes, existe a necessidade de um letramento que vá além das
disciplinas escolares, destacando assim 5 características do novo
letramento: "atenção, participação, colaboração, consumo crítico de
informação e redes inteligentes". Dentre as cinco caracterísiticas desse
novo letramento destaca-se a perspectiva de colaboração, que é
intensificada a partir das redes digitais de comunicação.
Segundo Lévy (2015) a inteligência coletiva está distribuída por toda
a parte, ninguém sabe tudo, mas cada indivíduo sabe alguma coisa, todo o
saber está na humanidade. O ideal da inteligência coletiva é valorizar a
inteligência de todos.
"Na era do conhecimento, deixar de reconhecer o outro em sua inteligência é
recusar-lhe sua verdadeira identidade social, é alimentar seu ressentimento
e sua hostilidade, sua humilhação, a frustação de onde surge a violência.
Em contrapartida, quando valorizamos o outro de acordo com o leque variado
de seus saberes, permitimos que se identifique de um modo novo e positivo,
contribuímos para mobilizá-lo, para desenvolver nele sentimentos de
reconhecimento que facilitarão, consequentemente a implicação subjetiva de
outras pessoas em projetos coletivos." ( Lévy, 2015)
Devemos repensar o modelo tradicional da escola, nesse sentido é necessário
desde a educação básica, o aluno ser inserido no processo de pesquisa, como
a escola não está preparada para auxiliar na formação do aluno pesquisador,
ela acaba destruindo ao longo do processo de escolarização, a criatividade
dos alunos, achando muitas vezes que vão conseguir fazer com que todos
pensem da mesma forma, "questões e soluções só são possíveis de serem
produzidas no coletivo, de forma colaborativa" (Bonilla e Pretto, 2015).
Pensando nessa perspectiva, da necessidade de um letramento que
valorize habilidades além dos saberes específicos de disciplinas, que
introduza o aluno na pesquisa e em um ensino que permita a colaboração de
todos os discentes na solução de um problema, o presente trabalho tem como
contexto uma pesquisa que foi desenvolvida com um grupo de alunos inseridos
em um projeto de robótica educacional, sabemos que propostas no sentido de
mudar a configuração tradicional das escolas ainda são pequenas e pontuais,
mas extramente importantes de serem realizadas, ainda que de forma paralela
ao ensino tradicional. Analisamos nesse grupo, as interações dos alunos por
meio de conversas pelo WhatsApp, como eles trocam informação, como
solucionam problemas, onde e como buscam informações.

2.METODOLOGIA
2.1 Caracterização da pesquisa
O presente estudo pretende investigar um grupo de 8 alunos inseridos
em um projeto de robótica educacional. Os estudantes participantes do
projeto da pesquisa cursam o ensino médio, 1º e 2º ano, todos do Colégio
Militar de Juiz de Fora (CMJF). As atividades de robótica tiveram seu
início nesse colégio no ano de 2014, fruto de um projeto maior da rede de
colégios militares do Brasil, no início das atividades, por falta de
material próprio do colégio iniciamos uma parceria com a Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF), onde o coordenador do curso de Engenharia
Elétrica em Robótica e Automação Industrial emprestou 7 kits da lego
mindstorms NXT para o início do projeto, no final de 2014 o colégio
adquiriu 2 kits lego mindstorms EV3. Vale destacar, que a parceria com UFJF
foi apenas no sentido de empréstimo do material, sem nenhuma capacitação ou
treinamento para o desenvolvimento das atividades.
Vários são os kits de robótica presentes no mercado, um dos mais
usados é o da Lego. Esses kits permitem trabalhar com situações problemas
em grupo de, no máximo, 4 alunos. Além da inserção do estudante na solução
de problemas orientados pelo professor, essa atividade incentiva o trabalho
em grupo muito importante para a formação do jovem.
Iniciativas e projetos desenvolvidos nos vários níveis de ensino
destacam que a robótica educacional pode ser usada como ferramenta
pedagógica e que esta tecnologia com características muito específicas
permite aos alunos desenvolver a capacidade de resolução de problemas, o
trabalho em equipe de forma colaborativa, a criatividade e imaginação, o
raciocínio lógico e pensamento abstrato (Batista, 2010; Silva, 2009).
Uma grande incentivadora no desenvolvimento de atividades de robótica
nas escolas é a Olimpíada Brasiliera de Robótica (OBR), que acontece nas
modalidades: teórica e prática. Sua modalidade prática incentiva os alunos
a solucionarem um problema real, como socorrer uma vítima e levá-la para um
local seguro. Durante esse processo, o aluno deve desenvolver um robô capaz
de desviar de obstáculos, subir uma rampa e socorrer uma vítima. Desse
modo, para a sua construção, os alunos precisam conhecer vários conceitos
referente às ciências - especialmente de física, como centro de gravidade,
frequência, velocidade, entre outros. Nesse sentido, a OBR torna-se uma
atividade importante e motivadora para os estudantes.
Durante o ano de 2014, no desenvolvimento do projeto de robótica no
CMJF, percebemos que a atividade proporcionou a criação de uma rede de
aprendizagem entre os alunos participantes. Os discentes, durante todo o
ano estabeleceram uma interação constante por meio do facebook e de
aplicativos como o Whatsapp, uma vez que criaram grupos para facilitar o
contato e trocar informações.
Nesse trabalho vamos analisar o fluxo de informações obtidas pelo
aplicativo Whatsapp, de modo a traçar como os alunos trocam as informações,
qual o tipo de informação e se durante as conversas é possível estabelecer
um perfil de liderança por parte de alguns alunos.
O grupo no Whatsapp foi criado em março de 2014, logo no início das
atividades, para nossa análise escolhemos o período de Março de 2015 a
Setembro de 2015, pois nesse período os alunos iniciaram as atividades do
ano e em setembro acontece a OBR, logo, durante o período analisado os
alunos estavam preparando para a competição.
As reuniões acontecem uma vez por semana, em um horário extraclasse
combinado com os alunos. O grupo é acompanhado pela professora orientadora.
Os encontros acontecem no laboratório de Física do próprio colégio. Esse
espaço possui bancadas para atividades experimentais já que o colégio não
dispoem de uma sala própria para a robótica. Desse modo, após o uso, todo o
material deve ser guardado nos armários, para não invibializar as
atividades experimentais que ocorrem no local.


2.2 Análise
Para facilitar a análise do fluxo de informações vamos dividir as
conversas por temas e quantificar o número de mensagens que cada
participante posta no grupo. Vamos dividir nos seguintes temas:
Robótica – todas as conversas referentes ao projeto;
Sala de aula – todo conteúdo relacionado as aulas, olimpiadas
escolares e eventos do colégio;
Professora orientadora – mensagens dos alunos para a professora
orientadora, tais como perguntas, dúvidas entre outras.
Consideramos na contagem das conversas o início de um assunto no dia,
e não o número de mensagens total trocadas pelos alunos e pela professora
orientadora.
Os alunos participantes dessa pesquisa foram identificados pelo
sistema alfanumérico A1, A2,..., A8 e a professora orientadora por P., para
preservar a identidade dos mesmos. A orientação teórico-metodológica
utilizada nesta pesquisa está ancorada na análise qualitativa (Bogdan e
Biklen, 1994).
Além de analisar as conversas do grupo criado no Whatsapp, as
observações feitas durante os encontros foram registradas em um caderno de
campo. Observamos constantemente como os alunos trabalham em grupo, se
existem um líder entre eles, como eles pesquisam, diante de problemas como
eles tentam solucionar.
Na tabela 1, abaixo, podemos observar como acontece o fluxo de
informações entre o grupo, para a contagem consideramos o assunto iniciado.







"Tema "Número de conversas "


"A1 "A2 "A3 "A4 "A5 "A6 "A7 "A8 " "Robótica "20 "4 "4 "2 "1 "6 "4 "1 "
"Sala de aula "3 "- "1 "1 "- "- "1 "- " "Professora Orientadora "5 "5 "- "-
"- "2 "1 "- " "
Tabela 1 – Troca de informações no whasApp

Além do número de conversas por assunto, observamos o número de
conversas iniciadas por cada participante do grupo, inclusive da professora
orientadora, podemos observar essas informações na tabela 2, a seguir.

"P. "A1 "A2 "A3 "A4 "A5 "A6 "A7 "A8 " "Número de conversas iniciadas "21
"19 "3 "4 "0 "1 "5 "2 "0 " "
Tabela 2 – Conversas iniciadas no Whatsapp

Os dados das tabelas 1 e 2 mostram uma liderança do aluno A1 nas
conversas. Percebemos que o grupo permaneceu focado na temática do projeto,
mesmo com alguns assuntos relacionados ao colégio. De modo geral, as
informações trocadas estavam diretamente ligadas às atividades de robótica.
A liderança constatada no grupo do Whatsapp também foi notada nas reuniões
presenciais. Esse aluno apresenta um perfil de líder e organizador, mesmo
quando faltava as reuniões deixava anotado os objetivos que deveriam ser
alcançados naquele encontro. Durante o recesso escolar, que ocorreu em
julho de 2015, ele mobilizou o grupo para que pudessem adquirir o material
para fabricar a pista de treinamento para as competições, fez orçamentos e
mesmo o colégio não disponibilizando recursos, sugeriu que dividissem os
gastos entre os integrantes do grupo. Sempre que precisavam fazer reuniões
extras, ele procurava agendar no laboratório e comunicava ao grupo. Vale
destacar que esse perfil de liderança em nenhum momento atrapalhou o
desenvolvimento do projeto e a participação dos demais, além de líder ele
sempre se mostrou prestativo, procurando ajudar e explicar aquilo que sabia
aos demais.
Percemos que os alunos A5 e A8 trocaram poucas informações e o aluno
A8 não iniciou nenhuma conversa no grupo. Observamos que os alunos A4, A5 e
A8, na grande maioria das mensagens apenas respondia as perguntas do grupo,
mas não inciavam assuntos, estavam conectados, mas não eram proativos.
Nesse sentido uma liderança é importante para que aconteça uma interação
entre os participantes. Essa postura também pode ser observada nos
encontros presenciais. As conversas dos alunos A2 e A3 fugiam do assunto em
alguns momentos, e esse comportamento também acontecia nas reuniões, apesar
de terem um racíonio rápido para programação e desenvolvimento das
atividades, desconcentravam facilmente.
Com relação às conversas iniciadas, podemos observar que a professora
orientadora iniciou a maior parte das conversas com o intuito de dar
informações sobre datas e horários das reuniões e sobre a competição.
Além da análise do fluxo das informações no Whatsapp, observamos como
os alunos buscavam solucionar os problemas que surgiram ao longo do
processo de montagem e programação do robô para a competição. Durante a
subida do robô na rampa a esteira colocada delizava. Para resolver o
problema os alunos colocaram uma fita isolante que aumentava o atrito.
Outra dificuldade encontrada foi a programação do sensor ultrassônico
que é utilizado para desviar de obstáculos. A programação continha um bloco
diferente do tipo de sensor utilizado, o sensor da programação era
infravermelho. Nesse caso eles tiveram que baixar um novo bloco para então
programar o sensor.
Essas soluções foram pesquisadas e testadas pelos alunos, o que
permitiu sua inserção em um problema real e os incentivou a buscar soluções
para o mesmo. A maior parte das informações e busca de soluções foram
obtidas por meio da internet.
Vale ressaltar que apesar da análise dessa pesquisa ser referente ao
ano de 2015, os alunos já haviam participado da OBR em 2014 e fizeram um
rôbo com um sistema de direção diferenciado dos demais. O rôbo não
conseguiu realizar a prova, mas foi premiado com a medalha inovação. Diante
dos erros cometidos na primeira competição, em 2015 eles inciaram o projeto
melhorando e adaptando o robô. Com essas adaptações conseguiram alcançar a
medalha de prata. Ao final da competição, em setembro de 2015, eles fizeram
uma reunião para discutirem os erros cometidos e traçaram metas para o ano
de 2016.
Essa movimentação em refletir sobre os erros cometidos, traçar metas e
objetivos para a próxima competição permitiu que os alunos aprendessem com
os erros, mostrando assim, que o erro não deve ser criminalizado com
freuqentemente ocorre com o sistema de provas e notas. Erros fazem parte do
processo de aprendizagem, o que na maioria das vezes não é percebido pelos
alunos e é associado ao fracasso pessoal.

3. CONCLUSÃO
Durante as observações do grupo e a análise das conversas no Whatsapp
percebemos a formação de uma rede de aprendizagem, onde os alunos puderam
compartilhar seus conhecimentos e amplia-los. Como afirma Lévy (2015) a
base e o objetivo da inteligência coletiva são o conhecimento e o
enriquecimento mútuos das pessoas, a valorização das competências de cada
indivíduo, entendendo desse modo que cada ser humano possui habilidade em
alguma coisa.
A organização e configuração dos encontros, ou seja, a forma como o
trabalho foi desenvolvido, sem um guia pronto, sem um professor para
indicar o caminho a seguir, possibilitou que os alunos se organizassem de
forma a buscar informações e resolver os problemas. A temática robótica
educacional, por mexer com o imaginário dos alunos, despertou o interesse
em pesquisar e solucionar os problemas que surgiram durante o projeto.
No ambiente das redes, o compartilhamento de informações é uma ação
constante, pois as pessoas frequentemente gostam de compartilhar o que
sabem. Nesse sentido, forma-se uma rede de colaboração, onde a inteligência
de todos será maior que a as inteligências individuais. Essa troca de
informação assegura ganhos, porque cada participante melhora, pois há uma
grande troca de conhecimentos entre os atores da rede. "Todos ganham,
porque cada ator vai construir alicerces e desenvolver novas ações tendo
como base as informações compartilhadas" (Tomael e marteleto, 2006, p. 76).

REFERÊNCIAS
Batista, M. C. M. (2010). O robot NXT Mindstorms e a área de projecto. 141
f.Dissertação (mestrado em Educação). Tecnologias de Informação e
Comunicação e Educação, Universidade de Lisboa, Instituto de Educação.


Bonilla, M. H. & Pretto, N. De L. (2015). Movimentos colaborativos,
tecnologias digitais e educação. Em aberto, Brasilia, V. 28, n.94, p.
23-40.
Bogdan, R.C. & Bilken, S.K. (1994). Investigação Qualitativa em Educação -
uma introdução à teoria e métodos - Porto, Portugal: Porto Editora.
Lévy, P. (2015). A inteligência coletiva. São Paulo: Folha de S. Paulo.
Pireddu, M. (2015). Redes de conhecimento: as dimensões do social learning.
. Em aberto, Brasilia, V. 28, n.94, p. 41-50.
Silva, A. F. (2009). RoboEduc: Uma Metodologia de Aprendizado com Robótica
Educacional. 133 f. Tese de Doutorado em Engenharia Elétrica da (Área
de concentração:Engenharia da Computação) Dissertação (mestrado em
Educação). , UFRN.
Tomael, M. I. & Marteleto, R. M. (2006) . Redes Sociais:posições dos
atores no fluxo da informação. In: VI ENANCIB-Encontro Nacional de
Pesquisa em Ciência da Informação, Florianópolis-SC. Anais do VI
ENANCIB- Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação.
Florianópolis-SC: ANCIB e UFSC.
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