DINÂMICAS DA POLITICA INTERNA E EXTERNA DA VENEZUELA NA ERA DE CHÁVEZ

July 3, 2017 | Autor: Hugo Monteiro | Categoría: Geopolitics
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DINÂMICAS DA POLITICA INTERNA E EXTERNA DA VENEZUELA NA ERA DE CHÁVEZ Hugo Monteiro Universidade de Évora, Licenciatura em Relações Internacionais, nº31051,

RESUMO Dando especial relevância à expansão da Geopolítica nas políticas internas e externas dos Estados, o principal objetivo deste artigo é conotar a Era Chávez às mudanças levadas a cabo por este governo nas Relações Nacionais e Internacionais envolvidas no próprio país. Uma vez que a politica externa é uma reflexão da conduta interna, queremos demonstrar como a evolução da sua governação e as implicações a ela adjacentes se revelaram um ponto essencial de viragem para a Venezuela. De forma a contextualizar o tema formalizado, introduzimos com um enquadramento das teorias e conceitos recorrentes da época sendo o artigo estruturado em prol da Revolução Bolivariana na Venezuela, assim como a política externa de Chávez. Explorámos a relação deste com os EUA e outros países e a disputa pela hegemonia regional. Este estudo permite a contextualização de uma ciência, a Geopolítica, no seio das acções inter e intra estatais tendo em conta o território. Palavras-chave: Politica Interna, Politica Externa, integração Regional, Poder Regional, Hegemonia

ABSTRACT Giving special importance to the expansion of Geopolitics in internal and external policies of states, the main objective of this paper is to connote the Chávez Era to the changes carried out by this government in the National and International Relations involved in the country itself. Since foreign policy is a reflection of the inner conduit, we demonstrate how the evolution of its governance and implications adjacent thereto proved a key turning point for Venezuela. In order to contextualize the issue formally, we introduce a framework using recurring concepts and theories of the time and structured the article towards the Bolivarian Revolution in Venezuela and Chávez's foreign policy. Explored its relationship with the U.S. and other countries and the fight for regional hegemony. This study allows the contextualization of a science, geopolitics, within the inter-and intra-state measures used, taking into account the territory Keywords: Domestic Policy, Foreign Policy, Regional Integration, Regional Power, Hegemony

1 - Politica Interna vs Politica Externa Para melhor percebermos o tema tratado neste trabalho, teremos que perceber como funciona a relação entre política interna e externa. Em teoria, a relação entre estes dois conceitos deverá sempre contrapor a tese do primado da política interna, porém, não poderemos efectuar uma análise assim tão linear, como podemos constatar com a doutrina alemã do Estado-potência. Primeiro, temos que reconhecer a autonomia da política externa da política interna, e de como os estados estão organizados. Por um lado, todos os aspectos internos de um Estado relacionados com as Relações Internacionais e dos conflitos que nelas surgem, diferem conforme as épocas e a organização dos Estados, podendo estas divergir, de um para o outro, os instrumentos que ajudam os Estados a regular. Por outro lado, essas relações, como a politica de potência, de equilíbrio e a guerra, mantêm-se praticamente os mesmos com as devidas inovações tecnológicas dos armamentos, o que reflecte a pluralidade dos Estados Soberanos. De facto, apesar de todas as mudanças e regime ocorridas na história moderna, que alteraram profundamente a estrutura interna dos Estados, “não fizeram cessar as leis fundamentais das relações de potência e de equilíbrio”1. Esta anarquia internacional obriga os estados a manter um aparelho militar forte destinado a defender o território das ameaças externas, ao mesmo tempo que exerce influência interna, o que favorece regimes autoritários e que se torna mais evidente em Estados onde a segurança é deficiente devido a razões geopolíticas, onde acontece com frequência a centralização do poder. Segundo este ponto de vista, explica-se como os estados do tipo continental (como a Prússia-Alemanha, França,…) se comportam de modo diferente dos estados insulares (Reino-Unido, EUA), sendo estes últimos, por norma, mais “pacíficos”. A existência de fronteiras terrestres provoca a necessidade de as defender, o que leva os estados a agir de modo tendencialmente ofensivo, tornando necessárias estruturas políticas de grande centralização do poder e forte autoritarismo. Os países insulares, devido à sua posição, não tinham fronteiras terrestres a defender, podendo a defesa ser efectuada essencialmente pela marinha de guerra, evitando a constituição de grandes e dispendiosos exércitos terrestres.

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Dicionário de politica, vol 1, Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino, 11ª Edição, Editora UnB

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Já os Estados com fortes tensões internas têm tendência de as dominar ou reprimir com políticas de expansão ou de aumento da tensão internacional. Com estas medidas consolida-se o governo ou regime, a não ser que o Estado seja derrotado ou entre em falência. Se for este o caso, as tensões internas transformam-se quase sempre em fenómenos revolucionários com o objectivo de alterar o regime. Esta tendência, também conhecida como Bonapartismo, leva a que a evolução da política interna exerça forte influência na política externa. Apesar de ser um factor importante, não é a causa central dos processos internacionais. Na Europa Continental, o exemplo mais importante desta tendência é a política externa da Alemanha nazi, onde o desvio para o exterior das suas tensões internas levou a que, fruto da sua posição geográfica no centro da Europa, a sua política expansionista partisse em busca do seu espaço vital no restante espaço continental, muito por força da centralização exacerbada do poder a nível interno. Se olharmos por outro prisma, um estado descentralizado pode ter alguma dificuldade em colocar em prática politicas expansionistas. Esta situação mostra-nos como a política interna pode influenciar a política externa, ou de modo mais amplo, a influência que a posição no sistema de estados tem sobre a política externa, logo, sobre a evolução interna de certos estados, sendo aqui um problema dos estados insulares. É no meio de um mundo globalizado, onde a politica interna não pode estar dissociada da política externa, mas sim integradas como um todo, que temos que avaliar as implicações mais amplas da Revolução Bolivariana, e aí sim, teremos que efectuar as devidas distinções entre uma e outra. Essas distinções permitem-nos ver os elementos centrais para o desenvolvimento da Venezuela, bem como da região onde está inserida. 1.1 - A Transformação do Estado Sem nos tornarmos demasiado exaustivos e sem entrar na história da evolução do estado, será necessário definir dois termos centrais: Soberania e Estado. Segundo King and Kendall2, soberania significa “poder ou autoridade suprema, incluindo a autoridade de um Estado se governar a si próprio”. Significa isto que, em termos de soberania interna, dentro das fronteiras definidas de um estado, é a esse

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King, R., G. Kendall (2004), “The State, Democracy & Globalization”, Palgrave, Macmilan, UK

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que compete e o único a poder exercer a autoridade política, exercendo, se necessário, o monopólio das forças armadas. No campo da soberania externa, o seu significado diz-nos que todos os estados são iguais no sistema internacional e podem operar de modo independente no que toca a acordos económicos, alianças militares ou relações e tratados com outros estados. Significa isto que, nenhuma outra autoridade tem o direito de intervir, a não ser o próprio estado. O Estado é composto pelas instituições permanentes dentro de um país através das quais a autoridade é exercida. O seu âmbito de acção é definido e limitado pelas suas fronteiras territoriais. Deverá ser imparcial e tratar todos como iguais, de modo a evitar o clientelismo. O Estado Moderno é um Estado Nação e a nação é definida pelos traços comuns que a população possui, como a linguagem e hábitos, transmitidos de geração em geração, de modo a criar uma identidade nacional, e na sua maioria, comum a todos. 1.2 - Teorias Marxistas do Estado Nas décadas de 1970 e 80, as teorias Marxistas do Estado estavam nos seus dias áureos, obrigando a Europa Ocidental a lidar constantemente com a ameaça do bloco soviético, mas via as suas economias capitalistas prosperar. Os Marxistas viam que o neoliberalismo estava a começar a entrar em declínio. Viam um novo arranjo de capital, espaço e trabalho enquanto o estado se transformava. A morte do capitalismo neoliberal levaria à descentralização, regionalização, novas redes e o emergir de novos actores públicos e privados. Bob Jessop3 afirma que a globalização é um processo espácio-temporal que enfraquece os estados através do seu impacto adverso nas suas intenções de soberania temporal e territorial. Os estados ainda continuariam envolvidos pois regulariam a economia, logo a globalização económica dependia da política. Segundo ele, a hipótese de que a globalização colocava a soberania de um estado sob pressão é falso, pois esse é apenas um aspecto do estado moderno, e não seria o estado modernos que estaria sob ameaça, mas sim alguns modelos deste, como o Estado de Previdência Keynesiano.

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Jessop, B. (2008), “State Power: A Strategic-Relational Approach”, Polity

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Sendo a Globalização um processo multifacetado, existem vários factores a exercer pressão ao mesmo tempo, enquanto outros fortalecem o estado. Jessop defende que o Estado é uma relação social e que não existe uma garantia incondicional de que o Estado Moderno será sempre capitalista. A sociedade da América Latina é complexa, e as teorias Socialistas Marxistas do estado talvez sejam as que melhor relatem as transformações ocorridas naquela região do globo. Considerando a Venezuela, que de acordo com o discurso oficial, transitou de um estado capitalista e neoliberal para se tornar um estado socialista, o ponto inicial e o ponto final seriam o mesmo. Contudo a história mostra que houve várias tentativas para o fazer mas a transposição do discurso para o Socialismo (o ponto final) seria muito diferente do que aconteceu nas primeiras tentativas de transformação do estado. 1.3 - A Critica Geopolítica Com o final do Séc. XIX, várias mudanças politicas e sócio-económicas fazem emergir novas teorias no campo da teoria do Estado. A industrialização, bem como a globalização, fazem surgir novas ideologias desde o comunismo ao liberalismo e do socialismo ao anarquismo. Essas mudanças são classificadas como pânico geopolítico, segundo Hefferman4, terreno fértil para o desenvolvimento de uma disciplina científica, a Geopolítica. Seria Kjellen, cientista politica Sueco a usar o termo pela primeira vez. Em 1904, Mackinder escreve um artigo, The New Geographical Pivot of History, onde desenvolve a sua teoria do espaço vital. A Europa e a Ásia seriam o centro do mundo, com as Américas, África e Austrália a formarem a periferia. Esta região central poderia servir de base a um império mundial, se algumas áreas vitais fossem conquistadas. Mackinder descreve ainda as divisões políticas entre a Europa e a Rússia e explicou a sua ligação à geografia, delimitando assim as áreas centrais e periféricas. Esta sua combinação de uma visão politica geográfica combinada com aspectos das relações internacionais, foi uma das primeiras teorias a descrever analiticamente a política internacional a uma escala global. Haushofer descreve o termo geopolítica dizendo que não é por acidente que a palavra Politica se encontra precedida do prefixo Geo, relacionando assim a politica com o

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Heffernan, “Fin de Siècle, Fin du Monde?: On the Origins of European Geopolitics, 1890-1920”, pp. 28-51

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espaço, explicando assim a dependência de todos os desenvolvimentos políticos da realidade permanente do espaço. A Geopolítica também pode ser descrita como a Geografia das políticas internacionais, que é a relação entre o ambiente físico e a implementação das políticas externas. Uma outra descrição de Geopolítica aparece pelas palavras de Ó Tuathail 5, que diz que a Geopolítica aborda o panorama geral e oferece uma forma de relacionar dinâmicas locais ou regionais para o sistema global como um todo. Faz ainda a distinção entre quatro formas de discursos Geopolíticos: 

Geopolíticos Imperiais



Geopolíticos da Guerra Fria



Geopolíticos da Nova Ordem Mundial



Geopolíticos Ambientais

Com o passar dos anos, as teorias geopolíticas e os novos aspectos como a ecopolítica (termo usado tanto para a vertente ecológica como económica) e a segurança começaram cada vez mais a ser levados em linha de conta e, muitas vezes, a terem primazia sobre outros factores. Um famoso exemplo de Geopolítica é a Doutrina Monroe, colocada em prática em 1823 pelos EUA, para contrariar as aspirações coloniais dos Estados Europeus no hemisfério ocidental. Tornou-se uma parte importante da política externa dos EUA, o que significou o início da perca de influência da Europa no continente Americano. Mais tarde, o Presidente Roosevelt reforçou estas políticas com o Roosevelt Corollary. Roosevelt declarou que “afirmando a Doutrina Monroe, ao dar estes passos no que respeita a Cuba, Venezuela, e Panamá (...) actuamos no nosso próprio interesse, como também no interesse da humanidade em geral... mas em casos extremos pode haver justificação para a tomada de medidas próprias.6 Sendo a Geopolítica um assunto em constante mutação, os seus teóricos como Ratzel, Mackinder, Haushofer e Kjellen não poderiam ser considerados como objectivos pois estavam envolvidos na política e na tomada de decisões, e o que escreveram era fortemente politizado e usado na prática por líderes políticos para realçar a política externa e aumentar o poder do estado. Geopolítica é um conceito particularmente 5 6

Ó Tuathail, G. S. Dalby, P. Routledge (1998), The Geopolitis Reader, Routlege, London, UK Theodore Roosevelt, citado em Ó Tuathail (1998), p.32 (tradução própria)

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amplo, englobando mais do que podemos pensar. A visão Norte Americana da América Latina como sendo o seu quintal é um produto da convenientemente neutra noção de Hemisfério Ocidental, sendo esta imaginária e parte de uma certa visão geopolítica, fomentada pela Doutrina Monroe. Tomando a Venezuela como exemplo, podemos dizer que a política externa dos governos Venezuelanos tinha sido baseada, durante décadas, na mesma noção de uma alegada ligação com os EUA. Nos anos 70 era vista como a democracia mais estável da região e a sua capital, Caracas, como a cidade mais ocidentalizada e modernizada da região. Era um exemplo a seguir por outros. A política externa da Venezuela tinha laços estreitos com os Estados Unidos. Os seus líderes preferiam olhar para os EUA como termo de comparação do com os outros países da sua região e Caracas funcionava como a entrada na América do Sul para os Estados Unidos. Com a chegada ao poder de Hugo Chávez, uma ruptura estava à vista embora tenha demorado um pouco até que a ruptura se tenha efectivamente concretizado. A Geopolítica não é neutra, objectiva ou imparcial, mas sim politizada. Ó Tuathail afirmava que a Geopolítica era tanto prática como teórica. A prática seria a acção dos líderes políticos, contudo, esta acção deveria ser suportada por teorias fortes e certas convicções dos mesmos seria o que direccionava a politica externa de um país7. Segundo ele, existia um paradoxo no conceito. Por um lado, reivindica o ir além do pensamento centrado no estado existente, colocando as políticas mundiais num contexto geográfico totalmente diferente, desafiando deste modo algumas das premissas da geopolítica mas, por outro lado, a Geopolítica é uma área científica baseada exatamente nesse pensamento centrado do estado num território restrito8. 1.4 - Transição para o Regime Democrático Uma definição minimalista de Regime Democrático pode passar por ser uma que a restrinja à sua dimensão político-institucional. Para tal, existe a necessidade da observância dos seguintes factores:

7 Ó Tuathail, G. and J. Agnew, “Geopolitics and Discourse: Pratical Geopolitical Reasoning in American Foreign

Policy”, Political Geography Quaterly, No.11, 1992 8 ó Tuathail, “(Dis)placing geopolitics: writing on the maps of global politics” Environment ans Planning D: Society and Space, Vol. 12, 1994,

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a. Todos os actores políticos devem submeter-se à livre e pacífica competição pelo poder (por valorizarem o processo democrático ou mesmo por estratégia politica)9. b. Nenhum actor político pode ter direito de veto sobre a participação dos outros ou sobre os resultados da competição política. c. A não existência de instituições estatais independentes e autónomas com poder sobre o poder politica. Naturalmente, está implícito que uma das bases fundamentais da democracia será a garantia das liberdades cívicas fundamentais. As orientações do estudo das transições alteraram-se paulatinamente com o decorrer dos tempos, de modo a capturarem as dinâmicas dos processos em curso. No início das transições na Europa e na América Latina, a análise era feita sobretudo pelas variáveis de carácter politico e quem a fazia era, muitas vezes, participante no processo. Variáveis essas como a qualidade das lideranças, escolhas e recursos dos actores políticos, entre outros. Variáveis que vieram substituir, a partir da década de 1980, as que privilegiavam a influência das variáveis económicas e sociais, como o nível de desenvolvimento, estrutura de classes ou fases de industrialização. Esta reorientação da análise deve-se, primeiro, à onda de democratização dos anos 70, onde se incluí a revolução Portuguesa, e que surpreendeu a maioria dos cientistas políticos. Este processo demonstrou que a necessidade de condições prévias para o processo, de cariz económico e social, já referidas anteriormente, não se verificavam, e no entanto o processo desenrolou-se. A participação de muitos intelectuais no papel de actores políticos influenciou em grande parte o tipo de análise centrada na escolha e na acção politica. A visão micropolítica parte do princípio de que a transição democrática depende de variáveis ligadas à intervenção e ao voluntarismo dos actores políticos que nela participam. Michel Dobry chama a estes processos de “conjunturas fluidas” 10, sendo a incerteza das regras e da continuidade do jogo politico a característica central, os condicionamentos económicos e sociais do processo politico ficam como que suspensos. 9

Moisés, J. A., “Os Brasileiros e a Democracia”, São Paulo, Ática, 1995 Dobry, M., “Sociologie de Crises Politiques”. Paris, presses de la Fondation Nationale des Sciences Politiques, 1986 10

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Tentar explicar as transições com base na identificação de actores centrais, pode levar à simplificação excessiva, desprezando a história politica e os dados contextuais da transição do país estudado. Esta postura provocou a formulação de regras destinadas a orientar os actores políticos de modo a poderem levar a bom porto as transições e consolidações democráticas. Exemplo claro foi o conjunto de regras que Huntington criou para tal efeito, e o debate que gerou sobre a forma de governo mais adequada para a América Latina – Presidencialismo ou Parlamentarismo. A transição para a democracia ocorrida na América Latina na década de 1980, coincide com uma grave crise económica e uma enorme reforma do modelo de desenvolvimento orientado pelo estado, sendo a sobrevivência da democracia, nestas circunstâncias, só possível se o apoio das populações for mais forte que a crise económica e social. No que toca ao processo de transição para democracia propriamente dito, este, para ser considerado finalizado, tem que envolver três etapas: 

Início da dissolução do antigo regime;



A criação da democracia;



A consolidação do novo regime.

Os processos de democratização na região mostram uma forte afinidade entre os tipos de regimes autoritários que os precederam, os modos como efectuaram a transição e os dilemas que decorreram dos próprios processos de consolidação dos novos regimes democráticos. O processo de transição é delimitado pelas características do regime autoritário, a tradição politica e o padrão institucional adoptado. Porém, os comportamentos políticos e padrão institucional estabelecidos durante o processo criam uma herança que pode ter um efeito no novo regime democrático e nas hipóteses da sua consolidação. Esses efeitos incidem sobretudo no padrão de competição entre as elites e sobre as regras institucionais, e também sobre os limites colocados na mudança politica, o que acaba por afectar as condições de início do novo regime. Neste capítulo, resta-nos sumarizar um modelo básico de transição, para melhor se compreender as “vontades” dos envolvidos. No modelo básico existem dois grupos de agentes: os ricos e os pobres, e o estado pode ser democrático ou não democrático. Numa democracia, o eleitor médio é aquele 9

que, indirectamente, acaba por decidir a taxa de imposto, logo, se os pobres são mais numerosos, o eleitor médio é pobre. Num regime não democrático, os impostos são estabelecidos pelos ricos. Neste caso, os pobres podem tentar um processo revolucionário, contudo, são sempre as elites que decidem se estabelecem um regime democrático ou não. No caso do regime democrático, a solução para alterar o regime passa por um golpe de estado pelas elites. É sabido que o custo de oportunidade de um golpe de estado ou de uma revolução, varia consoante a riqueza que se produz, se distribui e como se distribui. Esta condicionante leva-nos à perceber a razão de os períodos de recessão serem mais propícios à inquietação politica e social. Podemos concluir então que mesmo em democracia, a sociedade está em permanente conflito. Já Maquiavel, nos seus Discorsi11, defende que a estabilidade e perdurabilidade de Estado passaria por o definir como um estado misto, onde o objectivo é procurar uma solução, mesmo que parcial, mas não procurar a supressão para a natureza dos conflitos sociais. Procura-se a integração social pelo papel interventivo do Estado, que gera condições de segurança tanto interna como externas. A posição de equilíbrio encontrada tem a característica de bloquear a corrupção, factor que promove o aumento dos desequilíbrios sociais e a possível transição para um regime autoritário.

2 - A REVOLUÇÃO BOLIVARIANA NA VENEZUELA (Simon Bolívar e Hugo Chávez) A América Latina é fértil no que respeita a heróis revolucionários, e alguns deles, como Simon Bolívar, Pancho Villa ou Ernesto “Che” Guevara, ganharam o estatuto de lendas. Embora a maior parte de estes heróis revolucionários serem originários de uma classe média, defenderam os pobres e desafortunados. As suas histórias estão enraizadas na memória colectiva e na cultura da América Latina. A revolução Bolivariana na Venezuela, executada por Hugo Chávez, tem como grande inspiração Simon Bolívar. Bolívar sonhava com a libertação das colónias americanas dos governantes europeus, principalmente os espanhóis. Bolívar, que estudara na 11

Machiavelli, Niccoló, 1469-1527, “Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio” Tradução de Sérgio Bath, Brasília, Editora Universidade de Brasília, 1994, 3ª ed.

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Europa, viu-se agarrado pelos ideais de liberdade, democracia e soberania popular, e desejava o melhor dos governos práticos para a sua Venezuela, em parte, à imagem da Inglaterra. Em vez da monarquia, defendia um soberano que fosse eleito para o resto da sua vida, mas que não pudesse passar o poder de forma hereditária e 2 parlamentos: uma câmara baixa, onde estaria representado o povo e uma câmara alta, baseada em comissões hereditárias. Idealmente, ele via uma América Latina unida numa confederação, de modo a criar um contra poder à crescente “hegemonia” dos Estados Unidos na região, pois, como estado independente, Bolívar receava que as suas ambições de crescimento se virassem para sul. Conhecido como “O Libertador”, regressou da Europa em 1811 para lutar com os espanhóis do Peru à Venezuela. Depois de libertar o que se conhece hoje como a Colômbia, ajudou a criar um estado conhecido como a Grande-Colômbia, que incluía os territórios da Colômbia, Equador e Venezuela. Foi eleito presidente mas abandonou o executivo para voltar a combater os espanhóis. Já no fim da sua vida, viu os países recém-criados em lutas internas. Ao invés de terem seguido o caminho do desenvolvimento e da prosperidade, lutavam pelo poder interno. Foi mesmo proibido a certa altura de entrar na Venezuela. Apesar das suas falhas, ficou imortalizado e inspirou muitos nas lutas pela liberdade, e os seus ideais inspiraram o recente movimento revolucionário na Venezuela. Hugo Chávez Frias foi o mentor de esse movimento. Chávez queria ser jogador de basebol, contudo, cedo percebeu que o seu talento não lhe levaria a uma vida confortável e optou por seguir uma carreira militar. Na Academia Militar estudou estratégia militar e leu os clássicos da guerra, e a sua admiração por Bolívar cresceu e a ideia de uma revolução bolivariana tornou-se a sua paixão. Chávez queria uma união da América Latina que resolvesse os seus problemas, fortalecesse as suas economias e que criasse uma força hegemónica que criasse equilíbrio na balança de poder. Como Bolívar, estava saturado da posição e da dependência económica dos EUA, bem como do Banco Mundial e do FMI. Achava que estas dependências escravizavam o país. Em 1992, em conjunto com outros oficiais, conspira para derrubar o governo, porém, o golpe falha e Chávez efectua o discurso de rendição na televisão venezuelana. Com a

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ideia de dissuadir outros, o governo emite várias vezes o discurso de rendição, contudo o efeito é o contrário, e Chávez passa de um desconhecido a herói. É na prisão que Chávez começa a construir a sua base politica e quando é libertado, em 1994, inicia a sua vida politica. É eleito presidente em 1998 e o seu programa político passava por dar novamente o controlo ao povo. A sua primeira medida foi fazer um referendo para formar uma assembleia constituinte para escrever uma nova constituição, a qual recebeu um forte apoio popular. Em 1999 é aprovada a nova constituição e o país ganha o nome oficial de República Bolivariana da Venezuela12. De seguida são realizadas novas eleições, as quais Chávez ganha por larga maioria. Em 2002, o país está em plena agitação. Muitos questionam os programas que o governo estava a financiar e tentam um golpe militar. Chegam a tomar o governo e a fazer Chávez prisioneiro, mas ao fim de alguns dias, após muitos protestos do povo em geral, este volta ao poder. Em 2004, a oposição já tinha assinaturas suficientes para pedir um referendo que legitimasse HC, o qual se veio a realizar, tendo o povo decidido que Chávez se manteria no poder. Em 2006, é reeleito com 63% dos votos. A constituição de 1999 tinha sido votada com 70 % de votos a favor e previa que o povo tivesse mais participação no governo dos destinos do país. Enquanto uns criticavam o processo da criação da constituição, por não permitir maior participação popular, Chávez enaltecia o método usado, que consistia em linhas telefónicas sem custo para onde os populares poderia ligar de maneira a dar a sua opinião. De certa maneira, a constituição de 1999, dá mais poderes ao povo dando-lhe as ferramentas necessárias para a realização de referendos, como o de 2002, porém, consolidou o poder no executivo, que podia manipular os militares, que já estavam arredados do poder. Muitos elogiaram a constituição no que se refere aos direitos humanos embora outros aspectos da constituição dessem poderes ao executivo para colocar em risco esses mesmos direitos humanos. Transformou o parlamento de duas câmaras em uma só câmara, o que muitos viram como um enfraquecimento dos equilíbrios de governo pois eliminava o corpo capaz de lutar pelos interesses regionais contra o senado. Também foi dado ao presidente o

12 Foer, “The talented Mr. Chávez”, p 97

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poder de dissolver o parlamento e o de emitir decretos presidenciais que, na prática, teriam o mesmo impacto que as leis criadas na forma regular. A justificação para tal era a de que desta forma o presidente poderia agir rapidamente e apropriadamente, porém, é um poder que facilmente cai no abuso. Apesar de ser um líder com bastante apoio popular na Venezuela, existiam algumas situações questionáveis que colocavam a sua base de apoio, como por exemplo a distribuição de 3 mil milhões de dólares em bónus de natal aos funcionários públicos antes das eleições presidenciais de 2006, a qual justificou com a sua preocupação para com os gastos de natal do povo. Existem alguns casos de perseguição aos opositores do governo, como por exemplo, em 2002 e 2003, alguns trabalhadores da PDVSA (Petróleos da Venezuela, SA) fizeram uma greve de cerca de dois meses. Depois da greve, cerca de 18000 funcionários foram despedidos. Muitos, senão quase a totalidade, eram alinhados pela oposição13. Este tipo de tácticas políticas são completamente inaceitáveis tendo em conta a natureza dos ideais de liberdade da revolução bolivariana, dando apenas ao povo uma escolha específica. Escolher Chávez. Estes são métodos típicos de governantes de regimes autoritários ou mesmo ditadores. Para resultarem em pleno, as revoluções deverão usar métodos contrários aos dos governos que derrubaram. As pessoas deverão ser consciencializadas de modo a fazerem a escolher o que acreditam que lhes trará mais liberdade. Em 2004, Chávez recebeu o suporte da Assembleia Nacional, que estava repleta de membros do seu partido, e usando o seu poder de voto, recebeu o consentimento para alargar o número de Supremos Tribunais de Justiça, de 20 para 32, colocando nos cargos pessoas leais ao regime. Também investigava os funcionários para perceber a sua cor politica. Chávez recebia o apoio da maioria, e isso talvez se devesse ao numero de programas sociais que encetou, aos quais chamou de “missões”, aplicando nesses programas grande parte dos proveitos do pais com a venda de petróleo. Procurava assim ganhar o apoio das massas, fazendo com que estas sentissem que não estavam esquecidas.

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Christian Parenti, “Venezuela’s Revolution and the Oil Company Inside,” �ACLA Report on the Americas, (vol.39, no.4, Jan/Feb 2006, pp. 8-13), p. 9.

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3 - A POLITICA EXTERNA DE CHAVEZ A percepção de política externa para o governo de Chávez, leva-nos a considerar a abordagem realista das Relações Internacionais, realismo esse que nasceu no período liberal entre guerras, tendo como nome maior para muitos, Hans Morgenthau. Ele enumera os fundamentos do realismo político14: 1. O que ajuda o realismo a colocar-se no seio da política internacional o conceito de interesse definido em termos de poder; 2. O realismo é consciente da moral da acção politica e da tensão existente entre o mandamento moral e as exigências de uma acção política com sucesso; 3. Sustenta a autonomia da esfera politica. A partir de estes três princípios muito básicos, podemos compreender algumas das acções do governo Bolivariano, pois estando a esfera da politica separada das demais afirma que o interesse definido em termos de poder constitui o conceito central da conduta externa, logo, os actores internacionais buscam o máximo de poder possível com vista ao seu bem-estar, tomando muitas vezes acções politicas distanciadas da moral em voga. Os governos agem racionalmente no cenário internacional, e no caso da Venezuela de Chávez, enquanto culpava o Governo dos EUA pelo atraso económico da AméricaLatina em geral, mantinha um comércio intenso com os Norte-Americanos, comércio esse muito importante para a economia venezuelana. Em 1999, quando subiu ao poder, a sua prioridade diplomática era a de “limpar” a sua imagem no exterior, e agir autonomamente na cena internacional, porém, após identificar, no eu entender, as falhas do sistema, passou a defender a multipolaridade (blocos regionais) e a necessidade de reorganização das organizações supranacionais. A sua política externa pode-se dividir em duas fases, antes e depois do referendo de 2004. O período inicial, segundo Urrutia15, mantinha alguns elementos e princípios do que havia sido a política exterior venezuelana nos governos anteriores, e em mais alguns casos, as linhas de actuação foram mesmo aprofundadas, como a relação com o Brasil, construída desde meados dos anos 90.

14 MORGENTHAU, Hans J. “A politica entre as nações: a luta pelo poder e pela paz”, Brasília, IBRI, 2003 15 Urrutia, Edundo Gonzalez, “Las dos etapas de la politica exterior de Chávez”, revista Nueva Sociedad, nº 205,

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Chávez evitou promover mudanças radicais na sua política externa, porém à medida que o país foi estabilizando a nível interno, começou a delinear novas estratégias para as relações com o exterior. Essas estratégias apareceram compiladas no Plano de Desenvolvimento Económico e Social 2001-2007, onde constava a necessidade de criar um equilíbrio Internacional. Condenava a concentração dos poderes hegemónicos nos actores tradicionais, e disse ser necessário mais solidariedade e cooperação entre os Estados. Chávez apostava na cooperação SUL-SUL e numa união da América do Sul com a região caribenha, tendo a politica externa bolivariana dado primazia aos estados vizinhos, tendo identificado quatro zonas de âmbito regional: 1. Zona Atlântica 2. Zona Caribenha 3. Zona Andina 4. Zona Amazónica Com o intuito de assumir um papel de liderança em relação aos Estados menos desenvolvidos, usa o petróleo como arma política, servindo este de instrumento principal para captar os países carente em termos energéticos para a sua esfera de influência e também para fortalecer os laços com os outros membros da OPEP. Com o referendo de 2004, e a vitória de Chávez, inicia-se segundo período. Neste período, a consolidação do projecto revolucionário e a confirmação de alianças geopolíticas e estratégicas com outros estados passaram a ser os eixos principais da sua política externa. Ao mesmo tempo, acelerou a ruptura institucional do Ministério dos Negócios Estrangeiros, aquando do avanço do processo ideológico das relações com o exterior e centralizou no presidente todas as acções e decisões vinculadas às Relações Internacionais, estando assim personalizada a execução da política exterior. Suportado pela maioria da população, coloca a política externa ao serviço da revolução bolivariana, e dá uma viragem nas suas relações com o exterior. Ao mesmo tempo que fortalecia alianças geopolíticas e acordos regionais, aumentava o seu antagonismo para com os EUA, mantidas até ai num plano de baixa intensidade. Estes processos integracionistas que estavam a ocorrer na América-Latina eram alheios aos interesses americanos.

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Resumindo, a política externa de Chávez foi fortemente influenciada pela agenda terceiro-mundista e pelos ideais de Simon Bolívar, a unificação dos povos latinoamericanos. Na visão de Chávez, a integração deveria ser politica, económica e militar, estando a Venezuela na zona de cisão entre os dois sub-continentes americanos (Norte e Sul) e com uma forte influência das relações América do Sul e América Central. 3.1 - A RELAÇÃO COM OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA A subida ao poder por parte de Chávez na Venezuela não era vista com bons olhos por parte dos americanos que o consideravam uma ameaça aos ideais neoliberais defendidos pela administração Norte-Americana, e olhavam para ele como uma séria resistência naquele continente com probabilidades de contágio aos seus vizinhos. Numa fase inicial, a posição americana pautou-se por uma postura defensiva, um silêncio público que traduzia a desconfiança na nova democracia venezuelana. Aparte disso, os dois governos traçaram um tratado que promovia o Investimento Directo Estrangeiro, o que mostrava, que, ao mesmo tempo que Chávez radicalizava a sua posição, ainda conseguia colocar em acção um pragmatismo que separava os ideais nacionalistas, dos quais era acérrimo defensor, de uma visão realista de coexistência. No final de 1999 e em 2000, Chávez efectua visitas de estado a países não alinhados com o regime Norte Americano, o que veio fazer estremecer as relações entre os dois países. Chávez visitou a Chinam Cuba e o Iraque, ainda dominado por Sadam Hussein. Esta última visita desencadeou uma denúncia formal por parte dos Estados Unidos no conselho de segurança da ONU, alegando que Chávez tinha violado as resoluções da ONU. Com a subida ao poder de George W. Bush, pensou-se que as relações poderiam ser mais cordiais, e muitos as viam como fecundas e produtivas, porém, a diferença ideológica entre os dois aprofundou-se e a cordialidade que se via até então, esvaiu-se com a entrada em cena do Plano Colômbia16 e a permanente recusa da Venezuela em ceder o seu espaço aéreo para o combate antidrogas americano. Após o 11 de Setembro, os EUA deslocam a sua atenção para o Médio Oriente, e deixa a América latina para segundo plano, e é aqui que Chávez aproveita para tentar 16 Plano criado pelo governo dos Estados Unidos para combater a produção e o tráfico de cocaína na Colômbia,

bem como a desestruturação das guerrilhas de esquerda, como as FARC.

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criar uma coligação que pudesse criar um equilíbrio de poderes contra o poder hegemónico dos EUA. Depois dos bombardeamentos no Afeganistão, Chávez disse mesmo que “não se pode combater o terror com mais terror”, mostrando-se assim contra a ofensiva norte americana. A crescente tensão teve o seu ponto mais alto em 2002, quando os EUA apoiaram o golpe de estado em Caracas, que visava destronar o presidente Chávez do poder, tendo os EUA manifestado o seu apoio aos golpistas na formação de um governo de transição. Segundo Villa17, a moderação politica com os Estados Unidos começou a mudar de forma gradual depois do golpe de estado contra Chávez. Uma investigação do Conselho Nacional de Segurança da Venezuela, cujas conclusões foram tornadas públicas no aniversário do golpe, concluíam que os EUA tiveram participação nessa tentativa de derrube de Chávez, e a escalada das tensões alcançaria o seu ponto mais critico no início de 2004, quando o próprio Chávez acusa a América do Norte de terem participado directamente no golpe de 11 de Abril de 2002 e de intervir nos assuntos internos venezuelanos através do financiamento de grupos políticos e ONGs opositoras ao governo de Chávez. Esta posição anti americana tornou-se um dos pilares da política externa de Chávez, onde chega a acusar os Estados Unidos e os seus aliados como sendo o verdadeiro eixo do mal. Embora o clima de tensão entre os dois estados estivesse sempre presente, mantiveram sempre uma estreita relação comercial. Em 2008, 40% das exportações da Venezuela tinham como destino os EUA e 25% das importações tinham origem norte americana, ou seja, os EUA continuavam a ser o principal parceiro comercial da Venezuela, embora Chávez tivesse tentado diversificar os seus parceiros durante a sua governação. A Venezuela continuava a ser um país monoexportador, vulnerável às constantes oscilações do mercado e dependente das compras dos EUA. Com a tomada de posse de Barack Obama, abriu-se uma nova porta para o diálogo e as embaixadas de ambos os países retomaram a sua actividade em 2009. 3.2 - ALBA Em Dezembro de 2004, Hugo Chávez e Fidel Castro emitem uma declaração conjunta na qual é criada a ALBA (Aliança Bolivariana para os povos da Nossa América), a qual surge no início apenas com como uma cooperação bilateral entre a Venezuela e Cuba, 17 Villa, Rafael Duarte. “Venezuela: mudanças politicas na era Chávez”, Estudos Avançados, v. 19, nº 55, 2005

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mas que serviria para servir de oposição à ALCA (Área de Livre Comercio das Américas), idealizada pelos EUA para liberalizar o comércio no continente americano. Para Chávez, uma integração sob os ideais neoliberais americanos, colocaria os países da América Latina numa posição de subordinação em relação aos Estados Unidos, aumentaria a pobreza na região criava uma ruptura em sectores chave das economias nacionais. Para ele, a integração deveria ser feita com base na complementaridade económica e solidariedade entre as nações. Em Abril de 2006, adere a Bolívia e firmam o Tratado de Comercio dos Povos para impulsionar o intercâmbio de bens e serviços por meios não comerciais, procurando assim estimular um sistema de produção baseado em vantagens construídas. Os principais objectivos da ALBA eram: 1. A luta contra a pobreza, a exclusão social, os altos índices de analfabetização e a pobreza; 2. Defesa dos direitos humanos, dos trabalhadores e da mulher, bem como a defesa do ambiente; 3. Visão da agricultura para lá da simples produção de mercadorias. Ligavam-na à segurança e auto-suficiência alimentar. Actualmente é composta por nove países (Antíqua e Barbuda, Bolívia, Cuba, Dominica, Honduras, Equador, Nicarágua, São Vicente e Granadinas e Venezuela). Em 2008 foi instituído o Banco de ALBA encarregue de financiar melhorias na saúde, cultura e energia e também com a função de romper com a dependência dos Estados Membros de instituições como o FMI ou o Banco Mundial. No mesmo ano é lançado o projecto da moeda comum, o SUCRE (Sistema Unitário de Compensação Regional), que tinha como objectivo excluir o uso do dólar americano no mercado regional e agilizar as transacções entre os Estados Membros. 3.3 – AMÉRICA CENTRAL E CARIBE A América Central e o Caribe sempre foram uma zona vital para os interesses da Venezuela, e o petróleo funcionou como uma arma de aproximação à região. Com a chegada e Chávez ao poder, os países de essa zona ficaram expectantes sobre o que iria acontecer, pois sempre mostrou abertura para que essa zona fosse privilegiada na sua política externa. Desde cedo iniciou essa aproximação, com visitas a vários países caribenhos e mantendo um diálogo constante com os líderes desses países. Encetou 18

negociações com o México, e posteriormente com Cuba para a renovação do acordo energético de San José (petróleo em troca de bens e serviços, ou vendido a preços especiais) e em 2000, amplia o acordo com a assinatura do Acordo Energético de Caracas, que expandia assim as condições a outros países da região. Sendo membro da AEC (Associação de Estados do Caribe), influenciou os outros membros com o seu projecto integracionista. Em 2001, na reunião do organismo, mostra-se céptico em relação à ALCA e defende a união entre os estados LatinoAmericanos. A sua estratégia diplomática na região culminou com a constituição do Petrocaribe, um acordo de cooperação energético que o governo da Venezuela propõe e que pressupõe a redução das desigualdades no que respeita ao acesso a recursos energéticos. É constituída formalmente a 29 de Junho de 2005, com a participação de 14 países. É também criado nesta data o fundo da ALBA para oferecer linhas de crédito favoráveis às débeis economias da zona que sofriam com os preços altos do petróleo. Para manter o preço do petróleo o mais baixo possível, foram eliminados os agentes intermediários do comércio sendo o petróleo comercializado directamente entre os estados. Este novo organismo, além de coordenar a política energética da região, procurava estimular a cooperação tecnológica bem como o desenvolvimento de infra-estruturas energéticas. O Petrocaribe constitui o braço energético da ALBA, uma vez que seguem os mesmos desígnios de solidariedade regional e unificação dos estados com independência dos Estados Unidos. Contudo, a Venezuela manteve-se dependente das vendas de petróleo para o mercado americano, pois as vendas para os parceiros da ALBA e PETROCARIBE eram feitas em condições, muitas das vezes subsidiadas, ou mesmo por permuta. Porém, estes acordos fortaleceram a imagem de Hugo Chávez como líder regional, e assim, expandindo o seu projecto integracionista.

4 – AMÉRICA DO SUL, OS BLOCOS ECONÓMICOS E A DISPUTA PELA HEGEMONIA REGIONAL Nesta parte, analisaremos como Chávez se relacionava com a sua vizinha Colômbia, com quem a Venezuela mantinha disputas desde a fragmentação da Grã-Colômbia, a 19

sua postura em relação aos blocos políticos e económicos da região e como a Venezuela e o Brasil esgrimiam entre si o protagonismo das ambas no cenário regional. 4.1 AS RIVALIDADES COM A COLÔMBIA Com Chávez, o governo venezuelano mostra-se simpatizante das reivindicações dos insurrectos colombianos, as FARC. Chega a convidar membros das FARC para debates em Havana e Caracas, estabelecendo assim uma relação de confiança. Dessa forma, tenta afastar das suas fronteiras as acções de guerrilha. As ideias que transpareciam para a opinião pública eram de que a Venezuela apenas procurava a pacificação da região e actuar como mediador. Estas atitudes não foram recebidas de bom grado pelo governo colombiano, que reiteradamente pediu a Chávez e ao seu governo que não interferissem nas questões internas colombianas. Estas tensões atingiram o auge com a promulgação do Plano Colômbia, que visava o combate ao narcotráfico na região. A primeira versão, proposta pela Colômbia aos Estados Unidos, previa atingir os objectivos por meios de investimento em áreas estratégicas, para assim, desvanecer as desigualdades sociais, contudo, Bill Clinton, apresentou uma contra proposta, que previa destinar 82% dos recursos à acção militar, e assim, permitindo a Washington ter forças armadas na região. Chávez não estava de acordo com a solução americana pois temia a internacionalização do conflito e a intervenção Americana na região. Foram necessárias várias rondas negociais para se ultrapassarem as animosidades, e o plano avançou. Na área económica, a Colômbia era um bom parceiro da Venezuela pois comprava, em grandes quantidades, produtos que não eram derivados do petróleo, e com o processo de regionalização das últimas décadas, essas trocas intensificaram-se. Suportados em acordos bilaterais, diminuíram as taxas aduaneiras, e estimularam o Investimento Directo Estrangeiro nos dois lados da fronteira. Em 2002, Uribe é eleito e o clima favorável foi interrompido. Uribe decide eliminar as FARC através de acções militares e considerou-a uma organização terrorista, o que gerou problemas nas fronteiras com o seu vizinho, com muitos refugiados a atravessarem para a Venezuela. O mau estar agudizou-se, quando, em 2004, o guerrilheiro Rodrigo Granada foi capturado em Caracas por forças Colombianas, transportado até Cúcuta, e ai preso. Chávez acusa a 20

Colômbia de violar a sua soberania e gerou-se um clima de tensão entre os dois estados. Exigia um pedido de desculpas à Colômbia e suspendeu todos os acordos comerciais. Porém, o auge da crise estaria ainda para vir, quando em 2007 Uribe decide encerrar a mediação encabeçada por Chávez para a libertação de reféns. Em resposta, Chávez congela as relações com o seu vizinho. Para agravar, em 2008, os Colombianos matam, em território Equatoriano, Raul Reyes, membro das FARC. Chávez recrimina o acto, fecha a embaixada da Venezuela em Bogotá e ordena o posicionamento de dez batalhões junto à fronteira com a Colômbia. O diferendo viria a ser sanado uma semana mais tarde, em Santo Domingo, na reunião do Grupo do Rio, aceitando Chávez o pedido de desculpas formal do presidente colombiano, á imagem do que também fez o presidente do Equador. Tudo isto nos mostra que, até 2002, apesar das divergências permanentes, a situação era resolvida por via de uma forte diplomacia dos dois lados, contudo, é quando Uribe sobe ao poder que a situação se agudiza e provoca uma inflexão nos entendimentos bilaterais. 4.2 OS BLOCOS ECONÓMICOS Chávez partilhava da visão integracionista dos seus antecessores (Carlos Pérez – 1989-1993 – procurava uma integração a norte e oeste | Rafael Caldera – 1994-1998 – procurava a integração a leste e a sul) e isso levou a que executasse uma política externa com foco na América-Latina, ampliando as discussões sobre o tema e tornando-o uma prioridade do seu governo, tentando dessa forma concretizar o sonho de Simon Bolívar. Esta aceleração na política externa levou a que fosse desencadeada uma nova inserção geopolítica da Venezuela na região. Essa prioridade de Chávez insere-se no conceito de potência média, conceito esse que define os países que nele estão colocados: países que mesmo não tendo poder politico, económico ou militar, para se considerarem grandes potências, gozam de uma certa projecção internacional. Na sua concepção clássica, Waltz18 e Mearsheimer 19 dizem que as potências médias apenas têm duas formas de inserção:

18 Waltz, Kenneth, “Reflections on theory of international politics: a responde to my critics”, In: Keohane, Robert O.

“Neoralism and its critics”, NEw York: Columbia University Press, 1986 19 Mearsheimer, John J. “The tragedy of Great power politics”, New York: W. W. Norton, 2001

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1. Balancing - Tentativa de desafiar a grande potência, tentado criar um equilíbrio de forças do sistema hegemónico; 2. Bandwagoning – Aliar-se às grandes potências na procura de benefícios próprios. Posteriormente, surgiu uma nova abordagem teórica do conceito, onde é usado o termo de soft balancing, que significaria uma tentativa de contrapor o poder hegemónico pelas instituições multilaterais, em vez de o desafiar pelas alianças subregionais. Segundo Keohane, as potências médias poderiam ser divididas em quatro categorias, sendo o critério para esta divisão a sua influência regional. Estando numa posição inferior às grandes potências, para ganhar poder negocial, teriam que se organizar em grupos. Desta forma, começaram a surgir os blocos políticos e económicos entre este tipo de países. Por este motivo, podemos compreender a vontade de Chávez de insistir na integração regional, aproximando-se do MERCOSUL e promovendo acordos petrolíferos com os países vizinhos. No caso do MERCOSUL, já antes de Chávez, a Venezuela tinha manifestado vontade em integrar o bloco, e Chávez, inicialmente, tentou articular um acordo entre a Comunidade Andina e o MERCOSUL. O grande objectivo de Chávez, era de tornar a Venezuela como o estado pivot do processo integracionista, sendo um elo nas comunicações entre norte e sul. A ascensão de governos de esquerda no Brasil, Argentina e Uruguai, e a vontade da Colômbia e do Peru em assinar acordos de comércio livre com os Estados Unidos fizeram com que Chávez virasse o leme da sua política externa, desvinculando-se da Comunidade Andina e pedindo a entrada no MERCOSUL. Em 2005, na reunião do MERCOSUL, em Montevideu, Chávez acertou a entrada da Venezuela na instituição, que foi aprovada, sendo acertado que o processo correria de forma célere, fruto da influência exercida pelo líder venezuelano junto dos outros líderes. Em Julho de 2006 é assinado o protocolo de entrada, e a partir daí, a Venezuela gozava dos mesmos direitos e obrigações que tinham países como a Argentina e o Brasil. A sua entrada no MERCOSUL gerou várias opiniões. Umas contrárias, outras a favor. Os que estavam a favor, argumentavam que a Venezuela iria ampliar a integração política e económica da região, aumentando a segurança energética dos membros. Por 22

outro lado, ajudaria a consolidar o MERCOSUL nas relações internacionais, dando-lhe maior poder negocial, capaz de ombrear com os pressupostos da ALCA. As opiniões contrárias defendiam que a entrada de um país questionado pela sua conduta anti-democrática, poderia ser prejudicial ao bloco regional. O principal receio era de que Chávez tornasse o MERCOSUL num palco de disputas políticas e ideológicas. No que toca à Comunidade Andina (CAN), a Venezuela fazia parte do organismo desde a sua fundação, em 1969, e apesar da sua longevidade, os membros nunca conseguiram ter uma estratégia comum de longo prazo nem uma base politica, económica e social capaz de resistir a uma integração. Chávez tinha a intenção inicial de fundir a CAN com o MERCOSUL, buscando assim uma América Latina unida, contudo, depois da deterioração das relações com a Colômbia e a vontade dos outros estados membros em realizar tratados bilaterais com os EUA, a Venezuela renuncia ao bloco. Para Chávez, os Tratados de Livre Comércio assinados pelo Peru e pela Colômbia levaram a que a integração andina desabasse. Na mesma altura, Chávez renuncia também ao G-3 (Colômbia, México e Venezuela), pois este era baseado num modelo neoliberal, o qual não estava segundo os princípios da Republica Bolivariana. Tanto a renuncia ao G-3 como à CAN, estão ligadas à entrada da Venezuela no MERCOSUL, pois Chávez via a CAN como moribunda e o G-3 não ia de encontro aos princípios de solidariedade e cooperação por si defendidos. Dai ter virado a sua diplomacia para a entrada no MERCOSUL, onde almejava ter uma boa relação com os outros membros e por outro lado, exportar o seu ideal socialista. 4.3 A DISPUTA PELA HEGEMONIA REGIONAL Historicamente, o Brasil e a Venezuela sempre mantiveram um relacionamento cordial, e com a subida ao poder por parte de Chávez, é estabelecida uma convergência política referente à visão do mundo, o que influenciou os esforços de integração regional. Em Abril de 2001, os dois estados assumiram o compromisso de integrar a Venezuela no MERCOSUL. Um outro ponto de encontro era a posição dos dois governos em relação à proposta americana da ALCA, e diziam que a regionalização do continente deveria seguir os 23

pressupostos de igualdade, respeitando no entanto, as diferenças nos níveis de desenvolvimento económico dos diferentes países. Um acontecimento que nos faz ver esta convivência pacífica entre os dois, foi a crise interna de 2002, quando a Venezuela é assolada por greves gerais, o que deixa o país numa situação de escassez de gasolina. O governo brasileiro, apoia o governo bolivariano, enviando 520.000 barris de petróleo para, num claro sinal de não concordância com o objectivo Norte-Americano de isolamento politico de Chávez. Já com Lula da Silva no poder, é criado o Grupo de Amigos da Venezuela, que tinha o intuito de ajudar nas negociações entre a oposição e o governo brasileiro. Foram também aprofundadas as relações em vários níveis, como na energia, questões aduaneiras, agricultura, pescas, etc. Nas questões politicas também existiu uma convergência, quer seja a nível regional, como a nível mundial. Neste ultimo, o Brasil apoia a candidatura da Venezuela, em Junho de 2006, a uma vaga no Conselho de Segurança, em parte, porque os venezuelanos apoiavam o objectivo brasileiro de assegurar um lugar permanente no órgão. Apesar de todas estas relações cordiais, o caso muda de figura quando se coloca sobre a mesa a questão da hegemonia regional. Quando Lula da Silva chega ao poder, fala-se no nascimento de um eixo político Brasil-Venezuela, em oposição aos EUA, contudo, isto acabaria por não acontece, pois Lula da Silva, apesar de criticar algumas das posições das grandes potências, recusou-se a estabelecer uma política efectiva de combate à hegemonia Norte-Americana. Chávez, em contraponto, faz alianças políticas com outros países de orientação socialista na região, como é o caso da Bolívia de Evo Morales, relação essa que faz estremecer a relação da Bolívia com o Brasil. Já o Brasil procurava a estabilidade democrática e a segurança regional, sempre numa perspectiva de não intervenção, e o seu objectivo principal, era o de projectar o Brasil como líder regional e protagonista no sistema mundial. Para isso aposta na colaboração Sul-Sul, na integração económica regional e numa união política abrangente, o que difere do governo de Chávez, pois procurava uma pacificidade nas relações com os EUA. Já Chávez, fruto dos seus discursos extremamente ideológicos, tinha uma posição mais radical. Usou os recursos energéticos do seu país para criar parcerias com outros 24

estados, e assim, procurava um protagonismo internacional na defesa dos países subdesenvolvidos. Assente nos ideais bolivarianos, procura a integração da América do Sul, numa posição de contra poder às grandes potências, refira-se aqui, principalmente os EUA. Em suma, tanto o Brasil como a Venezuela, emergem no seculo XXI, como as principais potências da região e disputavam entre si a hegemonia regional. Partilham objectivos semelhantes em várias questões, mas discordam nos meios de actuação para atingir os objectivos. Os Brasileiros optavam pelo diálogo e pelos princípios da boa vizinhança, enquanto a Venezuela, se rege por desígnios militares e geoestratégicos, amplamente suportados pela figura carismática de Chávez. Não é de estranhar que a actuação brasileira tenha sido melhor aceite pela comunidade internacional, apesar de as ideias de Chávez terem repercussão em todo o mundo. A Venezuela, na sua estratégia de garantir a hegemonia regional, tem como base de suporte, os altos preços do petróleo, o que funciona como arma política nas relações com os outros estados. Por outro lado, o Brasil, com uma actuação activa nos organismos como o MERCOSUL, tem vindo assim, criteriosamente, a aumentar a sua influência na região e consolidando a sua liderança regional.

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CONCLUSÕES O Governo de Chávez traz profundas mudanças tanto na política interna como externa do país, o que resultou numa sensação de esperança para as classes mais desfavorecidas, que assim esperavam uma maior inclusão social. Os discursos populistas de Chávez, bem como a sua forte contestação aos programas neoliberais, foram fundamentais na sua eleição em 1999. Chávez surge como um herói nacional, que traria de volta o crescimento económico ao país. Sendo a política externa um reflexo da actuação dentro de portas devemos fazer um primeiro balanço ao governo de Chávez a nível interno. Os primeiros anos da sua governação foram marcados por um constante recurso ao escrutínio, o que, aliás, foi uma das variáveis constantes na sua governação. Com a Constituição Bolivariana aprovada, realiza novas eleições em 1999 as quais ganha com maioria, o que lhe da viabilidade governativa. Este ponto revela-se fulcral nas suas pretensões, pois assim eliminava os seus opositores dentro do congresso. No entanto, algumas das suas acções poderiam ser consideradas como as de um ditador, sendo por isso condenado pela comunidade internacional. No panorama internacional, podemos dividir a sua gestão em duas fases, como vimos anteriormente. A fase inicial pode ser explicada pela sua inexperiência internacional e pelo baixo preço do petróleo, o que condicionava a sua acção. Após o referendo de 2004, a sua postura radicaliza-se, e foca-se no combate aos EUA, principalmente pelo combate ideológico. O auge desta tensão surge com a descoberta de indícios de participação Norte-Americana na tentativa de golpe de estado em 2002. A sua agenda externa foca-se na integração regional, fundamentada pelos ideais de Simon Bolivar, acelerando assim negociações bilaterais e multilaterais com o intuito de formar blocos regionais, de forma a que, a Venezuela exercesse um papel preponderante na região. Usou a diplomacia do petróleo como arma política, o que beneficiava os países com escassez desse recurso energético, o que resultou na projecção da Venezuela como uma das lideranças do sub-continente no Seculo XXI. A aproximação ao Brasil e a entrada no MERCOSUL alteraram o paradigma do hemisfério. O seu posicionamento, ao renunciar à CAN, enfraquece-a, ao mesmo tempo que fortalece o Cone Sul. O seu desejo de criação de alternativas ao neoliberalismo torna-o uma voz influente na região, compartilhando ideias com o 26

governo brasileiro. Contudo, o seu radicalismo ideológico, faz com que o discurso brasileiro, mais calmo e ponderado, seja melhor aceite na comunidade internacional. No

que respeita ao tema da América do Sul, Chávez criou atritos fortes com a

Colombia de Uribe, que se gravou com os acordos comerciais e militares daquele pais com os EUA, que reafirmavam a influência norte americana na região. Chávez viu a necessidade de criar um órgão capaz de defender a região e propõe a Organização do Atlântico Sul (OTAS), que seria uma espécie de NATO, mas a sua ideia acaba por não vingar. Passados 5 anos, é o Brasil que surge em cena ao propor a criação do Conselho de Defesa Sul-Americano, inserido dentro da UNASUL. A aprovação desta proposta brasileira mostra a influência que o Brasil tem na região, a qual Chávez nunca foi capaz de ultrapassar. O aparecimento de Chávez na politica venezuelana veio alterar significativamente as relações internacionais no sub-continente, contudo a sua gestão está directamente relacionada à posse de recursos petrolíferos e ao seu preço. Porém, não consegue reduzir a dependência económica do país das exportações petrolíferas. Depois de 2009, consegue alterar a constituição, permitindo-lhe assim, reeleições ilimitadas, o que acabaria por acontecer se não tivesse falecido. Continuaríamos a ver uma Venezuela Chavista, com a sua política externa baseada no petróleo como arma politica.

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