Filosofia para dizer o que? Susan Haack is interviewed by Laura Talchin (2012)

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entrevista

susan haack Por Laura Talchin Tradução: Rachel Herdy

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Filosofia para dizer o quê?

la defende que a Filosofia é a busca pela verdade, uma investigação que deve ser feita com precisão e clareza. A obra da filósofa inglesa Susan Haack tem um alcance interdisciplinar, contém trabalhos em diversas áreas, como Filosofia da Lógica e da Linguagem, Epistemologia, Metafísica, Filosofia da Ciência e do Direito e Pragmatismo, mas sempre com um olhar simples. Critica o estado atual da Filosofia e o mau uso de termos técnicos que só podem ser entendidos por um pequeno grupo de pessoas: “A prioridade em escrever filosoficamente é ser o mais claro e exato possível; o que não significa que é necessário se adaptar ao estilo forçado, sem humor e cheio de jargões, que é recorrente em tantos escritos filosóficos profissionais hoje”, disse. Formada pela Universidade de Oxford  e doutora pela Universidade de Cambridge, Haack en-

sinou na Universidade de Warwick antes de se mudar para Miami e assumir sua posição atual de professora de Ciências Humanas, Filosofia e Direito. Ela demonstra o seu lado criativo em uma conversa imaginada entre os filósofos Richard Rorty e C. S. Peirce, na qual defende o Pragmatismo da filosofia de C. S. Peirce. E se preocupa com o futuro do ensino e da pesquisa na academia. Manifesto de uma moderada apaixonada, lançado no ano passado pela Editora PUC-Rio / Edições Loyola, é o segundo livro de Haack no Brasil. Filosofia das lógicas foi publicado pela UNESP em 2002, e um terceiro livro, Filosofia do direito: perspectivas pragmatistas, a ser publicado pela UNISINOS, está a caminho. Em Manifesto..., a professora aborda questões como multiculturalismo e feminismo. Nesta obra, poderemos ter bons exemplos do humor, sagacidade e clareza que marcam o seu estilo.

Laura Talchin é americana, formada em Ciências Políticas pela Georgetown University. Atualmente, mora no Rio de Janeiro e desenvolve pesquisas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro sobre os conceitos de cidadania e o sistema de cotas raciais, com bolsa da Fulbright. Rachel Herdy foi pesquisadora visitante entre os anos de 2008 e 2009 na Universidade de Miami sob a orientação da professora Susan Haack. Atualmente, é professora adjunta da Universidade Federal do Rio de Janeiro. www.portalcienciaevida.com.br •

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Com obra lançada recentemente no Brasil, a inglesa especialista em Lógica, Epistemologia e pesquisa para o ensino, ressalta a necessidade de clareza e objetividade em trabalhos sérios na Filosofia. E aborda os problemas no ensino da disciplina nas universidades

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Muitos escrevem somente para seus pares dentro da profissão ou para outros membros de sua panelinha; e em um estilo de escrita profissional pseudotécnico e enfadonho FILOSOFIA • Em Manifesto de uma moderada apaixonada, você lamenta o estado atual da Filosofia na academia. Você vê uma conexão com o modo como as pessoas de fora da Filosofia tendem a abordá-la?

“A Filosofia não está no presente momento em uma condição particularmente saudável” – escrevi em “Preposterismo e suas consequências”, publicado primeiramente em 1996. Gostaria de poder dizer que agora a situação está bem melhor, mas não posso. Pelo menos nos EUA e, provavelmente, no resto do mundo de língua inglesa, a Filosofia profissional encontra-se em um estado pior do que há 15 anos. Em 1996, minha preocupação principal era o cinismo extravagante em relação aos conceitos de verdade, prova, fato, objetividade e investigação que se tornou moda entre sociólogos da Ciência radicais, pós-modernos, filósofos, feministas radicais, etc – um cinismo que grande parte da Filosofia dominante ignorava, mas que a meu ver precisava urgentemente de uma crítica e de um exame cuidadoso. Hoje, os filósofos neoanalíticos estão ainda mais autocentrados do que antes: muitos escrevem somente para seus pares dentro da profissão ou para outros membros de sua panelinha; e um estilo de escrita profissional pseudotécnico e enfadonho é cada vez mais de rigeur. Não é de se admirar que muitos leigos acreditam que não há nada de interessante para eles na Filosofia!

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FILOSOFIA • O que você vê como a aplicação ideal de uma abordagem filosófica no dia a dia?

Este papo sobre “a aplicação ideal” sugere que há somente uma maneira por meio da qual a reflexão filosófica séria pode vir a possuir relevância no mundo real; e aquele papo de “uma abordagem filosófica” sugere que devêssemos nos valer de platitudes como “a vida é aquilo que você faz dela” ou “você faz a sua própria sorte”. Isso não é nem remotamente o que tenho em mente. Mas certamente acredito que ideias filosóficas – sejam elas encontradas em um romance, na obra de cientistas de pensamento ou juristas ou nos trabalhos

tradicionalmente classificados como filosóficos – podem iluminar questões que concernem a todas as pessoas que possuem a capacidade de reflexão. Por exemplo, qualquer pessoa que se questione sobre a confiabilidade dos relatórios de testes clínicos ou de uma pesquisa educacional tipo survey precisará de algum entendimento quanto às diferenças entre tentativas de boa-fé de descobrir a verdade sobre alguma questão e esforços para encontrar provas a favor de alguma conclusão previamente determinada; quanto à relação entre as probabilidades estatísticas relatadas em um estudo e as probabilidades epistemológicas de que a conclusão alcançada seja verdadeira; e quanto àquilo que faz um estudo ser bem ou mal projetado e conduzido. E aqui a Epistemologia séria – e não as disputas sobre questões ínfimas que interessam somente às panelinhas epistemológicas de hoje – pode ajudar. Mais uma vez, as distinções que faço entre os vários sentidos de “multiculturalismo” podem ajudar as pessoas a entenderem os desacordos sobre se o multiculturalismo é uma coisa boa, ou ruim; e minha distinção entre o feminismo à moda antiga que aceito e o feminismo filosoficamente imperialista, mais radical, que informa tais projetos como a “Epistemologia feminista” e a “Filosofia da Ciência feminista” etc. pode ajudar as pessoas a pensar nas confusões e ambivalências aqui correspondentes. FILOSOFIA • Na última década, presenciamos a emergência de muitas mulheres líderes políticas, dentre elas três presidentes atuais na América do Sul. Como uma “velha feminista” – o que significa dizer que seu feminismo baseia-se em uma perspectiva das mulheres como iguais e não diferenciadas em relação aos homens –, você se sente confortada pelos ganhos que as mulheres alcançaram na Política? Podemos agora julgar os candidatos não pelo seu gênero, mas por suas qualidades?

É claro que não penso nas mulheres como “não diferenciadas” em relação aos homens – o que www.portalcienciaevida.com.br •

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agora, como sempre, são de mais decanas com bom senso, bom julgamento e força de caráter para usá-los – qualidade que são raras o suficiente, mas não de prerrogativa exclusiva de qualquer dos sexos. Melhor um homem com essas qualidades do que uma mulher sem elas (p. 272). A sentença que dá início à sua pergunta confirma o meu medo de que ainda estejamos muito longe de julgar as pessoas por suas habilidades individuais, em vez de focalizar no gênero. FILOSOFIA • Suas reflexões sobre ação afirmativa, feminismo e multiculturalismo são todas informadas por sua crença de que a Ciência livre de valores é não apenas possível, mas desejável. Por que você rejeita a ideia amplamente aceita de que toda investigação, inclusive a investigação científica, é inevitavelmente carregada de valores?

me parece obviamente falso. No coração do meu feminismo está o pensamento de que precisamos reconhecer o quanto mulheres e homens possuem em comum enquanto seres humanos, e o quão importante são as diferenças entre um indivíduo, homem ou mulher, e outro. Isso é muito diferente do tipo de feminismo atualmente em voga, o qual se focaliza nas mulheres enquanto classe. Nada do que afirmo em Manifesto tem qualquer coisa diretamente a ver com os assuntos políticos que você menciona; logo, quanto à questão acerca das mulheres líderes políticas, posso apenas dizer o que disse em Manifesto sobre decanas em universidades: “Do que precisamos agora é de mais decanas mulheres”, é o que escuto às vezes. Do que precisamos 8 •

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Não, eu não penso, e tampouco afirmo, que a Ciência é, ou deveria ser, “livre de valores”. Evito deliberadamente essa frase enganosa, que não distingue os valores epistemológicos dos estéticos, morais, políticos etc. Uma vez que o cerne da empresa científica é a investigação, o bom trabalho científico deve estar informado por valores epistemológicos tais como honestidade intelectual e disposição para compartilhar provas com outros da área. Mas a integridade da Ciência fica ameaçada quando esta é pressionada para conformar-se a valores alheios, como é o caso de ideologias políticas (como ocorreu com a Física nazista ou a Biologia soviética de Lysenko) ou motivos de lucro (como ocorreu com os testes clínicos de drogas manipulados em benefício dos interesses comerciais de um fabricante). Algumas filósofas feministas insistem que a investigação em geral, ou a investigação científica em particular, deveria estar informada por valores feministas. Logo, tem-se aqui uma conexão com a minha crítica desta vertente na Epistemologia e na Filosofia da Ciência feministas – não, contudo, com aquilo que digo sobre ação afirmativa ou multiculturalismo. FILOSOFIA • Às vezes, a Ciência é politicamente motivada. Como podemos distinguir a pesquisa politicamente motivada da investigação de boa-fé?

O viés político é apenas uma das maneiras pela qual

No coração do meu feminismo está o pensamento de que precisamos reconhecer o quanto mulheres e homens possuem em comum enquanto seres humanos, e o quão importante são as diferenças entre eles a Ciência pode vir a ser distorcida. Interesses comerciais podem incentivar estudos tendenciosamente desenhados ou a interpretação errada de dados; e a pressão cada vez maior sobre cientistas universitários para publicar e conseguir bolsas pode estimular a pressa, o descuido e até mesmo a fraude. Não existe qualquer maneira fácil para distinguir a investigação realizada de boa-fé da investigação fingida e fajuta. Mesmo assim, você precisa desconfiar um pouco de “achados” que parecem, muito convenientemente, politicamente corretos, ou, muito convenientemente, justamente aquilo que um fabricante esperava por achar. Você precisa buscar as críticas de outros da mesma área, retratações e expressões de preocupação de editores de periódicos; e, se uma conclusão depende do trabalho de outros, você precisa checar se o trabalho citado realmente diz aquilo que se afirma que ele diz. (Você ficaria surpresa diante da frequência com que isso não ocorre!). Usualmente, quando você não possui qualquer conhecimento de uma área, há poucas opções a não ser confiar nas opiniões de especialistas; mas, às vezes, até mesmo uma pessoa leiga deveria estar capacitada para perceber que um estudo é falho: por exemplo, quando um estudo médico está baseado no relato dos próprios pacientes sobre o que lhes acometera.

explicitamente, são em alguns aspectos significativamente diferentes). Além do mais, reconheço que “a contratação preferencial de mulheres na minha profissão tenha feito bem”; embora afirme, em seguida, que “temo que possa ter feito mais mal do que bem” (p. 270). Minha preocupação não é simplesmente no sentido de que tais programas “alimentam estereó­ tipos”. O que digo – e argumento em cuidadosos detalhes – é que tenho medo de que tais programas tenham fracassado “em contratar as melhores pessoas...”; alimentado “a relutância dos homens em levar as mulheres a sério e a desconfiança por parte das mulheres de suas próprias habilidades”;

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FILOSOFIA • Você é cética quanto aos efeitos da ação afirmativa, preocupando-se com o fato de que programas de emprego que levam o gênero em conta podem alimentar estereótipos. Mas as mulheres encontram-se particularmente sub-representadas nos departamentos de Filosofia. Por que você acha que isso ocorre?

Meus argumentos em “A pessoa certa para o trabalho pode ser uma mulher” estão direcionados especificamente para a contratação preferencial de docentes mulheres em universidades. (Questões sobre a contratação de docentes representantes de minorias ou a admissão de alunos, como afirmo www.portalcienciaevida.com.br •

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desviado “energia para os esforços de se mostrar a relevância do sexo”; e minado “o nosso já debilitado senso de que faz diferença quando a pessoa certa consegue o trabalho”. E continuo: “Não é de se admirar que isso [a contratação preferencial de mulheres] me deixe tão desconfortável; isso se coloca na contramão tanto da tarefa de levar a Filosofia a sério como também de levar mulheres filósofas sérias a sério” (p. 270). “As mulheres encontram-se particularmente sub-representadas nos departamentos de Filosofia”, você diz, sugerindo que exista algum nível correto de representação do qual estamos aquém. Mas realmente não sei o que isso significa; tampouco sei se o que você quer dizer é que há muito poucas mulheres docentes, muito poucas mulheres alunas de programas de pós-graduação, muito poucas mulheres alunas de programas de gradua­ ção ou o que quer que seja; tampouco se está falando especificamente do Brasil, ou mais genericamente. E por que você pensa que as mulheres encontram-se especialmente “sub-representadas” em departamentos de Filosofia? Nos EUA, a proporção de mulheres em departamentos de Letras é, em média, maior, mas a proporção de mulheres em departamentos de Física é, e média, inferior em relação a departamentos de Filosofia. Se você está sugerindo que devemos continuar ou intensificar programas de ação afirmativa porque

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As pessoas com frequência confundem ser sério com ser solene em relação ao seu próprio trabalho, ou com o levar-se a si mesmo a sério; mas são coisas bem diferentes a representação de mulheres em Filosofia ainda é muito baixa, eu discordo. Se, depois de décadas de ação afirmativa, o nível “correto” de representação ainda não tenha sido alcançado, está mais do que na hora de repensar quais deveriam ser os objetivos, e qual a melhor forma de alcançá-los.

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FILOSOFIA • Seu foco filosófico está na Epistemologia, mas em Manifesto você trata de assuntos éticos. Qual a relação entre Epistemologia e Ética? O seu uso da analogia do jogo de palavras-cruzadas para dizer que a experiência empírica e as crenças existentes devem possuir uma relação dependente, na qual nenhuma delas domina, estende-se à Ética?

Escrevi sobre Filosofia da Lógica e da Linguagem, Metafísica, Filosofia da Ciência, Filosofia do Direito, Pragmatismo etc., bem como Epistemologia. (De fato, uma das coisas que não deu certo na Filosofia recentemente é que esta se fragmentou em minúsculas subáreas; e isso, uma vez que as questões filosóficas de uma área frequentemente transbordam para outras, impede o progresso). E meu interesse em questões éticas sobre a conduta

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da investigação e a vida da mente, uma preocupação central em Manifesto, é de longa data. Não tenho (pelo menos não ainda) uma teoria geral da Ética inteiramente desenvolvida para lhe oferecer. Mas acho que William James estava certo em dizer que descobrir quais regras e arranjos sociais são moralmente melhores e quais são piores é um processo investigativo não menos falível do que a descoberta das leis da Física; e John Dewey estava certo em dizer que o que precisamos resolver não é, como James pensou, como melhor satisfazer a maior parte dos desejos, mas como melhor satisfazer a maior parte das necessidades: quer dizer, quais regras e arranjos sociais mais conduzem ao florescimento humano. A intuição por trás disso é que não podemos divorciar o que é bom ou correto para os homens fazer daquilo que é bom para os homens. A analogia do jogo de palavras-cruzadas (como explico em “Verdade seca e conhecimento real”) é simplesmente uma ferramenta intelectual que usei no desenvolvimento de minha teoria da justificação epistêmica – uma teoria intermediária entre as tradicionais teorias rivais, fundacionalismo e coerentismo: por exemplo, para entender como o suporte mútuo legítimo entre crenças difere de um círculo vicioso, e 12 •

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como a experiência e as crenças de fundo trabalham em conjunto. Não sei se há qualquer coisa na teorização ética que corresponda à falsa dicotomia entre fundacionalismo e coerentismo; então só posso dizer que talvez, caso eu venha um dia a desenvolver uma teoria ética mais articulada, a analogia do jogo de palavras- cruzadas poderá ter algum papel. FILOSOFIA • Você emprega um senso de humor e uma ironia afiada em seus escritos, até mesmo quando fala de assuntos filosóficos difíceis. Você vê necessidade de humor em uma disciplina tão séria como a Filosofia?

Certa vez – em “Nós, Pragmatistas”..., a conversação entre C. S. Peirce e Richard Rorty que compilei a partir de suas próprias palavras –, deliberadamente decidi não escrever (outro!) artigo filosófico sério argumentando que o “Pragmatismo” de Rorty é uma distorção indefensável das ideais do pragmatismo clássico, mas buscar uma maneira lúdica e literária de contrastar o pensamento filosófico profundo de Peirce com a postura fashion de Rorty. Usualmente, no entanto, simplesmente não tenho medo de mostrar meu senso de humor. As pessoas com frequência confundem ser sério

com ser solene em relação ao seu próprio trabalho, ou com o levar-se a si mesmo a sério; mas são coisas bem diferentes. Se você é sério em relação ao seu trabalho filosófico, você não cortará caminhos ou fingirá para si mesmo, ou para os outros, que alcançou mais do que de fato alcançou. Divertir-se com a quebra de um problema difícil ou ver graça em alegações grotescamente exageradas é inteiramente compatível com ser sério, neste sentido. E a arrogância é uma desvantagem real para o trabalho filosófico sério – o qual requer que você tenha uma mirada alta, mas também um senso realista de suas fraquezas e limitações.

atenção ao ensino, o qual é cada vez mais relegado a estudantes de graduação e palestrantes temporários; outra, que muitos docentes utilizam suas aulas, especialmente suas aulas de graduação, para falar sobre “o que estou trabalhando neste momento” – seja isto o que os alunos precisam aprender ou não. Enquanto a quantidade de pesquisa produzida subiu, a média de sua qualidade decresceu; e torna-se cada vez mais difícil encontrar o que presta. Além disso, muitos professores logo percebem que a maneira mais fácil de conseguir uma apresentação aprovada para uma conferência ou um artigo publicado é unir-se a um “cartel de citações”, onde X faz referências e

Muitos professores, cientes de que o sucesso de suas carreiras depende de publicações e não de competência em sala de aula, dão cada vez menos atenção ao ensino As primeiras prioridades na escrita filosófica são a clareza e a precisão; mas isso não significa que você tenha de escrever a prosa medonha, assolada de jargões, de grande parte da Filosofia de hoje – o que é na maioria das vezes uma afetação, uma forma de tentar parecer “científica” sem ter de realmente executar o trabalho de fazer as coisas claras e precisas.

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FILOSOFIA • Como você encara o estado atual da Filosofia, na sala de aula e em termos de sua disseminação? Você vê alguma mudança no papel da Filosofia na academia?

Nas universidades dos EUA, agora comumente “gerenciadas” por administradores profissionais generosamente compensados, e que há muito tempo colocaram seus próprios trabalhos acadêmicos de molho, o que se tem é uma pressão cada vez maior sobre os docentes para conseguir financiamento, publicar, falar em conferências etc. A qualidade do trabalho produzido é uma preocupação secundária, na melhor das hipóteses. Uma consequência lamentável tem sido que muitos professores – cientes de que o sucesso de suas carreiras depende de publicações, etc., e não de competência em sala de aula – dão cada vez menos

bajulações ao trabalho de Y, e Y ao de X, ... etc. Isso, por sua vez, é em parte responsável pela hiperespecialização desastrosa da qual reclamei anteriormente. É claro, alguns professores – mais ainda, parece-me, em instituições de ensino superior dedicadas somente à graduação do que naquelas que possuem programas de pós-graduação – ainda se importam profundamente com seu magistério; e alguns estão produzindo trabalhos que genuinamente valem a pena. Mas, na média, a qualidade do ensino está em declínio; e muito do que é publicado é direcionado a um nicho de literatura efêmero, de interesse apenas para algum grupo pequeno especializado. Sou muito relutante em fazer previsões. Quando comecei a trabalhar na Filosofia (digitando meu trabalho em uma máquina de escrever elétrica!), jamais poderia ter previsto a influência desastrosa que um web site, que classifica programas de pós-graduação em Filosofia, viria a ter hoje em dia na qualidade da Educação na pós-graduação, em decisões sobre contratação e até mesmo nas prioridades de universidades quanto à alocação de recursos entre departamentos. Mesmo assim, embora às vezes fique desanimada com a minha profissão, ainda acredito no valor do trabalho filosófico sério e na sua potencial utilidade. www.portalcienciaevida.com.br •

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