Design Inovador: mandala transrelacional de abordagens criativas

October 4, 2017 | Autor: Ida Benz | Categoría: Transdisciplinarity, Design Innovation, Transdisciplinary Design
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Descripción

Ida Elisabeth Benz

Design Inovador: mandala transrelacional de abordagens criativas

Tese de Doutorado Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Design da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Design. Orientador: Prof. Claudio Freitas de Magalhães

Rio de Janeiro Março de 2014

Ida Elisabeth Benz

Design Inovador: mandala transrelacional de abordagens criativas Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Design da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Design. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada.

Prof. Claudio Freitas de Magalhães Orientador Departamento de Artes & Design - PUC-Rio

Profa. Rita Maria de Souza Couto Departamento de Artes & Design - PUC-Rio

Prof. Fernando Cosme Rizzo Assunção Departamento de Artes & Design - PUC-Rio

Profa. Virginia Souza de Carvalho orges Kistamann Universidade Federal do Paraná – UFPR

Profa. Cláudia Sousa Leitão Universidade Estadual do Ceará – UECE

Profa. Denise Berruezo Portinari Coordenadora Setorial do Centro de Teologia e Ciências Humanas - PUC-Rio Rio de Janeiro, 21 de Março de 2014

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização da universidade, da autora e do orientador.

Ida Elisabeth Benz Mestre em Design pelo Programa de Pós-Graduação em Design da PUC-Rio (2009), graduada em Comunicação Visual pela PUC-Rio (1989), trabalhou como designer gráfica por quase seis anos na Suíça. De volta ao Rio de Janeiro, estudou Design de Joias e frequentou diversos cursos de especialização do setor joalheiro. Trabalhou como designer de joias e também na Associação de Joalheiros e Relojoeiros do Estado do Rio de Janeiro – AJORIO. Atuou como pesquisadora na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro em um projeto de implementação de novas tecnologias para o setor joalheiro (2007-2009).

Ficha Catalográfica

Benz, Ida Elisabeth

Design

Inovador:

mandala

transrelacional

de

abordagens criativas / Ida Elisabeth Benz ; orientador: Claudio Freitas de Magalhães. – 2014. 289 : il. (color.) ; 30 cm

Tese (doutorado)–Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Artes e Design, 2014. Inclui bibliografia 1. Artes e design – Teses. 2. Inovação. 3. Design. 4. Design inovador. 5. Abordagens criativas. 6. Teoria da transdisciplinaridade. I. Magalhães, Claudio Freitas de. II. Pontifícia

Universidade

Católica

do

Rio

de

Janeiro.

Departamento de Artes e Design. III. Título.

CDD: 700

Agradecimentos

Ao meu orientador, Claudio Freitas de Magalhães, que destruía minhas “certezas” iniciais, me ajudando a quebrar meus padrões fixos de pensamento e a expandir a minha busca por novos conhecimentos. Através de nossos diálogos, de seu apoio e de sua confiança consegui trilhar caminhos inesperados e que me trouxeram muita satisfação. À Capes e à PUC-Rio, pelos auxílios concedidos sem os quais este trabalho não poderia ser realizado. Às professoras Rita Couto e Jackeline Lima Farbiarz, que me apresentaram a teoria da transdisciplinaridade, que não só deu um novo rumo a minha pesquisa, mas também mudou o meu modo de perceber e de trilhar o mundo. Aos professores que participaram da banca de qualificação pelas sugestões e conselhos que me ajudaram a perceber como minhas ideias e propostas seriam “recebidas”, me mostrando o que precisava ser adaptado para que fossem comunicadas com mais precisão. Aos professores que aceitaram o convite de participarem da banca examinadora, que disponibilizaram seu tempo e atenção para embarcarem nessa minha “aventura transdisciplinar”. Aos colegas, professores e funcionários do Departamento de Artes & Design pelo apoio nos quatro anos desta caminhada. A Anglogold Ashanti, pela generosidade e prontidão em me ceder o material para a realização da pesquisa. A minha família e amigos pelo incentivo que me deram nos momentos de dúvidas. E um agradecimento especial a Ricardo Miranda.

Resumo Benz, Ida Elisabeth; Magalhães, Claudio Freitas de. Design inovador: mandala tranrelacional de abordagens criativas. Rio de Janeiro, 2014. 289 p. Tese de Doutorado - Departamento de Artes e Design, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Esta pesquisa trata da relação do design com a inovação. Como o design é uma atividade multidisciplinar e complexa que transita entre ciência e arte, entender esta relação pode ser de grande auxilio na atual discussão por novos paradigmas, enquadramentos teóricos e metodológicos que buscam um avanço no conhecimento sobre a inovação. As peculiaridades do design em relação a outras áreas ligadas a inovação - principalmente sua característica ambígua de abranger tanto um aspecto abstrato de conceber/projetar/atribuir quanto um aspecto concreto de registrar/configurar/formar - dificulta a compreensão do papel do design em relação a inovação por estudiosos e profissionais externos à atividade. E ao unir a objetividade da ciência com a subjetividade das artes, o design enfrenta dificuldades em se encaixar no sistema vigente da lógica clássica. Por isso, esta pesquisa adota como questão norteadora se: A relação da inovação com o design pode ser melhor entendida usando-se teorias que ampliem os paradigmas da ciência, como é o caso da teoria da transdisciplinaridade? Como será demonstrado ao longo da pesquisa os três pilares sob os quais a teoria da transdisciplinaridade se baseia - i. a física quântica e os níveis de realidade; ii. a complexidade; e iii. a lógica do terceiro incluído – se adéquam melhor aos processos projetuais e a lógica abdutiva do design. A pesquisa teve como objetivo geral avaliar o papel dos conceitos da teoria da transdisciplinaridade no aspecto abstrato e no aspecto concreto do design em relação a inovação. Os objetivos específicos foram levantar os conceitos de inovação nas ciências, nas artes e no design, estabelecer da relação do design com a inovação, criar uma diferenciação dos conceitos de “inovação pelo design” e “design inovador”, além de apresentar e avaliar abordagens criativas baseadas na teoria da transdisciplinaridade que possam servir de auxilio no processo criação de “design inovador”. Para tanto a pesquisa foi dividida duas partes. A primeira é uma pesquisa exploratória de cunho transdisciplinar a partir de dados coletados por levantamento bibliográfico e documental e a segunda é uma pesquisa aplicada, onde foi proposto um modelo baseado no uso de uma multiplicidade de abordagens

criativas visando alcançar-se uma pluralidade de resultados. Para a validação deste modelo é realizada uma análise de mais de cento e setenta peças selecionadas sob o rótulo de design inovador em seis edições bianuais de um concurso de design de joias, onde pode-se concluir que a multiplicidade de abordagens já vem sendo utilizada inconscientemente por diversos designers e que a proporção do número de combinação de abordagens por peça usados nas joias vencedoras é significativamente maior do a apresentada no conjunto das peças selecionadas nos concursos.

Palavras-chave Inovação; design; design inovador; abordagens criativas; teoria da transdisciplinaridade.

Abstract Benz, Ida Elisabeth; Magalhães, Claudio Freitas de (Advisor). Innovative design: transrelational mandala of creative approaches. Rio de Janeiro, 2014. 289 p. DSc. Thesis - Departamento de Artes e Design, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. This study approaches the relationship between design and innovation. Since design is a complex multidisciplinary activity that moves between science and art, understanding this relationship can be of great aid in current discussion for new paradigms, theoretical and methodological frameworks which seek an advance in understanding of innovation. The peculiarities of design compared to other areas related to innovation - especially its ambiguous feature including both an abstract aspect of to conceive/project/ascribe as a concrete aspect of registering/configure/form - hinders the understanding of the role of design in relation to innovation by scholars and professionals outside to this activity. And, by joining the objectivity of science with the subjectivity of art, design faces difficulties to fit into the classical logical system. Therefore, the guiding question for this study was: The relationship between innovation and design can be better understood by using theories that expand the paradigms of science, such as the theory of transdisciplinarity? As it will be demonstrated throughout the study the three pillars upon which the theory of transdisciplinarity is based - i. quantum physics and levels of reality, ii. complexity, and iii. the principle of the “included middle”.- are more suitable to the projectual processes and the abductive logic of the design. The general objective of this study is to evaluate the role of the concepts of the theory of transdisciplinarity in the abstract aspect and the specific aspect of design in relation to innovation. The specifics objectives were gather concepts of innovation in science, arts and design; to establish the relationship between design and innovation; to create a differentiation of the concept of "innovation by design" and "innovative design"; besides presenting and evaluating creative approaches based on the theory of transdisciplinarity that may provide assistance in the process of creating "innovative design". For these reason the study was divided into two parts. The first part is an exploratory research with a transdisciplinary nature based on data collected through bibliographic and documentary survey and the second is an applied research, where a based on the use of a multiplicity of creative approaches aiming to achieve a plurality of results was proposed. To validate

these model an analysis of over one hundred and seventy pieces selected under the label of innovative design in six editions of a biennial Brazilian national jewelry design competition was released, which one can conclude that the multiplicity of approaches has already been used by many designers (purposefully or not) and that the proportion of the number of combination of approaches used per piece by the winning jewelries are significantly higher than the average of all selected pieces in all editions.

Keywords Innovation; design; innovative design; creative approaches; theory of transdisciplinarity.

Sumário

1 Introdução

16

1.1 Problema

25

1.2 Questão de norteadora

29

1.3 Justificativa

30

1.4 Objetivos

33

1.5 Metodologia de pesquisa

33

2 Inovação – sob a ótica da ciência e da arte

37

2.1 Inovar e inventar

38

2.2 Inovação na ciência – criação de teorias e conceitos

41

2.3 A relação da inovação com a cópia

52

2.4 Inovação na arte – rupturas de linguagem

55

3 Inovação no design

67

3.1 O “diferente” é inovação no design?

68

3.2 O design no processo de P&D

72

3.3 Uma nova proposta de inovação através do design

77

3.4 O designer como configurador de objetos

81

3.5 Inovação pelo Design versus Design Inovador

87

4 Design e Transdisciplinaridade

94

4.1 A teoria da transdisciplinaridade

97

4.2 Design – transdisciplinaridade posta em prática

110

5 Abordagens criativas para inovação no design de objetos

115

5.1 O pensamento criativo

131

5.2 Abordagens criativas: Mandala transrelacional

153

6 Mandala transrelacional de abordagens criativas – da teoria à prática

171

6.1 Mandala transrelacional no processo de design de um projeto

171

6.2 Mandala transrelacional de abordagens criativas como ferramenta de

análise da Coleção AuDITIONS Brasil

181

7 Consideração Finais

225

8 Referências bibliográficas

234

9 Anexos

247

Lista de figuras

Figura 1 - Linha do tempo da Inovação

47

Figura 2 - Les Demoiselles d'Avignon e Les Grandes Baigneuses

61

Figura 3 - A estética da cadeira vermelha dos Campanas transposta para sapatilhas de plástico da Melissa e joias para a H.Stern.

84

Figura 4 - Exemplos de projetos de Ron Arad

85

Figura 5 - A estética do computador da IBM e da Apple iMac (1998)

92

Figura 6 - O salto quântico.

102

Figura 7 - Pinturas e aquarelas de Cézanne da Montanha de Saint Victoire

106

Figura 8 - “Perfect face”

107

Figura 9 - Experimento da Fenda Dupla uma fenda aberta

108

Figura 10 - Experimento da Fenda Dupla duas fendas abertas

109

Figura 11 - Evolução do telefone celular

109

Figura 12 - Exemplo de imagem ambígua

151

Figura 13 - Homem-rato de Bugelski e Almapay

151

Figura 14 - “Minha mulher e minha sogra” de Hill

152

Figura 15 - Mandala transrelacional de abordagens criativas com os exemplos de peças da joalheria contemporânea

157

Figura 16 - Construção da mandala transrelacional de abordagens criativas

158

Figura 17 - Abordagens criativas organizada em forma de mandala

159

Figura 18 - Imagens de inspirações para o brinco Casa Grande & Senzala

174

Figura 19 - Peças de inspiração das respectivas nas abordagens selecionadas para o projeto Casa Grande & Senzala

175

Figura 20 - Primeira opção de layout para o brinco Casa Grande & Senzala

176

Figura 21 - Segunda opção de layout para o brinco Casa Grande & Senzala

177

Figura 22 - Render do layout para o brinco Casa Grande & Senzala

178

Figura 23 - Brincos extreme oversized

178

Figura 24 - Opções de proporções para o brinco Casa Grande & Senzala

179

Figura 25 - Mudanças no do projeto do brinco Casa Grande & Senzala

180

Figura 26 - O brinco Casa Grande & Senzala dentro da mandala

180

Figura 27 - Pranchas do segundo projeto “Mantilha para Iemanjá”

181

Lista de quadros

Quadro 1 - As três culturas do conhecimento

22

Quadro 2 - Modelo de difusão tecnológica

43

Quadro 3 - Estratégia do Oceano Vermelho vesus Estratégia do Oceano Azul

48

Quadro 4 - Modelo das quatro ações

49

Quadro 5 - Modelo de Dimensão da Inovatividade

51

Quadro 6 - Artistas segundo estilo e conteúdo da obra

57

Quadro 7 - Comunicação Estética

62

Quadro 8 - Linha do tempo da arte moderna e contemporânea

64

Quadro 9 - Rede de interesses que unem a empresa industrial e o consumidor 70 Quadro 10 - Fluxo principal do design dentro da atividade de design

75

Quadro 11 - Modelo de Circular para o processo de design thinking da IDEO

80

Quadro 12 - Classificação das funções de um produto

89

Quadro 13 - Casos de desenvolvimento de produtos nos estágios de uma ciclo de vida genérico

91

Quadro 14 - Teoria transdisciplinar do design

95

Quadro 15- Diferenças na forma de inquirir entre inter e transdisciplinar

96

Quadro 16 - Paralelos entre a metodologia da transdisciplinaridade e o modo de atuação e visão do design thinking

112

Quadro 17 - Gramática básica de Forty (2007) para a criação de objetos

117

Quadro 18 - Princípios da configuração formal de Mankau

120

Quadro 19 - “Tendências” de procedimento criativo

129

Quadro 20 - Vetores ou motrizes (driving forces) para inovação no design

129

Quadro 21 - Comparativo de processos de inspiração para criação de objetos no design

130

Quadro 22 - Conceitos mais difundidos sobre criatividade

133

Quadro 23 - Diagrama de conexões de associações comuns versus incomuns 137 Quadro 24 - Aprendizado de um padrão mental.

139

Quadro 25 - Pensamento reativo

140

Quadro 26 - Pensamento reflexivo

140

Quadro 27 - Pensamento reativo-reflexivo

141

Quadro 28 - Salto criativo

145

Quadro 29 - Conjunto de procedimentos criativos

155

Quadro 30 - Definição de termos para escolha de denominação

do novo conjunto de procedimentos

156

Quadro 31 - Exemplo de materialização de abordagens criativas no design de joias

160

Quadro 32 - Exemplos de materialização das abordagens criativas

161

Quadro 33 - Níveis de relação sujeito/objeto

164

Quadro 34 - Exemplos de criações gastronômicas de Ferrean Adriá

168

Quadro 35 - peças que serviram de inspiração para o projeto Casa Grande & Senzala

172

Quadro 36 - Processo de conceituação do projeto Casa Grande & Senzala

173

Quadro 37 - Números de projetos inscritos e selecionados por edição do concurso AuDITIONS Brasil

184

Quadro 39 - Exemplo de mapas de análise de abordagens por edição do concurso AuDITIONS Brasil

187

Quadro 40 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002 – HOT GLAMOUR

188

Quadro 41 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002 – YOUNG & COOL

189

Quadro 42 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002 – BRAZILIAN ESSENCE

190

Quadro 43 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2004 – RAIZES E FORMAS

191

Quadro 44 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2006 – CALOR GLACIAL

192

Quadro 45 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2008 – NATUREZA FANTÁSTICA

193

Quadro 46 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2010 – SINCRONICIDADE

194

Quadro 47 - Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2012 – BRASILIDADE

195

Quadro 48 - Peças que combinam 4 ou mais abordagens criativas e as respectivas percentagens

199

Quadro 49 - Colares divididos por edição e por número de abordagens identificadas

204

Quadro 50 - Brincos divididos por edição e por número de abordagens identificadas Quadro 51 - Pulseiras divididos por edição e por número

204

de abordagens identificadas

205

Quadro 52 - Anéis divididos por edição e por número de abordagens identificadas

206

Quadro 53 - Adornos de pés e pernas divididos por edição e por número de abordagens identificadas

206

Quadro 54 - Adornos de cabeça divididos por edição e por número de abordagens identificadas

207

Quadro 55 - Cintos e saias divididos por edição e por número de abordagens identificadas

208

Quadro 56 - Conjuntos divididos por edição e por número de abordagens identificadas

208

Quadro 57 - Peças diversas divididas por edição e por número de abordagens identificadas

209

Quadro 58 - Peças dos designers selecionados em mais de uma edição divididas por número de abordagens identificadas

215

Quadro 59 - Peças vencedoras das respectivas edições

221

Quadro 60 - Resultados diversos para mesmos briefings e/ou temas

227

Quadro 61 - Materialização das mesmas abordagens criativas em objetos totalmente diversos

232

Lista de gráficos

Gráfico 1 - Gráfico comparativo de tipos abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002-2012

196

Gráfico 2 - Gráfico comparativo de número de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002-2012

196

Gráfico 3 - Divisão das % de abordagens no total das 6 edições do concurso

197

Gráfico 4 - Divisão de % por número de abordagens no total das 6 edições do concurso

198

Gráfico 5 - Média de abordagens por peça nas 6 edições do concurso

200

Gráfico 6 - Peças acima e dentro na média arredondada de abordagens das 6 edições do concurso

200

Gráfico 7 - Áreas de expertise dos jurados por edição do concurso

201

Gráfico 8- Nacionalidade dos jurados por edição do concurso

202

Gráfico 9 - Gráfico de divisão da coleção AuDITIONS Brasil por tipos de peça 202 Gráfico 10 - Tipos de peças por edição do concurso

210

Gráfico 11 - Tipos de peças por número de abordagens combinadas

210

Gráfico 13 - Designers pressentes em mais de uma edição dividido por estado de origem

211

Gráfico 14 - Tipos de abordagens mais utilizadas pelos designers selecionados em mais de uma edição

216

Gráfico 15 - Percentagem dos tipos de abordagens mais utilizadas pelos designers selecionados em mais de uma edição

218

Gráfico 16 - Comparação entre número de peças e média de abordagens por peça mais dos designers selecionados em mais de uma edição

219

Gráfico 17 - Tipos de abordagens mais utilizadas nas peças vencedoras

222

Gráfico 18 - Comparação das percentagens dos tipos de abordagens na coleção como um todo e apenas nas peças vencedoras

222

Gráfico 19 - Peças vencedoras divididas por tipos

223

Gráfico 20 - Comparação da percentagem do número de abordagens combinadas na coleção como um todo e apenas nas peças vencedoras

223

1 Introdução

“Inovações acrescentam valor a produtos, ajudando as empresas a sobreviver num cenário crescentemente competitivo. Elas têm utilidades múltiplas: dão acesso a novos mercados, aumentam lucros, geram emprego e renda, fortalecem marcas. Tais vantagens tornaram se cruciais num mundo globalizado, no qual as empresas são obrigadas a competir, tanto no mercado externo quanto no interno, com concorrentes instalados em qualquer canto do mundo. Mas nem de longe os benefícios se restringem ao ambiente corporativo. Produtos melhores e mais baratos têm impacto na qualidade de vida dos consumidores. A influência na economia é igualmente notável. A exportação de produtos inovadores rende muito mais divisas a um país do que commodities agrícolas ou minerais” (Brandão et al., 2006, p. 15).

Exemplos como a Apple, a Sony, a Nokia, a Nike, etc. demonstram que o design começa a se tornar um fator de sucesso de mercado através da criação de valor junto ao consumidor. “Há pouco tempo a inovação nos produtos estava relacionada com as características físicas deste, principalmente com sua performance funcional. Atualmente, no entanto a inovação não passa só por produtos engenhoso como os Post-it [...], mas, sobretudo, por produtos com aspecto atraente, como o iPod, fabricado pela empresa Apple. O segredo do sucesso? Design!” (Sarkar, 2008, p. 175). Apesar desses exemplos, a relevância do design em todo o processo de inovação ainda é pouco reconhecida pelas áreas de pesquisa que estudam há mais tempo a inovação, como por exemplo, a economia, a administração ou a engenharia de produção. Trabalhando com valores intangíveis como subjetividade, criatividade, estética, etc., o design tem a avaliação quantitativa de seus resultados dificultada, já que a construção de parâmetros ou indicadores para a mensuração de seus resultados não é tarefa das mais fáceis. Como o bem intangível não entra no balanço das empresas, pois não é considerado investimento, é difícil transformá-lo em ativo. E para torná-lo, pelo menos em parte, ativável é preciso dar-lhe um referencial de valor.

17

“Há vários problemas de medição e obstáculos na aquisição de informações quantitativas sobre a relação entre design e desempenho dos negócios. As inúmeras variáveis que afetam os resultados de projetos e do desempenho da empresa em geral tornam difícil se distinguir qual é o papel do design em termos quantitativos. Nos estudos abordados na literatura, uma ampla gama de variáveis são usados para medir o desempenho dos negócios e design. O desempenho dos negócios foi medido com retorno sobre o capital, lucro, margem de lucro, o crescimento do lucro, o crescimento do volume de negócios, as vendas de exportação, e período de retorno de investimento” (Calonius, 2002, p. 10, livre tradução). Calonius (2002) afirma que além da mensuração de seu desempenho nos negócios, o design tem sido medido através de intensidade do design e do conceito do “bom design”. Segundo o autor, foram Gemser e Leenders (2001) que atribuíram um valor de intensidade ao design através da análise do percentual do desenvolvimento de novos projetos realizados pela empresa que se utiliza de expertise profissional de design. E, por outro lado, “o ‘bom design’ tem sido avaliado através de prêmios de design, premiações e citações (Roy 1994, Walsh et al. 1992). O problema com os prêmios de design é que eles são dados para objetos individuais e na sua maioria tem como base opiniões subjetivas do júri (Hassi 1998), e os seus aspectos econômicos podem não ser levados em conta na avaliação (Mazzarol 1994). Quando se avalia o desempenho da empresa [em relação a inovação] um único ou até mesmo alguns produtos não revelam não necessariamente muita coisa, e o impacto desses produtos pode também não ser percebidos a nível de números dentro da empresa (Roy 1994)” (Calonius, 2002, p. 10, livre tradução). O autor complementa que a relação entre “bom design” e desempenho no negócio é complexa e interativa, já que “como percebido por muitos, (Gemser 1997, Ainamo 1996, Roy 1994) o bom design pode resultar em bom desempenho ou o bom design pode ser causado pelo desempenho” (Calonius, 2002, p. 10, livre tradução) pois as empresas de maior sucesso têm mais recursos para investir em design. E nem sempre o design produz resultados econômicos, já que para que o design se traduza em resultados econômicos, é preciso que as outras áreas da empresa também funcionem bem (Calonius, 2002). Alanen (2005) levanta outra questão em relação a avaliação quantitativa dos resultados de inovação em design. “O maior problema na medição de capacidade de inovação do design é que não existe uma base teórica óbvia para ela. Por exemplo, pesquisas de inovação tecnológica podem se apoiar, ou pelo menos serem auxiliadas, por teorias de inovação e mensurações baseadas na tradição da pesquisa econômica neoclássica e evolucionária. Mesmo que Grupp (1998, 84) opine que nenhuma das teorias tecnológicas de inovação

18

ofereçam diretamente uma solução do problema de mensuração de uma inovação tecnológica. O problema não se torna mais fácil de ser abordado pelo fato do design, ao contrário de muitas áreas tecnológicas, não ter uma tradição em pesquisa própria” (Alanen, 2005. p. 1, livre tradução). Andreassi (2007), corroborando a opinião de Grupp (1998) afirma que mesmo a mensuração do processo de inovação tecnológica é controversa, já que “não há muito consenso sobre as variáveis que devem explicar o esforço inovador, a natureza da inter-relação entre as variáveis; e nem sobre o método empírico mais adequado” (Andreassi, 2007, p. 19). Como o mesmo autor demonstra, a literatura apresenta alguns indicadores para se medir o esforço inovador: 

estatísticas de P&D, como os gastos em P&D ou mão de obra alocada em P&D. patentes, que é o indicador de resultado do processo inovativo mais encontrado na literatura; indicadores macroeconômicos, como a balança de pagamento em tecnologia e a exportação de produtos de alta e média intensidade tecnológica; monitoração direta da inovação por exemplo anúncio de novos produtos lançados pela empresa em mídias especializada, mesmo que isso não reflita diretamente o sucesso mercadológico dos produtos anunciados; indicadores bibliométricos como por exemplo a criação e a citação de artigos científicos técnicas semiquantitativas de avaliação do departamento de P&D, convertendo em uma unidade métrica as impressões de pessoas sobre o desempenho da atividade de P&D.

    

Em um primeiro momento, como é muito comum na área do design, poderse-ia supor que bastaria se adaptar esses indicadores à produção de inovação em design. Mas como Alanen (2005, p. 4) comenta, inovações de produto baseadas no design podem apresentar uma relação intricada entre inovação tecnológica e inovação em design, ou, como por exemplo no design moveleiro ou de vestuário, podem não apresentar nenhuma inovação de função ou tecnológica, se baseando apenas em inovações estéticas, que a autora denomina de pure design innovation. Neste segundo caso a utilização dos indicadores apresentados por Andreassi (2007) acabariam por não conseguir captar nem avaliar esse tipo de inovação, não permitindo que ela assim fosse reconhecida. Mas como a diretora do CGEE - Centro de Gestão e Estudos Estratégicos afirma, o atual momento é de revisão e o processo consiste em identificar e analisar condicionantes da inovação no mundo contemporâneo para se propor novas

abordagens

para

desenvolvimento e inovação.

a

formulação

de

indicadores

de

pesquisa,

19

“Não estamos isolados na preocupação com o melhor entendimento do processo de P&D e inovação. Os debates entre os especialistas sinalizam para o caráter incipiente ou restrito das definições e categorizações das inovações adotadas nos manuais que orientam as principais surveys e as metodologias para a elaboração de indicadores sobre inovação em um grande número de países, inclusive o Brasil. [...] Apesar do imenso legado de estudos originados nas principais escolas dedicadas ao tema, ainda hoje muitas são as dificuldades de se apreender os fenômenos associados à inovação. Apreender o processo de inovação é perseguir um alvo móvel; inova-se hoje de forma diferente de como se inovava no passado. Detectar as transformações, que estão sempre no passado, e desenhar políticas para o cenário que está no futuro é o principal desafio dos formuladores de política” (CGEE, 2010, p.7) Segundo Giuseppe Cocco (in: CGEE, 2010), no modo de produção da pósmodernidade o conhecimento deixou de ser meio para a produção de bens (produção de mercadorias por meio de conhecimento), transformando-se em meio e produto final, ou seja “o uso do conhecimento para produzir outro conhecimento (produção de conhecimento por meio de conhecimento)” (Cocco, in: CGEE, 2010, p.33). Mas como o autor afirma o modo de se mensurar a inovação – através de indicadores de investimentos financeiros nele realizados – acaba medindo o capital aplicado, o trabalho que o produz e as mercadorias que o incorporam, mas o conhecimento propriamente dito não consegue ser medido. “Na produção de conhecimento por meio de conhecimento, perde-se o padrão de valor. O conhecimento não é mais instrumental voltado a um fim, mas contém o fim dentro dele mesmo, como atividade reflexiva: o conhecimento deve produzir sua própria significação, criando um mundo: world making. Essa operação não é automática. Pelo contrário, ela apresenta uma série de dificuldades materiais que, pelo menos em parte, explicam os próprios mecanismos da crise financeira do capitalismo global dessa virada de década” (Cocco, in: CGEE, 2010, p.34). Cocco (in: CGEE, 2010) ainda sugere que para vencer esse desafio, as políticas de inovação deveriam atribuir a inovações cognitivas – que diz respeito a questões da significação, do fazer do mundo – uma maior capacidade de agregar valor. Sem uma nova métrica que entenda o papel da inovação cognitiva, tem-se a impressão paradoxal de que não existe inovação já que se busca mensurá-la onde ela não está. Segundo o mesmo autor, com a desmaterialização do trabalho e dos bens, o eixo sobre o qual as transformações materiais se apoiam é fundamentalmente a “significação” – pois é ela que é comprada e vendida. Ele ainda afirma que esses novos indicadores de inovação que levariam em conta as inovações “humanas”, que reconhecem as dimensões

20

qualitativas e sociais da atividade econômica, não caberiam mais na simples contabilidade dos “custos”. “Comprar o sapato de uma determinada marca diz respeito a um sistema de significações que ultrapassa a dimensão funcional de colocar algo no pé para podermos andar. A marca da empresa, sua propaganda, seu ativismo cultural e desportivo nos oferecem, como dissemos, um “mundo”, quer dizer, um sistema de valores, uma forma de vida. Nessa perspectiva, o capitalismo cognitivo diz respeito, por um lado, a uma relação direta entre valor monetário (nível dos preços, determinação dos custos) e o valor como significação ética e social mais ampla e, por outro, nos remete àquele modelo antropogenético1 onde a produção de conhecimento por meio do conhecimento aparece como produção do homem por meio do homem, quer dizer, de formas de vida por meio de formas de vida” (Cocco, in: CGEE, 2010, p. 56). Mesmo que o autor não o tenha citado, o design faz parte desse capitalismo cognitivo, ele é um importante elemento desse “world making”. Segundo Forty (2007, p. 330), o design é muito mais do que uma atividade para tornar objetos belos ou um método especial de se resolver problemas. Ele transforma em objetos nossas ideias sobre o mundo e as relações sociais vigentes, já que nenhum design funciona se não encarnar os pensamentos e concepções dos usuários para os quais esses objetos se destinam. Para o autor o design em seus aspectos econômicos e ideológicos é uma atividade mais significativa do que costuma ser reconhecida. Seu efeito sobre nossas mentes na formação da percepção do mundo a nossa volta se equipararia aos da televisão, do jornalismo, da propaganda e da ficção. “Longe de ser uma atividade artística neutra e inofensiva, o design, por sua própria natureza, provoca efeitos muito mais duradouros do que os produtos efêmeros da mídia porque pode dar formas tangíveis e permanentes às ideias sobre quem somos e como devemos nos comportar” (Forty, 2007, p.12). Mas sem conseguir difundir entre outras áreas de conhecimento as características de suas práticas em relação a inovação, o design nem chega a ser convidado para discussão desses novos indicadores. Como Lemos (2007) afirma, na pesquisa de inovação o design é relacionado por muitos estudiosos desse tema apenas à inovação de produtos, já que não conseguem perceber que o design ultrapassa uma função de “embelezador” de produtos. “Eles não se referem ao design como uma ferramenta de inovação admitindo, somente, que inovações incrementais utilizam o design como 1

Conceito criado por Christian Marazzi (2008), onde os seres vivos concebidos como capital fixo estão no centro desta transformação e a produção de formas de vida se torna a base do valor formado a partir das faculdades humanas, as competências, os conhecimentos e os afetos adquiridos no trabalho, mas, sobretudo, os que são acumulados fora do trabalho.

21

ferramenta de estilo. Acadêmicos e pesquisadores reconhecem mais facilmente o valor dos conhecimentos de engenharia no desenvolvimento de novos produtos do que o do design” (Lemos, 2007). Como Martin (2010) comenta, apesar de nenhuma organização decidir limitar sua capacidade de inovação e de geração de valor adicional, através por exemplo do design, suas estruturas, processos e normas organizacionais privilegiam processos consistentes e previsíveis, livres de qualquer parcialidade – que o autor denomina de viés de confiabilidade. “Não é que as empresas não gostem ou não queiram um grande design. É que quando um design orientado para a validez2 alcança um importante gargalo de decisão organizacional, uma questão orientada para a confiabilidade inevitavelmente surge: ‘Mas podemos provar que isso vai funcionar?’ ou ‘Como podemos ter certeza de que isso vai dar certo?’ Normalmente a resposta é: não, não há como provar, e nós não podemos ter certeza. [...] E assim o design muitas vezes fica prejudicado ou subjugado ou mesmo aniquilado sem que haja uma intenção explícita, mais vítima do viés corporativo direcionado à confiabilidade” (Businessweek, 2005, livre tradução). O saber tácito do designer, que se expressa para o seu entorno como o “saber do olhar”, treinado durante anos de “confrontação” com o exercício da prática do design, é um “saber dos sentidos”. Com isso, cria-se dificuldades dele ser reproduzido e expressado apenas através do pensamento científico3, pois no caso do design o sujeito – neste caso os seus sentidos, sua cultura, seus conhecimentos acumulados, sua história de vida, etc. – não pode ser disjunto do objeto. Para Cross (1982, p. 221) o design tem um modo particular saber, de conhecer e de descobrir sobre as coisas, diferente das disciplinas ligadas a área das ciências ou as ligadas a área das humanas.

2

Segundo Martin (2010, p. 36-37) ao contrário da confiabilidade - cujo objetivo é produzir resultados consistentes e previsíveis, reduzindo-se o escopo para que possa ser medido de maneira replicável e quantitativa e eliminando-se o ao máximo possível a subjetividade, o julgamento e a tendenciosidade –, o objetivo da validez é produzir resultados que cumpram um objetivo desejado. Mas esse resultado só se demonstra como correto com a passagem do tempo, pois eles incorporam alguns aspectos da subjetividade e de capacidade de julgamento que são eliminados na busca por um resultado confiável, que seriam confirmados por dados que se baseiam em fatos que funcionaram no passado. 3 Nesta pesquisa se fará uso do termo científico a partir da definição de ciência de Gil (2006) que a considera “como uma forma de conhecimento que tem por objetivo formular, mediante linguagem rigorosa e apropriada – se possível com auxílio da linguagem matemática –, leis que regem os fenômenos” (Gil, 2006, p. 21); e a caracteriza como “uma forma de conhecimento objetivo, racional, sistemático, geral verificável e falível” (Gil, 2006, p. 21). O autor ainda afirma que no caso das ciências humanas torna-se, às vezes, impossível definir se os conhecimentos pertencem à ciência ou a filosofia – que se fundamenta em procedimentos racional-especulativos que avançaria para o terreno das explicações metafísicas e absolutistas, e não possibilitam sua adequada verificação.

22

“Na maioria dos casos, é mais fácil contrastar as ciências e as humanidades (por exemplo, objetividade contra subjetividade, experiência contra analogia) do que para identificar conceitos relevantes que podem ser comparados ao design” (Cross, 1982, p. 222, livre tradução). Ele chamaria o design de uma “terceira cultura” do conhecimento, que não foi ainda reconhecida pelas outras duas por não ter sido, do ponto de vista do autor, adequadamente nomeada ou articulada. Buscando melhor exemplificá-la Cross (1982) tentou tornar mais claro suas diferenças através da comparação em relação às outras duas, que compilei no Quadro 1. o fenômeno de estudo os métodos apropriados os valores

ciências o mundo natural

humanas a experiência humana

design mundo feito pelo homem

controle, experimentação, classificação, análise objetividade, racionalidade, neutralidade e uma preocupação com a "verdade"

analogia, metáfora, crítica, avaliação

modelagem, criação de pattern, síntese

subjetividade, imaginação, compromisso e uma preocupação com a "justiça"

praticidade, engenhosidade, empatia, e uma preocupação com a “adequação”

Quadro 1 - As três culturas do conhecimento (baseada em: Cross, 1982, p. 221-222)

Essa impossibilidade de não conseguir se adequar a disjunção do sujeitoobjeto faz com que o design não se enquadre como conhecimento puramente científico. Tanto que para Pazmino (2010) o design pertenceria ao campo da “arte-científica”, pois deveria conjugar o conhecimento científico ligado aos métodos do projeto ao talento, à habilidade e à intuição do designer. Mas ao contrário de perceber essa característica como uma desvantagem, acredito que está posição intermediária entre arte e ciência pode ajudar em muito na criação desses novos indicadores de inovação suprimindo as necessidades identificadas pelos autores anteriormente citados, já que o designer em sua prática está acostumado a levar em consideração valores antropogenéticos e inovações baseadas na significação. E como Bohr (2008) – uma das figuras centrais da revolução científica deste século que ajudou a criar a teoria quântica – já afirmava em 1954, “o enriquecimento que a arte pode nos trazer origina-se em seu poder de nos relembrar harmonias que ficam fora do alcance da análise sistemática” (Bohr, 2008, p. 101). Enquanto a ciência lida com esforços conjuntos sistemáticos para aumentar a experiência e desenvolver conceitos que segundo o autor se assemelharia a “carregar e encaixar tijolos num edifício” (Bohr, 2008, p.102), a arte se vale de esforços individuais, mais intuitivos, para evocar sentimentos que lembrem a globalidade da situação. Do meu ponto de vista, o transitar entre

23

essas duas culturas de conhecimento faz do designer um profissional que inconscientemente percebe o mundo além da matriz de pensamento cartesiano. “O tipo de pensamento que ocorre no designer é multifacetado e em vários níveis, análise, síntese, criatividade, representações mentais. Sendo o design uma atividade multidisciplinar, existe no designer um modo particular de saber, de pensar e de agir. Para Cross (2004) a habilidade do designer é uma forma autônoma de inteligência” (Pazmino, 2010, p.62). Segundo Cross (2004, in: Pazmino, 2010, p. 64), “o modo concreto/icônico de cognição é peculiar à área do design, enquanto que o modo formal/simbólico é próprio das ciências”. “Em termos de ensino, o desenvolvimento de pensamento construtivo é visto como um aspecto negligenciado do desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Esta negligência pode ser explicada pelo domínio das culturas das ciências e das humanidades, e o domínio das teorias de 'etapas' de desenvolvimento cognitivo. Estas teorias, especialmente as de Piaget, tendem a sugerir que as aptidões de raciocínio concretas, construtivistas, do tipos sintético ocorrer relativamente cedo no desenvolvimento da criança, e que elas evoluem para alcançar um estado mais desenvolvido do raciocínio analítico abstrato (ou seja, o tipo de raciocínio que predominam especialmente nas ciências). Há outras teorias (por exemplo, de Bruner) que sugerem que o desenvolvimento cognitivo é um processo contínuo de interação entre diferentes modos de cognição, e que todos os quais podem ser desenvolvidos a níveis bastante elevados. Isto é, os diferentes tipos qualitativos de cognição (por exemplo, os tipos ‘concreto’ e ‘formais’ pela terminologia de Piaget e ‘icônico’ e ‘simbólico’ pela terminologia de Bruner) não são simplesmente características de diferentes ‘etapas’ de desenvolvimento, mas são tipos diferentes de capacidades cognitivas inatas do ser humano, todas podem ser desenvolvidos dos mais simples até os mais elevados níveis” (Cross, 1982, p. 225, livre tradução). O autor derivou esses conceitos das teorias de Jean Piaget e Jerome Bruner, que buscavam entender a capacidade das pessoas de adquirir, organizar, relembrar e usar os conhecimentos e informações para guiar e orientar

o seu

comportamento,

a

partir da

definição

de

etapas

do

desenvolvimento cognitivo de uma criança. Para os dois autores 

o primeiro estágio iria até os 3 anos de idade e seria pautado pelo desenvolvimento de ações e respostas motoras a realidade;



o segundo estágio iria dos 3 aos 9 anos de idade e nesta fase a criança

desenvolveria

o

pensamento

icônico

através

da

aprendizagem através da percepção e da memória visual concreta e específica; e 

no terceiro estágio, a partir dos 10 anos a criança desenvolveria o pensamento simbólico através da aprendizagem da linguagem

24

simbólica e abstrata, que seria uma forma mais elaborada de representação da realidade. Entendo, porém, que como o designer não representa apenas a realidade vigente de modo visual, mas usa a imagem como uma linguagem, criando relações e símbolos para propor “novas” realidades, o pensamento do designer não seria, como Cross afirma, “concreto/icônico” de um nível mais elevado. Os designers uniriam o “concreto/icônico” com o “formal/simbólico” em um quarto estágio – do mesmo modo que um bailarino ou um coreógrafo uniria o estágio de ações e rações motoras ao “formal/simbólico”. Isso, porém, não invalida a afirmação de Cross (1982), pois o designer continuaria a ter uma inteligência diversa da “cobrada” pela ciência. Para se conseguir, portanto, se criar uma base teórica para se conseguir mensurar a capacidade de inovação do design, como Alanen (2005) defende, é preciso que se consiga entender como a inovação se dá no design, a partir de sua própria perspectiva, ou seja diferente a das ciências e das humanas. Acredito que analisar o que faz um design ser considerado inovador pode também abrir novas fronteiras de conhecimento para a pesquisa sobre inovação, pois: - entender como um designer “inova” em sua prática profissional pode ajudar a um melhor entendimento da inovação cognitiva, já que o designer, segundo Pazmino (2010, p. 64) busca trabalhar com toda a complexidade do processo cognitivo4 humano, que se inter-relacionam com as dimensões afetiva, racional e social que formam os estilos de pensamento; e - com sua tem experiência em trabalhar “inovações” de significação que fazem parte de sua prática projetual, o designer pode ser de grande auxilio na discussão por “novos enquadramentos teóricos e metodológicos para reorientar a percepção dos processos envolvidos nessas atividades, bem como lançar indagações que façam avançar o conhecimento sobre o tema” (CGEE, 2010, p.8). Além disso, como designer atuante, tenho um interesse particular no estudo deste assunto, já que os conhecimentos adquiridos através da pesquisa poderão vir a ser incorporados em minha prática projetual e também poderão me servir de auxilio como proponente de projetos em editais de inovação.

4 Relacionado ao conjunto dos processos mentais no pensamento, na percepção, na classificação, reconhecimento.

25

Portanto, esta pesquisa tem como tema a relação do design – sob sua ótica particular de saber, de pensar e de agir – com a inovação.

1.1

Problema “Confrontados com uma incerteza continua, os gerentes não conseguem definir os problemas nem soluções ideias. O desafio dos gerentes gerais começa a se assemelhar ao do gerente de desenvolvimento de novos produtos. No mundo instável da pesquisa e design, nem o fluxo do processo de desenvolvimento, nem seu estágio final podem ser definidos com precisão. [...] Nada seria fixo desde o início: nem as necessidades do cliente, nem as características do produto, nem mesmo os elementos do sistema de fabricação ou comercialização. Enfim, um novo modelo de fazer negócios” (Nitzsche, 2012, p. 93-94).

Coutinho (in: Martin, 2010) levanta uma questão muito interessante, ao afirmar que nos últimos 20 anos os conceitos de gestão como estratégias competitivas, benchmarking qualidade total, etc. foram amplamente difundidos a ponto dos concorrentes estarem fazendo os mesmos tipos de análises, e com isso chegando a conclusões mais ou menos parecidas, que acabariam igualando as estratégias empregadas. Além disso, com a velocidade da vida moderna, antes mesmo das análises ficarem prontas surgem mudanças tecnológicas, novos concorrentes, mudanças nas políticas públicas, etc. “Por mais que façamos análises, o contexto externo é mais dinâmico do que nossa capacidade de entendê-lo e digeri-lo e como empresa, produzir decisões razoáveis sobre o futuro. Em outras palavras, os moldes tradicionais de gestão que se baseiam em análise talvez estejam rígidos demais para ajudar a compreender e transformar a realidade dos negócios” (Coutinho, in: Martin, 2010). Nesta lacuna, autores ligados ao design encontram uma chance de mostrarem que o design pode ser um instrumento diferenciador frente aos concorrentes, que conecta a empresa aos “seus consumidores de maneira profundamente emocional” (Brunner e Emery, 2010, p. 18). E que, em razão disso, ele deveria ser percebido como parte do processo de inovação, podendo ser usado como uma outra forma de se pensar, criar e forjar relacionamentos com consumidores. Tanto que no início deste milênio, business schools no mundo inteiro começaram a criar cursos para “gerar[em] pensadores originais de negócios e inovadores por meio dos métodos do design” (Nitzsche, 2012, p.81) e essas

26

teorias começaram a ser difundidas para o resto do mundo através “replicadores” (normalmente alunos que voltam a seus países de origem e começam a aplicar e ensinar os ensinamentos adquiridos, como Nitzsche afirma) ou de tradução de livros sobre o assunto. Nesses cursos defende-se a ideia de que esse modo de pensar do designer pode ser ensinado a qualquer pessoa, através de programas que proporcionassem aos gestores das empresas experiência prática dos design thinkers. Tanto que no case de implantação do processo de design thinking na Procter & Gamble – a maior empresa do mundo em bens de consumo não duráveis –, Martin (2010) comenta a pessoa escolhida para implantar o modo de pensar dos designers dentro da empresa, assumindo o cargo de primeiro vicepresidente de estratégia de design e inovação, foi Claudia Kotchka formada não em design, mas em contabilidade e com experiência em funções de marketing dentro da empresa. De um ponto de vista muito simplista, do meu ponto de vista, acredita-se que os conceitos da metodologia de design thinking podem ser ensinados a profissionais de qualquer área de atuação, e como Nitzsche (2012) comenta, até mesmo a designers. Em um curso projetado para equipes de negócio da Procter & Gambler, tentava-se transmitir a experiência do “olhar do designer” em busca da resolução de um problema através do exercício de design thinking frente a problemas reais da empresa. Essa metodologia se baseava em “três componentes essências: (1) conhecimento profundo e holístico do usuário; (2) visualização de novas possibilidades, criação de protótipos e aperfeiçoamento; e (3) criação de um novo sistema de atividade para transformar a ideia proposta em realidade e em uma operação lucrativa” (Martin, 2010, p. 87). Mas a difusão dessa metodologia entre profissionais fora da área do design enfrenta alguma dificuldade, já que, segundo Kimbell (2009), o termo design thinking é confuso e sua literatura contraditória. Em livros, revistas, sites e blogs (por exemplo, Nussbaum 2009; Collopy de 2009; Currie de 2009; Brown 2009) profissionais e consultores em design discutem o que o termo significa, quais seriam os seus processos, etc. Essa diversidade de opiniões sobre o “mesmo” processo acaba transmitindo para os profissionais de outras áreas ligadas a inovação uma sensação de confusão. Como Ling (2013, slide 28) destaca através de depoimento, o aprendizado do design thinking por “não designers” pode se tornar muito frustrante, já que eles se sentem “perdidos” com essas opiniões contraditórias para guiá-los neste “território ainda não desbravado”.

27

“Dada a diversidade das abordagens, ainda não existe uma descrição clara do design thinking. Quais princípios ele se baseia? Quão diferente ele é em relação a outros tipos de conhecimentos profissionais? Será que todos os designers são design thinkers? Quais são os seus efeitos dentro dos mundos onde o design tramita? Como é que ele pode ser ensinado? (Kimbell, 2011, livre tradução). E com o passar dos anos, começou-se a repensar o design thinking em busca de sua nova conceituação. Dissociado de qualquer campo ou disciplina de design, apresentado como um estilo cognitivo isolado e sem história prévia (Kimbell, 2011), é o design thinking começou a ser questionado: "Trabalhando em diferentes contextos e em diferentes velocidades, a partir do ritmo lento da academia para o mundo em movimento rápido de consultoria alguns de seus principais proponentes estão começando a questionar o design thinking, chegando a considerá-lo uma ‘experiência fracassada’ (Nussbaum 2011)” (Kimbell, 2011, livre tradução). Para Norman (2011), Bruce Nussbaum, professor de Inovação e Design na Parsons The New School of Design, baseou a sua afirmação numa crescente frustração com a percepção de como o design thinking acabou se tornando uma ferramenta que está deixando seu elemento essencial – a criatividade – de lado. Segundo Seliger (2013), ao ser perguntado sobre o futuro do design, Nussbaum afirma que “precisamos voltar também ao ‘fazer’. Por cerca de 20 anos as pessoas com design thinking concentram-se em estratégia e em branding, que são muito importantes. Eu queria trazer de volta 'o fazer' [...]” (Nussbaum, in: Seliger, 2013, livre tradução). Ling (2010) concorda com Nussbaum (in: Seliger, 2013) e levanta uma questão ao afirmar que: “’Design thinking’ is not ‘design doing’!” (Ling, 2013, slide 16). E, cita Guersenzvaig e Verganti para fundamentar a sua argumentação: 

Guersenzvaig (in Ling, 2013, slides 53-54) defende a ideia de que não é através de alguns workshops com post-it (imagem icônica do modo de se projetar através do design thinking) que a pessoa irá se transformar em um designer: já que o “design thinking” não pode ser separado do “design doing”. Os designers pensam de um modo muito diverso ao que o design thinking propõe.



Verganti (in: McCullagh, 2010), afirma que “devemos nos lembrar que os designers aprendem fazendo [by doing], não através do aprendizado e da prática de teorias, o design envolve mais conhecimentos tácitos do que qualquer outra disciplina nos negócios” (Verganti, in: Ling, 2013, slide 55, livre tradução).

28

Do meu ponto de vista, a prática do design também engloba muito mais coisas que do que é apresentado pela metodologia do design thinking, e portanto, sua relação com a inovação não pode ser reduzida a uma fórmula prefixada que possa ser reproduzida em qualquer circunstância e ambiente. O design traz em si além deste aspecto ligado à ideia, à concepção, ao projeto – que Cardoso (2005) define como o aspecto abstrato do design – também um aspecto de configuração, de criar algo material, de dar forma ligado ao “design doing” - que Cardoso (2005) define como o aspecto concreto do design. E, como uma área onde a visão holística é muito apregoada, a dissociação do pensamento em relação ao fazer, como o design thinking propõe, me soa no mínimo incoerente. Kimbell (2011), afirma que é preciso que o design thinking seja discutido não somente através de círculos externos ao design, mas que, em um momento onde o design e os designers estão trabalhando sob novos contextos desafiadores, os profissionais de design devam se envolver em discussões sobre o papel do design em relação a inovação. “Design thinking não é o ‘fracasso’ descrito por analistas como Bruce Nussbaum (2011): as práticas dos designers desempenham um papel importante na constituição do mundo contemporâneo, sendo ou não ‘design thinking’ o termo correto para se defini-las. Design thinking, no entanto, permanece pouco teorizado e pouco estudado; na verdade, o repensar crítico do design thinking está apenas começando” (Kimbell, 2011, livre tradução). Concordando com a autora, também acredito que é preciso se aprofundar a pesquisa de como o design se relaciona com a inovação, buscando-se entender não só o aspecto abstrato – como o design thinking apregoa – mas também o aspecto concreto da prática do design em relação à inovação. Pois é no objeto concretizado através de forma, cor, textura, etc. que qualquer significação, como por exemplo a de um produto inovador, será passada ao consumidor. Como Brunner e Emery (2010) afirmam, “o processo que resulta em um bom design – a personificação física do produto e como ele se parece e é sentido pelo consumidor, o que é muito importante para o sucesso – é muitas vezes impulsionado por descobertas felizes e inesperadas, em vez [de por um] entendimento integrado do impacto do design na noção mais ampla de um produto ou negócio. Descobertas ao acaso são boas – depender delas não é bom!” (Brunner e Emery, 2010, p. 18-19).

29

1.2

Questão de norteadora

Em razão do design ser considerado uma atividade “multidisciplinar, criativa, inovadora e provedora de soluções a problemas específicos, [que] assume uma complexidade crescente” (Pazmino, 2010, p. 24), preferi adotar uma questão norteadora em vez de uma hipótese para o desenvolvimento desta tese. Segundo Gil (2006) existem: 

hipóteses casuísticas – muito presentes na pesquisa em história onde os fatos são tidos como “únicos”, no sentido de que não se repetem;



hipóteses que se referem à frequência de acontecimentos – aparecem em pesquisas descritivas sobretudo no âmbito da antropologia, sociologia social, antecipando que determinada característica ocorre, com maior ou menor intensidade, num grupo, sociedade ou cultura; e



hipóteses que estabelecem relação entre variáveis – onde se busca um enunciado conjetural das relações entre duas ou mais variáveis.

Como a relação do design – em seu aspecto abstrato e concreto – com a inovação é bastante complexa, levantar hipóteses casuísticas ou relacionadas a frequência de acontecimentos não ajudariam em um melhor entendimento do tema. Já em relação ao terceiro tipo de hipóteses, em razão do grande número de variáveis seria impossível se buscar por alguma relação causal entre elas, já que a operacionalização de conceitos muito amplos torna-se difícil (Gil, 2006, p.62), e a estratégia sugerida pelo mesmo autor de se dividir uma hipótese ampla em sub-hipóteses mais precisas não conseguiria englobar o entendimento da totalidade do problema. A questão norteadora se adéqua mais a pesquisas onde não é possível se criar uma sentença afirmativa que poderá ser confirmada ou negada, já que ela é uma indagação a ser respondida ao longo da execução da pesquisa, que funciona como um roteiro para a obtenção de respostas à questão ao problema identificado. Como,

porém,

o

design

não

se

enquadra

nas

estruturas

dos

conhecimentos puramente científicos, considerando-se que existe uma tensão “entre os conhecimentos teórico-científicos e a singularidade exigida e defendida pela prática do design” (Pazmino, 2010, p. 67), que transita desde seu surgimento com uma disciplina entre arte e ciência, para aprofundar o

30

entendimento da relação do design com a inovação, esta pesquisa irá buscar responder a seguinte questão norteadora: Para melhor se entender a relação da inovação com o design é necessário se fazer uso de teorias que ampliem os paradigmas da ciência?

1.3

Justificativa

O fato do design envolver uma ampla gama de atividades, segundo Shirley e Henn (1988, in: Walsh, 1995), que do ponto de vista da inovação tecnológica poderiam ser consideradas inovativas e outras “não-inovativas”, pode ter dificultado o reconhecimento de sua importância dentro do processo de inovação. Mas desde a 3ª Edição do Manual de Oslo5 (OCDE – FINEP, 2005) esta divisão perdeu a sua importância, quando o design é caracterizado como “inovações de marketing”. Esse reconhecimento já pode ser considerado um avanço, mesmo que, do meu ponto de vista, o design atua na verdade em todas as quatro categorias de inovação: i. inovação de produtos; ii. inovação de processos; iii. inovação organizacional; e iv. inovação de marketing. Apesar dessa visão “mais abrangente e flexível quanto às definições e metodologias de inovação tecnológica” (ANPEI e MCT, 2009, p. 13), os editais e chamadas públicas de fomento a inovação terminam por contemplar poucos projetos de design. Um dos possíveis motivos para que os projetos de design não sejam tão contemplados, é que em razão das definições que constam nos itens I e II do Art. 2º do decreto 5.798, de 7 de junho de 2006, que regulamenta a Lei 11.196 (conhecida como a Lei do Bem6), segundo a ANPEI e MCT (2009, p. 13), a inovação é definida a partir de recomendações do Manual de Frascatti – ou seja, sob um ponto de vista essencialmente tecnológico –, fazendo com que “apesar da mudança na definição de inovação, a maioria dos órgãos de fomento ainda utiliza a expressão ‘inovação tecnológica’ para designar a inovação em produtos e processos” (ANPEI e MCT, 2009, p. 13).

5

“Criado pela Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), o manual apresenta parâmetros para a coleta de dados sobre inovação e diretrizes para a difícil tarefa de comparar atividades de indústrias de diferentes países” (Brandão et al., 2006, p. 24). 6 A Lei de Inovação - Lei 10.973, de 2 de dezembro de 2004 - e a Lei do Bem proporcionaram um novo ambiente favorável à inovação no País. Surgiram possibilidades antes inexistentes, como a fruição automática dos incentivos fiscais e a subvenção econômica direta às empresas, inclusive para a contratação de profissionais com títulos de Mestre e Doutor (ANPEI e MCT, 2009, p. 9)

31

A importância do apoio e aporte governamental à inovação é comprovada pelos setores de petróleo e o de telecomunicações, onde o investimento público esteve na gênese desse avanço. “As telecomunicações são um exemplo de como o Estado foi importante para a consolidação de uma capacidade inovadora de ponta, que é característica do setor até os dias atuais. Os serviços e pesquisas na área começaram a ser realizado por empresas públicas estaduais e federais, que posteriormente foram reunidas no chamado Sistema Telebrás, criado na década de 70. O petróleo também apresenta um quadro semelhante: a gigante Petrobras é referência mundial no desenvolvimento e na inovação tecnológica, sobretudo na exploração de óleo em águas profundas e nos combustíveis alternativos” (Brandão et al., 2006, p. 27). Alguns poucos editais específicos para o design foram lançados, e mesmo neles não fica claro que parâmetros avaliam o processo inovador do design. Um exemplo disso pode ser percebido no EDITAL FAPEMIG 19/2009 (FAPEMIG, 2009). Este edital tinha como objetivo “financiar projetos de inovação na área de Design, submetidos por empresas mineiras em conjunto com Instituição de Ciência e Tecnologia – ICT ou Instituição Privada de Inovação Tecnológica – IPIT” (FAPEMIG, 2009). Mas no item ANEXO II do mesmo edital, CONCEITOS OBSERVADOS NESTE EDITAL, são definidos, nos itens 2 e 3, os conceitos de inovação e inovação tecnológica, mas não é apresentado nenhum conceito sobre inovação no design, gerando a “suspeita” que a avaliação dos projetos deve ter seguido apenas os parâmetros de inovação tecnológica. “2. Inovação – introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo ou social que resulte em novos produtos, processos ou serviços. 3. Inovação tecnológica - a concepção de novo produto ou processo de fabricação, e a agregação de novas utilidades ou características que resultem em melhoria de qualidade, maior competitividade no mercado e maior produtividade para o bem ou processo tecnológico já existente” (FAPEMIG, 2009). Gostaria de acrescentar que em outubro de 2013, reconhecendo a importância do design no processo de inovação o BNDES criou o Programa BNDES de Apoio a Investimentos em Design, Moda e Fortalecimento de Marcas (BNDES

Prodesign)

para

apoiar

investimentos

em

design,

moda,

desenvolvimento de produtos, diferenciação e fortalecimento de marcas. Entre os itens financiáveis pelo novo programa, como pode ser visto no site do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), estão as despesas relacionadas à pesquisa, desenvolvimento e aperfeiçoamento de produtos, embalagens, desenho industrial e design de moda, associados a ergonomia, concepção, conforto e estilo; aquisição de softwares desenvolvidos no país; despesas com

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treinamento, participação em feiras e eventos, no Brasil ou no exterior, e capacitações gerencial, técnica e de apoio operacional; estudos, consultorias e projetos de certificação e registros no INPI, etc. Mas com o valor mínimo de apoio fixado em R$ 3 milhões, acredito que muito poucos designers empreendedores terão acesso a esse apoio, o que não diminui a sua importância para que grandes empresas comecem a inserir o design em sua cultura empresarial de inovação. E em novembro de 2013, o Governo do Estado do Rio de Janeiro acreditando “que o design está presente no cotidiano de todos nós” (AgeRio, 2013) criou também uma linha de crédito através da Agencia Estadual de Fomento (AgeRio) – a AgeRio Design e Inovação para financiar: i. inovação; ii. capital de giro; iii. máquinas e equipamentos; iv. implantação, modernização ou expansão de unidade industrial; e v. eficiência energética. “O grande destaque da iniciativa, no entanto, será a oferta de financiamento para quem deseja investir no segmento de Inovação, através do programa Inovacred, da Finep, que é voltado para o desenvolvimento de novos produtos, serviços e processos, ou para inovação em modelos de negócio e marketing. Primeira agência do Brasil a repassar os recursos do Inovacred, a AgeRio oferecerá, para esta linha especial, crédito de até R$ 10 milhões, com taxas a partir de 0,41% ao mês, e prazo máximo de carência e amortização de até 96 meses” (Medina, 2013). O Inovacred, porém, em seu formulário de avaliação pede que o proponente “caracteriz[e] a(s) “inovação(ões) de produto(s), processo(s) e/ou serviço(s) no presente projeto”, e que “indi[que] o alcance da(s) inovação(ões) proposta(s): se novo para empresa; para o mercado nacional ou para o mercado global”, etc. (FINEP, 2013), demonstrando a necessidade da área do design se acostumar a jargões tradicionais da inovação para conseguir ter acesso aos recursos que serão disponibilizados pelos órgãos governamentais. Imagino que os designers irão enfrentar também outras dificuldades, pois no modelo de “Formulário de Apresentação de Projetos das Empresas” do Inovacred percebe-se também o peso que fatores quantificáveis e aprovações em editais anteriores exercem na sua avaliação, como por exemplo, informações sobre PD&I da empresa; dados de faturamento da Empresa nos últimos 3 anos; impactos e resultados esperados em vendas, faturamento e custos; histórico da empresa junto a FINEP, ao Agente Financeiro ou outras agências de fomento; etc. Mas o mais emblemático em relação às possíveis dificuldades que um designer poderá vir a enfrentar na apresentação de seu projeto, é que na

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descrição do item financiável “Equipe Própria”, ele não é citado nominalmente, ao contrário do “pessoal de engenharia” ou do “pessoal de fábrica”. “Considerar o pessoal de engenharia e outras áreas de conhecimento envolvidos no desenvolvimento do projeto e do pessoal de fábrica para execução de protótipos/pré-série; considerando o tempo de dedicação correspondente à atividade no projeto” (FINEP, 2013). A partir desses indícios, temo que os designers acabem não conseguindo ter acesso aos recursos públicos disponibilizados, que podem vir a não contemplar inovações relevantes sob uma ótica do design. Mas como exigir de alguém fora da área que consiga avaliar uma inovação sob a ótica do design se ela, como Alanen (20050 afirma não existe uma base teórica óbvia para ela. Acredito, portanto, ser essencial que os designers comecem a “pensar sobre” e “busquem entender” as peculiares da inovação em relação ao design para aproveitarem esse momento de apoio.

1.4

Objetivos A presente pesquisa tem como objetivo geral avaliar relação da inovação

com o aspecto abstrato e o aspecto concreto do design. Já os objetivos específicos são: 

levantar conceitos de inovação vigentes nas áreas ligadas ao modo de geração de conhecimento nas ciências e nas artes;



levantar os conceitos de “inovação” no design;



estabelecer, a partir da união dos mesmos, a relação do design com a inovação;



propor uma diferenciação dos conceitos de “inovação pelo design” para os aspectos abstratos e “design inovador” para os aspectos concretos da prática do design;



apresentar abordagens criativas para servirem de auxilio no processo criação de “design inovador”; e



avaliar a aplicação dessas abordagens criativas na criação e na análise de “design inovador”.

1.5

Metodologia de pesquisa

De cunho transdisciplinar, esta pesquisa é uma pesquisa exploratória, já que segundo Gil (2006, p. 43) esse tipo de pesquisa tem como principal

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finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos. A pesquisa exploratória é realizada especialmente quando o tema escolhido é pouco explorado e tornase difícil sobre ele formular hipóteses precisas e operacionalizáveis. De cunho transdisciplinar, a pesquisa foi nutrida por conceitos de diversas disciplinas para, a partir deles, buscar um novo esclarecimento sobre o tema proposto, já que a finalidade de uma pesquisa transdisciplinar é “a compreensão do mundo presente, impossível de ser inscrita na pesquisa disciplinar” (Nicolescu et al., 2000, p. 17). Coletados através de levantamento bibliográfico e documental de mais de 125 autores eles foram tecidos de forma complexa e multirreferencial, como sugere Morin (2003), através do raciocínio abdutivo – o modo, segundo Martin (2010) dos designers pensarem – que não leva em conta uma causalidade linear e uma unidirecionalidade, mas se permite ‘saltos lógicos da mente’. “O pensamento que une substituirá a causalidade linear e unidirecional por uma causalidade em círculo e multirreferencial; corrigirá a rigidez da lógica clássica pelo diálogo capaz de conceber noções ao mesmo tempo complementares e antagonistas, e completará o conhecimento da integração das partes em um todo, pelo reconhecimento da integração do todo no interior das partes” Morin (2003, p. 92-93). Além disso, será realizada uma pesquisa prática, para avaliar a usabilidade dos conceitos de abordagens criativas sugeridas e sua manipulação através da mandala transrelacional7 elaborada a partir dos conceitos levantados através da pesquisa bibliográfica e documental, que se divide em duas etapas: 

a primeira onde se faz uso da mandala transrelacional para criar uma peça para um concurso de design de joias inovadoras, avaliando empiricamente se ela pode ser usada como um instrumento de auxilio no momento de criação de um objeto que se propõe a apresentar um “design inovador”;



e a segunda, buscando uma validação dessa estrutura da mandala transrelacional, quando as mais de 170 joias finalistas das 6 edições deste mesmo concurso são analisadas para se levantar os tipos mais utilizados e a quantidade de abordagens criativas combinadas por peças que foram consideradas de “design inovador” ao longo de 10 anos de concurso, para se realizar uma

7 Termo cunhado ao longo da pesquisa para demonstrar a possibilidade de relações das diversas abordagens criativas entre si, de um modo que ultrapassa a simples união das diversas abordagens, mas se funde de modo trans-abordagens, ou seja, “entre, através e além” dessas abordagens selecionadas.

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comprovação se elas poderiam ser colocadas dentro das abordagens criativas estruturadas em mandala. O resultado desta análise é demonstrado através de tabelas e quantificado em gráficos. Após esta introdução, a o capítulo seguinte aborda o tema da inovação. Inicia-se essa abordagem com a apresentação dos principais conceitos de inovação sob a ótica das disciplinas mais ligadas ao pensamento científico, ou seja, ligadas à economia, administração e engenharia de produção, que do meu ponto de vista são importantes para se entender o papel do design na inovação e também para aproximar a linguagem do design a de áreas tradicionalmente lidadas aos estudos da inovação. Depois de forma análoga a área do design que atua entre pensamento científico e o pensamento artístico, a inovação será analisada sob a ótica das artes. Pois acredito que o entendimento da importância do conceito de novo nas artes, ajuda na busca por parâmetros sobre inovação que não estejam ligados apenas a valores financeiros e/ou ligados ao sucesso de mercado. Como pontos como a relação da inovação com a invenção e a relação da inovação com a cópia também serão abordados. Finalizando essa abordagem do tema inovação, o terceiro capítulo busca mapear o modo como a inovação é vista pelos autores ligados ao design, abordando a relação entre “estilo” e inovação, o papel do design dentro do processo tradicional de desenvolvimento de inovações – o processo de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) – e a nova proposta de processo de geração de inovações através do design thinking. Destaca-se ainda o novo papel do designer não mais como desenhista industrial ou comunicador visual, ou seja, preso a uma cadeia de processos predeterminada, mas como configurador de objetos, graças às novas tecnologias computacionais. E por fim, o capítulo aborda a questão da diferenciação entre “inovação pelo design” e “design inovador” – ou seja, a relação da inovação com aspecto abstrato e o aspecto concreto do design. O quarto capítulo aborda a questão da teoria da transdisciplinaridade como uma proposta para um novo enquadramento teórico para se entender o design. Além de apresentar os conceitos da teoria da transdisciplinaridade o capítulo demonstra como o design pode ser entendido como uma disciplina onde, mesmo inconscientemente, a transdisciplinaridade é já posta em prática. Depois de ter sugerido uma definição para o termo “design inovador”, o quinto capítulo busca entender como se faz esse “design inovador”. Além de levantar diversas gramáticas visuais, estratégias e princípios de configuração

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conceitual e formal usadas pelos designers para criarem objetos até os dias de hoje, onde não existe mais a pretensão de se encontrar uma única forma correta de fazer as coisas e se convive com um pluralismo – já que sociedade, no ponto meu de vista, em razão da valorização da inovação encontra-se aberta para posturas novas e a tolerância em relação a posições divergentes de cada designer –, apresenta também uma lista vetores ou forças motrizes (driving forces) para a inovação no design. Como a inventividade depende basicamente da intenção em se ser criativo no momento de realizar o respectivo projeto, aborda-se também o pensamento criativo através de conceitos de áreas ligadas à psicologia, ao marketing e também à física quântica. Sugerindo-se, por fim uma proposta que faz uso dos conceitos da transdisciplinaridade como uma ferramenta de ampliação do “repertório criativo” de modo consciente: a mandala transrelacional de abordagens criativas. E demonstra ainda que “criativos” de áreas como a gastronomia já atuam com um pensamento similar de uso de multiplicidade de funções operacionais, psicológicas e/ou afetivas, na da busca da complexidade de experiências no processo de criação. O sexto capítulo analisa a proposta da mandala transrelacional de abordagens criativas apresentada no capítulo anterior, através de seu emprego no momento de criar um projeto de “design inovador” para um concurso de joias internacional (o AuDITIONS Brasil da mineradora internacional Anglogold Ashanti) através da combinação plural e abordagens criativas. E em segundo momento deste capítulo é feita uma análise visual das peças finalistas das seis edições do concurso de design de joias da Anglogold Ashanti – o mais importante concurso de design de joias do Brasil –, sob os parâmetros das abordagens levantadas anteriormente, buscando-se avaliar se é possível usar a mandala transrelacional para mapear as abordagens consideradas mais inovadoras por um segmento específico, que pode auxiliar os designers em projetos futuros. Finalizando a presente pesquisa, no sétimo capítulo são apresentadas algumas considerações finais e apontados possíveis desdobramentos. Em seguida nos anexos, estão documentadas as mais de 170 peças finalistas das seis edições do concurso AuDITIONS Brasil, as inspirações apresentadas pelos designers e as respectivas abordagens identificadas por mim para a criação dos mapas de abordagens.

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2 Inovação – sob a ótica da ciência e da arte

“A inovação tornou-se a ‘religião’ industrial no final do século XX. O mundo empresarial a vê como a chave para lucros e fatias de mercado crescentes. Os governos automaticamente a buscam quando tentam por ordem na economia (Mattos e Guimarães, 2005, p. 7). As inovações, além de acrescentarem valor a produtos, geram emprego e renda, aumentam os lucros, dão acesso a novos mercados, fortalecem marcas, etc. (Brandão, 2006, p. 15). Os seus benefícios não se restringem apenas ao ambiente corporativo, já que a exportação de produtos inovadores rende muito mais divisas do que a de commodities agrícolas ou minerais, e assim ajudam a impulsionar o desenvolvimento econômico de regiões e países. Também no Brasil existe uma “grande preocupação do governo com a inovação e a competitividade tecnológica das empresas” (ANPEI e MCT, 2009, p.9). Buscando criar um ambiente favorável à inovação no país, que atenue os riscos inerentes ao processo, foram criados segundo o mesmo autor, além do Programa Nacional de Sensibilização e Mobilização para Inovação - PróInova/MCT, leis como a Lei de Inovação e a Lei do Bem que permitem a disponibilização de incentivos fiscais e subvenções econômicas às empresas inovadoras e fomenta a parceria entre universidades e empresas para a pesquisa e desenvolvimento de inovações. Como foi comentado anteriormente, o design começa a ter a sua importância reconhecida pelo governo. E isso se refletiu na criação, a partir do ano de 2013, de programas de apoio específicos ao setor, como por exemplo o Programa BNDES de Apoio a Investimentos em Design, Moda e Fortalecimento de Marcas (BNDES Prodesign) ou a criação de linhas de crédito através de agências de fomento estaduais, como por exemplo, a AgeRio Design e Inovação. Mas para que os designers consigam ter acesso a esses incentivos, acredito que a área deva se familiarizar com alguns conceitos amplamente difundidos sobre inovação, que não costumam fazer parte da formação regular destes profissionais. Por isso, este capítulo busca trazer os conceitos de inovação de outras áreas para a partir deles – no capítulo seguinte – discutir e entender tanto o

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papel do design na inovação quanto as peculiaridades da inovação em relação ao design. Como o design por definição é considerado “um conjunto organizado de conhecimentos que utiliza metodicamente postulados da Estética e achados da Ciência” (Couto, 1996) os conceitos que serão apresentados não se restringem apenas aos ligados à economia, administração e engenharia de produção, mas também aqueles ligados às artes.

2.1

Inovar e inventar "A palavra ‘inovar’ deriva do latim in+novare, que significa “fazer novo” renovar ou alterar. De forma simples, inovação significa ter uma nova ideia ou, por vezes aplicar as ideias de outras pessoas em novidades ou de uma forma nova” (Sarkar, 2008, p.115). Segundo o dicionário Ferreira (2004, p. 480), “inovar” significa renovar,

introduzir novidade. Ou seja, introduzir algo que é novo, que tem pouco tempo de existência, que é visto pela primeira vez, que acaba de ser feito ou adquirido, algo original. Como é algo ligado a mudança e a criatividade, comumente o termo inovação, no uso coloquial da linguagem, acaba se tornando quase que um sinônimo do termo invenção. Mas segundo o mesmo autor (2004, p. 489) “invenção” é o ato ou efeito de inventar, que entre outras coisas significa ser o primeiro a ter a ideia, criar na imaginação, imaginar ou descobrir através do pensamento. Inventar deriva do latim “inventio”, “invenire” e significa encontrar, descobrir; imaginar, saber, achar. Estes dois conceitos podem ser aplicados a qualquer atividade do ser humano. Sarkar (2008, p. 116) chega a afirmar que “inovação é aquilo que de novo fazemos todos os dias em nosso cotidiano e cujo resultado geralmente é desejado. De certa forma, todos nós somos inovadores!” E Dietrich (2009) acrescentaria, que a "inovação tem sido parte do nosso mundo desde de que os seres humanos tiveram problemas para resolver, comunidades para organizar, ferramentas para tornar o trabalho mais eficiente e ideias para dar a outros. É claro, que a nomeação desse impulso de repensar ou melhorar as coisas em nossas vidas veio apenas mais tarde" (Dietrich, 2009, p. 10, livre tradução). O mesmo autor lembra que em nossa atual sociedade o termo inovação está associado a progresso, mas nem sempre foi assim. A palavra derivada do termo em latim inovare, foi incorporada a língua inglesa e francesa no século

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XVI. Ela não remetia à ideia de “criação”, mas sim a de “renovação da tradição existente” ou “modo de se fazer algo”. O termo era associado à política e à religião e tinha um cunho negativo, quase herege, já que o novo – que não vinha de Deus, mas sim do homem – era algo a que se deveria resistir, ou até mesmo temer. "Antes do advento da Era Moderna, existiram pensadores originais e criadores que mudaram o curso da história – [...] Leonardo da Vinci, Copérnico, Gutenberg, Galileu, para citar apenas alguns – mas os inovadores autênticos frequentemente entravam em choque com o conservadorismo arraigado de autoridades religiosas e políticas. Foi somente no final dos anos de 1700, com a chegada da Idade da Razão, que a ideia de inovação per se, finalmente, começou a se livrar de uma aura pejorativa em um mundo que estava aprendendo a saudar a reavaliação, a reinvenção e a renovação” (Dietrich, 2009, p. 11, livre tradução). O conceito de inovação, utilizado até os dias de hoje, segundo Sarkar (2008, p. 122), começou a ser difundido após a Segunda Guerra Mundial, com a retomada dos estudos do economista austríaco Joseph Schumpeter publicados em 1912 em seu livro “Teoria do Desenvolvimento Econômico”. Nele o autor defendia que “a inovação cria uma ruptura no sistema econômico, no interior das indústrias, revolucionando as estruturas produtivas e criando fontes de diferenciação para as empresas” (Kupfer e Hasenclever, 2002, p.129). E, como para se criar essa ruptura no sistema econômico é preciso que a invenção seja levada para o mercado, começou-se a diferenciar invenção e inovação, fazendo com que esses termos deixassem de serem considerados sinônimos. “O processo de invenção está relacionado com a criação de coisas não existentes anteriormente e utiliza como principais fontes conhecimentos novos ou conhecimentos já existentes em novas combinações. O resultado desse processo pode ser patenteado [...]. No entanto, nem todas as invenções ou mesmo patentes chegam a se transformar em inovações, isto é, serem lançados no mercado com sucesso comercial” (Kupfer e Hasenclever, 2002, p.131). Schumpeter (1942) acreditava que o “empresário inovador teria um papel diferente do capitalista que apenas busca a renda fiduciária. Ao dinamizar a economia por meio da inovação, o empreendedor obedece a um papel positivo para o crescimento” (Tigre, 2006, p. 44). Através da “destruição criadora” o empresário inovador criaria uma nova dinâmica no mercado atribuindo a ele a função de “reformar ou revolucionar o padrão de produção, explorando uma invenção ou, geralmente uma possibilidade tecnológica ainda não experimentada

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para a produção de um novo bem ou para a produção de um bem antigo de uma nova forma [...]” (Schumpeter, 1942, in: Sarkar, 2008, p.20). Mesmo que o autor austríaco tenha cunhado e introduzido na economia o termo “destruição criadora”, acho importante ressaltar que, pelo meu ponto de vista, sua prática já vinha acontecendo nas artes há muito tempo, mais especificamente desde o final do século XIX, com o surgimento do modernismo através da valorização da experimentação e de uma busca por novas linguagens conceituais, escritas, musicais ou visuais. O conceito de arte desde o surgimento do modernismo ficou associado a questão do novo, que segundo Gullar (2006, p.12) “não pode ser separada da própria criação artística, uma vez que nenhum artista se dispõe a pintar um quadro [escrever um poema, compor uma música, etc.] se ele nada contém de novo”. Com os movimentos de vanguarda, isso só aumentou e “a sede de criar, de experimentar de destruir tudo o que ficou para trás, [se tornou] uma marca do desassossego e da inquietação da civilização moderna, cheia de ideias contraditórias” (Andrés, 1966, p. 50). Como na arte a produção individual tem uma grande importância na geração do “novo”, e segundo Gombrich (1999, p. 617) a ambição dos artistas de se superarem uns aos outros é, pelo menos no ocidente, o principal responsável pela introdução de mudanças, o termo inovação não costuma ser usado nesta área de conhecimento, já que de certa maneira ele ficou muito ligado a ideia de lucro, de sucesso comercial, etc. Mas Zolberg (2006) nos lembra que esse discurso parte de uma visão muito ligada ao romantismo, que acaba em uma mitificação característica do mundo das artes. No seu ponto de vista, os novos estilos nas artes não estariam ligados apenas à criação individual, e podem ser melhor compreendidos como “parte de um processo social em que redes de artistas e outros participantes se tornam estabelecidos dentro de um contexto socioeconômico mais amplo e orientado por tendências políticas” (Zolberg, 2006, p.105). Um discurso não nega o outro, eles se complementam: o discurso romântico, valorizando a busca individual do artista mostra o lado da busca do indivíduo pelo novo – a fase de criação da inovação –, enquanto o discurso sócio antropológico se detém mais sobre a aceitação e a difusão deste novo por toda a “cadeia produtiva” das artes, que incluiriam críticos, marchands, museus, etc. Neste processo, o “novo na arte” não estaria apenas ligado a criação de algo original – que poder-se-ia comparar ao ato de inventar –, mas também a

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necessidade de que essa originalidade fosse reconhecida e valorizada pela sociedade em que o artista se insere – que se assemelharia muito ao conceito de aceitação pelo mercado que define o termo inovação. A busca do indivíduo pelo novo nas artes, muitas vezes vai contra os contextos sociopolítico e econômico vigentes. Como Goswami (2012), tão bem destaca, a “condição de estar à frente de seu tempo é o motivo pelo qual encontramos muitos casos de criatividade ignorados pelos contemporâneos de um artista (e Van Gogh aparece aqui como exemplo trágico). Uma vez que o paradigma propriamente dito ainda não se encontra claramente manifesto, as pessoas não conseguem reconhecer o novo contexto sociocultural para julgar uma obra que já se encontra nele. Mas o artista que ouviu o canto da sereia da criatividade tem de assumir o risco que seus contemporâneas não podem compreender” (Goswami, 2012, p. 225). Este risco que o artista assume se assemelha ao risco que uma empresa corre ao lançar produtos inovadores no mercado, mostrando as semelhanças do processo de se criar algo novo, seja no âmbito individual ou no âmbito empresarial. E pode indicar também que exista uma similitude no processo de aceitação e valorização financeira ou conceitualmente de algo novo pela sociedade. A ótica da ciência e a ótica da arte não são antagônicas, elas ampliam e complementam a visão sobre o tema da inovação.

2.2

Inovação na ciência – criação de teorias e conceitos Como foi visto anteriormente, invenção e inovação não são a mesma

coisa. Invenção é anterior à inovação, e elas fazendo parte do ciclo de inovação, que segundo Kupfer e Hasenclever (2002) se divide em três estágios: invenção, inovação e imitação ou difusão. É importante ressaltar que a introdução de uma inovação pode se iniciar através do processo de invenção dando origem ao que se denomina inovação radical, ou pode se iniciar através do processo de imitação, baseando-se em melhorias do produto que é denominada inovação incremental. Antes de continuar, porém, gostaria de observar que durante muitos anos este conceito clássico de Schumpeter de invenção, inovação e difusão era ligado apenas as inovações tecnológicas. Percebia-se a inovação como algo que tinha origem, sobretudo, em descobertas que se originavam na ciência, resultantes das atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) e que posteriormente eram

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adaptadas ao uso comercial. Em razão disso em muitas das teorias e conceitos apresentados a seguir fala-se apenas em inovações tecnológicas, mas isso não quer dizer que eles não se aplicam também as inovações de produtos, processo ou serviços. Continuando, segundo Delaunay-Maculan (2002) as inovações radicais – que seriam as mais intensas – ocorrem no momento em que uma nova tecnologia está emergindo. Tradicionalmente considera-se que as inovações radicais ou de ruptura resultam de grandes projetos de P&D e favorecem a criação de novas empresas que vão se encarregar de difundir um novo paradigma tecnológico. Mas acho importante ressaltar que, do meu ponto de vista, as inovações radicais ou de ruptura não resultam apenas de grandes projetos de P&D, o design pode ser parte importante nesse processo também, como será aprofundado em um capítulo mais adiante. Continuando a usar a definição da mesma autora, as inovações incrementais ocorrem quando a base de tecnologia é madura. Na fase de tecnologia madura, as inovações aparecem como sendo peças naturais da competição. Quanto mais madura a tecnologia, mais as inovações parecem ser fenômenos “normais” tendo por objetivo diferenciar produtos e serviços já conhecidos ou melhorar a eficiência da produção e a qualidade dos produtos. Muitas inovações são os resultados de melhorias incrementais nos processos de fabricação que se acumulam ao longo do tempo e podem se transformar em mudanças tecnológicas profundas. Tradicionalmente o design é classificado como uma das possibilidades de se diferenciar o produto, principalmente em razão das variações “estilísticas” que o designer pode realizar, como por exemplo nas pequenas variações nos chassis de automóveis com mudanças em lanternas mais ou menos redondas, para choques mais finos ou mais largos, etc. E com isso, durante muitos anos, o design era percebido como um instrumento para se gerar apenas inovações incrementais nos produtos. Qualquer tecnologia sofre inovações radicais e inovações incrementais. Sua evolução foi exemplificada através de modelo chamado de “modelo de difusão tecnológica com uma curva em S” (Tigre, 2006), no Quadro 2. Dividido em quatro fases – introdução, crescimento, maturação e declínio – a curva se inicia com um pequeno número de empresas na introdução de uma inovação radical [1]; a medida que o inovador pioneiro tem sucesso o número de empresas que realizam pequenas inovações incrementais nesta tecnologia inicial aumenta [2]; vem então uma fase de estabilização dos processos produtivos mais padronizados [3]; e, por fim, com a diminuição das vendas, as

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empresas que fazem uso dessa tecnologia em razão do surgimento de outras inovações vão diminuindo [4].

Quadro 2 - Modelo de difusão tecnológica (Tigre, 2006, p. 80)

Tidd, Bessant e Pavitt (1997), apresentam uma complementação deste conceito, mostrando que durante o ciclo de vida da inovação não só ocorre uma mudança na sua intensidade, com também no tipo de inovação que é realizada: “Estágios diferentes no ciclo de vida enfatizam diferentes características de inovação, por exemplo, as primeiras fases podem ser caracterizadas pela produção rápida e frequente de inovações, com uma grande proliferação de variedades. Estágios mais avançados podem ser caracterizados por uma relativa estabilidade no conceito de produto, onde acontecem apenas inovações incrementais, e há uma maior ênfase na inovação de processos, ligadas a redução de custos” (Tidd, Bessant e Pavitt, 1997, p. 8, livre tradução). Como os mesmos autores ainda apresentam, a inovação pode ser classificada tomando-se como base as vantagens estratégicas que cada uma delas oferece:     

“Novidade – oferece algo que ninguém mais consegue oferecer Transferência de competência – reescreve as regras do jogo competitivo Complexidade – a dificuldade de se aprender a respeito da tecnologia mantém altas as barreiras de proteção Design “resistente” – o modelo básico do produto ou do processo pode ser prolongado a uma sobrevida, reduzindo o custo total Inovações incrementais contínuas – movimentos contínuos das fronteiras de custo/performance” (Tidd, Bessant e Pavitt, 1997, p. 6, tradução livre).

E em Albernathy and Clark (1988, in: Mozota, 2011) ainda se pode ver um outro tipo de classificação da inovação através do posicionamento que ela coloca a empresa inovadora em relação a seus concorrentes no mercado:

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   

“A inovação estrutural cria novas relações de mercado, mas exige novo conhecimento. Sendo frequentemente a consequência de uma ruptura tecnológica, é a melhor barreira contra imitação. A inovação revolucionária reforça os elos entre a empresa e seus mercados oferecendo novas soluções tecnológicas para satisfazer às necessidades existentes. A inovação orientada a um nicho baseia-se nas tecnologias existentes, mas cria novas relações de mercado. A inovação de rotina é a forma mais comum de inovação e melhora o desempenho de produtos existentes” (Albernathy and Clark, 1988, in Mozota, 2011, p. 159).

Christensen (1997, in: Sarkar, 2008, p.167) apresenta ainda outra classificação de inovação de produto – onde o sucesso da inovação não é o principal fator a ser levado em conta, mas sim as novas possibilidades como, por exemplo, expansão de novos mercados ou mudança dos valores de negócio que elas poderiam abrir:



Inovação sustentável: são as inovações que contribuem para a melhoria de performance em produtos existentes, fortalecendo o posicionamento da empresa no mercado. Assemelha-se a inovação incremental.



Inovação disruptiva: são inovações onde os produtos inovadores podem ser piores que os do concorrente na avaliação dos consumidores atuais, mas ao serem introduzidas no mercado criam um novo conjunto de atributos que permitem ao produto ser usado de uma maneira diferente dos que existiam antes, vindo a gerar uma mudança do posicionamento das empresas em relação a sua liderança no mercado no futuro.

Cada um dos tipos de inovação acima citados, está relacionado a diferentes estratégias competitivas de uma empresa. O modelo de classificação das estratégias competitivas ligadas a inovação de Freeman (1997, in: Tigre, 2006) é um dos mais difundidos: a. Estratégia ofensiva: adotada pelas empresas que buscam liderança tecnológica. O inovador corre grandes riscos ao introduzir no mercado uma ideia ainda não testada, e deve estar preparado para investimentos a longo prazo. Essa estratégia

não

envolve

apenas

P&D,

mas

também

propaganda, marketing, logística e criação de novas rotinas organizacionais. b. Estratégia defensiva: a empresa que adota essa estratégia não quer correr o risco de ser a primeira a inovar, mas

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também não quer ser deixada para trás em termos tecnológicos. Ela busca aprender com os erros dos pioneiros e aproveitar a abertura de novos mercados; e não se restringe a apenas copiar os inovadores, mas deseja superá-los aprimorando a nova tecnologia. c. Estratégia imitativa: a empresa que adota esta estratégia não aspira ser líder ou ter grandes lucros, ela pretende apenas marcar sua presença no mercado, oferecendo um produto semelhante ao existente. É uma estratégia que pode ser sustentada quando a empresa detém acesso privilegiado a determinados mercados em função da localização ou inserção em comunidades específicas. d. Estratégia dependente: as empresas que adotam essa estratégia assumem um papel subordinado em relação às outras empresas mais fortes. Elas só tomam a iniciativa de promover mudanças em seus produtos e processos por demanda explícita de seus clientes ou controladores, e dependem de outras empresas para obter as instruções técnicas necessárias para inovar. e. Estratégia tradicional: essas empresas praticamente não mudam os seus produtos, seja porque o mercado não demanda mudanças ou porque a concorrência também não inova. Elas geralmente não contam com capacidade técnica para inovações radicais, mas pode desenvolver mudanças incrementais e fazer pequenas alterações no design do produto. f.

Estratégia oportunista: esta estratégia está associada à exploração de nichos de mercado ou oportunidades temporárias. Ingredientes mais importantes do que a capacitação técnica são a imaginação e o conhecimento dos consumidores. Ela deve ser adotada quando se abre uma janela de oportunidade, já que chegar rapidamente ao mercado é essencial nessa estratégia.

Indo contra o senso comum, inovação não é necessariamente apenas a criação de produtos que não existiam anteriormente no mercado. Como Tidd, Bessant e Pavitt (1997, p. 5, livre tradução) comentam, "apesar de novos

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produtos serem vistos pelo mercado muitas vezes como a ponta da inovação, inovações no processo podem ser igualmente importantes na estratégia da empresa". Todos os autores dividem a inovação basicamente em inovação de produto e inovação de processo. Alguns ampliam essa classificação, como por exemplo, a classificação apresentada no Manual de Oslo (OCDE – FINEP, 2005, p. 57-63) – que serve como parâmetro para mensuração e avaliação das atividades inovadoras em diversos países do mundo –, onde a inovação pode se dar de quatro maneiras diferentes dentro de uma empresa: 

Inovações de produto: envolvem mudanças significativas nas potencialidades de produtos e serviços. Incluem-se bens e serviços totalmente novos e aperfeiçoamentos importantes para produtos existentes;



Inovações de processo: representam mudanças significativas nos métodos de produção e de distribuição;



Inovações organizacionais: referem-se à implementação de novos métodos organizacionais, tais como mudanças em práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas da empresa;



Inovações de marketing: envolvem a implementação de novos métodos de marketing, incluindo mudanças no design do produto e na embalagem, na promoção do produto e sua colocação, e em métodos de estabelecimento de preços de bens e de serviços.

Ainda é necessário se esclarecer, que o grau de novidade e de difusão de todas essas inovações podem se dar em três âmbitos diferentes: “nova para a empresa”, “nova para o mercado” e “nova para o mundo” (OCDE – FINEP, 2005, p.69). Outro conceito que considero importante quando se busca entender a inovação, é que a sua “intensidade” também pode variar de empresa para empresa, dependendo da estratégia de posicionamento adotada. Apesar de existirem diversas abordagens na hora de classificar os tipos de inovação, todos os autores concordam que o seu sucesso depende do modo como ela é gerida. E ao longo dos anos os estudiosos vêm criando novas propostas de modelos de gestão do processo de inovação, buscando uma melhor adaptação às respectivas circunstâncias econômicas, sociais, ambientais e teóricas de cada situação enfrentada. Principalmente a partir dos anos 90,

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“uma novidade leva a outra, que leva a outra, gerando uma espécie de espiral da inovação” (Abdallah, 2012, p. 24), como pode ser visto na linha do tempo da inovação na Figura 1.

Figura 1 - Linha do tempo da Inovação (Abdallah, 2012, p. 24)

A evolução desses modelos de gestão da inovação mostra que o processo de inovação sofreu diversas transformações ao longo dos anos. Mas todos eles se atem a um mercado já existente. Por isso, eu gostaria de dar um destaque a proposta de inovação que se propõe a criar novos mercados, e não buscar apenas uma maior fatia do mercado existente: a inovação de valor.

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“A aceleração dos avanços tecnológicos gerou aumentos substanciais na produtividade dos setores e criou condições para o fornecimento de um nível sem precedentes de produtos e serviços. O resultado é que em cada vez mais setores a oferta é maior que a demanda. [...] Os resultados tem sido a comoditização acelerada de produtos e serviços, a intensificação das guerras de preço e o encolhimento das margens de lucro” (Kim e Mauborgne, 2005, p. 8). A alternativa para essa situação, segundo os mesmos autores, não seria a busca da inovação apenas para superar as empresas rivais e abocanhar uma maior fatia da demanda existente do mercado, mas sim de se inovar procurando espaços de mercados ainda inexplorados, através da criação de novas demandas. A criação de novo mercado, denominado pelos autores como Oceano Azul, não se daria através das estratégias habituais de análise da estrutura econômica básica do setor, de escolha de uma posição estratégica de baixo custo, de criação de diferenciação ou busca de um novo foco, nem tampouco de comparar-se de maneira continua e sistemática com as concorrentes (benchmarking), todas consideradas como estratégias do Oceano Vermelho. Ela se dá através da mudança da visão estratégica, que se concentra na oferta e na demanda atual, para uma visão estratégica preocupada em transformar a demanda potencial em demanda real, buscando novos valores que atraiam esses consumidores potenciais (Quadro 3).

Estratégia do Oceano Vermelho

Estratégia do Oceano Azul

Competir nos espaços de mercado existentes

Criar espaços de mercado inexplorados

Vencer os concorrentes

Tornar a concorrência irrelevante

Aproveitar a demanda existente

Criar e capturar a nova demanda

Exercer o trade-off valor-custo

Romper o trade-off valor-custo

Alinhar todo o sistema de atividades da empresa com sua escolha estratégica de diferenciação ou baixo custo

Alinhar todo o sistema de atividades da empresa em busca da diferenciação e baixo custo

Quadro 3 - Estratégia do Oceano Vermelho versus Estratégia do Oceano Azul (Kim e Mauborgne, 2005, p. 17) A busca por esses novos valores, foi denominada por Kim e Mauborgne (2005) de inovação de valor. “Inovação de valor atribui a mesma ênfase ao valor e a inovação. Valor sem inovação tende a concentrar-se na criação de valor em escala incremental, algo que aumenta o valor, mas não é suficiente para sobressair-se no mercado. Inovação sem valor tende a ser movida a tecnologia, promovendo pioneirismos ou futurismos que talvez se situem

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além do que os compradores estejam dispostos a aceitar e comprar” (Kim e Mauborgne, 2005, p. 12). Para se chegar a esses novos valores, os autores sugerem que em vez de se tentar satisfazer as preferências dos clientes, as empresas deveriam focar a sua atenção nos não-clientes. Aprofundar os conhecimentos de seus universos e concentrar-se nos principais pontos em comum entre esses não-clientes e os clientes, seria a estratégia proposta pelos autores para que a empresa, através de insights, possa entender o que deve ser enfatizado, eliminado, criado ou mudado no seu atual produto, seguindo o modelo de atuação das quatro ações (Quadro 4) para a elaboração de uma nova curva de valor. E é a partir dessa nova curva de valor que seriam traçadas as estratégias necessárias para a criação de um novo produto ou serviço que reconstruam as fronteiras do mercado, indo além da demanda existente.

Quadro 4 - Modelo das quatro ações (Kim e Mauborgne, 2005, p. 17)

Outro ponto de deve ser ressaltado é que a aceitação de uma inovação pelos consumidores é um processo mais complexo do que seu simples lançamento no mercado. Muitas vezes relegado ao esquecimento nos estudos de inovação, por se acreditar que a difusão se dê de maneira “natural”, a difusão de um produto ou serviço inovador pelos consumidores, depende de não só do

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produto, do tipo de inovação radical ou incremental, a gestão e das estratégias da empresa, mas também das características do público alvo. Alguns autores como Sarkar (2008), as origens do estudo de difusão da inovação remontam ao jurista francês Gabriel Tarde que em 1904 escreveu o livro Les Lois de l’Imitation. [...] pode-se perceber como em toda sociedade temos grupos ou indivíduos mais afeitos a processos de inovação e outros, à imitação, relativamente a diferentes campos (se mesmo um indivíduo é um entrecruzamento de séries, não há unidade individual, o que permite que seja possível ao ser social ser inovador em um campo e conservador em outro). Isso autoriza pensar a alternância cíclica de sociedades mais propensas à imitação do antigo e de sociedades mais afeitas à imitação do novo, imitação de costume e imitação de moda, respectivamente, sem que essa propensão seja de modo algum absoluta” (Tarde, 1999, in: Gonçalves e Clair, 2007 p. 144). Rogers (1995) deu continuidade a este conceito, formalizando uma teoria de difusão de inovação. Segundo o mesmo autor, as pessoas não adotam uma inovação todas ao mesmo tempo. A adoção de novas ideias é resultado da troca de informações entre os indivíduos de um grupo, como se eles aprendessem uns com os outros as vantagens e desvantagens tanto funcionais quanto emocionais de uma inovação. Esse “aprendizado”, tanto no caso de organizações quanto de indivíduos, depende do seu grau de resistência a uma nova ideia. Sua adoção depende do grau de inovatividade do indivíduo, ou seja, do seu grau de percepção de inovação e de adoção desta inovação. Rogers (1995) caracterizou os adotantes de uma inovação em cinco perfis diferentes: 

Inovadores – o aventureiro: são os primeiros indivíduos a adotarem a tecnologia. São pessoas cosmopolitas interessadas em novas ideias; detêm reserva financeira que permite a eles correrem os riscos de inovarem; têm habilidade de entender e usar tecnologias complexas; fazem o papel de gateway de uma inovação dentro de um sistema social.



Adotantes iniciais - o respeitado: estão mais integrados no sistema social local que os anteriores; são os formadores de opinião do sistema e as referências para as categorias posteriores de adoção da inovação; diminuem o risco da inovação difundindo-a entre seu grupo através de sua “chancela”.



Maioria inicial – o deliberador: é uma das maiores categorias, interligando os mais “abertos” a inovação aos mais conservadores;

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eles deliberam por mais tempo antes de adotar uma inovação; são seguidores raramente líderes. 

Maioria tardia – o cético: eles adotam uma inovação assim que a média da população do sistema social a adota; como a categoria anterior eles somam 1/3 do sistema; só adotam a inovação quando ela se torna uma necessidade econômica e não se pode mais fugir a pressão de sua adoção; como não há recursos financeiros excedentes, as incertezas em relação à inovação devem ser totalmente extirpadas para que a assumam sem correr nenhum risco.



Retardatários – o tradicional: são os últimos a aderirem as inovações; a sua maioria encontrasse isolada dentro do sistema social; seu ponto de referência é o passado; demoram a tomar a decisão já que possuem aversão a mudanças e inovações; a sua situação econômica a força a ser extremamente cuidadoso em relação a adoção de uma inovação.

Segundo o modelo de dimensão da inovatividade do mesmo autor apresentado no Quadro 5, muito usado para apoiar o desenvolvimento de estratégias de marketing na prospecção de clientes para novos produtos pela a facilidade de seu uso e de previsibilidade da evolução da adoção de uma inovação, a difusão de uma inovação segue uma curva de desenvolvimento.

Quadro 5 - Modelo de Dimensão da Inovatividade (Rogers, 1995, p. 281, livre tradução) Rogers (1995) também

identificou quais são os fatores ou as

características mais importantes para se tentar encontrar uma explicação da taxa de adoção de uma inovação, ou seja, da velocidade relativa com que uma

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inovação é adotada por membros de um sistema social. Elas podem ser divididas em cinco atributos percebidos de inovação: 

Vantagem relativa: o grau com que uma inovação é percebida como melhor que a ideia que foi suplantada, que pode ser medido em termos econômicos, prestígio social, conveniência e satisfação;



Compatibilidade: o grau com que uma inovação é percebida como sendo consistente com os valores existentes, experiências passadas e necessidades dos adotantes potenciais;



Complexidade: o grau com que uma inovação é percebida como difícil de ser entendida e usada;



Possibilidade de ser experimentada: o grau com que uma inovação pode ser experimentada dentro de uma forma limitada;



Visibilidade: o grau com que os resultados de uma inovação são visíveis a outros.

Acredito que os dois primeiros atributos estariam mais ligados às emoções do consumidor em relação ao produto inovador e como ele se reflete sobre a sua autoimagem, enquanto os três últimos estariam mais ligados a interação do consumidor com o produto inovador em si. Segundo Tarde (1994, in: Katz, 1999, p. 148, livre tradução) “a invenção e a imitação são a chave para mudanças sociais”. Por isso, gostaria de dar um destaque à questão da relação da inovação com a cópia em um subcapítulo em separado, antes de tentar entender como o novo é percebido na arte.

2.3

A relação da inovação com a cópia “[...] a cópia ao longo da história do percurso do homem, serve de apoio para o aprendizado (FERNANDES, 2012; RUGIU, 2008; WARNICK, 2008), aquisição de conhecimento (KIM, 2005; MURRAY, 2011), e esteve em prol do aperfeiçoamento da ideia, fazendo parte do processo criativo (MURRAY, 2011)” (Souza, Kistmann e Siebenrok, 2012). Entre a cópia e a inovação existe uma relação intrincada, já que o retorno

de todo o investimento realizado para a colocação e difusão de um produto ou serviço inovador no mercado, depende do tempo que outros concorrentes levaram para conseguirem oferecer um produto igual ou similar a preços mais atraentes: “uma tecnologia facilmente imitável leva os rendimentos monopolistas de uma inovação a quase zero” (Tigre, 2006, p.112).

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Como pode ser visto no subcapitulo anterior, o ‘novo’ demora um tempo para ser aceito entre a população, vencendo a resistência a uma nova ideia. Por isso é importante garantir, ou mesmo defender, o maior tempo possível as vantagens adquiridas através da inserção no mercado de um produto inovador, já que o “valor de uma determinada tecnologia [inovação] depende da condição de apropriabilidade, ou seja da possibilidade de o inventor ou inovador manter o controle monopolista sobre a tecnologia em um determinado período de tempo” (Tigre, 2006, p.112). Segundo Sarkar (2008, p. 119), “estudos efetuados demonstram que os pioneiros apresentam, como seria de se esperar, maiores taxas de insucesso. Em estudo efetuado por Gerard Tellis, citado por Frankiln em (2003), a taxa de insucesso dos pioneiros é de 47%! Ou seja, aproximadamente uma em cada duas iniciativas inovadoras de pioneirismo falha. [...] Assim, esse estudo conclui que a teoria do first mover advantage é um mito, pois ser o primeiro a chegar ao mercado pode constituir mais uma oportunidade do que uma vantagem real”. Muitas vezes considerada inimiga da inovação, pode-se ver que a cópia, se olhada com mais cuidado, apresenta um outro lado além dessa posição antagônica. Por exemplo, a Basf – uma das maiores indústrias químicas do planeta – em uma iniciativa chamada Copy with Pride, “não só não vê mal algum em copiar, como estimula seus funcionários a replicar em seus departamentos inovações feitas por outros colegas” (Salgado, 2012, p. 63). Usando essa iniciativa para tornar o processo de inovação mais eficiente, é necessário que a inovação copiada seja melhorada ou adaptada tanto a um novo problema quanto a sua realidade – o que no caso de uma empresa mundial pode ser entendido como realidade e contextos locais. Adotando-se uma postura crítica em relação a diversos termos apresentados anteriormente, pode-se perceber que a cópia está de alguma maneira implícita nos conceitos de inovação apresentados anteriormente, como por exemplo: 



no grau de inovação “nova para a empresa” apresentado no Manual de Oslo (OCDE – FINEP, 2005, p.69): “o requisito mínimo para se considerar uma inovação é que a mudança introduzida tenha sido nova para a empresa. Um método de produção, processamento e marketing ou um método organizacional pode já ter sido implementado por outras empresas, mas se ele é novo para a empresa (ou se é o caso de produtos e processos significativamente melhorados), então trata-se de uma inovação para essa empresa”; ou na estratégia imitativa, uma das estratégias competitivas ligadas a inovação classificada de Freeman (1997, in: Tigre, 2006, p. 172-174): a empresa que adota esta estratégia não aspira ser líder ou ter grandes

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lucros, ela pretende apenas marcar sua presença no mercado, oferecendo um produto semelhante ao existente. Ela é usualmente adotada por empresas de pequeno porte que participam de setores menos vulneráveis à mudança tecnológica, em países onde as empresas inovadoras não atuam diretamente ou em mercados com uma grande proteção local. Mas ela apresenta a desvantagem de apresentar margens de lucro muito apertadas, pois produtos indiferenciados são tomados de preços estabelecidos pelo mercado. Para Souza, Kistmann e Siebenrok (2012), a “cópia é um fenômeno que precisa ser melhor estudado, uma vez que fica visível que, em muitas vezes, ela é responsável pela aquisição de conhecimento e faz ponte com a inovação”. Na arte, a cópia sempre fez parte do aprendizado. E segundo Zolberg (2006) até os avançados do século XIX as cópias eram quase tão aceitáveis como os originais por serem usadas como modo de difusão da obra. “Muitos museus entesouravam rotineiramente cópias de pinturas a óleo, modelagens em gesso de esculturas clássicas, e abastados amantes da arte e colecionadores costumavam encomendar a artistas cópias de pinturas” (Zolberg, 2006, p.147). Mesmo na obra de um dos artistas mais inovadores do século XX, Picasso, percebe-se uma intrincada relação com a cópia. Segundo Mac (1966, p. 217) ele sempre se sentiu inspirado pelo trabalho de outros artistas, tanto dos mestres como Goya, El Greco, Velazquez, Ingres, quanto por artistas contemporâneos, absorvendo suas ideias desenvolvendo-as e traduzindo-as para sua própria linguagem estética. “Por essa razão, falava-se em Paris que Picasso roubava os outros; ele se apropriava sem a menor consideração das ideias de quem quer que fosse, se ele encontra-se algo que o interessava. Contava-se que depois de uma visita a Braque ele sempre ia direto para casa para analisar o que ele tinha visto lá. Esse boato se espalhou de tal maneira, que outros artistas escondiam seus quadros dele, quando ele os visitava. Tudo que ele visse lhe servia de matéria bruta e se permitia o direito de se utilizar do que tivesse visto. Ele, como anarquista, tinha o ponto de vista que o mundo das ideias não tinha fronteiras [...]. O importante era o resultado. Sempre as ideias eram transformadas e cunhadas por ele; assim elas se tornavam uma outra coisa, porque ‘quando duas pessoas fazem o mesmo, nunca é o mesmo’” (Mac, 1966, p. 218, livre tradução). Por isso, acredito, que se encarada como no exemplo de Picasso, como matéria bruta para se chegar a um resultado próprio, a cópia é um instrumento de aprendizado. O problema é quando a cópia assume apenas uma função de reprodução mecânica de algo, pois quando duas, duzentas ou duas mil máquinas fazem o mesmo, o mesmo sempre permanece igual.

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2.4

Inovação na arte – rupturas de linguagem “O novo é, por definição, conjuntural, circunstancial e efêmero. Conjuntural e circunstancial porque uma coisa só é nova em determinado momento e em determinadas circunstanciais, uma vez que o que é velho num momento e em certo contexto pode ser novo ao se transferir para outro contexto (haja visto Macondo8). Decorre daí que o novo é uma qualidade externa (não essencial) às coisas, e a busca do novo pelo novo uma empresa fútil” (Gullar, 1993, p. 41). Segundo o mesmo autor, a preocupação dos artistas com o novo é

relativamente recente. Durante grande parte de sua história percebe-se que a necessidade de inovar na arte não existia, já que os artistas antigamente seguiam os modelos clássicos, os mestres, as regras acadêmicas. Para mim essa afirmação está correta, se a definição do novo e/ou da inovação na arte, como acontece comumente, se restringir apenas a inovações de estilos ou linguagem. Mas olhando-se, porém, mais detalhadamente a história da arte, gostaria de destacar que é possível se perceber que desde de seu surgimento sempre existiram inovações técnicas: do primeiro momento quando foi feita a inclusão do contorno em preto na bicromia do vermelho e ocre nas pinturas préhistóricas, das regras formais e da utilização de ferramentas e cores minerais sobre o gesso branco nas pinturas murais egípcias, do uso do escorço na pintura grega, da pintura sobre tábuas dos romanos, dos afrescos italianos, do aperfeiçoamento da pintura a óleo pela escola realista flamenga, da perspectiva e a pintura de cavalete do Renascimento, da pintura sobre tela, etc. até a arte digital dos dias de hoje. Como no conceito de modelo de difusão tecnológica com uma curva em “S” (Quadro 2, p. 43) – que divide o processo em 4 fases distintas: i. introdução; ii. crescimento; iii. maturação; e iv. declínio – as inovações técnicas na arte também passam por um processo de introdução até o seu declínio. Por exemplo, a discussão que se viveu no final do século XX sobre a “fim da arte” nada mais seria do que o declínio de uma técnica: “a eliminação ou destruição do quadro com suporte da pintura. [...] Saiu-se do terreno da representação para o da presentação. Ou seja, deixou-se de utilizar uma linguagem preexistente para tentar expressar-se sem linguagem: cada obra fundaria sua própria linguagem” (Gullar, 1993, p. 23).

8 Gullar costuma dizer, brincando, que: “Nasci em Macondo”, a cidade de 'Cem anos de solidão' onde tudo acontecia um século depois.

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Segundo Faith (1987, in: Zolberg, 2006, p. 139-140), “somente nos últimos cem anos é que o mercado enobreceu as pinturas em um patamar acima dos objetos, cujas virtudes maiores eram os materiais nobres, a perícia e a engenhosidade neles empregados”. A singularidade e originalidade da obra, e também a sua raridade, não significavam o mesmo que significam atualmente, como pode ser visto no exemplo de Leonardo da Vinci, onde muitas de suas “invenções se originaram do trabalho de inventores anteriores, apesar de invariavelmente modificados, e melhorados de modo significativo” (Capra, 2008, p.99). Além de inovações técnicas, existiam também inovações de processo, como o exemplo da técnica do “esboço dinâmico”9 usada por Leonardo da Vinci que buscava traduzia as possibilidades e a velocidade de seu discorso mentale10 sobre um tema a ser pintado. Mas Leonardo não introduziu apenas essas inovações, todas as suas obras “sempre envolveram inovações radicais em diversos níveis – artístico, filosófico e cientifico” (Capra, 2008, p. 68). “[As] inovações não eram, para ele, apenas resultado do desejo de inovar, mas os meios imprescindíveis que teve que inventar para exprimir uma visão própria, profunda, da religiosidade e da complexidade dos sentimentos humanos. Noutras palavras, o novo ali ocorreu como consequência de uma necessidade e não de uma deliberação exterior ao processo expressivo” (Gullar, 1993, p. 92). “Com o surgimento da burguesia, do colecionador de arte e do artista individual – que assina sua obra e se distingue pelo seu estilo pessoal” (Gullar, 1993, p. 92) – e também do valor dado às vanguardas artísticas e a obsolescência acelerada, gerou-se na arte uma busca do novo pelo novo. O Gullar (2006) concorda que atualmente todas as questões podem se tornar matéria artística. Mas a velocidade e a banalidade ao se apropriar dos temas, sem que ele seja interiorizado e processado na linguagem artística, abrindo assim nossa sensibilidade a novos aspectos da realidade, faz com que a arte contemporânea se torne efêmera. Acredito que essa efemeridade é resultante de uma velocidade que foi se exacerbando ao longo do século passado. A exploração exaustiva das formas e

9 Arasse a descreve como “um borrão ilegível. Nada mais podia ser distinguido nesse caos, mas seu olho captou o movimento de suas mãos de forma recôndita, subterrânea e latente, que luta para tornar-se uma figura. Leonardo marca com um estilo, e virando a folha pelo avesso, torna-a visível com uma linha distinta” (Kleele 1983 in: Capra, 2006, p. 64) 10 O discorso mentale, é um processo de intelectualização da pintura. “Leonardo poderia passar semanas entre camadas de tinta, retrabalhando e refinando seus painéis anos a fio, refletindo sobre cada detalhe de sua concepção, empenhando-se no discurso mental que via como essência de sua arte e pintura” (Capra, 2006, p. 68)

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matérias por parte dos artistas originadas a partir dessa velocidade e da busca incessante pelo novo levou a sociedade a uma ampliação de sua capacidade de ver e sentir, revelando formas, texturas, matérias para as quais eram cegos ou insensíveis, aumentando o repertório estético dos indivíduos de nossa sociedade e introduzindo uma linguagem estética “que pôs a mostra muita riqueza até então soterrada e desconhecida (Gullar, 2006, p.137). “Essa fome de novidade, esse furor de inovação, arrefeceu. Naturalmente, muitas dessas pesquisas não traziam em si possibilidades maiores de desdobramento: valiam como descoberta. Esgotaram-se como pesquisa em si, como tentativa autônoma de criar uma linguagem própria, mas são elementos novos trazidos ao campo da linguagem visual. A partir deles, ou incorporando-os em experiências mais amplas; constituem o rico vocabulário que dispõem o artista de hoje” (Gullar, 2006, p.137-138). O autor ainda afirma que na arte, a febre inovadora passou. Mas Zolberg, (2006, p. 198) levanta uma interessante questão ao nos lembrar de que existem várias maneiras de inovar, e que “inovar revivendo formas ou estilos de arte tradicionais ou redescobrir e valorizar uma arte negligenciada pode exigir tanta inspiração quanto criar o absoluto novo”. Gostaria de destacar, que não apenas os artistas inovadores são artistas como se pode ver no Quadro 6. Criando-se um paralelo entre a postura do artista frente a inovação e as estratégias competitivas ligadas a inovação a partir de uma classificação de Freeman (1997), apresentadas no capitulo “2.2 Inovações segundo a Economia da Inovação”, páginas 44-45, é importante se relembrar que a arte “pode ser inovadora ou tradicional; ela pode ter sido feita recentemente ou redescoberta por indivíduos excepcionalmente criativos, ou ainda por indivíduos confiáveis, do tipo trabalhador.” (Zolberg, 2006, p. 197). Descobridores de problemas Solucionadores de problemas

Inovador Criação de arte nova (belas artes ou design; música; literatura; cinema) Tradição dos novos realizadores (variantes de protótipos; arte comercial)

Tradicional Redescoberta criativa (com meios recém-criados) Seguidores da tradição (antiguidade, arte acadêmica; música antiga)

Quadro 6 - Artistas segundo estilo e conteúdo da obra (Zolberg, 2006, p. 200)

Acredito que é possível se identificar também na arte, como no exemplo da linha do tempo da arte moderna e contemporânea apresentada no Quadro 8, os conceitos comuns nos estudos de inovação de: i. “novo para o mundo”; ii. “novo para o mercado”, ou no caso da arte, “novo para o um país” (no exemplo apresentado “novo para o Brasil”); e iii. “novo para o artista”, que corresponderia ao conceito de “novo para a empresa”. Este conceito de “novo para o artista”, tanto pode ser estendido a um artista amador que se identifica com estilos

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“antigos” e começa a produzir objetos (pinturas, esculturas, gravuras, etc.) seguindo essa estética, quanto a artistas consagrados, como por exemplo, Picasso (apresentado no exemplo linha do tempo o Quadro 8), que no início de sua carreira buscam inspiração e diálogo na obra de outros artistas até conseguirem criar uma linguagem própria, uma expressão única que lhes traz o reconhecimento como “artistas” e coloca sua obra nas categorias de inovação para o mundo ou para o país. Nunca é demais ressaltar, que nenhum artista pode ser inovador o tempo todo, sua obra não é formada apenas por “obras de arte”. Depois que uma linguagem própria é encontrada pelo artista e ele tem a sua proposta reconhecida pelo mercado de arte – ou seja, que ele introduziu nesse mercado uma inovação radical que o difere de outros artistas – ele continua a explorar essa linguagem – que poderia ser comparado a inovações incrementais em sua obra. As obras iniciais dessa nova proposta não são necessariamente mais valiosas do que as posteriores durante a sua exploração do tema ou linguagem do artista. Por exemplo Picasso, que pintou em sua carreira 5.000 quadros, produziu mais de 10.000 gravuras e 3.000 cerâmicas11 (Mac, 1966, p. 213) – sem o apoio de aprendizes e assistentes como os pintores antigos faziam –, teve muita coisa que foi considerado pela crítica e historiadores de arte de pouca relevância, muita coisa apresentava defeitos, muita coisa era sem valor. “Mas ele conseguia vendê-los, até mesmo o refugo. No auge de sua fama ele alcançou um sucesso tão impressionante, que tudo lhe era permitido” (Mac, 1966, p. 213, livre tradução). Lançado nos EUA, por Gertrud Stein, as obras de Picasso encontraram naquele país grande procura, e é a este fato que o artista deve o seu sucesso e a sua fortuna (Mac, 1966, p. 228). Depois da Segunda Guerra Mundial a “rica” América do Norte teve uma grande influência na arte moderna francesa, em razão de ser o seu maior comprador. Pelo menos a metade da obra de Picasso se encontra em solo norte americano, pois seus quadros eram vistos como um investimento de grande liquidez. “Os americanos compravam tudo que dele [Picasso] conseguissem obter, porque eles queriam o mais caro, o que causasse maior sensação, o que fosse considerado mais famoso. [...] ‘Eu compro Picasso não porque é do 11 Apenas como comparação com grandes Mestres da pintura: Renoir pintou aproximadamente 3’000 quadros; Rubens a quem é atribuído também 3’000 quadros, dos quais apenas 700 foram pintado por ele o restante foi realizado por seus alunos a partir de seus esboços; Utrillo 2’500; Van Gogh pintou 2’000 quadros; Rembrandt 700; Toulouse-Lautrec 600; Raffael 2’000; Modigliani 200; Vermeer 40; e Leonardo da Vinci 8 ou 9. (MAC , 1966, p. 213, livre tradução).

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meu gosto, mas sim porque seus quadros um dia vão alcançar valor inestimável’. Outro [comprador] disse: ‘Eu só compro seus quadros horrorosos, porque sei que eles irão ter mais tarde procura’” (Mac,1966, p. 229-230, livre tradução). O que comprova que o reconhecimento e sucesso de um artista não dependem apenas da genialidade de sua obra. E também, do meu ponto de vista, que o fator “sucesso de mercado” que define o que é uma inovação nas áreas ligadas ao estudo da inovação, não pode ser transposto ipsis litteris para qualquer área. Como em qualquer inovação, que se desenvolve melhor em um ambiente favorável tipo os clusters – por exemplo, Silicon Valley, na Califórnia –, “os artistas [também] dependem direta ou indiretamente das estruturas sociais que lhes dão suporte. Essas estruturas podem abranger uma série de mecanismos, processos, instituições ou agências, que premiam ou penalizam o desempenho ou a criação artística. Elas abrangem desde relações simples e diretas entre artistas e o cliente até relações de grande complexidade, envolvendo intermediários, redes e círculos. Estes não apenas abrem caminhos para o reconhecimento do talento e da inovação e para a oportunidade de empregos ou encomendas, como também disseminam o novo conhecimento a universos mais amplos, incluindo os públicos ou plateias para as artes, que se tornaram comum nas sociedades modernas” (Zolberg, 2006, p.207). Mas esta questão não se restringe apenas a arte moderna e contemporânea: encontramos esse mesmo processo no afluxo de artistas para a corte dos Médicis em Florença, para Paris em razão da estrutura criada pela Academia Francesa de Artes, para Nova York depois da destruição da Europa na Segunda Guerra Mundial. Eram nesses “centros” que brotavam as ideias novas e fascinantes e eram deles que elas eram difundidas. Por exemplo, a bottega de Verrocchio em Florença, onde Leonardo da Vinci fez o seu aprendizado, “era um lugar de discussões vibrantes sobre as novidades que ocorriam diariamente. Tocava-se música à noite e os amigos do mestre e colegas artistas passavam por lá para trocar planos, esboços e inovações técnicas; escritores viajantes e filósofos visitavam-na quando passavam pela cidade. Muitos dos principais artistas da época foram atraídos para a bottega de Verrocchio. Botticelli, Perugino e Ghirlandaio passaram certo tempo lá, quando já eram mestres consumados, para aprender novas técnicas e discutir novas ideias” (Capra, 2008, p. 93). Paris, séculos mais tarde, exercia sobre os artistas o mesmo fascínio. “No ar de Paris tem alguma coisa, que estimula a criação de obras de arte” (Whistler in: Mac, 1966, p. 27, livre tradução). Era lá que o “mundo das artes” se encontrava, onde se era descoberto e se era consagrado como “grande artista”.

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Retomando o exemplo de Picasso, pode-se ver que o artista tentou se instalar na cidade por 4 vezes, de 1900 a 1904, voltando sempre para sua terra natal quando não via mais nenhuma perspectiva de sustento. Somente na última vez conseguiu se estabelecer como artista na cidade. Dessa vez, teve a sorte de estar nos lugares certos, conhecer as pessoas certas – tanto artistas (pintores, escultores, poetas e escritores) como marchands e colecionadores, como por exemplo, Gertrud Stein, que era uma admiradora de seu trabalho e levou a obra do artista para os EUA. Estar no “centro das artes” tem o lado positivo de abrir muitas possibilidades “de ver e de ser visto”, mas, em compensação, tem também o lado negativo do artista ter que se destacar – usando-se um termo da economia da inovação – neste “mercado saturado” de estímulos e propostas. Picasso também passou por essa experiência de ter que se distinguir de seus “concorrentes”, pois sua obra não se diferia tanto assim do trabalho de outros artistas contemporâneos. “A concorrência era grande, e as exigências eram enormes para aqueles que quisessem fazer parte da primeira fila. Ele [Picasso] era muito esforçado, e muito aplicado, mas outros também o eram. Ele nem mesmo poderia ser considerado o primeiro entre eles. Seu nome só era conhecido em seu pequeno círculo de amigos e admiradores; o grande público não o conhecia. Ele sentia que a sua hora havia chegado; agora ele queria mostrar o que ele podia fazer. Ou ele deveria, como muitos outros pintores, continuar pintando da mesma forma? Os quadros da fase azul e rosa começaram a achar seu público, os comerciantes de arte queriam que ele continuasse a pintar com o mesmo estilo. A procura aumentava. Mas ele não queria se repetir: ‘Copiar os outros pode ser necessário, mas copiar a si mesmo – não!’ “(Mac, 1966, p.93, livre tradução). Quebrando todas as pontes, o artista começou a buscar por novos caminhos, comprovando que a inovação, mesmo nas artes, está antes de qualquer coisa na intenção de se ser inovador. Muito impressionado com as máscaras africanas da Costa do Marfim que chegavam a Paris e lhes foram apresentadas pelos seus colegas artistas Matisse e Vlaminck, Picasso começou um estudo sobre as esculturas em madeira dos negros, buscando as linhas simples, o “primitivismo”, o voltar a ser criança. Segundo Mac (1966, p. 100-101), ao desenhar o quadro “Les Demoiselles d’Avignon” (Figura 2) - que ele encarava inicialmente apenas como uma experimentação – com linhas duras, cores secas, sem uma unidade (as três mulher da esquerda se baseavam nas mulheres que se banhavam no quadro de Cézanne e as duas da direta estavam deformadas com rostos que se pareciam

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as demoníacas máscaras africanas), Picasso criou uma quebra tão brusca da antiga tradição, que vinha desde a época do Renascimento, de como uma pintura deveria ser, que a obra é considerada por muitos a pedra fundamental do modernismo. “Sua importância estava no efeito que ela causaria, e dos resultados que daí surgiriam. Significava o abandono do naturalismo como a única direção reinante” (Mac,1966, p. 100-101, livre tradução).

Figura 2 - Les Demoiselles d'Avignon (1907) e Les Grandes Baigneuses (1898-1905) (http://www.moma.org/explore/conservation/demoiselles/history.html, http://nicolehamers.skynetblogs.be/archive/2009/04/07/cezanne-toujours.html e http://eduardopereiradeazevedo.blogspot.com.br/2011/06/especial-pablo-picasso.html. Acessado em 15/02/2013)

Isto não quer dizer, porém, que o seu valor foi imediatamente reconhecido. Em um primeiro momento o quadro foi um choque para todos. Todos horrorizados com a liberdade que o artista de 26 anos tinha tomado. Ninguém o entendia, seus amigos Matisse e Leo Stein (irmão de Gertrud Stein e um dos mais importantes colecionadores de arte de vanguarda da época) ao verem o quadro pela primeira vez não seguraram o riso, a imprensa e o público receberam o quadro com ironia, escárnio e desprezo, e até sua esposa Fernande pediu que o trouxessem a razão, pois ele havia ficado louco! Segundo Mac (1966, p. 104), o quadro ficou muito tempo sendo apreciado apenas por um pequeno círculo. Ele não era exposto ao público pois sua reação frente a pintura era ainda imprevisível, o autor supõe que temessem até mesmo que algum opositor mais furioso pudesse cortá-lo com uma faca. Fiz questão de ressaltar esta passagem importante da história da arte por ela demonstra que, mesmo em uma área de conhecimento, um local e uma época em que todos

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valorizavam e buscavam o novo, a inovação continua sendo um risco. Principalmente no caso da inovação de estilo ou linguagem – muito comum nas artes –, já que a inovação não depende apenas de sua criação, mas também de como esta criação é percebida pelo o entorno, como ela é decodifica. Para Gullar (1993), como já existe uma a linguagem artística que preexiste a qualquer obra, é impossível que o artista ao buscar o novo não lide também com o “velho”, “isto é, com formas e ideias que geraram (e foram geradas por) suas obras anteriores [e até mesmo por obras de outros artistas], de modo que a obra nova guarda consigo algo do passado, não pode ser radicalmente nova” (Gullar, 1993, p. 43). A nova linguagem criada pelo o artista deve se reportar a algum repertório existente do observador da obra para poder ser entendida e incorporada ao repertório estético do observador, como se pode ver no gráfico (Quadro 7) de Bense (2003). O grau de interseção entre o repertório do artista (Rep 1) e o repertório do observador da obra (Rep 2) define se ela é considerada inovação radical (área de interseção pequena), inovação incremental (área de interseção grande), ou até mesmo se ela é ignorada e/ou não valorizada como obra de arte pelo observador (área de interseção inexistente).

Quadro 7 - Comunicação Estética (Bense, 2003, p.142)

“A expressão pictórica se realiza em vários planos ao mesmo tempo, envolvendo desde a concepção e definição das imagens até a relação de luz e sombra, de cor e textura, de linhas e planos, que vão surgindo ou desaparecendo, para a conformação final da obra. Esse processo, que lida com fatores conscientes e inconscientes, mentais e sensoriais, provocados e casuais, não é mera variação caprichosa na combinação de elementos que constituem a linguagem deste ou daquele artista. A realização da obra

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abre sempre a possibilidade de uma ampliação desse universo significativo” (Gullar, 1993, p. 31). Para o autor, o trabalho criativo do pintor está em criar a sua própria linguagem, atuando no sistema semântico ao ultrapassar os limites de seu universo expressivo. Gostaria ainda de destacar que, ao contrário da arte no passado onde as técnicas muitas vezes “delimitavam” os meios de expressão do que poderia ser considerado arte, atualmente a criatividade do artista pode buscar por de novos significados semânticos através de qualquer material, qualquer técnica – seja ela ligada a tradição das artes ou não. Para Gullar (1993), é nesta busca por uma linguagem própria, por novos limites “vocabulares” que gerem outros significados que está a diferença para “a pintura ‘acadêmica’, que seria um simples uso mecânico, burocrático, da linguagem pictórica existente” (Gullar, 1993, p. 31). “A linguagem da arte não se constitui apenas de signos (imagens, sinais) mas também de não-signos (matéria). E deve-se entender por matéria da arte não somente a pasta pictórica mas a própria tela e todos os materiais existentes (pedra, metal, madeira, estopa, areia, etc., etc., etc.), já que tudo é suscetível de ser transformado em expressão” (Gullar, 1993, p. 39). Segundo Gullar (2006, p. 101) as rupturas radicais constituem um valioso patrimônio da experiência estética, marcando a ampliação dos limites da expressão estética em seu tempo e o aumento do acervo de sua linguagem através da busca por novos materiais, novas formas, e novas técnicas, como pode ser visto no Quadro 8. Essas etapas sucessivas na solução de certos problemas artísticos documentadas como marcos da sua história, não podem ser atribuídas ao conceito de “progresso”, pois uma não anularia a anterior. Picasso uma vez disse que “na arte não existe evolução, somente mudanças constantes” (Mac, 1966, p. 117). Mesmo em relação as suas próprias criações ele não gostava que usassem o termo evolução, afirmando que ele nunca evoluiu apenas se modificou. E Gullar (1993, p. 47) também se mostra contrário à teoria evolucionista da arte complementa, afirmando que a arte nem evolui nem retrocede. Acho importante acrescentar que a negação do conceito de “evolução” negaria também uma linearidade da inovação na arte. É preciso diferenciar a linearidade histórica tão presente nas linhas do tempo da arte – que apenas apresenta de uma maneira ordenada os diversos estilos que marcaram a história da arte – de uma linearidade causal – baseada em um novo paradigma que invalidaria o anterior em busca da “verdade única”.

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Quadro 8 - Linha do tempo da arte moderna e contemporânea

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Mas para que essas rupturas radicais que aumentam o acervo de linguagem possam acontecer, o artista não pode estabelecer técnicas e normas para o seu trabalho, porque a essência desse trabalho é exatamente o questionamento de todas as normas e técnicas, inclusive as suas. “Na prática da arte, o artista termina por adquirir um domínio de seus instrumentos de expressão, uma técnica, mas o que define os grandes artistas é precisamente sua capacidade de se sobrepor à técnica, de dar a volta por cima, isto é: um domínio tão profundo da técnica que a anula como eficácia, impedindo assim que sua linguagem se esclerose. É nesse sentido que se deve entender a frase de Goeldi, mestre da gravura: “Não sei gravar”. Sim porque “saber gravar” é já não poder criar (Gullar, 2006, p. 111-112). O “não saber algo” refere-se à rejeição de normas e soluções preestabelecidas, “concebendo a obra como uma experiência permanentemente aberta [como Cézanne se propunha], em que o que o artista diz e a linguagem que usa para dizê-lo são uma incessante busca e descoberta” (Gullar, 2006, p.67-68). Na arte que procura ser inovadora a obra tem que ser descoberta, inventada a cada momento durante o processo de pintar [esculpir, fazer, etc.]. “Quando ele [Picasso] esta frente a uma tela, é uma catarata do Niágara em energia, cheio de vitalidade. Em geral, ele não permite que ninguém esteja presente enquanto pinta. Sua arte vem espontaneamente, em pura alegria criativa, ao mundo. Ele põe logo mãos à obra, sem hesitar, sem insegurança. ‘Eu não procuro’, ele costumava dizer, ‘eu acho’” (Mac, 1966, p 215, livre tradução). Do meu ponto de vista, esta afirmação de Picasso levanta uma questão muito importante: quem procura já tem um caminho traçado, já sabe o que quer alcançar ao iniciar o processo; quando o artista afirma que “acha”, no sentido de “encontrar”, “se deparar com” estaria se entregando ao acaso, ao aleatório, ao inesperado, ao que vier a surgir durante o seu fazer em uma experiência totalmente aberta, como Cézanne propunha. “O que define o modo de formulação estética – e determina a vitalidade da expressão – é essa unidade do pensar e do fazer: o artista não sabe a solução senão quando termina a obra – ela é a resposta à indagação que a fez nascer. Se o artista já sabe a resposta, antes de fazer a obra, a obra é desnecessária” (Gullar, 2006, p133-134). A “indefinição” que a arte permite – e até mesmo exige ao se iniciar um processo de expressão artística – é, no meu ponto de vista, uma proposta que deveria ser estendida a qualquer processo em que se busca pelo novo e/ou pela inovação, pois foi através dessa unidade entre o “fazer” e o “pensar” que os grandes pensadores originais e criadores mudaram o curso da história.

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Esse reconhecimento do indivíduo, da importância da história de sua vida e da expressão individual é, do meu ponto de vista, é uma das grandes diferenças da inovação na arte frente ao conceito de inovação difundido nas áreas de administração, economia e engenharia que se baseiam mais em uma visão do todo, ou seja, da economia, do mercado, do modelo, etc. E esse valor começa também a ser descoberto por outros teóricos da inovação, como por exemplo Seifter (2012). “[...] As organizações líderes da atualidade descobriram o poder da aprendizagem baseada em artes, e estão usando isso a seu favor. [...] A Boeing considera as artes essenciais para um complemento da educação [de seus funcionários] porque acredita que as artes podem proporcionar aos alunos as habilidades que estes precisam para ter sucesso na vida e navegar com sucesso nas carreiras do século 21” (Seifter, 2012, p.15, livre tradução). A habilidade de se pensar criativamente, trabalhar de maneira colaborativa e se comunicar com eficácia foi considerada primordial pela maioria dos líderes em um levanto entres os participantes da importante Conference Board survey of 400 senior U.S. business leaders, realizada em 2006 (Seifter, 2012, p.12). E, segundo o mesmo autor, para se alcançar o nível de inovação desejado, não basta se ter apenas uma força de trabalho especializada e competente tecnicamente – os funcionários devem ser criativos, “colaborativos” e comunicativos. Mas isso é muito mais fácil se dizer do que se fazer. A solução para a implementação desta prática, estaria nas “artes” (Seifter, 2012),. Ele acredita que pessoas com treinamento em artes cênicas, visuais, dança, musica: 

são mais suscetíveis a fazer mudanças do modelo de negócios para realizar suas estratégias;



são mais propensas à inovação disruptiva, incentivando os outros a abandonar abordagens ultrapassadas e assumir riscos;



se sentem mais confortáveis com a ambiguidade e tem mais experiências para criar novos modelos de negócios;



são corajosas e visionárias o suficiente para tomar decisões que alteram o status quo; e



inventam novos modelos de negócios baseados em premissas inteiramente diferentes.

Unir então os pontos de vista da inovação da ciência e das artes, pensando ao mesmo tempo no processo de gestão no todo e no indivíduo, pode trazer resultados surpreendentes.

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3 Inovação no design

Mas, e para o campo do design? Como a inovação é definida e percebida? Pode-se simplesmente absorver as definições e conceitos das áreas que estudam tradicionalmente a inovação, agregando-as ao corpo de conhecimento do campo como é comumente feito com o conhecimento de diversas áreas? Como uma “disciplina nova, nascida da união de áreas diversas de conhecimentos, cuja prática se caracteriza pelo relacionamento com outras disciplinas” (Couto, 1997, p.9), e cuja esfera entre arte, ciência e tecnologia é um dilema que ainda não encontrou uma resposta, a preocupação com definições próprias, como por exemplo, a diferenciação básica entre os termos invenção e inovação parecem não constar ainda da pauta da área, mostrando que o tema não é muito estudado – pelo menos não pelos designers e estudiosos da área fora da linha de pesquisa de gestão em design. Uma indicação que corrobora essa afirmação está no livro “Conceitoschave em design” (Coelho, 2008), que se propõe a mapear “os termos mais utilizados pela comunidade que trabalha com design hoje” (Coelho, 2008, p.12). Tirada do “Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa” (1993) os autores apresentam uma definição e uma dedução onde o termo invenção acaba se tornando resultado da inovação, ou seja, em uma proposta inversa a definição apresentada pelo campo da Economia de Inovação, que é a utilizada pelos órgãos governamentais e agência de fomento, como foi visto anteriormente. “Inovar é deslizar um signo até a invenção de outro (Coelho, 2008, p.101). Inovar é introduzir novidades no existente, renovar; inventar é ter a ideias primeiro, imaginar, criar, descobrir, além de mentir, falsificar. Se é uma novidade, é porque é a primeira vez que tal situação, OBJETO, ideia, é exposta: logo, é uma invenção. Então, qual a diferença entre inovar e inventar? Poder-se-ia propor que a invenção acontece quando uma inovação gera algo conceitualmente diferente do existente? Pode-se inovar, por exemplo, no DESIGN de um objeto X, a ponto de se inventar um objeto que deixa consensualmente de ser X e passa a ser Y” (Coelho, 2008, p. 103). Conforme a área de atividade do design, o conceito de inovação nem é as vezes abordado, e quando se fala de inovações em design em livros, revistas, sites, blogs, etc., normalmente apresenta-se apenas exemplos de criações consideradas no momento inovadoras – como é comum no mundo das artes.

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3.1

O “diferente” é inovação no design? “No mundo da moda, por exemplo, uma roupa excêntrica ou mesmo escandalosa (que provavelmente ninguém um dia irá vestir) é considerada criativa e inovadora. De fato o mundo da moda é constantemente orientado para a criatividade e a inovação – é preciso criar algo ‘diferente’, o que tem muito haver com o apelo do choque” (Sarkar, 2008, p. 117). Criar algo “diferente” é criar algo inovador? Como definir o grau de

diferenciação entre um produto inspirado em outro, uma releitura de algum estilo ou produto, ou algo totalmente original? Apesar do design ser uma atividade ligada a criação de objetos, acho importante ressaltar que criatividade e inovação não são sinônimos: a inovação se origina da criatividade, mas a criatividade nem sempre gera uma inovação. O que o dia a dia da atividade demonstra, é que nem sempre o designer cria um design inovador, já que ele como ele tradicionalmente está atado ao briefing que lhe é passado, ele só conseguirá criar algo inovador se essa for a proposta da empresa para quem ele projeta. No seu processo criativo é preciso levar em consideração a relação que se quer construir entre o produto e o consumidor, o seu custo final, as matérias primas mais adequadas e as que estão a sua disposição, etc. Mesmo as tecnologias disponíveis para a sua criação podem ser um fator importante, mas não determinante na criação de um design inovador, como pode ser visto no exemplo das mudanças do design de móveis no final do século XVII na Inglaterra, apresentadas por Forty (2007). O autor defende que “não foi a máquina que provocou as mudanças no design, mas o uso da máquina em circunstâncias econômicas e sociais específicas. [...] Atribuir mudanças no design apenas à tecnologia é não compreender a natureza tanto das máquinas como do design nas sociedades industriais” (Forty, 2007, p. 81). O exemplo das cerâmicas de Wedgwood, apresentado pelo mesmo autor, mostra que a associação “natural” entre design e inovação não é verdadeira. O design na Wedgwood criava produtos diferentes para gerarem desejo de compra nos consumidores, mas, apesar da empresa sempre estar realizando pesquisas por novas descobertas e inovações técnicas, o seu design era usado não para ressaltar as inovações, mas para encobri-las através de desenhos neoclássicos: “o design do produto não enfatizava sua novidade, mas suas origens antigas. [...] Antiguidade, e não novidade, era a qualidade comercializável.” (Forty, 2007, p. 39).

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Segundo Fairhead (1998, in: Sarkar, 2008), existem quatro níveis para conceber o envolvimento do design no processo de inovação. “No primeiro nível, o design serve apenas para conferir um estilo próprio aos produtos. No segundo nível, no entanto, o design serve já para melhorar o próprio produto. Em seguida, no terceiro nível, o design é utilizado para concretizar a interface entre a empresa e o cliente. Finalmente, no nível mais elevado, o design faz parte integral de todo o processo de inovação do produto” (Sarkar, 2008, p.179-180). Quando o design não é visto apenas como “estilo”, mas faz parte integral de todo o processo, ele pode dar uma orientação mais inovadora às empresas, como pode-se ver pelo exemplo da Apple – considerada a empresa mais inovadora pelo ranking da revista Businessweek (Sarkar, 2008, p. 175) –, onde o design faz parte da filosofia da empresa. “A busca de excelência por [Steve] Jobs é o segredo do notável design da Apple. Para Jobs design não é decoração. Não é aparência superficial de um produto. Não é apenas a cor ou detalhes estilísticos. Para ele, design é a maneira como um produto funciona. Design é função, não forma. E para compreender corretamente como o produto funciona, ele tem que ser realmente discutido no processo de design” (Kahney, 2008, p. 71). Se inovação está ligada ao lançamento de produtos no mercado com sucesso comercial (Kupfer e Hasenclever, 2002). Como definir então uma inovação no design? Uma peça que apresente uma nova estética e é percebida pelos agentes da área como inovadora pode não se traduzir em um número de vendas relevante; nesse caso ela não deveria ser considera uma inovação? Johansson (2008) apresenta uma outra definição para inovação que considero mais fácil de ser “instrumentalizada” por áreas que lidam também com valores intangíveis como é o caso do design: “as inovações precisam ser não apenas valiosas mas também postas em uso por outras pessoas na sociedade. [...] Se uma ideia existir somente na cabeça de uma pessoa, não poderá ser considerada inovadora. Ela tem que ser ‘vendida’ a outras pessoas no mundo, sejam elas colegas que analisam provas científicas, clientes que compram novos produtos ou leitores de artigos ou livros” (Johansson, 2008, p. 36). Segundo Forty (2007, p. 325), o design só transforma um produto em sucesso de mercado quando encarna as ideias que são comuns às pessoas que irão consumir aquele objeto. Para o autor, as mudanças – e porque não dizer, as inovações – de design não se explicam apenas com referências à personalidade, conjunturas de vida e carreiras de artistas e designers, nem tampouco podem ser atribuídas à “um processo evolutivo, como se os bens manufaturados fossem plantas ou animais, [ou fossem também] mutações no desenvolvimento de

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produtos, estágios de uma evolução progressiva na direção de uma forma mais perfeita” (Forty, 2007, p. 13). Mas é preciso se ressaltar que esta postura, de negar o papel do indivíduo no processo, vai de encontro às abordagens sociológicas, onde os “cientistas sociais partem da premissa de que arte deve ser contextualizada, em termos de lugar e tempo, em sentido geral” (Zolberg, 2006, p. 37), negando os valores “internos” que os humanistas enfatizam e que dão ao designer o total controle do processo de inovação em design. Como o caminho do equilíbrio entre as duas visões é o mais sensato a se seguir, como Zolberg (2006) mesmo defende, podemos corroborar a ideia de que o design “é determinado pelas pessoas e as indústrias que os fazem e pelas relações entre essas pessoas e a indústria e a sociedade em que os produtos serão vendidos” (Forty, 2007, p. 14). Löbach (2001, p.108) demonstra essa intrincada relação do designer com a indústria e o usuário, e como este profissional precisa representar os dois grupos de interesses no gráfico do Quadro 9. Para o autor o designer industrial é aquele profissional que realiza o “processo de adaptação dos produtos de uso, fabricados industrialmente, às necessidades físicas e psíquicas dos usuários ou grupos de usuários” (Löbach, 2001, p.22).

Quadro 9 - Rede de interesses que unem a empresa industrial e o consumidor. O designer industrial tem compromisso com as duas partes (Löbach, 2001, p. 108).

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Percebendo o design como uma ferramenta de desenvolvimento e de diferenciação de produtos, Löbach (2001) afirma que “o designer industrial tem a tarefa de fazer o desenvolvimento continuo dos produtos” (2001, p112), através da diferenciação dos mesmos pela busca de versões diferentes das já existentes. Para o autor, a “maioria dos designers industriais consegue romper as normas estéticas de configuração vigente somente em proporções muito limitadas. Para se transformar em nova norma, um produto inovador precisa ser um fenômeno de vendas, sendo aceito por um grande número de compradores. Geralmente, os consumidores só aceitam os produtos que concordem com seus próprios princípios de valor. Os produtos de aparência estética inovadora, estabelecendo novas escalas de valores, quase sempre são recebidos com ceticismo pela maioria” (Löbach, 2001, p. 183) E ele ainda afirma que alguns designers de vanguarda, conhecidos por derrubar normas estéticas vigentes e sinalizar novos caminhos e novos valores estéticos são normalmente aceitos por um pequeno círculo de entendidos, e que as fabricações de seus “projetos” são tão custosas que constituem um segundo motivo para sua pouca difusão. Mesmo sendo estes os designers que estão nos livros de história do design, nas timelines dos ícones do design, nos catálogos das exposições, etc. pela criação de produtos que marcaram época, eles não estariam preocupados em dar ao usuário uma melhor satisfação de suas necessidades, conduzindo ao incremento da demanda e assegurando as vendas para a empresa. Não se pode esquecer, porém, que essas afirmações do autor, apesar de ainda serem muito difundidas entre os designers, retratam uma realidade do design na Alemanha na década de 1970. Como pode ser visto no Modelo de Dimensão da Inovatividade (Quadro 5), página 51, toda a inovação é difundida da mesma maneira: sendo primeiramente adotada pelos inovadores (2,5%), depois pelos adotantes iniciais (13,5%), em seguida pela maioria inicial (34,0%), maioria tardia (34,0%) e por fim pelos retardatários (13,5%). Os designers de vanguarda, citados por Löbach (2001), pela natureza de sua criação. A definição de inovação no design se depara a meu ver com está questão fundamental: por um lado o sucesso de mercado – fator que defini o termo nas áreas ligadas à Economia da Inovação – e que está ligado a produção em massa, privilegiando inovações incrementais ou diferenciações no design para serem mais facilmente adotadas pelas maioria inicial e tardia; e por outro lado, as inovações radicais no design que, por serem adotadas pelos inovadores e adotantes iniciais, se traduzem em números economicamente falando pouco

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relevantes. As inovações radicais no design teriam que ser definidas por outros valores que não podem ser quantificados monetariamente, ou seja, por valores “intangíveis”, próprios às especificações da área do design.

3.2

O design no processo de P&D “Em um primeiro momento a maestria dos artesãos, a tradição das corporações de ofício e a arte dominaram a produção artesanal de objetos únicos. Posteriormente, com o desenvolvimento das manufaturas e a produção de pequenas séries de produtos, foram criadas as primeiras academias de arte e as schools of design – onde se qualificava pessoal para a criação de formas, segundo princípios técnicos e normas de sucessivos estilos artísticos. Finalmente, com a industrialização da produção, a arte foi gradualmente substituída pela ciência como fundamento no processo de configuração” (Bomfim e Portinari, 2005, p.2). Segundo Bomfim e Portinari (2005) a arte sempre esteve presente na

história da configuração de artefatos. A partir da década de 1950, é que o design começou sua busca por adoção de métodos científicos, rompendo assim importantes vínculos que mantinha com a tradição artística (Cipiniuk e Portinari, in: Coelho, 2006, p. 29). Ao lado de diversas causas, pode-se atribuir a busca por uma aproximação com a ciência à “vontade ou necessidade do design de adquirir autonomia e delimitar seu campo de atuação profissional, diferenciando-o de outras atividades similares, praticadas por profissionais correlatos, do artesanato e da prática artística” (Cipiniuk e Portinari, in: Coelho, 2006, p. 30). Com isso, a “intuição e a criatividade foram substituídas por métodos, a habilidade por instrumentos tecnológicos, e mesmo aquilo que não pode ser quantificado, mas apenas qualificado, como o valor estético, tornou-se matéria submetida a cálculo” (Cipiniuk e Portinari, in: Coelho, 2006, p. 30). Foi a partir dessa época também que começaram a ser criados diversos métodos e modelos de processos de design, muito similares aos modelos e processos de P&D. Através da introdução dos processos de gestão do design, na década de 1960, os modelos se difundiram de tal maneira que na publicação “How do you design? – A Compendiun of Models” de Dubberly (2004) são apresentados mais de 100 modelos diferentes.

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Criada a partir da “consciência do papel crucial que o design poderia ter na indústria e na economia” (Hetze, 1993, in: Mozota, 2011, p. 92), a área de gestão do design está interessada em entender e definir “o lugar ocupado pelo design em uma organização, na identificação das disciplinas específicas de design que são relevantes para a resolução de importantes questões de gestão e no treinamento de gerentes seniores no uso eficiente do design” (Mozota, 2011, p. 93-94). Com dois objetivos: i. treinar e familiarizar os gerentes com o design e os designers com a gestão, e ii. desenvolver métodos de integração do design no ambiente corporativo (Mozota, 2011, p.92), a gestão do design criou uma linguagem de aproximação dos dois mundos tão distantes através de modelos e processos codificados. Para mim, nessa aproximação, buscou-se reduzir as incertezas de uma postura mais intuitiva, de pensamentos “não organizados” e de métodos e modos não convencionais utilizados por muitos designers até então, que não permitiam uma previsão da duração, nem tampouco do resultado final do processo de desenvolvimento de produto pelo designer. “Os métodos são modelos matemáticos ou linguísticos de algo mais complexo, ou seja, o método está no lugar de alguma outra coisa, tornando-a mais simples e, portanto operacional. Métodos, portanto são relatos descritivos ou prescritivos sobre o real e, se em um primeiro momento o sujeito cria o método, uma ótica e uma maneira determinada de pensar e agir, no momento seguinte, a persistência dessa ótica e dessa maneira de agir modela a realidade e, por extensão o próprio sujeito” (Cipiniuk e Portinari, in: Coelho, 2006, p. 33). A crescente sistematização do processo de design facilitou a percepção do “fazer” do designer dentro de organizações e empresas, “reduzindo riscos (aumentando a possibilidade do sucesso), criando expectativas (reduzindo incertezas e medos) e aumentando a possibilidade de repetição (possibilitando a evolução)” (Dubberly, 2004, p. 6, livre tradução). Mas como o design é uma atividade complexa, acabaram sendo gerados uma infinidade de modelos, métodos, técnicas e ferramentas, cada qual se adequando a uma realidade especifica. Segundo Cipiniuk e Portinari (in: Coelho, 2006) John Christopher Jones, autor do livro Design Methods – Seeds of human futures, conseguiu dividir esses modelos em 6 estratégias diferentes de visualização dos processos de design: i. estratégia linear; ii. estratégia cíclica; iii. estratégia em ramificação; iv. estratégia adaptativa; v. estratégia exploratória; e, vi. estratégia fortuita ou aleatória. “Na atualidade, há uma infinidade de métodos, técnicas e ferramentas dedicados ao desenvolvimento de projetos de design, mas é preciso muito cuidado em seu emprego, uma vez que esses procedimentos foram

74

desenvolvidos empiricamente a partir de situações concretas e muito bem definidas, e, portanto, não podem ser transferidos para qualquer contexto sem os necessários ajustes” (Cipiniuk e Portinari, in: Coelho, 2006, p. 34). Acredito que seguir esses modelos como uma “receita de bolo”, como uma mera reprodução de técnicas, sem reflexão durante o processo, cria um território inóspito para criatividade, e, por conseguinte para a inovação. Como o processo de design é um processo de identidade, que define a empresa,

seus clientes e seus investidores,

diferenciando-a de seus

concorrentes e criando um identificador chave da empresa para o público (Mozota, 2011, p. 30), com o tempo – e falando uma linguagem “mais cientifica” – os designers foram alcançando níveis de maior responsabilidade em relação às estratégias das empresas. O papel do designer dentro do processo de P&D define a relação do design com a inovação dentro de uma empresa. No exemplo da Apple, que criou inovações, como o Apple II, a interface gráfica do Mac e o iPod, consideradas por alguns autores as mais importantes na informática contemporânea, os designers estão intimamente envolvidos desde a primeira reunião, e não apenas no final do processo de desenvolvimento de um produto: “os produtos em fase de desenvolvimento não são passados de equipe a equipe, dos designers aos engenheiros, aos programadores e finalmente ao pessoal de marketing. O processo de design não é sequencial. Em vez disso, os produtos são trabalhados simultaneamente por todos esses grupos, e há rodadas e mais rodadas de revisões” (Kahney, 2008, p 9394). No gráfico do Quadro 10, Pugh (1990) exemplifica a diferença do papel do design no processo de criação de um objeto. Na geração de inovação – Pugh (1990) nomeia esse primeiro processo de inovador, enquanto o segundo seria o processo convencional - o trabalho da equipe multidisciplinar responsável pelo projeto, onde o profissional de design faz parte dessa equipe, se inicia na especificação do produto que leva a uma conceituação e posteriormente a seu detalhamento, fabricação e venda. Já no segundo, o convencional, o designer tem pouca influência sobre a inovação de produto, pois ele não participa da fase de conceituação, trabalhando com uma proposta pré-determinada.

75

Quadro 10 - Fluxo principal do design dentro da atividade de design (Pugh, 1990, p. 165, livre tradução)

Segundo Nitzsche (2012), no prefácio do mesmo livro de John Christopher citado anteriormente, o autor apresenta pela primeira vez a ideia que: “[o] design vai além de desenhar e cuidar da fabricação de objetos. Design seria um processo não só para a geração de produtos, mas de sistemas inteiros, como ambientes complexo de um aeroporto, sistemas de previdência, redes de computadores ou estruturas bancárias. Design é a participação ativa que consegue envolver todos os interessados em um processo de tomada de decisão. Design é um processo criativo e potencialmente presente em todos nós” Nitzsche (2012, p. 35-36). A IDEO, uma empresa de design de sucesso do Silicon Valley, que trabalhou no primeiro mouse da Apple, no Apple III, no computador Lisa, etc., foi uma das primeiras empresas de design a colocar essa proposta em prática. Como ela já tinha em algum ponto de sua trajetória deixado de participar da criação de produtos inovadores, para gerar experiências inovadoras tanto para os usuários quanto para os executivos das empresas, foi fácil para “tangibilizar” e difundir esse novo tipo de processo, onde o design se propunha a praticar “não apenas um design reconhecido pela qualidade, mas um processo completo de transformação de negócios” (Nitzsche, 2012, p. 41).

76

Aceitando, em 1999, o desafio de um programa de televisão americano, o Nightline – ABC News Nightline, de recriar, um produto tradicional em cinco dias – no caso do programa foi escolhido um carrinho de supermercado12 –, a IDEO aproveitou para mostrar um conceito completamente inovador do papel do design no desenvolvimento de qualquer produto e/ou serviço. Nesse programa de televisão o mundo pode ver pela primeira vez uma proposta de processo criativo onde os designers não ficavam restritos apenas a incorporar um “estilo” no final do processo de desenvolvimento de produto, pois a equipe do Nightline mostrou todo processo de design da IDEO, filmando desde do brainstorming de uma equipe multidisciplinar, a observação da interação do usuário com o produto em questão, a busca pelo feedback dos usuários sobre as opções de designs propostos, até o modelo virtual final do carrinho de compras. No dia seguinte, diversos executivos de todos os tipos de negócios entraram em contato com a empresa em busca desse tipo de criatividade, pois eles apregoaram no programa de televisão, que: “nós não somos especialistas em determinada área de trabalho. Somos meio que especialistas no processo de como se projetam as coisas. Não importa se é uma escova ou um tubo de pasta de dentes, um trator, uma nave espacial, uma cadeira. É tudo a mesma tarefa para nós. Nós descobrimos como inovar aplicando nosso processo” (David Kelley, in: Nitzsche, 2012, p. 42). Segundo Nitzsche (2012, p. 43), nesse início a metodologia apresentada ainda era chamada de DeepDive sendo rebatizada como Design thinking apenas em 2003. Do meu ponto de vista, porém, ela era mais do que uma nova metodologia, finalmente os designers tinham encontrado um meio de demonstrar o que faziam e como faziam. Ao apresentarem na prática toda a complexidade de seu fazer, havia sido criada uma ponte de comunicação entre os empresários e os designers que os modelos até então não haviam conseguido criar. E, subvertendo a ordem vigente até então no processo de P&D, os designers, ou melhor, os design thinkers deixavam de ter que entregar apenas uma encomenda bem realizada. “Como um empreendedor criativo, ele [o design thinker] parte da intenção de gerenciar um processo que resolva um problema existente no negócio do cliente. Por isso ele interage com os diferentes stakeholders da operação para entender as necessidades daquele modelo de negócios e de seus participantes.

12

O

resultado

final

desse

http://www.ideo.com/work/shopping-cart-concept.

processo

pode

ser

visto

no

link

77

[...] Para mergulhar no universo do problema, ele redefine o próprio problema, interpretando-o sob diversas pontos de vista, usando sua criatividade para reescrever o briefing para atingir uma meta além do imaginado inicialmente” (Nitzsche, 2012, p. 42).

3.3

Uma nova proposta de inovação através do design

“As diferenças entre o design e as outras atividades estão não apenas nos resultados que produz [...], como também nos processos mentais e físicos que geram esses resultados” (Neumeier, 2010, p. 37). Segundo Neumeier (2010), os designers acostumados ao mal-estar gerado pelas tensões criativas presentes na elaboração e concretização de projetos, habituaram-se a acolher os paradoxos. Ao contrário do que era apregoado por muitos designers e autores de livros de design, para o autor “os designers não ‘solucionam’ problemas, eles ‘trabalham através’ deles” (Neumeier, 2010, p. 50). Neumeier (2010, p. 52) compara a ação do designer a de um pintor, construindo pincelada após pincelada, uma nova noção de como ficará a tela a cada momento. É um “processo do saber dinâmico” com base em um repertório de ações e reações práticas, combinando em sua reflexão o “pensar” e o “fazer”, onde se aprende o que se faz durante o processo. Para o autor os designers trabalham em um processo de “reflexão em ação” – termo cunhado pelo filósofo de sistemas Donald Shön –, que apenas permitiria com que a pessoa se aproximasse de uma previsibilidade do resultado a ser alcançado no início do processo, tornando assim impossível o uso da lógica da causalidade local. Trabalhando com “o que poderia ser” em vez do com “o que é” (Neumeier, 2010, p. 37), o designer faz uso do pensamento intuitivo, fugindo de um enfoque linear: ação A, depois ação B, C, D, E consecutivamente. “A mente intuitiva reordena os itens como C–B–D–A, e inclui R–K–Z–P, para completar” (Neumeier, 2010, p. 34). Tim Brown, Ceo da IDEO – empresa líder em design e inovação e um dos principais elaboradores de conceitos e práticas do design thinking (Budman, 2010, p.69) –, também afirma que, como designer “[...] temos que confiar tanto em nosso poder de análise como no de síntese. A análise, que significa estudar e compreender o complexo, é muito útil para saber como algo vai funcionar e como você poderá aperfeiçoá-lo ou torná-lo mais eficiente. Mas a análise não é muito boa para produzir novas ideias.

78

Então temos que sintetizar muitas ideias ou conhecimentos concorrentes, mesmo se isso estiver em tensão, para gerar algo que é, de algum modo um todo” (Budman, 2010, p.71). Para compreender esse “complexo”, muitos autores sobre design, e até mesmo os autores do design thinking apregoam a vantagem do uso de equipes multi/pluridisciplinares. “Grandes designers são maravilhosos observadores do mundo. Eles têm a habilidade de observar e perceber realmente o em torno e daí vêm esses saltos de imaginação. Porém muitos de nós não fazem isso natural ou intuitivamente e, quando estamos pensando em lidar com problemas mais complexos do que a forma da próxima cadeira, temos que desenvolver processos ligeiramente mais formais. Mas uma evolução que aconteceu foi a passagem da ideia da etnografia como exercício acadêmico para a pesquisa etnográfica, como algo que você faz dentro de uma organização. Temos pessoas em nossas equipes de design com formação em etnografia/antropologia e em psicologia, bem como gente com treinamento em engenharia e design” (Brown, in: Budman, 2010, p.64). É

preciso,

porém,

se

destacar

que

o

trabalho

em

equipes

multidisciplinares, não é tão simples como esses autores apregoam. Segundo Belbin (in: Baxter, 1998), ao se reunir um grupo de pessoas excepcionalmente inteligentes e criativas e solicitar que eles que eles resolvessem “problemas administrativos em equipe, esse grupo atuou mal, funcionando pior dos outros grupos, constituídos por pessoas menos talentosas. Ele descobriu que esse grupo era muito difícil de ser coordenado, realizava debates muito críticos e pouco construtivos, e era menos capaz de tomar decisões em reação aos outros grupos” (Baxter, 1998, p.106). Johansson (2008) que também apregoa as vantagens da diversidade não apenas em termo de disciplina, mas também em termos de cultura, etnia, geografia, idade e sexo, pois assim se consegue alcançar diferentes pontos de vista, e diferentes abordagens, ressalta, porém que, “reunir simplesmente pessoas de diferentes disciplinas e culturas, com estilos de pensamento variados, valores diferentes e atitudes diversas não é a mesma coisa que formar uma equipe inovadora. Uma dinâmica de grupo problemática básica funcionará contra você, a não ser que o grupo seja gerenciado apropriadamente” (Johansson, 2008, p. 123). Outro ponto importante levantando por Neumeier (2010, p.52) – e que pode também influenciar na dinâmica do grupo multidisciplinar – é o do “pensamento equivocado”, ou como o autor denomina “thinking wrong”, que ele afirma ser cultivado pelos designers mais inovadores que rejeitam a opçãopadrão.

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“Quando a grande inovação aparece, ela quase sempre parece desordenada, incompleta e confusa [...]. Não há esperança para as especulações que, à primeira vista, não soam completamente insanas” (Neumeier, 2010, p.53). Muitas vezes esses pensamentos equivocados podem estar errados, mas ao se procurar a inovação não se pode ficar atado apenas às coisas que dão certo, não se pode ter medo do erro. Afinal, não há como se prever resultados, já que o caminho é traçado durante o caminhar. Como não há modelos a serem seguidos é preciso se desenvolver três capacidades, que segundo Martin (2010, p. 157) são as principais ferramentas dos design thinkers – termo que o autor faz questão de ressaltar que não se restringi apenas aos designers, mas sim a qualquer pessoa predisposta a usar essa metodologia de gestão e de criação de inovações de produtos, experiências e serviços. Essas ferramentas seriam: 1. a observação – para ajudar a ver coisas que os outros não conseguem ver, conseguindo-se assim novos insights; 2. a imaginação – para tentar gerar testes de inferências em loops através dela, imaginando e experimentando o que poderia ser feito para aperfeiçoar aquela ideia e/ou protótipo, apurando os conceitos a cada resultado de teste; e 3. a configuração – para concretizar o insight, obtido pelo pensamento abdutivo, produzindo assim os resultados desejados. Brown (in: Budman, 2010, p.69), costuma esquematizar o trabalho de design thinking em três fases, que poderiam ser comparadas as ferramentas apresentadas por Martin (2010): 1. “inspiração – coleta de insights que começa com a empatia, ou seja com a compreensão de como as pessoas experimentam o mundo física, cognitiva e emocionalmente, e como funcionam os grupos sociais e culturais. [...] 2. idealização – a construção de protótipos é a ideia mestra dessa etapa e deve ser vista como uma maneira de aprender sobre o conceito à medida que se interage com o protótipo. [...] 3. implementação – contando uma história, [...] ajuda-se a desenvolver e expressar uma ideia com maior clareza e, assim, encontrar uma melhor forma de tornar o seu produto tangível para pessoas e envolvê-las em sua proposta” (Budman, 2010, p.71). Brown traduziu esse processo em um “modelo circular” (Quadro 11), apresentado em 2008 em um artigo na Harvard Business Review, que revelava toda a complexidade de um pensamento sistêmico, como é a proposta do design thinking. Dividido em três principais áreas relativas a cada uma das respectivas fases, o modelo à primeira vista é confuso, contrapondo-se aos padrões de

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linearidade e de simplificação do processo, enraizado em nossa cultura de pensamento científico. Atualmente este modelo é apresentado de modo mais simplificado, restringindo-se às setas externas que mostram a relação entre as três respectivas fases, sem a tentativa de exemplificar os movimentos e saltos entre as três áreas/fases que tentam reproduzir a lógica abdutiva do designer.

Quadro 11 - Modelo de Circular para o processo de design thinking da IDEO. (Brown, 2008, p. 88-89)

Com o passar do tempo, foram desenvolvidas diferentes formas de visualização desse processo, como pode ser visto em uma rápida busca pelo Google. Algumas voltaram a linearidade do processo acrescentando novas fases; outras incluem nessa linearidade curvas de feedbacks unindo-as; muitas fazem uso de círculos, setas, hexagramas, todos muito coloridos; Brown criou um novo modelo ilustrado com pessoas, carros, martelos e muitas setas – enfim, todas mostrando que é um processo “desenhado” por um designer, mas que na realidade nada acrescentam ao conceito inicial de Kelley e/ou de Brown.

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3.4

O designer como configurador de objetos13 “Na era industrial tardia em que vivemos - ou, pósindustrial, como preferem alguns – as ramificações do campo do design estendem para além de suas origens no processo de industrialização. [...] A produção flexível acarreta um novo paradigma, radicalmente divergente da produção de massa. O conceito de artesanato – que foi em grande parte, inventado pela sociedade industrial para ser contraposto à ideia de indústria, então nova ainda – começa a perder o sentido. Um cartaz, projetado e impresso em ferramentas digitais, pode ser realizado por uma única pessoa, do começo ao fim, e pode ser produzido por uma única pessoa. Porém seria um disparate chamá-lo de objeto artesanal. No estágio avançado de industrialização que atingimos atualmente, foram superadas as questões historicamente primordiais de produção em série e divisão de tarefas. [...] O velho desafio de situar o design como campo profissional não obedece mais ao procedimento simplificador de dizer o que ele é e não é, então como devemos fazê-lo?” (Cardoso, 2011, p. 237-238). Cardoso (2011) afirma que como o design é uma atividade complexa,

durante muitos anos os designers se definiram através da contraposição àquilo que não são: “designer não é artista, tampouco artesão, arquiteto, engenheiro, estilista, marqueteiro, publicitário, e assim por diante. Em meio a tantas advertências sobre o que [...] não devem ser, esquecem-se muitas vezes de [...] dizer o que, de fato, eles podem vir a ser” (Cardoso, 2011, p. 231). Como a profissão se institucionalizou durante a primeira Revolução Industrial, onde a divisão intensiva de trabalho era uma das principais características (Cardoso, 2005, p.16) era necessário se criar uma distinção entre o design e outras atividades responsáveis pela geração de objetos, e mais diretamente entre os artesão e artistas que detinham uma forma de

“No Novo Dicionário Aurélio, objeto ‘é tudo que é apreendido pelo conhecimento, que não é sujeito do conhecimento’. Também é ‘tudo que é manipulável e/ou manufaturável”. É o mesmo que coisa, peça, artigo. Etimologicamente (objectum) significa ‘lançado contra’, coisa existente fora de nós mesmos, coisa posta diante de nós que tem caráter MATERIAL: tudo que se oferece à vista e afeta os sentidos (Petit Larousse). Os filósofos empregam o termo no sentido do pensado, em oposição ao ser pensante. [...] 13

Em A. Moles, ‘em nossa civilização o objeto é artificial. Não se dirá que uma pedra, uma rama ou uma árvore é um objeto, senão uma coisa. A pedra se converterá em objeto quando ascender à classe de peso para papéis e se lhe coloque uma etiqueta (preço... QUALIDADE...) que faça ingressar no universo social de referência’” (Coelho, 2008, p. 212).

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conhecimento e capacitação muito semelhante a do designer, já que, por razões óbvias, essa distinção frente a engenheiros e técnicos de produção não se fazia necessário. “Design como disciplina é muitas vezes definido, by default, em justaposição com outros campos limítrofes: não é arte, porque ela não pode se tratar apenas de auto expressão; não é arquitetura porque o contexto e a escala são diferentes; não é artesanato porque mexe com ferramentas de produção em massa; não é engenharia porque vai muito além da sólida funcionalidade” (Antonelli et al., 2009, p. 141, livre tradução). “Segundo a conceituação tradicional, a diferença entre design e artesanato reside justamente no fato de que o designer se limita a projetar o objeto para ser fabricado por outras mãos ou, de preferência, por meios mecânicos” (Cardoso, 2005, p.15). Redig (in: Coelho, 2006) aponta ainda outras diferenciações, como por exemplo: 1. “Enquanto o designer busca antes de tudo resolver problemas, atendendo a necessidade da sociedade, o artesão como todo artista, busca, antes de tudo, expressar-se através de suas criações – ainda que eventualmente utilitárias. 2. O artesão produz ele mesmo as peças que cria e as vende, depois de prontas, diretamente para o consumidor, ou o apreciador da obra – geralmente pessoa física – enquanto o designer não produz nem comercializa o produto mas vende, por encomenda, apenas sua idealização (ou projeto) para um terceiro – quase sempre pessoa jurídica – que irá produzir e vender ao consumidor final. 3. O artesão trabalha com determinado tipo de material ou objeto, enquanto os designers se propõem a trabalhar com qualquer tipo de objeto ou material” (Redig, in: Coelho, 2006, p. 169). O mesmo autor ainda levanta o problema da palavra “designer” estar sendo associada na mídia a ceramistas, decoradores, cenógrafos, iluminadores, costureiros, joalheiros, etc. e afirma que o que diferencia um designer industrial de outros “designers” é a metodologia, “porque para resolver problemas – às vezes altamente complexos – os designers precisam de metodologia” (Redig, in: Coelho, 2006, p. 170). Bomfim corrobora essa ideia ao afirmar que, o “design se diferencia de outros processos de configuração, justamente pela fundamentação lógica que pretende, ou seja, o design é essencialmente uma práxis, mas ao contrário da arte e do artesanato, uma práxis que procura seguir princípios de diversas ciências na determinação da figura do objeto” (Bomfim, 1994, p. IV – 16). Já em relação à comparação com a arte, segundo Coelho (2008, p. 18) “a arte seria produto do esforço individual, enquanto o design seria o produto do empreendimento coletivo típico da sociedade industrial”. Durante muito tempo, o

83

design estava acima de “meras” questões estéticas, pois no design “a forma tinha que seguir a função” – “célebre dito modernista atribuído a Louis Sullivan [que] norteou os ideais do design por muitas décadas” (Coelho, 2008, p. 197). O design se formou em cima de ideias fundamentais (Sudjic, 2008), como por exemplo, que: 

o design é uma resposta a uma série de instruções;



os designers buscam solucionar problemas;



o design é essencialmente democrático: aspira à produção em massa e à acessibilidade; e



o design deve ser útil.

E, Löbach (2001) também afirma que os “produtos” do design eram “objetos destinados a cobrir determinadas necessidades e [serem] produzidos de forma idêntica para um grande número de pessoas” (Löbach, 2001, p. 38), enquanto do “produto” da arte é esperado originalidade, singularidade e raridade com afirma Zolberg (2006). Ao artista é permito uma postura de enfrentamento, já que é “a capacidade crítica e de questionamento de um artista que justifica o que ele faz. Para um designer, fazer um objeto crítico é cuspir no prato em que come” (Sudjic, 2008, p.211). “O design é considerado uma atividade que não deve ser comparada com a arte. A arte, supostamente trata de toda uma categoria de coisas diferentes. Uma atividade trata do mundo material, comercial e útil dos objetos produzidos em massa, e a outra de um mundo de ideias mais intangíveis e escorregadio, e da aura do singular e do inútil” (Sudjic, 2008, p.168). Todas essas afirmações, do meu no ponto de vista, precisariam, porém, ser questionadas: Será que essas definições ainda são validas no mundo atual? São essas “não definições” que diferenciam o fazer de um designer? Esses conceitos que se adequavam tão bem ao modelo normativo de produção em massa se adequam ainda a designers que convivem com uma industrialização que caminha rumo a produção flexível? Um designer em um mundo onde a informatização possibilita a fabricação industrial em pequenos lotes e em até mesmo em peças únicas, deixaria de ser designer já que não tem mais as amarras da produção em massa para balizar o seu projetar? “[...] O designer pode sim ser artista, ou artesão, arquiteto engenheiro, estilista, marqueteiro, publicitário ou uma infinidade de outras coisas. A grande importância do design reside, hoje, precisamente em sua capacidade de construir pontes e forjar relações, num mundo cada vez mais esfacelado pela especialização e fragmentação de saberes” (Cardoso, 2011, p. 234).

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Diversos exemplos de designers estão indo atualmente contra essas definições. Sudjic (2008) afirma que na sua visita a feira de Arte de Milão em 2007, “todos os designers que chamavam a atenção na feria estavam fazendo coisas que, à primeira vista são tudo o que o design não é. Estavam criando objetos que não tinham nenhuma relação com a solução de algum problema. Estavam produzindo coisas que eram fundamentalmente inúteis, em números reduzidos e a preços elevadíssimos. Significa que não eram mais designers? Ou seriam designers que mudaram o significado do design em reação a natureza sempre mais efêmera dos objetos produzidos em massa?” (Sudjic, 2008, p.176). O mesmo autor nos mostra que como na teatralidade da moda de passarela, que lança tendências para toda a indústria do vestuário, “o design sem função pode ser um investimento em pesquisa e inovação, da forma como a indústria automobilística usa carros-conceito e a Fórmula 1 explora novas técnicas e novos materiais que mais tarde podem ser aplicados à produção de massa.” (Sudjic, 2008, p.177). E continua afirmando que estes designers são capazes de explorar a produção industrial produzindo objetos ousadamente concebidos feitos para as massas, ao mesmo tempo em que trabalham em peças únicas ou em pequenas séries para o sistema de galerias. Ron Arad, Karim Rashid, Ettore Sottsass, Philippe Starck, os irmãos Campana – como pode ser visto na Figura 3 –, etc. são exemplos desse novo tipo de designer.

Figura 3 – A estética da cadeira vermelha dos Campanas transposta para sapatilhas de plástico da Melissa e joias para a H.Stern (http://ecotece.org.br/blog/2008/10/melissairmaos-campana-em-prol-da-sustentabilidade/ e http://veja.abril.com.br/200601/p_094.html). Acessado em 1/3/2013.

Gostaria ainda de lembrar, que a informatização também cria canais de divulgação e distribuição das criações dos designers através de comunidades e lojas virtuais, permitindo um contato direto entre eles e os consumidores. Com isso lhes é dada uma independência financeira e criativa, uma conquista que escritores, músicos e artistas plásticos alcançaram há muitas décadas atrás, e

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que libertou essas categorias profissionais dos trabalhos de encomenda para os mecenas, a igreja e os órgãos governamentais. Segundo Elias (1995) sempre que acontecem processos sociais como esse, pode-se perceber mudanças específicas no padrão de criação, dando maior liberdade de criação aos criadores, e permitindo-lhes mais espaço para a experimentação e a improvisação autorregulada, individual. Acredito que não existe mais – como, por exemplo, no caso dos designers – problemas para serem resolvidos, o autoquestionamento, o seu gosto particular, suas fantasias e experimentos podem ser materializados, “para, mais cedo ou mais tarde, despertar um eco em outras pessoas através de tais estruturas simbólicas” (Elias, 1995, p.50). “O design passou a ser a linguagem com que se molda os objetos e confecciona as mensagens que eles carregam. O papel dos designers mais sofisticados, hoje, tanto é ser contador de histórias, fazer um design que fale de uma forma que transmita essas mensagens, quanto resolver problemas formais e funcionais” (Sudjic, 2008, p.21). Essas peças entre arte e design são expressão da criatividade liberta de padrões e que nasce da exploração de matérias ou de conceitos prédeterminados de “forma = uso”, como por exemplo, “cadeira = sentar”. “A correspondência estrita entre uma forma e determinado uso (por exemplo, cadeira = sentar) acaba por bitolar o pensamento. Ao pensar a ação de sentar como experiência e não como artefato específico, o projetista se liberta de estruturas pré-existentes e ganha a possibilidade de criar soluções realmente inovadoras” (Cardoso, 2011, p. 124).

Figura 4 - Exemplos de projetos de Ron Arad (Antonelli et al., 2009)

Cardoso (2011) afirma que é o pensamento sistêmico do designer, acostumado a considerar problemas de modo integrado e comunicante, em vez de fracioná-los para reduzir as variáveis e garantir uma reprodutibilidade do processo – como as metodologias científicas apregoam –, que permite que ele atravesse saberes e disciplinas.

86

Acostumados a trabalhar com a expressão estética14 – que, segundo Löbach (2001), é percebida instantaneamente em sua totalidade por todos os sentidos ao mesmo tempo, exercendo certo efeito na percepção do observador – em vez da expressão oral ou escrita que é sequencial – onde os elementos são absorvidos um após o outro para posteriormente se gerar uma visão totalizadora do enunciado –, acredito que o designer sabe, que como o mundo e os objetos não são percebidos fracionadamente não existe, por conseguinte, uma ordem pré-determinada de criação e de percepção um objeto. Essa ordem criada “artificialmente” e difundida nas metodologias projetuais, só engessaram os processos de criação. Ron Arad (in: Antonelli et al., 2009) também defende essa proposta: “’eu não acredito em nenhuma teoria prescritiva, em que as pessoas lhe dizem como as coisas deveriam ser e não deveriam ser‘, e esta perspectiva permite que ele [Ron Arad] permaneça aberto a todos os tipos de empreendimentos, de modo que seu trabalho possa continuar a surpreender” (Antonelli et al., 2009, p. 17, livre tradução). Segundo Novaes e Ripper (in: Coelho, 2006) as interações do objeto com o meio físico e social acabam gerando a desconstrução dos esquemas mentais feitos na fase de idealização do objeto, e é através dessa interação que o novo aparece. Eles podem servir de desencadeadores do processo, mas os métodos “mecânicos, organizados, materializam ideias primordiais, passadas, impedindo a possibilidade de inovação” (Novaes e Ripper, in: Coelho, 2006, p. 140). O designer como configurador de objetos, segundo os mesmos autores, deve sim ter o domínio sobre um determinado tema, mas não pode perder de vista os aspectos gerais, aceitando os processos e métodos em transformação, sem temer a desconstrução das primeiras ideias que funcionam como disparadoras do processo criativo. Eles devem estar “abertos e atentos ao que [os] cerca, com a disponibilidade de receber influências e perceber de que maneira elas podem ser incorporadas a um assunto especifico que esteja sendo estudado. Quando iniciamos um trabalho, tudo o que acontece passa a ser pertinente. Fazemos associações, derivamos o conhecimento. O objeto surge no procedimento recorrente e circular” (Novaes e Ripper, in: Coelho, 2006, p. 138).

14

O conceito estético provém da palavra grega aesthesis e significa algo como percepção sensorial. [...] A definição mais ampla da estética considera-a como: ciência das aparências perceptuais pelos sentidos (por exemplo, estético do objeto), de sua percepção pelos homens (percepção estética e sua importância para os homens como parte de um sistema sociocultural (estética de valor)” Löbach, 2001, p. 156)

87

3.5

Inovação pelo Design versus Design Inovador “A origem imediata da palavra está na língua inglesa, na qual o substantivo design se refere tanto à ideia de plano, desígnio, intenção, quanto a configuração arranjo, estrutura (e não apenas de objetos de fabricação humana, pois é perfeitamente aceitável, em inglês, falar do design do universo ou de uma molécula). A origem mais remota da palavra está no latim designare, verbo que abrange ambos os sentidos, o de designar e o de desenhar. Percebe-se que, do ponto de vista etimológico, o termo já contem nas suas origens uma ambiguidade, uma tensão dinâmica, entre um aspecto abstrato de conceber/ projetar/atribuir e outro concreto de registrar/configurar/ formar” (Cardoso, 2005, p.14) Uma questão que gostaria de levantar, pois considero que não é abordada

nem pelos estudiosos em design, nem pelos os estudiosos em inovação – que já começam a vislumbrar a importância do design nesse processo – é a diferenciação entre “inovação no design” e “design inovador”. Do meu ponto de vista, essa diferenciação se relaciona exatamente com essa tensão entre o aspecto abstrato e o aspecto concreto do design. Como a maioria dos estudos sobre o papel do design na inovação se concentra nesse aspecto abstrato, o termo “design inovador” acabou sendo pouco estudado e, até mesmo, banalizado pela mídia e pela publicidade. Meras diferenciações de produtos através do design são apregoadas como design inovador, como se pode perceber muito claramente no discurso publicitário, como, por exemplo, no lançamento de “novas versões” de carros anualmente. E geram assim uma falta de clareza na definição do termo. Como foi visto anteriormente, a “inovação pelo design”, não precisa se materializar em um objeto. Como o design thinking defende, o designer através de seu modo particular de pensar as coisas pode gerar também inovações de processo ou organizacional, tanto quanto as inovações de produto ou de marketing. O design seria “apenas” mais um instrumento para se alcançar um produto e/ou um serviço inovador, que não precisa aparentar concretamente esse conceito – como aconteceu no exemplo das cerâmicas de Wedgwood descrito anteriormente. Como um instrumento, a “inovação pelo design” obedeceria os conceitos de inovação apresentados no sub capítulo que a borda a inovação sobre a ótica da ciência, como por exemplo:

88



o grau de novidade e de difusão: nova para a empresa, nova para o mercado e nova para o mundo;



as

estratégicas

competitivas:

estratégia

ofensiva,

estratégia

defensiva, estratégia imitativa, estratégia tradicional, estratégia oportunista; 

os conceitos de intensidade: inovação incremental ou inovação radical;



os conceitos de continuidade: inovação disruptiva e inovação sustentável; etc..

Mas se for levado em consideração que um dos papeis principais do design é criar uma comunicação entre o objeto e o usuário, suprindo além de suas

necessidades

práticas,

necessidades

psicológicas

que

dialogam

diretamente com os seus “juízos, crenças, valores, oriundos de experiências anteriores e memórias, assim como de informações obtidas indiretamente” (Cardoso, 2011, p. 116), não se pode esquecer da importância da forma concreta do objeto na mediação de qualquer comunicação entre sujeito e objeto. Para mim, porém, esses conceitos não abordam a questão do que faz um design ser percebido como “inovador” pelo usuário, e considero a busca por esse entendimento relevante, já que atualmente esse é um fator que agrega valor a objetos e produtos. “Na origem de todo de todo artefato, há um projeto. Seu propósito maior é embutir significados aos objetos: codificá-los com valores e informações que poderão ser depreendidos tanto pelo uso quanto pela aparência. Por meio da visualidade, o design é capaz de sugerir atitudes, estimular comportamentos e equacionar problemas complexos” (Cardoso, 2011, p. 116-117). Segundo Löbach (2001) a relação do usuário com qualquer objeto – objetos naturais, natureza modificada como objeto, objetos artísticos ou objetos de uso – não se dá apenas através de sua função prática. No processo de sua percepção, o objeto atua por meio de elementos estéticos de sua aparência (função estética) que remete o usuário a outros objetos e conceitos (função simbólica), como pode ser visto no Quadro 12.

89

Quadro 12 - Classificação das funções de um produto (Löbach, 2001, p. 55).

Do designer é esperado que ele, em razão de seus estudos e experiência profissional, domine as três funções – e no meu entender é isso que o define e o que o diferencia tanto de engenheiros, de artistas ou de artesãos, que lidam com uma ou no máximo duas dessas funções. Segundo Löbach (2001): 





“As funções práticas são todas as relações entre o produto e seus usuários que se situam no nível orgânico-corporal, isto é fisiológicas. A partir daí poderíamos definir: São funções práticas de produtos todos os aspectos fisiológicos de uso” (Löbach, 2001, p. 58). “A função estética é a relação entre um produto e um usuário no nível dos processos sensoriais. A partir daí poderíamos definir: A função estética dos produtos é um aspecto psicológico da percepção sensorial durante o seu uso” (Löbach, 2001, p. 59-60). “Um objeto tem função simbólica quando a espiritualidade do homem é estimulada pela percepção deste objeto, ao estabelecer ligações com suas experiências e sensações anteriores. A partir daí podemos definir: A função simbólica dos produtos é determinada por todos os aspectos espirituais, psíquicos e sociais de uso” (Löbach, 2001, p. 64).

Como muitas vezes as funções práticas não são muito diferentes entre os concorrentes – ou, no caso de produtos tecnológicos, não são muito transparentes para os usuários – são as funções estéticas e simbólicas que determinam a compra de um produto. “A função estética é muitas vezes mais atuante no ato da compra que as funções práticas de um produto industrial, as quais só serão percebidas, na maioria das vezes, quando se chega em casa. A função estética é percebida imediatamente e, muitas vezes é o fator que deflagra a compra. A configuração consciente de produtos estimula a percepção do comprador e aumenta as chances de venda para o fabricante” (Löbach, 2001, p. 63-64).

90

A configuração de objetos é, portanto, fator determinante na percepção de um produto como inovador. Segundo Cardoso (2011, p. 125), os objetos “possuem duas dimensões: sua configuração material e sua capacidade de mediar relações – ou seja, a grosso modo, a dimensão formal e informacional”, dando assim ao design uma característica de linguagem. “Um produto pode trazer mensagens para o mercado de várias formas e o seu estilo é apenas uma delas, enquanto que a funcionalidade de um produto pode satisfazer as necessidades operacionais do usuário, os significados desse produto satisfazem as suas necessidades emocionais e sócio-culturais. Inovação radical guiada pelo design [radical design-driven innovation] é definida por Verganti (2003) como uma inovação onde as novidades do significado e da linguagem do design prevalece em comparação com as novidades funcionais e tecnológicas”. Sinais de produtos e linguagens, tais como materiais, cores, tratamentos de superfície, etc, podem ser usados por empresas e designers para introduzir inovações semânticas” (Dell’Era e Verganti, 2009, p.2, livre tradução). Verganti (2006) foi um dos primeiros autores que se trouxeram para os estudos de inovação uma preocupação em tratar desse lado concreto do design, que ele denominou de inovações guiadas pelo design (design-driven innovation15). Para o autor as inovações guiadas pelo design, também se apresentam em intensidades diferentes. Exatamente como na inovação, onde a intensidade das mudanças geradas no produto – radical ou incremental – dependem do momento em que o produto se encontra em seu ciclo de vida tecnológico, “o ciclo de vida nos estágios de crescimento, de maturidade e de rejuvenescimento do produto poderão alertar a empresa para a necessidade de reação através do design” (Magalhães, 1997, p.36), como pode ser visto no Quadro 13. O “design inovador” seria a forma de inovação radical das inovações guiadas pelo design.

15 “A inovação radical de significado não vem de abordagens centradas no usuário. Se a Nintendo tivesse apenas observado, atentamente, adolescentes usando os videogames existentes, esta provavelmente teria apenas melhorado os equipamentos tradicionais dos jogos, permitindo aos usuários uma melhor imersão em um mundo virtual, ao invés de redefinir o que é um videogame. Inovação centrada no usuário não questiona os significados existentes, mas sim, os reforça, graças a seus poderosos métodos. Inovações guiadas pelo design são, na verdade, propostas, que contudo, não são sonhos sem fundamento. Acabam sendo o que as pessoas estavam esperando. Frequentemente as pessoas se apaixonam por produtos com novos significados e não por aqueles desenvolvidos com base em pesquisa de necessidades dos consumidores” (Verganti, 2012).

91

Quadro 13 - Casos de desenvolvimento de produtos nos estágios de um ciclo de vida genérico (Kotler (1990), in: Magalhães, 1997, p.37)

“Por exemplo, o primeiro Swatch, lançado em 1983, foi uma inovação radical do ponto de vista da linguagem. O Swatch transformou a associação de relógios a joias ou instrumentos tempo em acessórios de moda (Glasmeier, 1991). A adoção de uma linguagem de design caracterizada pelo uso intensivo do material plástico e estilo colorido adicionado a um preço mais baixo ajudou a difundir essa nova interpretação no mercado. Cada coleção – e são algumas por ano – pode ser considerada uma inovação incremental, pois adapta o significado original do produto, introduzindo alterações estéticas de acordo com a evolução de novos modelos socioculturais e paradigmas estéticos” (Dell’Era e Verganti, 2007, p. 584, livre tradução). Segundo os mesmos autores, mais do que nunca, é o diálogo que o produto estabelece com o usuário através de sua natureza simbólica emanada pelo seu design que os definem no mercado. Por exemplo, o iMac da Apple lançado em 1998 transformou os computadores em uma peça de mobiliário pela escolha do material (plástico translúcido) e pelo uso de cores vibrantes. Seu design foi uma inovação do ponto de vista estético em comparação com o arquétipo comum de computador pessoal (Figura 5). Considero o iMac um exemplo inegável de “design inovador”, pois ele acabou se tornando posteriormente um arquétipo em design, já que “fabricantes de tudo, de calculadoras de bolso a equipamentos de áudio, começaram a apresentar produtos de plástico transparente arredondado e de cores cítricas” (Sudjic, 2008, p. 88).

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Figura 5 - A estética do computador da IBM e da Apple iMac (1998) (Dell’Era e Verganti, 2007, p.582)

O design acaba se utilizando do mesmo repertório e códigos existentes nas em todas as linguagens visuais e sensórias, tanto apresentadas na natureza quando nas artes visuais e utilitárias. Como a linguagem do design se “expressa por forma, cor, textura e imagem de um objeto, há constantes paradoxos entre função e simbolismo a ser considerados” (Sudjic, 2008, p 34). “Embora só de vez em quando se torne marco duradouro ao instituir um novo arquétipo, a obra de um designer quase sempre se baseia na exploração e manipulação de arquétipos existentes. Uma vez criado, um arquétipo fica na nossa memória, uma recordação pronta para ser usada novamente, as vezes de formas muito diretas” (Sudjic, 2008, p 80). Para trabalhar com esses códigos, os designers precisam conhecê-los. Mas como Cardoso (2011) nos lembra, eles são dinâmicos, já que seus significados só existem dentro de um sistema maior de significação, gerados através de uma complexa inter-relação de visão, tato e movimento, com sentimentos e lembranças individuais, além dos conceitos e padrões de grupos sociais, locais, de geração, etc. por exemplo o significado das cores branco e preto no ocidente e no oriente são diametralmente opostas, podendo gerar significados diversos para o mesmo objeto na diferentes regiões do globo. Para moldar a linguagem dos objetos e confeccionar as mensagens que eles carregam, “o papel dos designers [...] hoje, tanto é ser contadores de histórias, fazer um design que fale de uma forma que transmita essas mensagens, quanto resolver problemas formais e funcionais” (Sudjic, 2008, p. 21). Mesmo que o “design inovador” muitas vezes não signifique um retorno financeiro imediato em razão do tempo que as grandes massas de consumidores possam vir a levar para vencerem o estranhamento inicial que sua proposta estética pode vir a gerar, é preciso se destacar que isso não quer dizer que o “design inovador” traga apenas recompensas emocionais e de auto expressão para o designer. Segundo Verganti (2006), que estudou as estratégias de

93

inovação orientadas para o design das empresas do norte da Itália organizadas em um tipo de cluster de design, “produtos que são radicalmente inovadores allo Milano tendem a ter ciclo de vida comercial maior do que outros bens, criam no consumidor expectativas mais ousadas para a marca e uma igual receptividade aos [produtos] que o sucedem, e eles tendem a ser beneficiados por margens de lucro elevadas, especialmente, por serem diferentes das ofertas dos concorrentes” (Verganti, 2006, p. 116, livre tradução). Como já acontece na prática nos museus, galerias e coleções dedicadas ao design seguindo os moldes das artes plásticas, a definição do que é “design inovador” – e nesse momento assumo um caráter opinativo, baseada tanto em minha pesquisa sobre o assunto, quanto na minha experiência como designer de joias com criações selecionadas em diversos concursos – deveria ser considerada a que se equivale a das artes através as rupturas estéticas, da busca de novas formas, novas técnicas, novos materiais. O “design inovador” seria aquele que constitui um valioso patrimônio da experiência estética, marcando a ampliação dos limites da expressão estética e o aumento do acervo de sua linguagem, como os padrões que Gullar (2006) defende em relação às artes. Ou seja, como Cardoso (2011), afirma “um [...] valor característicos do bom design é a inventividade de linguagem. Todo o trabalho de design envolve o emprego e a conjunção de linguagens, geralmente de ordem visual e/ou plástica. Os melhores projetos são aqueles que usam essas linguagens de modo criativo e inovador” (Cardoso, 2011, p.244-245). Antes, porém, de tentar investigar como se cria esse “design inovador”, gostaria de abordar no capítulo seguinte a questão da transdisciplinaridade no design, pois acredito que é através de suas teorias e conceitos que se poderá entender melhor a questão da inovação nesta área que pretende pertencer ao campo da “arte-científica”, unindo modos tão dispares de se perceber o mundo.

94

4 Design e Transdisciplinaridade

“O elo estabelecido pelo design entre a criação e a tecnologia nos permite este pensar integrado, interrelacionado, permite a convivência interdisciplinar e aponta a abrangência transdisciplinar no sentido de derrubar barreiras, diluir fronteiras, fundir, hibridizar, tornar-se outro. São essas relações complexas que explicam a diversidade e as dúvidas com respeito à área de atuação” (Moura e Gusmão, 2008, p. 24).

Buscando construir um arcabouço teórico, os pesquisadores em design vêm “usando uma ampla variedade de perspectivas vindas de um largo número de culturas disciplinares e subdisciplinares” (Love, 2009). Como Bomfim (1997) afirma, “este conjunto de ciências empregadas na fundamentação do design caracteriza-o como atividade interdisciplinar. Deste modo, uma Teoria do Design, se possível, provavelmente também não se enquadraria em nenhum dos grupos clássicos da ciência, ou seja, deveria ser igualmente interdisciplinar ou transdisciplinar” (Bomfim, 1997, p. 29). Couto (1997) também fala da natureza e da vocação interdisciplinar do design, e de como ela tem povoado o discurso daqueles – tanto no âmbito do exercício da práxis, quanto dos acadêmicos em design – que entendem a área como propicia para trabalhar em conjunto com outras áreas de conhecimento. Segundo a mesma autora, o design muitas vezes se debruça sobre problemas complexos e não estruturados, dificultando que os pensamentos e tomadas de decisões durante um projeto de design se dê através de um processo linear simples. Além disso, os problemas tratados pelos designers muitas vezes não permitem, na prática, qualquer análise e sínteses lineares. Moura e Gusmão (2008), completam essa ideia afirmando que “O Design é uma atividade interdisciplinar que aponta e possibilita relações transdisciplinares e que se fundamenta no estabelecimento de um trânsito de relações com todas as áreas do conhecimento humano. Por este motivo, além da amplitude deste campo, a sua área de ação é extremamente fértil, aberta a diversas relações que se constroem a partir do exercício de criação no desenvolvimento de novas ou diferentes propostas e questionamentos, principalmente quando consideramos a contemporaneidade” (Moura e Gusmão, 2008, p. 13)

95

Bomfim (1997) expande essa ideia ao afirmar que como o design não possui um campo fixo de conhecimento, seja ele linear-vertical (disciplinar), ou linear horizontal (interdisciplinar), a teoria do design seria instável, e provavelmente, teria uma constituição transdisciplinar, que se move entre disciplinas tradicionais, para buscar as informações necessárias conforme a natureza do problema tratado (Quadro 14).

Quadro 14 - Teoria transdisciplinar do design (Bomfim, 1997, p. 40-41)

Contudo para o mesmo autor a transdisciplinaridade não seria a conquistada por uma só pessoa, pois ela não era domínio de um indivíduo, se desenvolvendo através de processos dialógicos entre os participantes envolvidos nas diferentes situações do projeto. Stein (2007), porém, afirma que o indivíduo não pode ser esquecido ao se abordar o tema da inter e da transdisciplinaridade, pois “as competências de grupos são construídas a partir das várias competências das pessoas, mas os níveis não são correlativos, por exemplo, um grupo de pessoas multidisciplinares não precisa ser formar necessariamente um grupo multidisciplinar; um grupo transdisciplinar não é necessariamente preenchido com pessoas transdisciplinares” (Stein, 2007, p. 98, livre tradução). É preciso se entender como os processos se desencadeiam nas relações dentro de um grupo e como eles se processam em relação ao indivíduo. E em razão disso o Stein (2007, p. 98-99) apresenta uma taxonomia hierárquica transversal de formas de investigação diferenciando as competências em indivíduos e em grupos em culturas disciplinar, multidisciplinar, transversal, interdisciplinar e transdisciplinar. No Quadro 15 destaco apenas as duas últimas que são relevantes para esta discussão.

96

Forma de inquirir Interdisciplinar

Transdisciplinar

Competências em pessoas Nível exigido de desenvolvimento cognitivo: princípios únicos Indivíduos demonstram pelo menos duas competências. Uma delas é a primária, mas eles são capazes de empregar conceitos e metodologias de outra disciplina suficientemente bem para contribuir com as questões e os resultados, resultando em novos entendimentos da disciplina primária. Nível exigido de desenvolvimento cognitivo: além de princípios únicos Indivíduos demonstram pelo menos duas competências disciplinares, sem que nenhuma das quais seja a principal. Ambas competências trabalham e contribuem uma com a outra, e geram resultados originais, concepções e artefatos, como resultado de uma emergente perspectiva transdisciplinar. Eles são capazes de se comunicar com indivíduos de diversas disciplinas numa maneira sinótica, ou seja que permite ver um conjunto de uma só vez e em que é dada uma visão geral do todo.

Competências em grupos O grupo engloba pelo menos dois subgrupos de disciplinas, com um dele assumindo sua direção em razão de sua expertise. É capaz de resolver problemas que não podem ser abordados por qualquer disciplina, tipicamente um modo focado no problema.

O grupo engloba pelo menos dois subgrupos de disciplinas, nenhum dos quais assume um papel principal. Produz tanto conhecimentos focados no problema quanto sinóticos, que não podem ser reduzidos por nenhuma das competências dos subgrupos. É capaz de gerar novas disciplinas, e reformar as já existentes a partir da emersão de novas perspectivas.

Quadro 15- Diferenças na forma de inquirir entre inter e transdisciplinar (baseado em Stein, 2007, p. 98-99, livre tradução)

A partir dessa taxonomia de Stein (2007), Dykes et al. (2009) sugerem um novo enquadramento disciplinar para a prática de design, que classificaria tanto o trabalho individual de designers, quanto ajuda na compreensão da dinâmica do trabalho em grupo nas equipes de projeto: 

design disciplinar: envolve o trabalho dentro de um domínio singular específico, usando um conjunto de métodos e cumprindo os conceitos de uma disciplina design, e o designer será um especialista dentro de um dessas disciplinas, por exemplo, design industrial, design gráfico, etc.;



design multidisciplinar: um grupo multidisciplinar composto por indivíduos de diversas disciplinas que se comunicam entre si, envolvendo consultores externos à área do design para a execução do projeto;



design transversal: envolve uma disciplina de design que requer o conhecimento de outro domínio - o designer tem experiência buscando o conhecimento de outro domínio - para resolver os problemas relevantes para o projeto, diferindo-se do design

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multidisciplinar através da colaboração construtiva, que vai além da comunicação entre as disciplinas buscando envolvimento da intersecção ativa das partes; 

design interdisciplinar: conterá pelo menos duas disciplinas diferentes com a predominância de uma delas, e o designer interdisciplinar demonstra conhecimento especializado em mais de um campo, com a capacidade de combinar os métodos e conceitos de cada um deles como expert, como por exemplo designers que projetam através de tecnologia CAD-CAM;



design transdisciplinar: envolve conhecimentos ou conceitos a partir de pelo menos duas disciplinas em que nenhuma delas assuma a predominância. Este trabalho será inovador, constituindo novos conhecimentos, conceitos e objetos, e vai significar um novo tipo de prática, que é uma combinação de conhecimentos disciplinares fundidos para criar uma forma híbrida recém-unificada.

Como pode ser visto, para Dykes et al. (2009) o design transdisciplinar está ligado a inovação por combinar e fundir em uma forma híbrida conhecimentos de duas ou mais disciplinas. Acredito,

porém,

que

esta

relação

entre

design,

inovação

e

transdisciplinaridade engloba outros pontos além do apresentado por Dykes et al. (2009). Por isso, para conseguir se aprofundar nessa a relação do design com a inovação através da transdisciplinaridade, no próximo subcapítulo irá se debruçar mais detalhadamente sobre a teoria da transdisciplinaridade.

4.1

A teoria da transdisciplinaridade “É preciso substituir um pensamento que isola e separa por um pensamento que distingue e une. É preciso substituir um pensamento disjuntivo e redutor por um pensamento complexo, no sentido originário do termo complexus: o que é tecido junto” (Morin, 2003, p. 89). Como foi citado anteriormente, as habilidades do designer e sua visão

holística como solucionador de problemas e gerador de ideias com uma orientação mais inovadora que o tradicional processo de P&D vem sendo apregoada como uma tendência no mundo empresarial, principalmente em razão de metodologias como o design thinking. Trabalhando através da empatia,

98

intuição, imaginação e idealismo (Neumeier, 2010, p. 33) o designer se aproxima de questões e problemas através de processos mentais diferentes dos de outras atividades. Segundo o mesmo autor, enquanto os profissionais de outras atividades são treinados para atuarem dentro da realidade – “o que é” –, os designers se preocupam também com uma visão – “o que poderia ser”. “Roger Martin, diretor da Faculdade de Administração Rotman da Universidade de Toronto, refletiu sobre as diferenças entre o raciocínio para negócios e o raciocínio para design. No tocante aos negócios, Martin menciona o raciocínio indutivo (fundamentado na observação de que algo funciona) e o raciocínio dedutivo (baseado na prova de que algo existe). Em relação ao design, ele cita o raciocínio ‘abdutivo’ (que imagina que algo poderia existir)” (Neumeier, 2010, p. 39). Segundo Martin (2010, p. 62-63), Peirce acreditava que as novas ideias “não surgiam das formas convencionais da lógica declarativa”, que engloba os modos fundamentados na tradição científica, que seriam: 

a lógica dedutiva – que prevê o que deve ser, através de conclusões tiradas do geral para o específico, e



a lógica indutiva – que conclui o que é pertinente e/ou eficiente, a partir de observações do específico para o geral.

Como esses dois modos de pensar se utilizam de dados do passado para gerarem as suas comprovações, eles “são perfeitos para tarefas de natureza ‘algorítmica’, que têm formulas conhecidas” (Neumeier, 2010, p. 39). Mas quando as tarefas não são governadas por regras pré-definidas, como é o caso no surgimento de novas ideias, esses dois modos de pensar podem induzir a erros que não se baseiam nos cálculos, mas sim nos parâmetros definidos para os mesmos criados a partir de realidades não mais vigentes. “As novas ideias, postulou Peirce, nascem por meio dos ‘saltos lógicos da mente’. As novas ideias surgiram quando o pensador observou dados (ou até mesmo um único dado) que não se encaixavam no modelo ou nos modelos existentes. O pensador tentou entender a observação fazendo o que Peirce chamou de ‘inferência da melhor explicação’” (in: Martin, 2010, p.63). É exatamente essa ‘inferência da melhor explicação’, que faz com o designer transite em diversas áreas de conhecimento para encontrar respostas a seus questionamentos, que aproxima, no meu ponto de vista, o design a uma nova metodologia de conhecimento que amplia o pensamento disciplinar: a “teoria da transdisciplinaridade”. “A transdisciplinaridade se interessa pela dinâmica gerada pela ação de vários níveis de Realidade ao mesmo tempo. A descoberta desta dinâmica passa necessariamente pelo conhecimento disciplinar. Embora a transdisciplinaridade não seja uma nova disciplina, nem uma nova

99

hiperdisciplina, alimenta-se da pesquisa disciplinar que, por sua vez, é iluminada de maneira nova e fecunda pelo conhecimento transdisciplinar. Neste sentido, as pesquisas disciplinares e transdisciplinares não são antagonistas, mas complementares” (Nicolescu et al., 2000, p. 16). Antes de se aprofundar no conceito da transdisciplinaridade, é preciso entender que “a disciplina é uma categoria organizadora dentro do conhecimento científico; ela institui a divisão e especialização do trabalho e responde à diversidade das áreas que as ciências abrangem” (Morin, 2003, p. 105). O mesmo autor destaca que foi com a formação das universidades modernas no século XIX, que a organização disciplinar foi instituída, mostrando que antes dessa época as pessoas não pensavam de um modo que: ignora o individual, o singular e o concreto (real). Graças a sua criação, começou-se a construir circunscrições que permitem que o conhecimento de uma área de competência se torne tangível. Com isso, além da fronteira disciplinar, acaba se criando também uma linguagem e conceitos próprios daquela disciplina que isolam os objetos a serem estudados e “proíbem” qualquer incursão estranha em sua parcela de saber. A complexidade e as incertezas do nosso mundo atual, e também nos processos de inovação, com cita Maculan (in: CGEE, 2010, p. 174), está sempre presente, relacionada à geração e troca de conhecimentos, à alocação de recursos materiais e humanos, às especificidades das interações, etc. Com isso, a necessidade por uma reforma de pensamento começa a ser percebida com uma necessidade para se conseguir criar novos enquadramentos teóricos e metodológicos

para

se

avançar

nos

conhecimentos

sobre

os

temas

tradicionalmente ligados à lógica clássica. “O pensamento que une substituirá a causalidade linear e a unidirecionalidade por uma causalidade em círculo e multireferencial; corrigirá a rigidez da lógica clássica pelo diálogo capaz de conceber noções ao mesmo tempo complementares e antagonistas, e completará o conhecimento da integração das partes em um todo, pelo reconhecimento da integração do todo no interior das partes” (Morin, 2003, p. 92-93). Esse novo modo foi inicialmente chamado de interdisciplinar. Mas, segundo Paviani (2003, p.1), em razão do “uso indiscriminado do termo no ensino, na pesquisa, no exercício profissional, nos meios de comunicação, nos congressos ou seminários, nos subtítulos de obras científicas” gerou-se uma multiplicidade de significados, que acabaram resultando na falta de um significado comum aceito pela comunidade de professores e pesquisadores. Tentando criar diferenciações para os conceitos foram surgindo acréscimo

100

através dos prefixos pluri ou multi, inter e trans, que acabou gerando uma confusão entre os respectivos termos. Por isso, antes de se apresentar a metodologia da transdisciplinaridade proposta por Nicolescu (Nicolescu et al., 2000) é importante realizar uma distinção entre os mesmos, já que a transdisciplinaridade pode se apresentar em diferentes

graus,

se

aproximando

mais

da

interdisciplinaridade,

da

multidisciplinaridade ou até mesmo da disciplinaridade. Para Nicolescu (Nicolescu et al., 2000), 

 

“a pluridisciplinaridade/multidisciplinaridade diz respeito ao estudo de um objeto de uma mesma e única disciplina por várias disciplinas ao mesmo tempo. [...] O objeto sairá assim enriquecido pelo cruzamento de várias disciplinas, [...] mas sua finalidade continua inscrita a estrutura da pesquisa disciplinar; a interdisciplinaridade [...] diz respeito à transferência de métodos de uma disciplina para a outra, [...] mas sua finalidade também permanece inscrita na pesquisa disciplinar; a transdisciplinaridade, como o prefixo trans indica, diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das disciplinas e além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, para o qual um dos imperativos é a unidade dos conhecimentos” (Nicolescu et al., 2000. p.14-15).

Iribarry (2003) afirma que na transdisciplinaridade não existe o domínio de uma disciplina, ela tem “como ambição a unificação, em suas diferenças, do objeto e do sujeito: o sujeito conhecedor faz parte integrante da natureza e do conhecimento” (Iribarry, 2003, p.486). Morin (2003) ainda levanta a questão de que esses termos ainda são difíceis de definir por serem imprecisos e polissêmicos: “A interdisciplinaridade pode significar, pura e simplesmente, que diferentes disciplinas são colocadas em volta de uma mesma mesa, como diferentes nações se posicionam na ONU, sem fazerem nada além de afirmar, cada qual, seus próprios direitos nacionais e suas próprias soberanias em relação a invasões do vizinho. Mas interdisciplinaridade pode significar também troca e cooperação, o que faz com que a interdisciplinaridade possa a ser alguma coisa orgânica. A multidisciplinaridade constitui uma associação de disciplinas, por conta de um projeto ou de um objeto que lhes sejam comuns; as disciplinas ora são convocadas como técnicos especializados para resolver tal ou qual problema; ora, ao contrário, estão em completa interação para conceber esse objeto e esse projeto [...]. No que concerne à transdisciplinaridade, trata-se frequentemente de esquemas cognitivos que podem atravessar as disciplinas [..]” (Morin, 2003, p. 115). Segundo o Nicolescu (Nicolescu et al., 2000), a metodologia da transdisciplinaridade se baseia em 3 pilares: i. a física quântica e os níveis de realidade, ii. a complexidade, e iii. a lógica do terceiro incluído.

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As pesquisas ligadas à física quântica, que se iniciaram com a descoberta de Max Planck no começo do século XX, colocaram em questão conceitos – ou pilares como Morin (2007) os denominou – sobre o qual o mundo científico repousava deste da época de Aristóteles:   

“o primeiro pilar era a ordem, a regularidade, a constância e sobretudo o determinismo absoluto. [...]; o segundo pilar era a separabilidade. [...]; o terceiro pilar era o valor de prova absoluta fornecida pela indução e pela dedução, e pelos princípios aristotélicos que estabelecem a unidade da identidade e a recusa da contradição” (Morin, 2007, p. 60-61).

A desconstrução dessas verdades absolutas iniciou-se com o testemunho da descontinuidade no campo da física, já que uma partícula quântica poderia aparecer em qualquer lugar não previsto tornado impossível se traçar uma trajetória pré-determinada, e por consequência, abalando a primazia do conceito de causalidade local como se conhece no mundo percebido pelo “observável pelo ato de medir” – a macro física. A esse conceito se uniu um segundo, o da não separabilidade, que apontava que no mundo quântico objetos, que no mundo da macro física não interagiriam mais entre si em razão da distância, continuam a interagir entre si qualquer que seja o seu afastamento, mostrando que existe uma causalidade global, que engloba um sistema de todas as entidades físicas em um único conjunto. Segundo Nicolescu (Nicolescu et al., 2000, p.19), “a existência de correlações não locais expande o campo da verdade, da Realidade”. O autor frisa que o termo realidade, deve ser entendido por “aquilo que resiste às nossas experiências,

representações,

descrições,

imagens

ou

formalizações

matemáticas” (Nicolescu et al., 2000, p. 21). Random (in: Nicolescu et al., 2000, p. 116 e p. 119) divide essa realidade em três níveis distintos: 

o mundo racional, associado ao mundo “observável” do espaço e tempo contínuos;



o mundo do vibratório ou quântico, associado à não separabilidade;



e, o mundo subquântico, que o autor associa à autoconsciência da partícula e a unicidade instantânea de todas as coisas; o cósmico, a união do visível com o invisível – ou seja à causalidade global.

Goswami (2012) exemplifica de um modo mais claro para leigos, no qual eu me incluo, o que são os saltos quânticos.

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“Desde seus primeiros passos a física quântica foi reconhecida e identificada pela implicação de movimentos descontínuos para os quais não há nenhum algoritmo. Quando um elétron pula de uma órbita atômica para a outra, seu movimento é descontínuo; ele jamais atravessa o espaço interveniente (Figura [5]). A isso chamamos “salto quântico”. Você pode se imaginar pulando de um meio-fio para a rua sem passar pelo espaço que há entre eles? Não obstante é o que fazem os elétrons. E se há muitas órbitas disponíveis, não conseguimos predizer para qual órbita o elétron pulará. Tampouco podemos dizer quando ele vai pular. Podemos falar apenas em probabilidades. Não havendo um algoritmo completo – um determinismo completo – no mundo quântico, abre-se uma janela para a verdadeira criatividade, para o verdadeiro novo” (Goswami, 2012, p 46-47).

Figura 6 - O salto quântico – a luz é emitida somente quando o elétron salta descontinuamente (o que é denominado por “pulo”) de uma órbita para uma órbita inferior. As órbitas atômicas podem ser pensadas como degraus de uma escada quântica. O elétron pula de uma órbita superior e aparece em uma inferior, e o faz de maneira descontinua (Goswami, 2012, p.47).

O mesmo autor ainda destaca que o salto quântico cria uma nova visão do mundo, já que antes de se detectar o lugar para aonde o elétron saltou, existe uma onda de possibilidades, e que o “nosso olhar (a mensuração) entra em colapso com sua onda de possibilidades, provocando um único acontecimento” (Goswami, 2012, p 49). Portanto segundo o autor o “nosso” olhar muda as coisas, pois a partir da mesma onda vários acontecimentos ligados a olhares diversos podem ser gerados. Pelo menos a nível dos elétrons e de todos os objetos submicroscópicos, já que no macro mundo – mundo em que vivemos – as leis newtonianas, que possibilita o determinismo, são as que reinam. “Isto é abarcado pelo princípio de correspondência inerente à matemática quântica: para massas maiores, o comportamento quântico tende a se aproximar do comportamento clássico. Primeiro, as moléculas de objetos muito maciços são mantidas juntas por forças coesivas, para que não haja a menor possibilidade de escaparem; elas fazem suas ondulações mantendo-se firmes em seu lugar, como ondas sonoras em uma corda de guitarra. Além disso, a matemática quântica é construída de tal forma que, para objetos macro maciços com um todo, o espectro de possibilidades seja limitado” (Goswami, 2012, p 49-50).

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É preciso ressaltar, porém, que “a ‘observação’ a que os físicos se referem quando falam de fenômenos quânticos não requer uma mente consciente. No sentido quântico, a observação não requer um observador” (Bezerra, 2013, p. 95). Qualquer interação irreversível entre objetos inanimados – até mesmo um grão de poeira cósmica que brilhe ao ser atingido por uma partícula de luz – mesmo que ninguém esteja olhando é considerada uma “observação”. Assim sendo, como não é preciso um “observador consciente” para que o fenômeno aconteça, a consciência do observador “não teria como ‘escolher’ o resultado final da observação que é sempre aleatório” (Bezerra, 2013, p. 102). “Veja só quanta diferença se comparado ao panorama determinístico da Física clássica! No universo de Newton, partículas ou planetas têm suas trajetórias cuidadosamente definidas, sem espaço para dúvidas. As incertezas que existem são resultados da imprecisão de nossos instrumentos ou da falta de perícia do experimentador. No universo quântico, não. As imprecisões e incertezas são parte intrínseca da natureza, e precisão instrumental alguma poderá eliminá-las. Além disso, Bohr sugeriu que sequer fazia sentido dizer que ‘o elétron estava realmente na posição x’. Antes de realizar uma medida, o elétron simplesmente não está em lugar nenhum que se possa definir” (Bezerra, 2013, p. 76). Goswami (2012) lembra que a nossa consciência se utiliza de matéria densa e mundos sutis. Eu acrescentaria que, treinada para “seguir” a linearidade e o determinismo newtoniano, nossa mente só alcança os saltos quânticos no mundo das ideias quando no nosso inconsciente surgem os insights. Mas, se libertada desta lógica, nossa mente teria a possibilidade de realizar mais saltos quânticos – que podem ser traduzidos também por saltos criativos –, já que não sendo de matéria densa, não existem as forças coesivas que prenderiam as ideias à linearidade e a causalidade. Bohr (2008) entende que o abandono dessas ideias traz grande impacto sobre os esforços de conhecimento em todas as áreas, já que os fundamentos filosóficos da física acabaram sendo estendidos a toda a ciência, pois colocava em questão o próprio ato de conhecer definido na tradição clássica. Como o autor afirma, a indivisibilidade dos fenômenos quânticos em relação à localização espaço-temporal impossibilita que qualquer experimento possa ser repetido de modo “não ambíguo”, como a ciência – inclusive as humanas – prega. E isso “implica a impossibilidade de qualquer de qualquer separação nítida entre o comportamento dos objetos atômicos e a interação com os instrumentos de medida que servem para definir as condições que os fenômenos aparecem. De fato, a individualidade dos efeitos quânticos típicos encontra

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expressão apropriada no fato de que qualquer tentativa de subdividir os fenômenos exige uma mudança do arranjo experimental, introduzindo novas possibilidades de interação entre os objetos e os instrumentos de medida, as quais, em princípio, não podem ser controladas. Consequentemente, os dados obtidos em diferentes condições experimentais não podem ser compreendidos dentro de um quadro único, mas devem ser considerados complementares, no sentido de que só a totalidade dos fenômenos esgota as informações possíveis sobre os objetos” (Bohr, 2008, p. 51). Mas mesmo que essas mudanças descobertas pela física quântica remontem a primeira metade do século passado, como o arcabouço conceitual característico da física clássica dominou a mente humana ao longo dos últimos 3 séculos e se tornou “um meio lógico de compreendermos vastos campos da experiência” (Bohr, 2008, p. 100), ainda hoje vemos que a maioria das disciplinas buscam se “enquadrar” dentro dessa matriz de pensamento clássica, onde dados divergentes não são percebidos como complementares, mas deixam as pessoas “perdidas” como no exemplo comentado por Ling (2013) das “opiniões contraditórias” a respeito do design thinking. “O aspecto principal a reconhecer é que todo o conhecimento se apresenta dentro de um arcabouço conceitual adaptado para explicar a experiência prévia, e que qualquer referencial desse tipo pode revelar-se estreito demais para abranger novas experiências. A pesquisa científica, em muitos campos de conhecimento, de fato comprovou reiteradamente a necessidade de abandonar ou remodelar pontos de vista que, por sua fecundidade e sua aplicabilidade aparentemente irrestrita, eram indispensáveis à explicação racional” (Bohr, 2008, p.85). Bohr (2008) comenta que como qualquer afastamento radical da explicação costumeira, a física quântica encontrou mesmo entre muitos físicos e filósofos, principalmente em razão da renúncia a ideia de determinismo causal, um campo fértil para dúvidas. Einstein, por exemplo, afirmou que a descrição quântica seria meramente um meio de explicar o comportamento médio de um grande número de sistemas atômicos e não uma descrição exaustiva dos fenômenos individuais, afirmando que era possível se acreditar nisso, “mas é tão sumariamente contrário a meu instinto científico, que não posso renunciar à busca de uma concepção mais completa” (Bohr, 2008, p. 76). Domingues (2001) afirma que esse princípio da complementaridade para se tentar esgotar um objeto que não pode ser compreendido dentro de um quadro único, inaugura a reflexão atual sobre a impossibilidade de se reduzir a realidade a uma única linguagem, contendo-a em um único discurso, relançando a questão da multi, da inter e transdisciplinaridade.

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Para mim é exatamente nesta aceitação da complementaridade dos fenômenos individuais que reside a beleza dessa teoria, pois demonstra a importância da visão de cada um sob um fenômeno, uma experiência, um projeto, etc. já que será através da soma de todas elas que se alcançará a totalidade de seu entendimento. “A individualidade peculiar dos efeitos quânticos nos apresenta, no que tange à compreensão de dados bem definidos, uma situação inédita, imprevista na física clássica e incompatível com ideias convencionais que servem para nossa orientação e adaptação à experiência corriqueira. Foi nesse aspecto que a teoria quântica exigiu uma nova revisão das bases do uso inambíguo de conceitos elementares, como um passo adicional no desenvolvimento que, desde o advento da teoria da relatividade, tem sido tão característico da ciência moderna” (Bohr, 2008, p. 76). Domingues (2001), afirma que não existe exemplo melhor para a transformação da passagem para o paradigma da mecânica quântica – e no meu ponto de vista, para a explicação do princípio da complementaridade – do que a sequência de pinturas e aquarelas de Cezánne da Montanha de Saint Victoire (Figura 7), quando o pintor abandona o conceito de pintura como uma encenação de cenas imaginadas ou extroversão de um sonho, e começa a encará-la como um estudo preciso das aparências, pinturas buscando retratar a realidade sem abandonara as sensações. “Para ele [Cézanne] a linha divisória não está mais entre os sentidos e a inteligência, mas entre a ordem espontânea das coisas percebidas e a ordem humana das ideias e das ciências. As pesquisas de Cézanne sobre a perspectiva revelam então que a perspectiva vivida, a de nossa percepção, não é a perspectiva geométrica ou fotográfica. Ao longo de sessenta óleos e aquarelas em que retoma incansavelmente a Montanha de Saint Victoire, cada quadro é, ao mesmo tempo, a mesma montanha e é outra montanha, mais do que isso, é a história dessa descoberta que relata, é a descoberta de leis da perspectiva na invenção de um novo estudo de pintar” (Domingues, 2001, p. 42).

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Figura 7 - Exemplos de pinturas e aquarelas de Cézanne da Montanha de Saint Victoire

O segundo pilar da metodologia da transdisciplinaridade, a complexidade, pode ser decorrência da percepção dessa impossibilidade de se prever, e, portanto, se reduzir a realidade. Morin (2007, p. 64) afirma que “o desafio da complexidade se intensifica no mundo contemporâneo já que nos encontramos em uma época de mundialização”. A complexidade está presente no nosso mundo e nas nossas relações sociais, consequentemente a complexidade também está presente na nossa ciência – que busca observar e entender o que cerca o ser humano. A complexidade do nosso mundo associada aos conceitos científicos ainda vigentes, podem ser considerados uma das principais razões para o big-bang disciplinar e para especialização exageradas, que Nicolescu (Nicolescu et al., 2000, p.14), compara a um processo de babelização que pode “colocar em perigo a nossa própria existência”. Através do pilar da complexidade, a linearidade causal – presente nos modelos clássicos de construção de conhecimento – começa a ser substituída por uma busca entre a relação da parte e com o todo. “Pascal já havia dito que todas as coisas estavam ligadas umas às outras, que era impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, assim como

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conhecer o todo sem conhecer as partes. Para ele, o conhecimento era um vai-e-vem permanente do todo às partes [...]” (Morin, 2007, p. 65).

Figura 8 - “Perfect face” (Star Magazine, 2008)

Como no exemplo de um rosto humano uma análise das partes separadas, pode até determinar o formato ideal para bocas, olhos, nariz, etc., mas é o conjunto, ou melhor, a relação de um elemento da face com o todo que determina se uma pessoa é bela ou não. Nesta brincadeira feita pela Star Magazine (Figura 8), uma revista de celebridades que resolveu “montar” a face mais perfeita a partir de exemplos mais pedidos aos cirurgiões plásticos de Beverly Hills – os olhos do 007 Daniel Craig, o nariz de Leonardo DiCaprio, os lábios de Matt Damon, o queixo de Batman Christian Bale e os cabelos de John Stamos –, pode-se ver que essa afirmação se confirma, e que a união das partes “perfeitas” não cria um rosto mais atraente que os “originais”. O último pilar da metodologia da transdisciplinaridade é a lógica do terceiro incluído, que também deriva de observações da mecânica e da física quântica, e que gerou, a princípio, um escândalo intelectual (Nicolescu et al., 2000, p. 26), já que a lógica clássica é baseada em três axiomas: 1. A é A = axioma da identidade; 2. A não é “não-A” = axioma da não contradição; 3. não existe um terceiro termo T (de “terceiro incluído) = axioma do terceiro excluído. Esses 3 axiomas, tão incorporados ao modo de pensar do homem moderno torna impossível que a lógica do terceiro incluído seja compreendida como aceitável em um primeiro momento. Quando, segundo o mesmo autor, Lupasco formaliza o axioma do terceiro incluído – que afirma que “existe um

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terceiro termo T que é ao mesmo tempo A e ‘não-A’” (Nicolescu et al., 2000, p. 27) – é compreensível o surgimento desse estranhamento, já que no mundo racional, associado ao mundo “observável” do espaço e tempo contínuos, deste axioma poder-se-ia derivar afirmações como o dia é noite, o preto é branco, o homem é mulher. Mas Nicolescu (Nicolescu et al., 2000, p. 27) mostra que “o terceiro dinamismo, o do estado T, exerce-se num outro nível de Realidade, onde aquilo que parece desunido (onda e corpúsculo) está de fato unido (quantum), e aquilo que parece contraditório é percebido como não-contraditório”. “Na lógica do terceiro incluído os opostos são antes contraditórios: a tensão entre os contraditórios promove uma unidade que inclui e vai além da soma dos dois termos. [...] A lógica do terceiro incluído é uma lógica da complexidade e até mesmo, talvez, sua lógica privilegiada, na medida em que nos permite atravessar, de maneira coerente, os diferentes campos do conhecimento” (Nicolescu et al., 2000, p. 28). Confesso porém, que só conseguiu entender na prática a lógica do terceiro incluído, quando ao me deparei com a ilustração do experimento mental da fenda dupla. O experimento da fenda dupla (Figuras 9 e 10) apresenta uma característica da mecânica quântica que vai contra ao nosso modo intuitivo de pensamento (Bezerra, 2013). Um elétron ao ter a sua passagem por um anteparo opaco “liberada” por duas fendas registra em uma tela, por exemplo, fosforescente, colocada atrás desse anteparo uma imagem que não é uma simples soma da forma das duas fendas, mas em razão da propagação do elétron em forma de ondas cria pela da difração um terceiro padrão formado através da interferência das duas ondas entre si.

Figura 9 - Experimento da Fenda Dupla com apenas uma fenda aberta no anteparo vemos as marcas de impacto acumularem-se atrás da passagem esteja ela na esquerda ou na direita (Bezerra, 2013, p. 119 e 120)

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Figura 10 - Experimento da Fenda Dupla com as duas fendas abertas, vemos a formação de um padrão de interferência que é diferente da simples soma das duas condições anteriores (Bezerra, 2013, p. 120), como o esquema de Goswami (2012, p. 138) apresenta

Esta zona de interferência formada em razão da superposição das duas ondas, fez com que eu percebesse que os conhecimentos de duas disciplinas, não apenas se somam como dois “tijolos de um edifício”, mas criam uma área de atuação conjunta e indeterminada pelos padrões das duas disciplinas que a originaram. Outro ponto importante de ser destacado é que apesar de Nicolescu (2000) apresentar exemplos de A e ‘não-A’ como dia e noite, preto e branco, homem é mulher, o termo “não-A” não precisa se restringir apenas ao oposto de A, mas a tudo que “não é A”, ou seja, B, C, D, 1, 2, 6 etc. são também “não-A”s. Pensando assim pude entender que as inovações radicais poderiam ser encaixadas dentro desta máxima como o exemplo da criação dos telefones celulares nos mostraram.

Figura 11 - Evolução do telefone celular

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Desde o início da década de1980 quando o primeiro telefone celular foi lançado nos EUA – um modelo grande e que pesavam em torno de 1 kg –, até os dias de hoje, “o avanço da tecnologia contribuiu bastante, os aparelhos de celular foram evoluindo, ganhando cada vez mais funções e ficando cada vez menores e mais leves. O que antes “só” servia para fazer e receber chamadas, hoje serve para mandar mensagem, jogar, tirar foto, filmar, ouvir músicas, ver vídeos, acessar a internet, ver televisão entre outras inúmeras funções” (Monteiro e Ramalho, 2010). Olhando-se mais detalhadamente para essas funções “anexadas” ao celular, notei que elas são o exemplo da máxima do terceiro incluído de que “existe um terceiro termo T que é ao mesmo tempo A e ‘não-A’”. Ou seja, os “não-As” no telefone celular seriam as câmeras fotográficas, os rádios, os gravadores de voz e imagem, os aplicativos, etc. E a cada inclusão de “não-As” o modo das pessoas se relacionarem com esse objeto foi se tornando diferente, chegando-se ao ponto segurar o celular de outro modo, já que o principal canal de interação entre pessoa e objeto não é mais a audição, mas sim a visão. Para Iribarry (2003, p. 487), a “transdisciplinaridade é nutrida pela pesquisa disciplinar; ou seja, a pesquisa disciplinar é esclarecida de maneira nova e fecunda pelo conhecimento transdisciplinar”. Através dos conceitos de descontinuidade, não separabilidade, causalidade global, não redução da realidade, não linearidade causal e do conceito “A + não-A = T” é permitido seguir-se um nível de raciocínio muito semelhante aos apresentados nos estudos sobre o pensamento criativo, que serão detalhados no subcapítulo 5.1.

4.2

Design – transdisciplinaridade posta em prática “A transdisciplinaridade não procura o domínio sobre várias outras disciplinas, mas a abertura de todas elas àquilo que as atravessa e as ultrapassa. A visão transdisciplinar está resolutamente aberta na medida em que ela ultrapassa o domínio das ciências exatas por seu diálogo e sua reconciliação não somente com as ciências humanas mas também com a arte, a literatura, a poesia e a experiência espiritual” (Iribarry, 2003, p. 486) Atuando com um modo de pensar intermediário entre o pensamento

científico e o pensamento artístico, defendo a ideia de que o designer inconscientemente já vem operando através de uma visão transdisciplinar do “entre/através/além de” há muitos anos. Segundo Random (in: Nicolescu et. al,

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2000, p. 118), a visão transdisciplinar “é um reencontro da riqueza do sentido aparente e do sentido escondido mediante um diálogo entre as ciências e as tradições, entre as ciências e a beleza da poesia e da arte”. Ao buscar a aproximação da esfera cientifica, os designers – como foi visto anteriormente – desde de “meados do século passado, [...] começaram a reunir diversos processos de design com o objetivo de alterar seus status de ‘serviçais exóticos’ para o de ‘profissionais sérios’. Nesse sentido, inúmeros processos foram concebidos, mas em sua maioria não passavam de fluxogramas simplistas construídos para orientar projetos através de uma série de fases. Quando eram retirados os termos específicos e os detalhes customizados para cada empresa, esses fluxogramas reduziam-se a quatro fases básicas: 1) descoberta, 2) ideação, 3) refinamento e 4) produção. Essa sequência lógica trouxe alívio para os gestores, já que o design poderia ser administrado, rastreado, comparado e mensurado, como a fabricação de produtos” (Neumeier, 2010, p.48). Mas, a meio ver, essa aproximação fez com que o design relegasse a beleza a quase um segundo plano, pois se percebia nela apenas a esfera do externo, da superfície, que acabou gerando a subordinação da forma à função, tão presente no discurso do design durante diversos anos. Random (in: Nicolescu et al., 2000) nos relembra, porém, que beleza é harmonia, ritmo, proporção; ela existe no objeto e no seu observador; é a parte e o todo; e está ligada a esse princípio de unicidade e identidade: “A beleza é irredutível a qualquer análise, pois ela associa o indizível ao dizível, o invisível ao visível. Ela associa unidade e complexidade. Ela nos interroga sobre a nossa abordagem do conhecimento” (Random, in: Nicolescu et al., 2000, p. 121). Como Neumeier (2010, p.73) ressalta no discurso de Buckminster Fuller: “Quando estou trabalhando em um problema, nunca penso na beleza. Mas quando termino, se a solução não for bela, sei que algo deu errado”. Os designers sabem se não atingiram essa integração, essa harmonia do objeto em todos os seus níveis de realidade. É um saber “tácito”, que tenta ser expressado para o seu entorno como o “saber do olhar”, treinado durante anos de “confrontação” com o exercício do fazer design, do fazer o “belo”. Poder-se-ia afirmar que é um “saber dos sentidos”, difícil de ser reproduzido e expressado através do pensamento científico, que é a principal metodologia de geração de conhecimento até os dias de hoje, pois o sujeito – neste caso os seus sentidos, sua cultura, seus conhecimentos acumulados, sua história de vida, etc. – não pode ser disjunto do objeto. Acredito que essa impossibilidade de se dissociar da beleza pode ser o portal que intuitiva e inconscientemente faz com que os designers já atuassem

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nessa nova esfera de geração de conhecimento através de um modo holístico que a metodologia da transdisciplinaridade defende. Comparando a metodologia da transdisciplinaridade a conceitos do design e do design thinking, percebe-se um paralelo surpreendente entre ambos, como pode ser visto no Quadro 16.

Metodologia da Transdisciplinaridade

Exemplos do Design e do Design thinking os saltos lógicos da mente

descontinuidade processo de reflexão em ação física quântica e os níveis de realidade

complexidade

a lógica do terceiro incluído

junção de análise e síntese não separabilidade

“o que é” e “o que poderia ser”

causalidade global

processo do saber dinâmico

não redução da realidade

modelo circular de Tim Brown

não linearidade causal

pensamento intuitivo raciocínio abdutivo

A + não-A = T pensamento equivocado

Quadro 16 - Paralelos entre a metodologia da transdisciplinaridade e o modo de atuação e visão do design thinking (Benz e Magalhães, 2012)

Através da metodologia da transdisciplinaridade de Nicolescu et al. (2000) o designer ganha ferramentas para explicar o seu modo de pensar e se liberta das amarras do pensamento clássico, que se apoia na previsibilidade e reprodutibilidade, na delimitação no domínio de competência do conhecimento (reducionismo) e na dissociação entre o sujeito e o objeto. “A disjunção sujeito-objeto é um dos aspectos essenciais de um paradigma mais geral de disjunção-redução, pelo qual o pensamento científico separa realidades inseparáveis sem poder encarar sua relação, ou identificá-las por redução da realidade mais complexa à realidade menos complexa” (Morin, 2007, p. 55). A metodologia da transdisciplinaridade, segundo a minha percepção, permite que o designer volte a se “religar” ao belo, ao saber do olhar, ao saber dos sentidos, explicando os saltos de criatividade, a não linearidade de seu pensamento, a sua busca pela relação das partes com o todo, a impossibilidade de se prever resultados em razão do “processo do saber dinâmico” e da “reflexão em ação”. E, ela explica a razão do design thinking, ou seja, do modo particular dos designers verem e pensarem o mundo, estar sendo celebrado como um novo instrumento de gestão da inovação, pois se percebeu, intuitiva e empiricamente,

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que esse modo holístico dos designers se aproximarem das questões se adapta melhor a complexidade do mundo atual. Gostaria de destacar também que, olhando-se para a história da configuração de objetos, na época em que essa função ainda era exercida pelos artistas e/ou artesãos, pode se perceber que esse modo holístico de se aproximar das questões já era empregado. Um dos melhores exemplos desta aproximação holística, segundo Capra (2008, p. 56), é Leonardo da Vinci. Seguindo o ideal renascentista do “homem universal” – que busca ser instruído em todos os ramos – o artista-cientista italiano transcendeu as fronteiras disciplinares de sua época, reconhecendo padrões que interligavam as formas e processos, gerando uma visão unificada do mundo, buscando unir “o processo de criação – a configuração abstrata de múltiplos elementos – [ao] processo de produção material” (Capra, 2008, p. 59). Para Leonardo, era necessário se unir ciência a arte – isto é conhecimento/teoria à habilidade – buscando “elevar sua arte da categoria de mero oficio para uma disciplina intelectual tão importante quanto as tradicionais artes liberais16” (Capra, 2008, p. 57). Para ele um inventor, como ele se denominava, “era alguém que criava um artefato ou obra de arte por meio da junção de vários elementos numa nova configuração que não se manifestava na natureza” (Capra, 2008, p. 59). E como o mesmo autor ressalta, essa definição é muito parecida com a nossa noção atual de criador, que só se tornou uma profissão distinta no século XX em consequência do capitalismo industrial e da produção em massa, que separou o processo de criação do processo de produção material. “Projeto, naquela época e agora, sempre foi uma parte integral de um processo mais amplo de dar forma aos objetos. Como princípio, o processo de criação é puramente conceitual, envolvendo a visualização de imagens, o arranjo de elementos em um padrão em resposta a necessidades específicas, e o desenho de uma série de esboços representando as ideias do projetista. Todas essas são atividades que fascinavam Leonardo, e nas quais ele tinha excelência” (Capra, 2008, p.73). A retomada de uma visão holística proposta pela metodologia da transdisciplinaridade, onde não haveria uma separação entre scientia e arte – isto é entre conhecimento/teoria e habilidade – retoma uma visão orgânica e sistêmica do mundo vigentes da Idade Média e na Renascença, vencendo o 16 “Na Idade Média, os sete ramos de aprendizado conhecido como artes liberais eram o ‘trivium’ da gramática, lógica e retórica, cujo estudo conferia o grau de bacharel em artes, mais o ‘quadrivium’, da aritmética, geometria, astronomia e música, que conferiam o grau de mestre em artes” (Capra, 2008, p. 56)

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paradigma mecanicista formulado ao longo de 300 anos por Galileu, Descartes, Newton e Locke, que transformou a percepção do mundo ao de uma máquina, que pode e deve ser fragmentada para ser melhor compreendida. Acredito que os designers, como “configuradores de objetos”, podem ajudar nessa mudança de paradigma, se buscarem essa integralidade em seu fazer, como os antigos artistas/artesão já o faziam.

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5 Abordagens criativas para inovação no design de objetos

“Como podemos encorajar nossos estudantes a serem verdadeiramente criativos? Como podemos ensiná-los a não seguirem apenas estilos do último número das revistas de design, mas em vez disso, busquem alcançar níveis de criatividade que eles não imaginavam serem possíveis? Uma das respostas está no processo, o processo que eles usam para resolverem um problema de design. É o caminho que eles tomam que determina as suas soluções. Se eles seguirem a mesma rota de sempre, irão chegar aos mesmos lugares de sempre” (Morris, 2005, livre tradução).

A criação de objetos, como se sabe, é anterior ao surgimento do design como uma função social e profissional em nossa sociedade ocidental. Antes dos anos 1920, a criação estava ligada a diferentes estilos – estabelecidos por um tipo de gramática visual definida através do uso de linhas retas ou curvas, ornamentos abundantes ou não, referências a culturas antigas ou a natureza, motivos geométricos ou florais, sobrecarregar ou simplificar (Couturier, 2006, p. 230) – que materializavam a sua época. "[...] este termo é usado para definidor padrões ligados às formas produzidas em um lugar, em uma certa época. Todo grande estilo inclui mobiliário, objetos e um tipo de organização interna onde uma estética é reconhecível graças a vários índices: o uso de linha reta ou curva, um tipo específico de ornamentação, a utilização materiais particulares, etc. Um estilo sempre inclui um conjunto de características formais, um repertório de signos distintos e motivos recorrentes "(Couturier, 2006, p. 32, livre tradução). Segundo a mesma autora, o surgimento de um estilo estava ligado a instalação de uma nova elite no poder – seja sucessão natural pela morte do anterior ou pela interrupção violenta através de golpes, revoluções, guerras, etc. – que quisesse marcar a mudança que seria instaurada e/ou apagar resquícios da liderança anterior. Se adaptando a esse novo modo de vida, os melhores artesãos eram convocados para criarem objetos que retratassem essa nova época. E até a instauração de um novo poder, esses padrões ditavam o fazer e delimitavam a criatividade do artesão dentro daquele “pequeno universo” formal e estético.

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Couturier (2006, p. 34) ainda afirma que está prática vigorou até a época da instauração da fabricação industrial e dos “tempos modernos” quanto através do design, as mudanças das formas seriam ditadas, para se agradar aos clientes e não mais pela elite que governava, mostrando que o poder havia mudado de mãos. Mas Forty (2007) nos mostra que as coisas não eram tão simples assim: o design necessita sim agradar ao gosto do consumidor, mas em seu período inicial agradar ao cliente não dava a este agente da cadeia produtiva o poder de escolha e de determinação do produto como o que ele exerce nos dias de hoje. O design surgiu para criar formas apropriadas tanto aos métodos de fabricação como

à

satisfação

dos

gostos

do

mercado,

ele

precisava

“fundir

satisfatoriamente as exigências da produção como do consumo”. (Forty, 2007, 58), dando poderes também aos industriais. “O sucesso do capitalismo sempre dependeu de sua capacidade de inovar e de vender novos produtos. Não obstante, de modo paradoxal, a maioria das sociedades em que o capitalismo criou raízes mostrou resistência à novidade das coisas, novidade que eram tão evidentes na Inglaterra do século XVIII quanto são hoje nos países em desenvolvimento. [...] Entre as maneiras de obter essa aceitação, o design, com sua capacidade de fazer com que as coisas pareçam diferentes do que são, foi de extrema importância” (Forty, 2007, p. 20). Cardoso (2005, p. 24) nos mostra que na organização industrial ocorreram transformações fundamentais ao longo do século XVIII:  

 

A escala de produção começou primeiramente a aumentar de modo significativo, necessitando-se a criação de mercados maiores e cada vez mais distantes do centro fabril. O tamanho das oficinas e fábricas, que concentravam investimentos maciços de capital em instalações e equipamentos, também aumentou, reunindo um número cada vez maior de trabalhadores. A produção tornava-se cada vez mais seriada, através de recursos técnicos, reduzindo a variação individual entre os produtos. O que resultou no crescimento da divisão de tarefas com uma especialização cada vez maior de funções, inclusive a separação entre a fase de planejamento e de execução.

“A mesma abundancia de mercadorias baratas que era percebida pela maioria como sinônimo de conforto, de luxo e de progresso logo passou a ser condenada por alguns como indicativa do excesso e da decadência dos padrões de bom gosto e mesmo dos padrões morais” (Cardoso, 2005, p. 67). Mas Forty (2007) nos mostra que a culpa dessa decadência não está no uso do maquinário, mas sim “o uso da máquina em circunstâncias econômicas e

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sociais específicas” (Forty, 2007, p. 81) que privilegiavam a busca de preços cada vez mais baixos para atingir a um número sempre maior de consumidores em detrimento da qualidade do produto. Relacionando “a má qualidade do design à ignorância do trabalhador [...] e a sua falta de habilidade artística” (Forty, 2007, p. 83), surgiu assim em meados do século XIX uma preocupação em educar o gosto vigente, e uma busca por definições de “princípios gerais para arranjo de forma e da cor no design” (Cardoso, 2005, p. 67). Para se realizar o “bom design” era preciso seguir certos critérios “na busca de um estilo unificado e adequado ao novo século” (Cardoso, 2005, p. 112). Esses princípios variaram ao longo das épocas, da inspiração na sinuosidade das linhas da natureza do Art Nouveau, que se cristalizou no imaginário popular, ou das linhas mais geométricas exaltando o mecânico do Art Déco, à busca da valorização nacionalista do design a serem traduzidos pelas políticas de design na Grã-Bretanha como forma de ideológica do design pelas Werkbunds e que se instalaram por toda a Europa, e posteriormente pela Bauhaus e por Ulm. Essas regras que surgiam criavam padronizações dentro das quais a criatividade do designer precisava encontrar variações para gerar a demanda por novos produtos por parte do consumidor. Nos primórdios do design, segundo Forty (2000), três abordagens para se apresentar uma mercadoria ao consumidor eram usadas “com tanta frequência no design industrial que se pode dizer que compõem uma gramática básica do repertório da imagética do design” (Forty, 2007, p. 21):   

arcaica – imitava objetos, estéticas e/ou estilos antigos, criando referências ao passado conhecido e familiar; supressiva – escondia o objeto dentro de uma outra peça mais familiar; e utópica – criava uma estética que indicava que o objeto pertencia a um mundo futuro e melhor.

Quadro 17 - Gramática básica de Forty (2007) para a criação de objetos

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Segundo o mesmo autor, se os fabricantes no século XVIII precisavam superar a resistência à inovação dos consumidores e por isso confiavam mais no modelo arcaico, durante grande parte do século XX a estratégia utópica foi a mais utilizada, pois a atração pelo futuro, onde todos os males seriam eliminados, e a facilidade de se viver emocionalmente fora do presente (no passado ou no futuro), perpassavam toda sociedade. “O uso de um simbolismo que desse aos produtos a aparência de estar ‘a frente de seu tempo’ foi um traço recorrente e, às vezes, monótono do design do século XX. [...] O sucesso do design no uso do imaginário tecnológico para transmitir a visão de um futuro livre de desconforto e ansiedades foi um dos fenômenos mais peculiares da sociedade do século XX” (Forty, 2007, p. 274). Para o mesmo autor, o fato do design ter “poderes de disfarçar, esconder e transformar foram essenciais para o progresso das sociedades industriais modernas” (Forty, 2007, p.22). Ele afirma que, apesar de muitos autores sustentarem que dar aos artefatos formas que não pertencem a eles próprios ou a seu período é errado – gerando uma crença, que resistiu durante décadas, que “a aparência do produto deve ser uma expressão direta da sua finalidade, visão encarnada no aforisma ‘a forma segue a função’” (Forty, 2007, p.21) –, não era isso que acontecia na realidade de mercado. Afinal, se esse aforisma tivesse sido seguido ao pé da letra “todos os objetos com a mesma finalidade deveriam ter a mesma aparência” (Forty, 2007, p.21). Para o autor a variação de design de produto está ligada a outras funções: “servem para criar riqueza e satisfazer o desejo dos consumidores de expressar seu sentimento de individualidade” (Forty, 2007, p.22). Löbach (2001) relembra que por muito tempo o conceito de funcionalismo vigente “foi aplicado de forma unidimensional, quase de modo exclusivo para o ambiente onde se destacavam as funções práticas” (Löbach, 2001, p. 88) – relegando-se as funções estéticas e simbólicas a um segundo plano. “A longa tradição do funcionalismo se baseou consideravelmente na meta formal da ordem. Ligada a isto, sob o ponto de vista psicoperceptivo, havia uma redução de estímulos que, em muitas áreas como arquitetura, o urbanismo, a comunicação visual ou o design, conduziu a um verdadeiro tédio visual” (Burdek, 2006, p. 302-303). Löbach (2001) apresenta 6 critérios principais que a teoria funcionalista ofereceu, e que permaneceram durante muitos anos como indiscutíveis para a produção industrial, ditando o as balizes criativas dos designers: 

“Eliminação dos adereços ‘inúteis’ e ‘supérfluos’ dos produtos (por exemplo, ornamentos ou efeitos lúdicos).

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    

Utilização de princípios construtivos técnico-físicos e técnicoeconômicos. Utilização racional dos meios disponíveis com objetivos bem determinados. Gastos mínimos para obter rendimento máximo. Custos mínimos de fabricação e de administração. Renuncia a configuração de produtos com influencias emocionais” (Löbach, 2001, p. 89-90).

Corroborando as afirmações de Forty (2007), Löbach (2001, p. 90) afirma que os produtos que seguiam esses critérios, são “frios” e impessoais, por estarem sintonizados apenas no mundo intelectual do homem. Ao se escolher não desenvolver qualquer tipo de relação emocional com o consumidor, esses produtos tem uma aparência pobre em informação, e despertam pouco interesse por serem rapidamente apreendidos. Mais recentemente foram criadas propostas, como as de Morris (2005), em que ao invés de se seguir o caminho tradicional no projeto de design – e que seria do meu entender o reflexo da divisão de funções tradicional dentro de uma indústria – de: i. briefing; ii. pesquisa; iii. sketching bidimensionais; iv. renderização dos conceitos (2D); v. refinamento dos desenhos; vi. criação do modelo 3D; e, vii. detalhamento do design (3D), sugere que se inicie o processo com a criação da forma tridimensional, depois se faça os sketching bidimensionais, a partir daí se crie o briefing, faça-se a pesquisa, revise-se a forma para adaptá-lo a função proposta, crie-se o modelo final e o seu detalhamento. A essa proposta da “função seguir a forma” o autor dá o nome de processo reverso, e para o mesmo abre possibilidades dos designers se tornarem mais criativos, pois os “obriga” a quebrarem os padrões de pensamentos condicionados. Outra sugestão para se quebrar esse condicionamento dos padrões de pensamento foi estabelecida na HfG Offenbach, nos anos 70, através da criação de uma série de pares estéticos/formais que ajudariam nas decisões para a criação da forma de um objeto e que percebo, pela minha experiência, serem ainda muito usados e ensinados no processo de um projeto de design: ”simples – complexo, regular – irregular, fechado – aberto, unitário – separado, simétrico- assimétrico, claro – confuso, na grade [grid] – fora da grade [grid], balanceado – não balanceado, conhecido – desconhecido, ordem conhecida – complexidade nova, etc.” (Burdek, 2006, p. 302) Dieter Mankau (in: Burdek, 2006), também da HfG Offenbach, em seus estudos sobre estética formal elaborou uma descrição de 5 princípios de

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configuração formal (Quadro 18) para mostrar que as funções estético-formais se estendem além do campo puramente sintático. “As formas respectivas são sempre sócio culturalmente mediadas, e por isso adquirem diferentes significados nos seus respectivos contextos” (Burdek, 2006, p. 312)

Configuração aditiva

Fala-se de uma configuração aditiva na percepção de um produto ou uma figura que tenham sido configurados de tal forma que as características técnicas ou as funções práticas mantenham completamente suas características visuais.

Configuração integrativa

Aqui se utilizam recursos configurativos tais que determinam a percepção completa do produto. As perturbações visuais, que à primeira vista se manifestam pelo uso de diferentes funções técnicas ou práticas e os materiais a serem utilizados podem ser reduzidos de forma clara com o uso de meios formais. Entre eles, por exemplo, linhas de fluxo contínuo, boa continuidade ou prolongamento, a padronização de materiais e cores. Aqui domina a forma-base escolhida, que em regra é limitada por uma formula matemático-geométrica no seu desenvolvimento com poucos elementos formais básicos. Incluem-se aí a esfera, cilindro, quadrado e pirâmide. Estes corpos geométricos são por motivo de pregnância cognitivo-cultural, na percepção psicológica, formas altamente estáveis, que mesmo com intervenções formais fortes, por meio de cortes ou interferências, permanecem visualmente estáveis em nossa concepção mental. Esta não é resultante apenas das necessidades prático-funcionais do produto e sim de uma interpretação individual ou artística das funções, se manifesta com um forte componente simbólica.

Configuração contínua

Configuração escultórica

Configuração natural

Esta remete a princípios biológicos (biônica) e permite também associações naturais. São estados de ânimo, que não se baseiam apenas em urna percepção visual, mas incluem todo o nosso espectro de percepção: odores, sensação de frio ou quente, impressões táteis, a audição como fenômeno ambiental e outros são experiências elementares, onde os seus significados têm diferença mínima em cada cultura.

Quadro 18 - Princípios da configuração formal de Mankau (in: Burdek, 2006, p. 304)

Existem setores, como por exemplo o setor automobilístico, onde o design tem grande importância na diferenciação e na geração de desejo de consumo: “os automóveis são projetados para chamar a atenção, por isso o design é o fator número um de escolha para quem compra um automóvel” (Larica, 2003, p. 82).

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Como parte de uma grande engrenagem esse tipo de designer tem menos espaço de trabalho autoral e de experimentação pessoal, já que o ciclo de renovação do design dos modelos em produção em série está diretamente atrelado ao ciclo de vida de dos moldes para prensagem das chapas de aço ou conformadas em plástico de aproximadamente 3 anos. Acreditando que os carros que “introduzem um design original, raramente são aceitos pelo público à primeira vista” (Larica, 2003, p. 100), é que o público precisa de mais tempo para entender os novos conceitos e o design diferente, segundo o mesmo autor, o setor automobilístico criou um mecanismo através das principais feiras de automóveis para lançar as inovações mais radicais. “O Design de Efeito é para causar impacto e sensação, projetado para causar um efeito (resultado) brilhante, para sondar a reação do mercado, vide o design dos concept cars apresentados nos Salões de Automóveis” (Larica, 2003, p. 100). Neste setor também existe uma gramática básica do repertório da imagética do design levantada por Larica (2003, p. 92-93), num jogo de formas que determinam o design do setor automobilístico: 

As formas imitativas – o design sempre tirou partido das formas sugeridas pela natureza: remetendo a formas de besouros, rabo de peixe, barbatanas, asas, olhos de gato, raios, foguetes, flechas, gotas, bocas de tubarão e monstros, bicos de pássaros, etc. Atualmente, qualquer alusão a estes elementos é feita de forma muito sutil e estilizada.



O retilíneo e o sinuoso – as primeiras carrocerias de automóveis eram quase retas e chapadas, por limitações construtivas. [...] Com a evolução dos processos construtivos, das prensas e das ferramentas de estampagem, as formas se arredondaram.



A forma em cunha – estilo retilíneo, afilado e marcante, com a linha da cintura inclinada e tendendo para a frente em cunha.



O movimento retrô (retrofuturismo) – é um retrocesso ao uso de formas e elementos-chave que surgiram em épocas passadas. O grande achado dessa tendência é a estilização e a modernização de formas antigas pertencentes ao imaginário da pessoa. O culto a objetos antigos transfere valores afetivos e emocionais de uma geração

anterior

para

uma

geração

mais

jovem

subconscientemente se encanta com a “novidade” de estilo.

que,

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Além dessas “receitas” estético-formais, segundo Burdek (2006), a semiótica, a fenomenologia e a hermenêutica também tiveram uma grande importância no século XX para o design. Diversas metodologias em design foram criadas a partir dos anos 1960, e foram equivocadamente, segundo avaliação de do mesmo autor, interpretadas como uma proposta de desenvolvimento de um método único e restrito para se fazer design. “Neste aspecto frequentemente não se levou em conta que tarefas diferentes necessitam métodos diferentes e a pergunta crucial a ser colocada no início do processo de design é a de que método deve ser empregado em qual problema” (Burdek, 2006, p. 251). A partir dos anos 1980, começou-se a questionar a onipresença do pensamento cartesiano no design, quando “por meio dos pós-modernos novas tendências de design foram propagadas” (Burdek, 2006, p. 257). Segundo o mesmo autor, os métodos que até então eram orientados na sua maioria dedutivamente – ou seja a partir de um problema geral – passam a ser trabalhados de forma mais indutiva, se perguntando para quem o projeto deve ser colocado no mercado. Pattern language, mind mapping, cenários, etc. são métodos, ainda hoje empregados. Mas são métodos onde a palavra se sobrepõe à imagem, criando possibilidades abertas pelas diferentes significações que cada pessoa pode dar a partir de suas experiências e de seu repertório visual para os termos e conceitos levantados. Como uma imagem “além de valer por mil palavras”, também transmite as informações que são compreendidas em sua totalidade – até mesmo de conceitos para os quais não façam ainda parte do repertório semântico das pessoas (criadores e usuários) –, iniciou-se nos anos 1980, segundo Burdek (2006), a utilização de colagens (“charts”) para evidenciar o contexto, o mundo (“mood”), em que os usuários de um possível produto tramitam. Surgiram assim os mood charts. “No desenvolvimento e configuração de produtos, é cada vez mais necessário se trabalhar com métodos de visualização. Particularmente no desenvolvimento do design, que é incorporado sob o s aspectos globais, não são mais suficientes as descrições verbais de metas, conceitos e soluções. Os diferentes significados semânticos de termos e conceitos podem ser muito diferentes entre os designers, técnicos e dirigentes de marketing (em uma equipe de desenvolvimento). No contexto nacional ou global, isto se torna ainda mais complexo e pode gerar equívocos de entendimento” (Burdek, 2006, p.265). Baxter (1998, p. 190-191), além dos mood charts – que o autor denomina “painel de estilo de vida” do consumidor do produto – sugere que se amplie essas colagens para:

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Painel de expressão do produto – criado a partir do “painel de estilo de vida” para se buscar identificar uma expressão para o produto, como, por exemplo, jovial e suave, forte e enérgico, trivial e relaxada, intenso e decisivo, etc. Ele tem o “objetivo de fazer com que todos os membros da equipe de projeto busquem o mesmo tipo de estilo” (Baxter,1998, p.191), e



Painel do tema visual – a partir do “painel de expressão do produto”, busca-se imagens de produtos, dos mais variados tipos de função e de setores do mercado, com o objetivo da equipe projete partindo de estilos de produtos que já foram bem sucedidas e já fazem parte do repertório visual dos consumidores. “Esses estilos representam uma rica fonte de formas visuais e servem de inspiração para o novo produto” (Baxter,1998, p.191).

É importante se ressaltar que o uso de referências visuais como inspiração sempre esteve presente na arte, e consequentemente no design: elas apenas não eram ligadas a tentativa de se mapear o universo visual do possível consumidor. Elas eram expressão individual de caminhos criativos, buscando-se ou não estar ligado aos conceitos vigentes em outras áreas da cena cultural da época: como, por exemplo, artes plásticas, cinema, música, teatro, etc. Fazendo um paralelo entre pesquisa cientifica, poder-se-ia chamar essa pesquisa visual de conceitos vigentes de outras áreas culturais de uma “pesquisa de dados visuais secundários”, pois já foram conceitos trabalhados por algum criador anteriormente, construindo-se o objeto a partir de conceitos já consagrados por e em outras disciplinas. No design de moda e no design de joias vê-se claramente que durante muitos anos esta influência de outras áreas culturais foi fator crucial no momento de criação. Segundo Clarke (2013), a joalheria contemporânea sofreu uma grande influência de estilos da arte moderna e contemporânea. E é surpreendente ver que alguns autores atuais do design, como por exemplo Ambrose e Harris (2011), que em seu livro Design thinking, escrito em 2010 e editado em português no ano seguinte afirmam ainda que os designers podem buscar inspiração e referências nesses mesmos estilos da arte moderna e contemporânea. “Para se avaliar a estética de uma joia, que lida com as questões das artes liberais, considera-se a essência do design, buscando por estruturas poéticas tanto na concepção, quanto na composição da peça, e por elementos metafóricos e/ou simbólicos significativos. Na joalheria,

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materiais alternativos são experimentados na medida em que reafirmam as intenções nas mensagens artísticas” (Clarke, 2013). Para a autora os principais conceitos da arte que influenciaram o design de joias contemporâneo foram: 

Purismo: retorno às formas mais simples reduzidas. Forma, linha e cor eram vistas por puristas como elementos de uma linguagem que não mudam de cultura para cultura, porque se baseiam em reações óticas invariáveis.



De Stijl: importância das cores primárias, da linha horizontal e vertical, defendendo uma abstração geométrica, que considerava um ideal de harmonia universal.



Construtivismo: provém da arte abstrata e seus artistas passaram a abstrair a partir das formas geométricas, ao invés da natureza. O designer deve ocupar seu lugar ao lado do cientista e engenheiro, fundindo conteúdo e formas simples com modernos recursos tecnológicos.



Arte cinética: o movimento ritmado, que pode gerar ainda outra forma de volume sem massa no espaço.



Arte conceitual: refere-se a diversas formas e manifestações de arte, e comum o princípio aristotélico, afirmando que a “verdadeira” obra de arte não é o produto físico elaborado pelo artista, mas sim a “ideia” ou o “conceito”. Sendo assim, a “ideia” não precisa ser concretizada, bastando ser apenas uma atitude.



Expressionismo abstrato: compreendeu o movimento formal de arte abstrata que creditava ao desenho, a geração da imagem reconciliada com a técnica, e à pintura, a reafirmação da superfície plana da tela e ao embate com o material.



Minimalismo: todos os efeitos expressivos a umas poucas categorias formais que, por sua vez, se integram ao espaço circundante. Sua impessoalidade é vista como uma reação ao excesso de emoção no expressionismo abstrato.

Olhando-se para a o universo da moda pode-se perceber que, até os anos 1970, essa postura também era de praxe no mundo dos criadores de moda. Desde influência dos artistas do Art Nouveau e do Jugendstil na liberação da silhueta feminina do espartilho e a criação por artistas do departamento de moda

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das Wiener Werkstätten - a partir de 1911, ainda antes da 1ª Grande Guerra Mundial –, que moda e as artes caminham juntas: 

Orientalismo ou exotismo: com influências indianas, egípcias, bizantinas, árabes, chinesas e do leste da Rússia que vigorava no imaginário dos consumidores europeus no começo no final do século XIX e início do século XX através do Ballets Russes, das importações de produtos das colônias e dos quadros de Gauguin que influenciaram, por exemplo, o trabalho do grande costureiro francês Paul Poiret; ou da inspiração nas vestes gregas do estilista espanhol radicado em Veneza de Mariano Fortuny.



Futurismo: de Giacomo Balla que por se propor a substituir “pesado, sombrio e sufocante vestuário masculino por um vestuário mais dinâmico, colorido, assimétrico e versátil “(Lehnert, 2001, p. 17) não conseguiu impor as suas criações aos consumidores.



Construtivismo: em uma busca pela modernidade nos anos 1920 a moda busca retratar a modernidade através de linhas puras, claras e diretas, estruturas visíveis e funcionalidade, que não lhes condicionavam os movimentos e lhes proporcionavam trabalhar e praticar esportes retratando uma mulher como um ser andrógino que começava a comandar sua própria vida, como as criadas por Coco Chanel.



A influência do Cinema Americano: nos tempos antes da 2ª Grande Guerra Mundial, desde os anos de 1920, o cinema tinha se tornado um importante veículo difusor de moda, mas as atrizes usam roupas do seu dia-a-dia nos filmes. No início dos anos de 1930 começam-se a criar figurinos próprios para os filmes, reforçando-se o glamour das atrizes da época que se tornavam verdadeiros ícones, como Greta Garbo, Marlene Dietrich, Ginger Rogers, Katherin Hepburn, etc.



Surrealismo:

traduzindo

através

de

matérias

possíveis

e

imaginários, como tecidos sintéticos, o rayon e o celofane (que parecia vidro), e modificando a forma de percepção convencional do que era o vestuário, Elsa Schiaparelli, defendia a ideia de que moda era uma arte, buscando inspiração nas obras de artistas como Salvador Dali, Jean Cocteau. 

O cinema e a música dos anos 60: a cultura e a rebelião juvenil propagado pelo rock and roll do cinema americano, como por

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exemplo a rebeldia de James Dean, o sex appeal e a ingenuidade “desarrumada “de Brigitte Bardot, começaram a “destruir” o império dos estilistas sobre as pessoas, tornado as pessoas de carne e osso “centro das atenções”. 

Influência direta do vocabulário formal e estético das artes plásticas – os quadros de Mondrian (em 1965) e POP ART de Andy Warhol que influenciaram toda uma coleção de Yves Saint Laurent no Verão de 1966, a ilusão de ótica da OP ART de Victor Vasarely que foi transformada em diversas padronagens, como o vocabulário formal de outras tendências artísticas dos anos 60 foram adotadas pela moda da época.



A cultura POP e Swinging London: a música, através dos grupos de dos grupos rock americanos e ingleses – principalmente os Beatles, a inversão de papeis masculinos e femininos, a sexualidade livre em razão da criação da pílula anticoncepcional com uma crescente sexualização, e o começo da influência das ruas como a introdução da minissaia nos desfiles, mudaram a relação dos estilistas com os consumidores de moda.



Filmes futuristas – o cinema, a TV e até mesmo os desenhos animados refletindo a imensa admiração com a ida do homem à lua começam a divulgar toda uma estética futurística como a moda espacial de Courrèges, ou as criações utópicas de Paco Rabanne formando texturas através da junção de pequenas placas de alumínio ou plástico eternizadas por Jane Fonda no filme Barbarella.



Historicismo híbrido – nos anos 80 a diversidade do “estilo pósmoderno, que marcou todas as formas de arte da década de 80, marcou também o design de moda” (Lehnert, 2001, p. 84). Sem a nostalgia dos anos de 1970, o conhecimento profundo da história da moda e de técnicas antigas de produção geraram citações de épocas passadas de forma evidente e irônica: “pegava-se em elementos de diferentes origens, que eram montados de forma nova e davam, assim, origem a algo extremamente novo” (Lehnert, 2001, p. 84) com pode ser visto na obra de John Galliano, Jean Paul Gaultier, Karl Lagerfeld, Moschino, etc.

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A partir do movimento dos Hippies, os criadores de moda começaram a buscar inspiração nas ruas, nos movimentos étnicos, e posteriormente nas tribos como por exemplos os punks, os frequentadores das discotecas, etc. “A maneira de vestir dos Hippies depressa se tornou moda. [....] Dera-se pela primeira vez um fenômeno que se iria tornar muito frequente na moda: o modo de vestir de um grupo minoritário da sociedade torna-se moda, massificando-se e perdendo em grande parte o significado do ideário que esteve na sua origem” (Lehnert, 2001, p. 59). O autor ainda afirma que a partir dos anos 1990, a moda se apresenta caracterizada por uma enorme diversidade: “da sua essência faz agora parte ser impossível distinguir nitidamente o que ‘é Moda’ e o que ‘não é Moda’” (Lehnert, 2001, p. 102). Como, segundo o mesmo autor, a mudança se tornou a essência da moda, e os conteúdos das diversas coleções são relativamente livres, não seguindo mais normas definidas como anteriormente, a inspiração pode vir de qualquer fonte. Segundo Erner (2005), existem criadores de moda que praticam uma “pesquisa de dados visuais primários” – retomando o paralelo com a pesquisa científica – como, por exemplo, John Galliano em seus áureos tempos na Maison Dior, para alimentar e ampliar o repertório visual próprio e o de sua equipe para o momento de criação, nessa busca pelo novo. “[A] cada 6 meses, [...] [Galliano] leva sua equipe a um país longínquo – para o verão de 2003, a Índia – de onde traz roupas, ideias, esboços, objetos, fotografias, pedaços de tecido, etc. O conjunto é agrupado dentro de uma “bíblia” em que cada um vai procurar sua inspiração. Esse agrupamento não constituí uma coleção acabada, longe disso. É difícil trabalhar o vínculo entre elementos escolhidos na Índia e uma coleção finalmente articulada em torno da dança, com saias de bailarinas, roupas de flamenco e chinelos. Trata-se mais de “snacks criativos”, conforme o termo consagrado, que permitem a todos inspira-se na mesma fonte de ideias” (Erner, 2005, p.139). Essa experimentação criativa descompromissada relativa à era do pósmodernismo, se abriu também na área do design nos anos 1980 (Couturier, 2006, p. 90). Como, segundo a autora, o “futuro já parecia haver passado” e a sociedade se encontrava em um novo dinamismo econômico criado pela globalização, pelo surgimento do computador e da internet que revolucionou o conceito de trabalho, o design dessa época se recusou a ser aprisionado dentro de uma definição petrificada. Efervescente, eclético e contraditório, ele é fruto de um retorno à espontaneidade e ao entusiasmo do ornamento pelo ornamento, da miscigenação de símbolos, de “desvios geográficos, geológicos e históricos”.

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Cardoso (2005) também fala da quebra de paradigmas nos anos 1980 com o ingresso no período pós-moderno, e como que com a perda das certezas do paradigma industrial e a adoção de tecnologias computacionais, o design atravessava um período de insegurança, mas ao mesmo tempo livre de rigidez. “A marca registrada da pós-modernidade é o pluralismo, ou seja, a abertura para posturas novas e a tolerância para posições divergentes. Na época pós-moderna, já não existe mais a pretensão de encontrar uma única forma correta de fazer as coisas, uma única solução que resolva todos os problemas, uma única narrativa que amarre todas as pontas. Talvez pela primeira vez desde o início do processo de industrialização, a sociedade ocidental esteja se dispondo a conviver com a complexidade em vez de combatê-la, o que não deixa de ser (quase que por ironia) um progresso” (Cardoso, 2005, p. 266). Buscando um melhor entendimento da prática do design atualmente, onde através da queda de regras e barreiras do pós-modernismo é permitido aos designers fazerem experimentações criativas sem qualquer tipo de restrição, Couturier (2006) levantou cinco “tendências” de procedimento criativo (Quadro 19), a partir da produção de designers contemporâneos – dando uma grande ênfase nesta pesquisa ao design de mobiliário e luminárias –, que seriam:

Desviar funções

Recuperar sucatas

Buscar a hibridização dos materiais

Revisitar o passado

Na arte, o desvio é uma oportunidade para reinventar a forma, de desnudar estrutura ou reduzir os limites da criação. E também para introduzir uma distância, muitas vezes humorística, em relação à realidade. O design contemporâneo se apodera dessa prática de reconsiderar a função de um objeto, sua forma e seu simbolismo. Hoje em dia, o jogo das aparências pode se tornar enganador. (Couturier, 2006, p. 118, livre tradução) Atualmente, uma minoria de pessoas vive na opulência, enquanto a grande maioria conhece a privação. O acesso aos objetos não é o mesmo para todos. [...] Sensível a esta realidade, alguns designers estão reconsiderando sua posição. Eles fazem da recuperação um processo criativo. Isso os permite renovar a sua escrita [seu vocabulário visual] e endossar outro papel social, ao colocar os objetivos comerciais em segundo plano. Eles criam, então, objetos surpreendentes e únicos de estética estranha, muitas vezes se aproximando de esculturas ou de instalações artísticas, mas que continuam sendo funcionais. (Couturier, 2006, p. 122, livre tradução) A história do design pode ser escrita através da dos materiais. O designer, hoje em dia, tem a sua disposição uma grande liberdade de uso e uma ampla palheta. [...] Desse modo, alguns criadores buscam experimentações introduzindo por própria vontade quebras na lógica simplista de progresso ao perturbar o encadeamento racional da evolução dos materiais e das técnicas. Como? Praticando a hibridização ou o enxerto de materiais, até então, impensáveis. Seja técnica ou esteticamente falando. (Couturier, 2006, p. 126, livre tradução) Nenhum diálogo era possível entre partidários da tradição e ativistas contemporâneos. Todos se entrincheiravam em suas posições. Uns se vangloriavam da beleza de uma pátina, da qualidade do acabamento e da perenidade das formas. Enquanto os outros defendiam a inovação técnica, a renovação dos materiais e uma concepção diferente de conforto. Um muro invisível separava o clássico do moderno, reativando assim uma ruptura orquestrada em 1920 por arquitetos e inovadores ansioso por virar a página e acabar com as releituras passadistas. Mas o pós-modernismo [...] e o retorno a formas barrocas, enterrou o machado guerra. Os jovens lobos do design olham desarmados de um modo novo para o mobiliário do passado. Sem sentir que estão traindo o seu campo. (Couturier, 2006, p. 130, livre tradução)

129

Fazer coexistir os estilos

Os modos passam, as tendências se sucedem, as correntes entrecruzam. E isso sempre foi assim. Mas esse fenômeno hoje em dia se acelera [...] Muitos criadores de mobiliário ou de decoração contemporânea se dispõe a traduzir a extraordinária movimentação do início deste III Milênio praticando uma forma de sampling estilístico. Tal como DJs, eles fazem conviver culturas e épocas. Misturando o antigo e o novo, o design e a arte tribal, o oriente e o ocidente. Eles flertam conscientemente com o contrassenso ou a falta de gosto. E alcançam combinações ousadas que horripilam os tradicionalistas. (Couturier, 2006, p. 134, livre tradução)

Quadro 19 - “Tendências” de procedimento criativo (Couturier, 2006)

Ao abordar o tema de design, inovação e globalização Bonsiepe (2011) apresenta também uma lista vetores ou forças motrizes (driving forces) para a inovação no design (Quadro 20), que podem servir também de fonte de inspiração para os designers no momento de criação. Inovação baseada na tecnologia (technology-driven)

Inovação baseada no usuário (user-driven) Inovação baseada na forma (form-driven)

Inovação baseada na invenção (invention-driven) Inovação baseada no valor simbólico ou status (symbol or status-driven) Inovação baseada na tradição (tradition-driven) Inovação baseada na engenharia mecânica (engineeríng-dríven)

Inovação baseada na ecologia (ecology-driven)

Inovação baseada no branding (brand-driven)

Inovação baseada nas tendências (trend-driven) Inovação baseada na arte (artdriven) Inovação baseada na crítica (critique-driven)

Exemplo: uma roda com raios extremamente resistentes e leves para uma bicicleta de competição. Essa inovação pressupõe know-how para fabricação e transformação de materiais especiais Exemplo: um abridor de falas com disco de corta aluando lateralmente no cilindra da lata. Com isso, evita-se que limalhas de metal caiam na conserva. Exemplo: um tecido esticado em cima de uma moldura retangular com urna superfície de apoio minimamente indicada. Nesse caso, o vetor formal-estético tem um papel determinante. Exemplo: o aspirador de pó de Dyson resultou de uma extensa série de provas para transformar um aspirador de pó sem saco em produto viável. Exemplo: o espremedor de cítricos de Phílippe Starck, que se transformou num objeto de status – o que não era necessariamente a intenção original do designer. Exemplo: o tampo de madeira talhado de uma mesa no México. Exemplo: no caso de um caminhão de carga pesada para mineração ou um equipamento de tomografia com ressonância magnética, as engenharias terão um papel determinante. O grau de liberdade formal-estética é menor comparado a uma inovação baseada na forma. Exemplo: a cadeira . Trata-se de um design sustentável que se caracteriza pela redução da variedade dos materiais, pelo uso de materiais puros sem conter metais pesados; em que se usam junções removíveis (em vez de soldas, colas ou rebites], facilitando assim o conserto. A taxa de reciclagem chega a pelo menos 90%. Exemplo: no processo de privatização (1990) do serviço telefônico público Entel, na Argentina, os dois novos consórcios foram apresentados ao público por uma nova campanha própria de branding. Exemplo: design de tênis que define e promove novas tendências. Exemplo: uma escultura artística aplicada na base de um poste de sinal de trânsito. Exemplo: um martelo com o cabo curvado em 180 graus uma paródia sobre a praticidade de uma ferramenta de Jacques Carelman

Quadro 20- Vetores ou motrizes (driving forces) para inovação no design (Bonsiepe, 2011, p. 258)

130

Como se pode perceber, muitos dessas forças motrizes para inovação no design propostas por Bonsiepe (2011) encontram eco nas propostas e conceitos dos outros autores apresentados anteriormente (Quadro 21). Bonsiepe (2011)

Forty (2000)

tecnologia

utópica

usuário

forma

Lehnert (2001)

Clarke (2013)

Couturier (2006)

Larica (2003)

futurismo estética espacial “a força” das ruas e das minorias

Mankau (in:Burdek, 2006) configuração aditiva

retilíneo e sinuoso forma em cunha

supressiva

configuração integrativa configuração contínua

invenção valor simbólico ou status

tradição

cinema americano entre guerras orientalismo ou exotismo arcaica

desviar funções revisitar o passado fazer coexistir os estilos

historicismo híbrido

retrôfuturismo

engenharia mecânica recuperar sucatas

ecologia

formas imitativas

configuração natural

branding tendências

cinema e música dos anos 60 cultura POP construtivismo surrealismo

arte OP e POP Art

purismo de Stijl construtivismo arte cinética arte conceitual expressionismo abstrato minimalismo

configuração escultórica

buscar a hibridização dos materiais

crítica

Quadro 21 - Comparativo de processos de inspiração para criação de objetos no design

Gostaria ainda de destacar que qualquer um dos procedimentos de inspiração para a criação de objetos apontados acima podem não garantem que o objeto resultante apresente um “design inovador”. Como Lessa (in: Westin e Coelho, 2011, p.24) destaca, “nem todos os projetos de design envolvem invenção e inovação. Existem diferentes complexidades projetuais [...]. O fato de um projeto ser inventivo

131

e outro, mesmo bem equacionado, não apresentar inovações que se destaquem, pode resultar de diferentes competências profissionais dos designers respectivos. Mas isso também pode se dar porque as condições do projeto menos inventivo são mais simples, e/ou sua complexidade menor, e/ou seus objetivos menos ambiciosos”. Acredito que além desses fatores propostos por Lessa (in: Westin e Coelho, 2011), a inventividade de um projeto depende muito também da intenção do designer em ser criativo no momento de realizar o respectivo projeto. Tschimmel (2003) ao falar sobre o pensamento criativo no design corrobora essa ideia ao afirmar que criatividade “é um resultado de um pensamento intencional”, e que “o pensamento criativo não se processa, por exemplo, quando é dificultado pela falta de conhecimento da área, pela inexperiência ou pela falta de motivação” (Tschimmel, 2003, p. 2). Para se entender um pouco mais sobre o pensamento criativo, o próximo subcapitulo irá se debruçar sobre alguns pontos que considero importantes no estudo desse assunto.

5.1

O pensamento criativo Não existe uma teoria sobre criatividade universalmente aceita (Kneller,

1978). Por isso o autor, para alcançar uma ampla visão dos conceitos mais difundidos sobre criatividade, buscou apresentar em seu livro as teorias filosóficas e teorias psicológicas mais relevantes, que foram resumidas no Quadro 28. As teorias filosóficas, “trataram a criatividade como parte da natureza humana e em relação ao universo em geral” (Kneller, 1978, p. 38); elas não procuraram explicar o funcionamento interior do processo criativo. Já para examinar o assunto de um ponto de vista mais “de perto”, o autor se voltou para as teorias psicológicas “uma vez que neste século a minuciosa investigação da criatividade tem cabido em grande parte ao psicólogo” (Kneller, 1978, p. 38).

TEORIAS PSICOLÓGICAS

TEORIAS FILOSÓFICAS

132

Criatividade como inspiração divina

o criador é divinamente inspirado

Criatividade como loucura

sua aparente espontaneidade e sua irracionalidade, que se desviam das normas geralmente padronizadas, são explicadas como fruto de um acesso de loucura

Criatividade como gênio intuitivo

criatividade é uma forma saudável e altamente desenvolvida de intuição; ela não pode ser educada porque é imprevisível, não racional e limitada a poucas pessoas decorrente da teoria da evolução de Darwin, a criatividade seria a manifestação da força criadora inerente a vida

Criatividade como força vital

Criatividade como força cósmica

expressão da criatividade universal imanente a tudo que existe.

Associacionismo (ligada à escola behaviorista)

o pensamento criador é a ativação de conexões mentais, e continua até que surja a combinação certa ou até que o pensador desista

Teoria da Gestalt

o pensamento criador é primariamente uma reconstrução de gestaltes ou configurações estruturalmente deficientes

Psicanálise

para Freud a criatividade origina-se num conflito dentro do inconsciente, que produz uma “solução” para esse conflito; na moderna psicanálise a pessoa criativa, não é mais considerada emocionalmente desajustada, mas tem um ego flexível e seguro que lhe permite viajar pelo seu inconsciente a principal contribuição dos neofreudianos é que a criatividade passa a ser produto do pré-consciente e não do inconsciente a criatividade além de ser um meio de reduzir tensão (como Freud acredita) seria procurada como um fim em si mesma.

Neopsicanálise

A reação ao Freudianismo

remonta à antiguidade e persiste até hoje; como dom divino a criatividade nasce da inspiração por um poder supra humano em vez da educação remonta à antiguidade; no século XIX, o sociólogo Cesare Lombroso alegava que a natureza irracional ou involuntária da arte criadora deveria ser explicada patologicamente; Freud sustentava que a criatividade era um purgativo emocional que mantinha o artista mentalmente são. nasceu no Renascimento aplicada a Da Vinci, Vasari, Telésio; Kant no século XVIII associou criatividade ao gênio em sua Crítica do Juízo

a evolução orgânica é fundamentalmente criadora, uma vez que está sempre a gerar novas espécies; a criatividade humana para Sinnott (1962) seria a manifestação do processo organizador presente em toda a vida ao impor sentido e padrão a uma multidão de coisas ou experiências que pareceriam sem relação Whitehead (1929) considerava a criatividade um “avanço para o novo”, pois tudo que existe tem de renovar-se para poder existir dominou a psicologia na Inglaterra e nos Estados Unidos durante o século XIX; o pensamento consiste em associar ideias, derivadas da experiência segundo as leis da frequência, da recência e da vivacidade explica de maneira satisfatória os casos que começam de uma situação problemática, mas não explica os pensamentos criativos que não estão diretamente sugeridas pelos fatos a sua disposição a pessoa cria para aliviar certos impulsos, da mesma forma que come ou dorme; muito comportamento criador, especialmente nas artes, é um substituto e uma continuação dos folguedos da infância ou mesmo transforma as experiências da infância em matéria prima de suas criações. o ego se retrairia voluntária ou temporariamente podendo recorrer ao seu pré-consciente para reunir, comparar e rearranjar as ideias para Schachtel a criatividade é a capacidade de permanecer aberto ao mundo, e se manifesta pela flexibilidade mental, intensidade de

133

Análise fatorial

busca entender o fenômeno da criatividade através de testes e da medição do fenômeno

interesse, repetição e variedade de abordagem; já para Rogers, além de abertura para o mundo, a criatividade é motivada pela premência do indivíduo em realizar sua potencialidade como ser humano Guilford foi pioneiro nesse tipo de pesquisa criando os conceitos de pensamentos convergente e divergente onde a criatividade se enquadraria; para Koestler a criatividade se fundamenta no conceito da bissociação, que consiste na conexão de níveis de experiência ou sistemas de referência – ou seja o ato de criação brotaria do encontro de duas matrizes de pensamento até então desprovidas de relação

Quadro 22 - Conceitos mais difundidos sobre criatividade

“[...] na falta de uma teoria definitiva da criatividade, temos de arranjar-nos com as intuições das teorias particular disponíveis. Para as explanações metafísicas ou cosmológicas da criatividade temos de ir aos filósofos, à teoria evolucionária, e a modernos como Whitehead. Para compreender o papel do inconsciente na criatividade voltamo-nos para Freud. Devemos a Schachtel nossa consciência da medida em que a criatividade constitui resposta ao meio exterior. A melhor tentativa de localizar a criatividade dentro da personalidade como todo é até agora a de Rogers. Apelamos para J. P. Guilford quando queremos a mensuração e a análise sistemáticas das capacidades mentais que a criatividade abrange. E para a mais larga síntese dos últimos anos temos de ir a The Act os Creation, de Koestler” (Kneller, 1978, p. 61). Quase trinta anos mais tarde Torre (2005), ao fazer uma revisão rápida das teorias da criatividade, divide-as do mesmo modo que Kneller (1978): 

De um lado as teorias filosóficas ou pré-científicas que explicam “o poder criativo do homem através de uma força extrínseca, determinista, não controlada pela vontade individual e nem pela ação social” (Torre, 2005, p. 71): o

teorias baseadas na inspiração superior (Platão, Sorokin, Maritain);

o

teoria da demência ou a criatividade como uma espécie de loucura (Kretschmer, Lange);

o

criatividade como uma espécie de gênio intuitivo (Kant, Hirsch);

o

criatividade como força vital, proveniente da própria evolução (Darwin, Bérgson); e

o

criatividade como atributo hereditário que passa de pai para filho através da genética (Galton, Terman e os geneticistas).

134



E, de outro, as teorias psicológicas que explicam “a criatividade pelas ações ou processos intrínsecos, provenientes do próprio indivíduo e pelo mesmo suscetíveis de serem modificados pela ação pessoal ou social” (Torre, 2005, p. 71), elas interpretam a criatividade como algo enraizado no criador e no comportamento humano: o

associativas e comportamentais que explicam a criatividade mediante mecanismos de associação (Ribot, Thurstone, Mednick, Wallach, Skinner);

o

teoria de bissociação que é um caso especifico de associação por comparação, fusão ou superposição (Koestler);

o

a gestalt, que concebe a criatividade como reajuste perceptivo e problemático para alcançar-se a globalidade ou a sua totalidade (Wertheimer, Köhler); e

o

teoria psicanalítica que vê a criatividade como mecanismo de sublimação.



E, o autor ainda diferencia essa segunda, que seriam as teorias psicológicas unidas às humanísticas “que dão a criatividade funções de auto realização” (Torre, 2005, p. 71): o

teorias de integração harmônica com o universo (Gurman, Mooney, Anderson); e

o

teorias cognitivas, que entendem a criatividade como um conjunto de mecanismos cognitivos, aptidões ou habilidades para se resolver problemas (Guilford, Cattel, Vermon).

Até meados do século passado, a criatividade era vista como um dom – nos casos de se considerar a sua origem na inspiração divina, na genialidade intuitiva, etc. – ou como uma maldição – quando era resultante de loucura do indivíduo. Ainda no início da década de 1950, segundo Butcher (1972), a criatividade era considerada pela grande maioria “como colocada à margem da psicologia, dificilmente pesquisada por métodos empíricos” (Butcher,1972, p. 101). Os primeiros esforços, ainda grosseiros de uma ciência que pretendia através de estudos experimentais e estatísticos explicar realizações artísticas consagradas só aumentou a distância entre o ponto de vista das ‘artes’ e o da ‘ciência’. Mas após o lançamento do primeiro satélite soviético no final da década de 1950, o interesse do EUA nos temas sobre originalidade e criatividade científica e, principalmente em delinear o perfil do indivíduo criativo e desenvolver instrumentos para que se pudessem identificá-lo, foi intensificado.

135

Através de financiamento de pesquisas pelo governo americano “houve um grande aumento em especulações teóricas e em trabalhos empíricos na área geral de capacidades criativas [...]” (Butcher,1972, p. 102). No design alguns desses estudos e técnicas foram bastante difundidos – ao contrário do que na arte, onde a criatividade se baseia mais nas teorias filosóficas –, pois com a necessidade de se enquadrar a capacidade criativa do designer dentro do tempo prefixado de um projeto, era necessário se diminuir a espera “indeterminada” pela inspiração da musa, pelo insight criativo. Segundo o mesmo autor, grande parte desse aumento de interesse foi devido aos estudos de Guilford (1950) sobre criatividade, mais especificamente ao estudo sobre à distinção entre: 

pensamento convergente – aquele exigido para resolver um problema que tem uma resposta correta definida; e



pensamento divergente – mais aberto, menos analítico, direcionado “para enfrentar um problema que pode ter várias respostas mais ou menos certas, ou não ter uma resposta correta” (Butcher,1972, p. 104).

Segundo Carson (2012, p. 139), “o pensamento convergente é o tipo de pensamento que você tem quando acessa conteúdos guardados em seu cérebro (incluindo conhecimentos e as lembranças) para encontrar uma resposta correta para um problema definido [...]”. Mas a autora afirma também, que ao se acreditar que exista apenas uma resposta certa, a pessoa acaba limitando seu processo de pensamento, não explorando múltiplas soluções que poderiam ser alcançadas através do pensamento divergente faz. Carson (2012) ainda levanta uma questão interessante: “as pessoas que tendem a ser pensadores divergentes interpretam frequentemente todos os problemas como sendo abertos e, consequentemente, geram múltiplas soluções, mesmo quando o resto do mundo está vendo a questão com olhos convergentes” (Carson, 2012, p. 139). Muitas técnicas foram criadas para estimularem o pensamento divergente. Segundo Tschimmel (2003), uma das mais propagadas é a do pensamento lateral (lateral thinking) de Edward de Bono, no final da década de 1960. E através Baxter17 essa técnica acabou também sendo muito difundia entre os designers. 17

Mike Baxter foi diretor do Design Research Centre da Universidade de Brunel, e através de seu livro “Product Design – a practical guide systematic methods os new product development” (1995) as teorias de De Bono chegaram as práticas do design.

136

“De Bono define o pensamento criativo como um ‘pensamento lateral’ em oposição a um ‘pensamento vertical’. Ele entende por ‘pensamento vertical’ um pensamento lógico, matemático e seletivo que se dirige numa só direção definida a priori. Enquanto o ‘pensamento vertical’ só processa informações relacionadas com um problema determinado, o ‘pensamento lateral’ integra, nos seus procedimentos mentais, informações que pouco ou nada têm a ver com o problema em si. Trata-se de um pensamento criador que procura novas visões e possibilidades, que se move continuamente, dando por vezes saltos, criando assim uma nova direção: o pensamento como um processo de possibilidades em vez de um processo com um objetivo pré-definido” (Tschimmel, 2003, p. 2). Outro conceito que foi muito destacado por Baxter (1998, p. 57) foi o da bissociação de Koestler (1964), introduzindo-o – juntamente com o do pensamento lateral – na prática criativa dos designers através da larga difusão de seu livro. A bissociação “consiste na conexão de níveis de experiência ou sistemas de referência. No pensamento criador a pessoa pensa simultaneamente em mais de um plano de experiência, ao passo que no pensamento rotineiro ela segue caminhos usados por anterior associação. [...] Quando reagem entre si duas matrizes de percepção ou raciocínio, independentes, o resultado é ‘ou uma colisão que resulta em riso, ou fusão delas em uma nova síntese intelectual, ou ainda confrontação numa experiência estética’. Assim descreve Koestler o ato criador no humor, na ciência e na arte.”. (Kneller, 1978, p. 56). Segundo Johansson (2008), estas associações podem gerar: 

ideias direcionais – que combinam conceitos dentro de um campo de conhecimento específico, e geram assim ideias que se desenvolvem numa direção específica e previamente determinada; e



ideias intersecionais – que combinam conhecimentos de áreas de conhecimento distintos, gerando ideias onde é difícil de se predeterminar a direção que elas irão seguir, transformando o mundo com saltos em novas direções (este conceito, a meu ver, se assemelha muito ao da metodologia da transdisciplinaridade, mesmo que o autor não faça uso dessa nomenclatura em sua proposta).

A inovação através de ideias direcionais, segundo Johansson (2008, p. 40) é mais propícia para os projetos de melhoria de um produto – ou seja, inovações incrementais –, pois nela tanto os passos a serem tomados são previsíveis, quanto a dimensão da inovação pode ser pré-determinada. Já a inovação através de ideias intersecionais, segundo o mesmo autor, por permitirem uma maior circulação de ideias incomuns através da combinação de conceitos de

137

outras disciplinas e culturas, cria maiores chances de se gerar inovações radicais, levando os inovadores para fora da concorrência direta. Também considero que seja importante se ressaltar, em relação à geração de ideias únicas e originais, um conceito apresentado por Carson (2012) nesse processo de associação de ideias, que pode ser também estendido a qualquer processo criativo: o conceito de censura ou desinibição a associações incomuns. É na censura às associações incomuns que muitas ideias para inovações radicais morrem antes mesmo de serem expressas, principalmente em processos de geração de ideias aleatórias, como por exemplo brainstorming, brainwriting, estímulos grupais, etc. Através da palavra folha, a autora exemplifica as diferenças entre associações comuns e incomuns (Quadro 23).

Quadro 23 - Diagrama de conexões de associações comuns versus incomuns (Carson, 2012, p. 150-151).

Em uma resposta considerada pela autora como típica, a palavra folha é comumente associada a palavra árvore, e a partir dela é que se abre uma rede de conexões de associações. Através da espessura das setas nesse diagrama a autora procura demonstrar que nesse caso existem conexões “mais fortes que vem à mente mais rapidamente, enquanto as mais fracas surgem apenas quando as associações fortes se esgotam” (Carson, 2012, p. 150). “Esse diagrama indica um estado moderado de desinibição, em que muitas palavras diferentes, claramente não associadas a “folha”, tiveram permissão de acesso ao pensamento consciente. Além disso, a força das conexões foi mais ou menos igual, portanto, o tempo de reação para todas essas palavras foi muito pequeno, cada uma seguindo a resposta anterior sem uma pausa” (Carson, 2012, p. 150-151). No diagrama ao lado de associações incomuns percebe-se que a voluntária do experimento não se atem apenas a um caminho como o conceito

138

de árvore do primeiro exemplo. Como a autora ressalta, além de criar associações de significado com outras palavras (árvores, livro, mesa) a voluntária buscou também associações a partir do som (folha em inglês leaf lembra o nome de Leif Erikson). Johansson (2008) denomina essa inibição ou censura a associações incomuns de barreiras associativas. Essas barreiras podem ser baixas ou altas. Como nossa mente sempre procura seguir o caminho mais rápido e simples, barreiras associativas altas permitem um rápido acesso a associações préexistentes em nossa mente. “Ao simplesmente ouvir uma palavra ou ver uma imagem, a mente libera uma sequência de ideias associadas, cada uma conectando-se a outra. Essas cadeias de associações tendem a ficar agrupadas em torno de domínios relacionados à nossa própria experiência” (Johansson, 2008, p. 68). O autor afirma que uma pessoa com barreiras associativas baixas – como no segundo exemplo mostrado por Carson (2012) no Quadro 23 – pode existir uma menor rapidez de passar da análise de uma questão ou experiência para a respectiva ação, mas como nela a pessoa não agindo no automatismo, não se agarra a conclusões tão rapidamente, nem se prende de imediato a suposições, sua criatividade seria menos inibida. Bohm (2011) nomeia esse tipo de pensamento automático como “pensamento reativo”. É importante ressaltar que esse tipo de pensamento é uma parte essencial do processo mental como um todo, pois sem ele seria preciso que uma pessoa refletisse a cada passo de qualquer ação que ela realizasse. O pensamento “seria frequentemente muito lento (como por exemplo, ao dirigirmos um carro). Além disso, o total de passos é em geral tão grande que não poderíamos refletir sobre todos de uma vez” (Bohm, 2011, p. 66). Segundo Carson (2012), quando se aprende algo novo ou forma uma nova lembrança – que para mim se equivaleria se viver qualquer nova experiência –, são criados no nosso cérebro novas conexões e novos dendritos, que são os braços que saem do corpo celular do neurônio e realizam as conexões com os outros neurônios para receberem e transmitirem as informações através de impulsos elétricos. Ao se revistar “essas lembranças ou partículas de aprendizado, aumenta[-se] a velocidade e força dessas conexões” (Carson, 2012, p. 56). Quanto mais rápidas e fortes, mais automático se torna as associações e mais esforço é necessário para se vencer o “pensamento reativo”.

139

Em seu livro Bohm (2011) explica o processo de pensamento e, para tentar entender melhor esse processo apresentado pelo autor, transformei essas informações em gráficos, que serão apresentados a seguir. O primeiro gráfico, Quadro 24, mostra o momento de criação de um padrão mental – que seria o impulso de reação – sobre qualquer tipo de aprendizado ou experiência que é vivenciada por alguém. A percepção do que foi vivenciado foi separada em 4 níveis que ocorrem simultaneamente: racional, sensorial, estética e emocional. E esse padrão mental fica então registrado no cérebro.

Quadro 24- Aprendizado de um padrão mental.

Depois deste padrão mental criado, quanto a pessoa se depara pela primeira vez com a mesma situação nossa mente ativa o pensamento reativo como pode ser visto no Quadro 25. Ou seja, ela procura em nossa memória (consciente ou inconsciente) semelhanças às vividas anteriormente e gera um impulso de reação armazenado para aquela situação. Assim não é preciso se perceber toda a situação novamente, ganhando-se tempo através da reação automática. Um cheiro, um som, uma palavra armazenada no nosso inconsciente no momento que se viveu a situação original podem servir de gatilho para que esta reação seja deflagrada, mesmo que situação não esteja ocorrendo naquele momento. Isso acontece tanto na relação de indivíduos com indivíduos, quanto na relação de indivíduos com objetos, como o marketing e o design tão bem exploram atualmente visando impulsionar cada vez mais o consumo. Músicas, luzes, sons, cores, etc. tudo enfim deflagra em nosso inconsciente reações imperceptíveis a nosso consciente.

140

Quadro 25 - Pensamento reativo

Bohm (2011) afirma que o pensamento reativo funciona muito bem até o momento em que experiência se afasta muito do contexto “no e para o” qual o padrão mental foi criado. Quando isso acontece, e o padrão de pensamento reativo existente não consegue mais lidar com a nova situação, o sistema nervoso volta a ser ativado. O cérebro começa a procurar uma solução para o problema, e inicia-se assim o pensamento reflexivo (Quadro 26), que é um processo de busca por uma correspondência, pelo menos de modo geral, a padrões de ação já armazenados.

Quadro 26 - Pensamento reflexivo

141

“Torna-se evidente, então, que a reflexão é, antes, um modo de encontrar dificuldade ao mudar constantemente o padrão de pensamento reativo para adaptá-lo ao fato real. A função primária de tal pensamento reflexivo é tentar restabelecer uma estabilidade e um equilíbrio na qual o pensamento reativo seja novamente adequado para lidar com a situação em que nos encontramos. De fato, uma vez que a reflexão encontra um padrão que fornece solução, mais cedo ou mais tarde, à medida que tal padrão se repete, ele é absorvido em todo conjunto do pensamento reativo. Pode-se dizer que pensamentos desse tipo devem ser caracterizados como reativos–reflexivos” (Bohm, 2011, p. 66).

Quadro 27 - Pensamento reativo-reflexivo

Acho importante ressaltar, que a situação que inicia o pensamento reflexivo pode se dar, como no exemplo que Bohm (2011) apresenta, quando uma teoria não mais condiz à realidade dos fatos e não existe nenhum padrão de memória disponível, mas pode se iniciar também quando de um erro ou de um acontecimento inesperado encontra-se um novo conceito/objeto/produto ou cria-se uma nova função que não era percebida anteriormente. Esse seria o caso dos exemplos de produtos apresentados Baxter (1998, p. 56) gerados através da transformação de acontecimentos fortuitos em invenções: 

da cola sem muito poder adesivo criada por Spencer Silver que deu origem ao Post-it da 3M, ou



do acaso que fez um pedaço de borracha cair sobre o enxofre e Charles Goodyear encontrou nessa borracha dura uma solução para tornar a borracha insensível às variações de temperatura, criando assim a borracha vulcanizada.

142

Nesses casos, em vez de se procurar na memória por uma solução de um “problema”, buscou-se um “problema” – ou seria melhor se chamar de oportunidade – para aquela solução. Para Bohm (2011) o padrão reflexivo continua, de algum modo, sendo uma procura por padrões de memória, só que em outro nível menos direto. “Em vez de se ter uma reação imediata dominada por um padrão de memória, teremos um reflexo, levando a uma reação retardada dominada por um padrão de memória. O padrão retardado pode ser mais rico e sutil que o original, mas, é ainda, basicamente mecânico” (Bohm, 2011, p. 67). Acredito que pessoas que se mantém “presas” ao pensamento reativo são as mesmas que possuem barreiras associativas altas. Para vencer essas barreiras, Johansson (2008, p. 76) sugere quatro posturas individuais – que se reforçam e complementam entre si – que ajudariam a romper esse aprisionamento: 

Expor-se a uma série de culturas: para o autor ter consciência e/ou vivenciar que culturas diferentes enfrentar um problema de maneiras diversas ajuda a introjetar que existem múltiplas maneiras de se fazer a mesma coisa e aumentam a probabilidade de se ver situações sob perspectivas múltiplas.



Aprender de forma diferente: a autoeducação nos permite maior chance de abordar a situação de uma perspectiva diferente da difundida pelo campo ou pela disciplina ensinada através da educação formal. Mas o autor ressalta que em um primeiro momento a educação formal aumenta a probabilidade de alcançar sucesso

criativo,

pois

ela

também

apresenta

e

ensina

possibilidades até então desconhecidas de se pensar e de perceber as coisas. Ele ressalta porém que, depois de alcançar um pico, ela reduza essas chances por introjetar censuras e padrões “corretos” de se ver e fazer as coisas. 

Reverter as suposições: às vezes as barreiras estão tão sedimentadas que é preciso forçar a sua quebra através da busca por caminhos incomuns enquanto se pensa em uma situação, questão ou problema. Para o autor a reversão de suposições é uma das maneiras mais eficientes, pois a mente é conduzida conscientemente a ver a situação de uma perspectiva complemente diferente.

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Assumir múltiplas perspectivas: o autor ressalta que para que essa estratégia alcance o propósito de quebrar as barreiras a pessoa precisa escolher perspectivas radicalmente diferentes daquelas que com as quais normalmente trabalha. Ele cita os exemplos de criar restrições, aplicar a ideia a alguém ou a alguma coisa. Para mim as técnicas onde os criadores buscam imaginar e se colocar na “pele” de grupos de consumidores, estudam comportamentos de tribos urbanas, etc. são um exemplo dessa estratégia. E até mesmo o estudo de métodos de criação de outros profissionais da mesma ou de outras áreas ou a busca de inspiração nos objetos criados por outros profissionais serviria para se gerar uma vontade de se conhecer e assumir novas perspectivas que não fazem parte do próprio repertório criativo de alguém.

Fico em dúvida, porém, se essas proposições de Johansson (2008) quebrariam as barreiras associativas, ou simplesmente aumentaria o conteúdo passiveis de serem acessados em sua memória pelosos criadores. Como Carson (2012) afirma, “quanto mais você aprende, mais rica e densa sua ‘floresta neural’ fica. [...] É como construir rodovias entre cidades. Quanto mais pessoas precisarem ir de Nova York a Boston, mais rodovias serão construídas e mais largas elas se tornarão. De maneira semelhante, no cérebro, se você conectar duas informações, seus neurônios construirão uma estrada. Se você usar essa estrada com frequência, seu cérebro irá transformá-la numa super-rodovia. Além de ajudarem o aprendizado e a memória, essas super-rodovias mentais podem auxiliar, de forma significativa, o processo do pensamento criativo [...]” (Carson, 2012, p. 56). Segundo a mesma autora, este uso com frequência através de anos de prática e treinamento de qualquer tipo de atividade acaba armazenando as respectivas informações na memória implícita da pessoa, tornando-as automáticas. Ao contrário dos conteúdos da memória explícita onde estão armazenadas as informações que podem ser acessadas conscientemente, os conteúdos da memória implícita não conseguem ser descritos em palavras, mas podem ser acessados sem se pensar conscientemente neles. Um bom exemplo de memória implícita é a linguagem materna, onde a pessoa não precisa ter um conhecimento explícito das regras de linguagem, mas tem a capacidade de formar frases, conjugar verbos, usar corretamente os advérbios sem qualquer hesitação ou dificuldade. E mesmo que a autora não tenha tocado nesta questão, acredito que o conhecimento tácito faz parte dessa memória implícita.

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São necessários anos para se formar a memória implícita (Carson, 2012) – pesquisas científicas afirmam que aproximadamente dez anos de experiência, e esse tempo se aplicaria igualmente a qualquer área de atuação. Desde de um músico de jazz que numa improvisação em uma jam sessions responde inconscientemente a melodia proposta pelos seus parceiros musicais, até pilotos de avião que reagem automaticamente a forças do avião e da natureza para manter o curso da aeronave, a memória implícita para a autora ajuda a pessoa a “desenvolver seu próprio estilo e produzir inovações que irão abalar [sua] área” (Carson, 2012, p. 251). Pois a pessoa ao desenvolver alguma atividade sabe implicitamente que “está fazendo a coisa certa”, permitindo um feedback continuo e inconsciente enquanto realiza a atividade. Goswami (2012) comenta que, em uma pesquisa sobre pensamentos divergentes e convergentes, diversos cientistas considerados criativos ao serem perguntados se fariam uso intensivo do pensamento divergente negaram o seu uso, afirmando que usavam mais o pensamento convergente. O autor atribui essa resposta ao fato dos criativos desenvolverem “um ‘pensar divergente’, mas no inconsciente” (Goswami, 2012, p. 168). Acredito que esse pensar divergente no inconsciente que Goswami (2012) relatou se dá no âmbito da memória implícita. Como designer, minha experiência mostra que essa sensação de que se está seguindo um caminho de pensamento lógico e que não existe outra resposta para aquela questão é comum nos momentos de criação. Mesmo quando para todos a sua volta aquelas associações não apresentam “lógica” alguma, a sensação de encadeamento lógico de ideias só pode ser explicada pelo processo automático e pelo feedback continuo que se dá no inconsciente de cada um de Carson (2012) relatou. Johansson (2008), que defende a proposta de quanto maior o número de ideias geradas maiores são as chances de se gerar ideias inovadoras, ou seja que “a quantidade de ideias leva à qualidade de ideias” (Johansson, 2008, p. 138), lembra que é preciso haver um equilíbrio entre extensão e profundidade de conhecimentos para se maximizar o potencial criativo. A especialização – e consequentemente a experiência que gera a memória implícita abordada por Carson (2012) –, mesmo sendo algo que pode fortalecer as barreiras associativas inibindo a criatividade, é necessária para se desenvolver e colocar em prática as novas ideias. Como a mesma autora afirma, “como a criatividade é pensar ou fazer algo que ainda não foi feito, saber o que foi criado antes ajuda a levar o jogo para um nível seguinte” (Carson, 2012, p. 79). Ou seja, a pessoa criativa no momento de geração das ideias deve ser

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generalista, conhecendo diversos campos, mas é preciso que, na fase de combinar concretamente essas ideias, ela possua experiência e conhecimentos profundos tanto para tornar a ideia realidade quanto para avaliar se aquela ideia será considerada pela sociedade inovadora ou não. “A criatividade não é somente fruto do saber, mas sim do querer e do saber fazer. O que representa o saber fazer? O domínio de certos códigos comunicativos que possibilitam a expressão das próprias ideias e sentimentos. [...] Imaginemos um escritor criativo que não domine a linguagem, um pintor que não saiba utilizar o pincel ou combinar cores, um escultor que não saiba utilizar cinzel. E, o que dizer do cientista, inventor ou artista que não possui certo conhecimento da sua área? Toda manifestação criativa exige certo domínio dos códigos de expressão que utiliza” (Torres, 2005, p. 170). Mas, e nos casos em que a situação se difere de todas as já experimentadas anteriormente, e não se observa nenhum padrão de memória disponível? Segundo Bohm (2011), nesses casos a mente tenta descobrir o que fazer usando primeiramente uma percepção criativa ou imaginação primária associada a dados na memória para gerar uma fantasia que poderá criar um novo paradigma, um salto criativo (Quadro 28), como no exemplo do processo vivenciado por Newton ao observar a queda da maça.

Quadro 28 – Salto criativo

“O poder de imaginar coisas que ainda não foram vivenciadas é considerado, [...] um aspecto fundamental do pensamento criativo e inteligente”

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(Bohm, 2011, p.47). Citando Coleridge (in: Barfield, 1971), o autor apresenta uma diferenciação dos termos imaginação primária para fantasia: “Imaginação primária é para ele, uma percepção criativa da mente, na qual as imagens são geralmente novas e originais, e não originárias da memória [e] sobre a qual todas as diferenças e inúmeros recursos surgem harmoniosamente como aspectos ou partes de uma unidade. No outro extremo [da natureza do pensamento como um todo], a fantasia é uma interpretação envolvendo a junção de imagens separadas e distintas que já estavam disponíveis na memória” (Bohm, 2011, p. 47-48). Nesses casos quando a questão possui muitos fatores contraditórios ou confusos, que não permitem o pensamento reativos-reflexivo a percepção criativa permite que através de imaginação primária surja de repente, em um momento de compreensão, uma totalidade através de uma imagem mental que abrange as principais características da nova percepção. Normalmente chamados de insights, esses padrões originados através de visões mentais parecem vir de fora da mente e são os responsáveis pelas teorias filosóficas onde a criatividade é vista como inspiração divina ou genialidade intuitiva. Como a pessoa não tem consciência do trabalho que realizou para produzir a ideia criativa, tem-se “uma sensação ilusória de que alguém ou algo pôs o pensamento diretamente em seu cérebro, sem o seu consentimento” (Carson, 2012, p. 73). A autora, usando as definições do neurocientista Arne Dietrich, explica que existem dois trajetos para o pensamento criativo. Esse do insight, onde a pessoa tem a sensação do pensamento não pertencer a ela é o caminho espontâneo, onde os processamentos mentais das informações acontecem abaixo da percepção consciente. No outro, o caminho deliberado, a pessoa constrói uma solução criativa passo a passo, deliberada e conscientemente. “A principal diferença entre os dois caminhos, em termos de neurociências é que o centro executivo do córtex pré-frontal18 – principalmente o centro executivo do hemisfério esquerdo19 do cérebro – permanece firmemente no controle do processo criativo no caminho deliberado. Tal centro direciona o que você puxa de seu banco de memória enquanto tenta trabalhar criativamente. [...] Em contraste, no caminho espontâneo, o centro executivo (propositalmente ou por conta de fadiga) cede parte do controle sobre o

18 O córtex pré-frontal é considerado o centro executivo do cérebro e englobam as funções de planejamento, raciocínio, tomada de decisões, projeção do futuro (Carson 2012, 61). 19 O hemisfério esquerdo controla as letras, palavras e linguagem; a memória verbal; a fala, leitura, escrita e aritmética. Ele é responsável pelo processamento objetivo, resolução de problemas sistemáticos, processamento sequencial analítico, resolução de problemas lógicos e de lidar com emoções (Carson, 2012, p. 58).

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conteúdo do pensamento consciente. Isso permite que mais ideias dos centros de associação nos lobos temporal e parietal20 – que comumente seriam impedidas de chegar a consciência – manifestem-se conscientemente. Há evidências de que o processo espontâneo também permite mais integração do hemisfério não dominante do cérebro (que seria o hemisfério direito21 nas pessoas destras e também em muitos canhotos) O resultado é que uma ideia criativa pode repentinamente brotar na consciência quando você menos espera” (Carson, 2012, p. 72). A autora afirma que os benefícios do caminho deliberado são a transparência e o controle consciente do processo criativo, mas como a atenção da pessoa está concentrada, sua desvantagem é que só se consegue processar um pensamento por vez. Já no caminho espontâneo, que se dá abaixo do nível da percepção e por isso permite que uma base de dados mais ampla possa ser processada ao mesmo tempo, o benefício é a possibilidade de se ter ideias mais novas e abundantes. Esse processo espontâneo está presente na descrição do processo de criação de diversos gênios criativos das artes, como compositores, escritores, artistas plásticos, etc., e da ciência. Mas também pode ser vivenciado no cotidiano por qualquer pessoa que buscando soluções para problemas em sua vida, de repente, do nada “cai no seu colo” a resposta. Deve ser por isso que Wallas (1926) – a quem é atribuída pela maior parte dos autores que estudam criatividade a elaboração das fases arquetípicas do processo criativo: i. preparação, ii. incubação, iii. iluminação e iv. verificação, mas que na verdade, segundo Torre (2005) foram estabelecidas por Poncaré em 1913 ao definir os passos do processo intuitivo ou de insight – incluiu uma fase em seu processo linear de criação onde a pessoa deveria deixar conscientemente de pensar na questão por algum tempo. Goswami (2012), em seu livro “Criatividade para o século 21: uma visão quântica para a expansão do potencial criativo” afirma que “o processamento inconsciente é o processamento quântico – um processo simultâneo de muitas

20

Juntamente com o occipital, os 3 lobos fazem parte do centro de associação do cérebro. O lobo temporal é responsável pela compreensão da linguagem, reconhecimento de rostos, exercendo funções ligadas à memória e funções emocionais. Já o lobo parietal é responsável pela percepção e integração sensorial, pelas habilidades espaciais e pela consciência do corpo no espaço. (Carson 2012, 59). 21

O hemisfério direito controla os padrões geométricos, reconhecimento de rostos, os sons ambiente, as melodias e acordes musicais. Ele é responsável pela memória não verbal, pelo senso de direção, pela rotação mental de formas, pelo pensamento concreto, pelo processamento paralelo, pela comparação de imagem holística versus detalhes, e por evitar emoções (Carson 2012, p. 58).

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possibilidades – radicalmente superior ao método científico de cepa newtoniana” (Goswami, 2012, p. 40). Em um discurso que considero muito semelhante ao da teoria da transdisciplinaridade, Goswami (2012), mostra que a compreensão da não localidade e da descontinuidade dos processos quânticos – que podem ser claramente reconhecidas nas mudanças de contexto dos insights – permitem uma percepção plena da questão. Ou seja, uma percepção em três níveis: como os três níveis distintos da realidade da teoria da transdisciplinaridade (Nicolescu et. al, 2000): 

a percepção interna e pessoal – os pensamentos, conceitos e outros objetos mentias;



as percepções físicas dos objetos – que são compartilhadas com outras pessoas, cormo cores, texturas, formas, tamanhos, etc.; e



a percepção do que está “gravado” no inconsciente coletivo.

Existem as coincidências ou acontecimentos casuais na criatividade que são eventos ligados a sincronicidade, já que a criatividade é nutrida por nossas raízes ligadas ao inconsciente coletivo, e “quando estamos envolvidos com o insight criativo, alinhamo-nos com o movimento do todo, a consciência não local” (Goswami, 2012, p. 180). “O movimento de consciência quântica não local que se manifesta em um ato criativo pode envolver mais do que uma pessoa. A criatividade múltipla, ou seja, o nascimento de uma ideia criativa que se origina conscientemente com mais de uma pessoa, é fenômeno bem conhecido que vem a ser outro exemplo de sincronicidade. A descoberta quase simultânea da equação matemática da física quântica pelos físicos Werner Heisenberg e Erwin Schrödinger é um exemplo [...]. É claro que Heisenberg e Schrödinger expressaram sua descoberta de maneiras diferentes (equivalentes), mas isso não deve dar margem a confusão. Uma vez que cada um de nós detém o seu próprio repertório – que é diferente portanto – para manifestar o insight criativo, nossas linguagens de expressão da mesma verdade fundamentalmente são diferentes” (Goswami, 2012, p. 177-178). Para Kneller (1978), o insight – que o autor denomina iluminação usando a denominação criada por Poncaré – é a percepção da solução do problema pelo criador através de um “conceito que enfoca todos os fatos, o pensamento que completa a cadeia de ideias em que ele trabalha” (Kneller, 1978, p. 68). É muito interessante perceber que mesmo animais possuem esse momento de insight criativo para solucionar uma questão –o que me faz pensar que os insights devem fazer parte da natureza de sobrevivência dos seres vivos

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–, que incluem tanto fatores físicos quanto emocionais. Em um experimento realizado com chimpanzés para verificar como eles solucionavam problemas de alcançar frutas colocadas fora de seu alcance, Koeler (in: Puchkin, 1976) verificou também a sua presença. “Tornou-se bastante conhecida sua experiência com uma banana colocada longe do macaco, juntamente com um pau com cujo auxilio era possível trazer a fruta para mais perto. Complicando o problema, Koeler pôs a banana distante da janela de forma que o macaco já não podia alcançá-la com a vara e precisava, desde logo, apanhar outra mais comprida e só depois a banana. Noutra experiência, pendurou a fruta no teto de forma que, para alcançá-la, o macaco teria de utilizar três caixas, uma sobre a outra. Em todas essas experiências, o comportamento dos macacos não se ajustou à teoria de provas e erros, presumindo reflexão, reconhecimento de objetos e sua interligação. Em alguns casos, Koeler chegou mesmo a observar em macacos até certo vislumbramento repentino, como que compreensão da situação – fenômeno que, em Psicologia, recebeu o nome de insight (percepção). Exteriormente, o quadro de comportamento consistia no seguinte: Após algumas tentativas infelizes para solucionar o problema, o animal deixava de agir e punha-se de lado. Durante algum tempo permanecia imóvel, sentado, depois de súbito, saltava e, sem qualquer erro, realizava as ações que conduziam à solução de problemas. De maneira alguma, esse fato se ajusta à teoria de provas e erros” (Puchkin, 1976, p. 31-32). O autor faz questão de frisar que “o relatório dos pesquisadores não cita nenhum caso que o animal se lançasse, completamente às cegas, contra tudo que os cercava” (Puchkin, 1976, p. 32). O que, do meu ponto de vista, pode reiterar a importância de uma intenção inicial de se inovar – ou seja, de se encontrar uma nova ordem racional, sensorial, estética ou emocional para suprir a percepção de algo mudou na situação e que os padrões fixos já não são o bastante –, como no caso do macaco, de suprir a necessidade de alcançar a banana. Para Werthheimer (in: Puchkin, 1976) o insight é um vislumbre súbito, da percepção da situação através de uma nova ótica, como “um salto de um para outra estrutura de situação” (Puchkin, 1976, p. 36). Na época, como o autor afirma, a essência dos processos mentais do insight, ainda permaneciam obscuros. Mas através da adoção dos conceitos da transdisciplinaridade, ou seja, pensar fora dos padrões da lógica clássica – que se atêm aos padrões de linearidade, de regularidade, de constância, de separabilidade e de impossibilidade a coexistência dos opostos – consegue-se trazer um pouco de luz sobre este processo. “A formulação de um problema, frequentemente, é mais essencial do que sua solução... Levantar novas questões, novas possibilidades, considerar

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antigos problemas de um novo ângulo... marcam um verdadeiro avanço na ciência” (Einstein, in: Carson, 2012, p. 148) E como pode ser visto até agora, a formulação do problema está diretamente ligada à percepção da situação que o envolve. Por isso gostaria de abordar um último conceito que considero relevante no estudo do pensamento criativo: a relação da ambiguidade com a criatividade. Kneller (1978, p. 85) afirma que “grande parte da energia do estimulo que atinge os receptores é ambígua”. Olhando-se a definição em dicionários, percebe-se um tom negativo da sociedade frente ao termo ambíguo, associandoo a termos como indeciso, equivoco, insegurança, de sentido incerto, desprovido de clareza em suas opiniões, sem firmeza ou convicção. Do meu ponto de vista isso é resultado de um preconceito negativo ao fato de algo ambíguo conter ou “poder conter” múltiplos sentidos, o que impediria uma comunicação ou uma relação clara e objetiva entre as pessoas ou entre pessoas e objetos. Mas é preciso destacar que para o pensamento criativo o fato de conter múltiplos sentidos, impede o cérebro de seguir o caminho mais cômodo do pensamento reativo, da resposta automática à situação vivenciada. Segundo Goswami (2012), estímulos ambíguos são cruciais para se abandonar os processos mentais conscientes e consequentemente dirigidos, abrindo-se as possibilidades dos saltos criativos através de processamentos inconscientes. Para o autor, buscar a fronteira das coisas para ver o que acontece, como os artistas fazem, ou pensar em metáforas, como muitos filósofos ou cientistas fazem, são táticas que ajudam a gerar padrões ambíguos de pensamento que abrem diversas possibilidades de soluções. Ao se buscar por situações que não sejam claras nem objetivas desencadeia-se um processo de um pensamento que envolve o desconhecido, forçando-se conscientemente a criação de novos padrões mentais. Como pode ser visto no exemplo de imagem ambígua (Figura 12), ao se deparar com uma imagem pouco definida, a mente busca na memória por uma aproximação através da forma ou das cores – o que não é o caso dessa figura em preto e banco – por algum significado conhecido para se poder compreendêla. Ou seja, quando a “estimulação é ambígua, os significados aprendidos, dados ao estímulo, determinam em grande parte a percepção” (Day, 1970, p. 85). Se a figura de Jesus Cristo fosse, por exemplo, a de um homem de cabelos curtos, sem barba, essas manchas ficariam sem significado, e não passariam de contornos indefinidos.

151

. Figura 12 - Exemplo de imagem ambígua

“[Este] exemplo amplamente popularizado, presente até em restaurantes à beira de estradas, é o da ilustração da face de Jesus Cristo composta de uma série de manchas pretas sobre um fundo branco, encimada pela frase: “Quem me vê jamais me esquece”. Na base deste tipo de evento perceptivo reside o princípio de que, uma vez visualizada, sempre será possível ver a imagem desta forma e mesmo, no limite, alternar os modos de ver” (Figueirôa, 2009). Acho importante se ressaltar, que segundo o experimento de homen-rato de Bugelski e Almapay, (1946, in: Day, 1970), esta percepção pode ser induzida por uma sequência de estímulos prévios:

Figura 13 - Homem-rato de Bugelski e Almapay (1946, in: Day, 1970)



vários rostos humanos direcionam para se perceber a figura de um velho careca de óculos; e



várias figuras de animais direcionam para se perceber a figura de um rato onde os olhos do senhor careca se tornam as orelhas, a boca e a orelha se transformam em duas patas e o queixo e percebido como a cauda longa do rato.

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Day (1970) afirma ainda que o significado da ambiguidade “pode derivar-se de outras fontes, como, por exemplo, das denominações anexadas ao estímulo, quer pelo próprio observador, quer por outra pessoa que forneça instruções ao observador” (Day, 1970, p. 87). A Figura 14 “Minha mulher e minha sogra” de Hill (in: Goswami, 2012), é um exemplo disso. Ao se identificar qualquer uma das duas, muitas pessoas ficam “lutando” com a mente para conseguir ver a outra, pois seu título mostra que nessa imagem as duas estão contidas: no caso da mulher jovem vê-se um perfil onde se destacam o queixo, orelha e o pescoço longilíneo com uma fita negra amarrada, lembrando uma figura da belle epòque; e no caso da sogra o queixo é visto como um nariz enorme, a orelha e percebida como olho e a fita negra no pescoço se transforma em uma boca “rasgada”, lembrando as figuras de bruxas das histórias infantis.

Figura 14 - “Minha mulher e minha sogra” de Hill (in: Goswami, 2012)

Para Goswami (2012) o exemplo desta figura demonstra que uma mesma imagem

pode

conter

mais

de

uma

possiblidade

de

percepção

e

consequentemente de significação, bastando-se apenas adotar uma outra perspectiva. “A possibilidade de ver ambos os significados já está presente na nossa mente. Estamos apenas reconhecendo e escolhendo uma das possibilidades” (Goswami, 2012, p. 85).

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5.2

Abordagens criativas: Mandala transrelacional Ao ser convidada para realizar uma apresentação sobre criatividade e

inovação no design de joias dentro de um projeto onde os designers de joias e bijuterias do Rio de Janeiro deveriam fazer uso de novos materiais sócio e economicamente sustentáveis, e resolvi apresentar não só os conceitos levantados até então na pesquisa de doutorado, mas também mostrar exemplos de criações de designers da joalheria de arte que se utilizavam de materiais inusitados em suas criações. Para melhor organizar esses exemplos, resolvi categorizá-los usando as “tendências” de procedimento criativo levantadas por Couturier (2006) – que do seu ponto de vista, até então, era a que apresentava uma das sínteses mais atuais da prática do design contemporâneo – mesmo tendo sido criada a partir da área do design de mobiliário e luminárias. Os designer e autores de joias de arte, questionando o conceito de joalheria, o valor da matéria-prima versus o valor da conceituação, etc. costumam fazer uso de materiais não-convencionais, para atuarem nesse limite do que seria e do que não seria uma joia – e eram esses conceitos e questionamentos que eu queria apresentar para os designers participantes do projeto. Como essas criações são ligadas à pesquisa pessoal de cada autor e muitas vezes não existe a preocupação e o compromisso da produção em massa, segundo Clarke (2013), as joias de arte acabam se tornando peças únicas e exclusivas, podendo-se trabalhar com experimentações de materiais e formas, com as possibilidades de combinações entre metais preciosos – principalmente a prata – com materiais não convencionais como sementes, borracha e plásticos, resinas, pano, lã, etc. Relativamente recente, já que a primeira grande mostra de joias contemporâneas aconteceu em 1961 em Londres, a joalheria de arte surgiu dentro do mesmo movimento de liberdade social e estética que inspirou todas as produções criativas (artes cênicas e plásticas, moda, design, etc.) dessa década. Segundo Clarke (20130, foi na Alemanha que surgiram as primeiras experimentações com novos materiais. Mais precisamente na Alemanha Oriental, onde vigorava na época o regime comunista, e a falta de ouro e outros materiais preciosos fez com que os artistas e designer de joias buscassem por novos materiais sintéticos e reciclados para comporem suas peças, respondendo

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à necessidade do ser humano em se enfeitar e se diferenciar através de adornos. Desde de então a joalheria de arte encontrou um nicho nas galerias e ateliês de joias e conseguiu visibilidade ao participar de importantes exposições de artes, como a Ornamenta e a Documenta. Subvertendo e reinterpretando técnicas tradicionais, como por exemplo, a criação de novas lapidações, a mistura de linguagens estéticas, a adaptação de tecnologias produtivas de outros setores, etc., a joalheria de arte é um “manancial” onde a indústria joalheira sempre pôde buscar inspiração para seus novos produtos. E, acredito, que é na joalheria de arte que as rupturas estéticas e de linguagem que ampliam os limites da área são realizadas. “Depois dos anos1960, a joia gerou debates sobre os materiais da qual ela poderia ser fabricada, como suas fronteiras deveriam ser definidas, e se ela é arte ou não. Preconceitos sobre materiais e técnicas já foram em muito vencidos. A fronteira entre joia, escultura, arte performática e moda foi esticada e continuará a ser redefinida por artistas que não queiram ser contidos por convenções” (Phillips, 1997, p. 216, livre tradução). Tomando como base mais de 60 exemplos de joias de arte recolhidos durante minhas pesquisas em sites de designers e de galerias de joalheria contemporânea, em um período de mais de 3 anos (entre 2009 e 2011) para a publicação de posts em o blog do Portal Joiabr – o portal de joias e bijuterias mais respeitados do Brasil –, iniciei a sua classificação tentando ordená-los nas “tendências” de procedimento criativo levantadas por Couturier (2006). Mas no meio do processo percebi, porém, que muitas das joias não seguiam apenas uma das tendências propostas. Nesse momento esbarrei em uma questão crucial: Qual delas escolher? Como definir a importância de cada uma dessas tendências naquela peça especificamente? Seria válido escolher “a mais importante” reduzindo assim a complexidade da peça proposta pelo designer autor de joias? Se a inovação dessas criações estava exatamente na ambiguidade que era gerada através da multiplicidade de referências que impediam que, através do pensamento reativo, as enquadrássemos automaticamente em algum padrão pré definido, ignorar essa multiplicidade de tendências seria uma “simplificação idealizada e reducionista” que escamotearia a sua força expressiva. Optando em manter a complexidade e a totalidade da peça, surgia então uma nova questão: Como demonstrar a multiplicidade de tendências dessas peças? Que recurso visual usar para comunicar esse conceito de globalidade?

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Lembrando-me de um exercício de interdisciplinaridade, onde em um mapa circular de disciplinas buscava-se levantar as áreas que a pesquisa em design poderia tangenciar, experimentei ordenar as tendências de Couturier (2006) em volta de um círculo, pois assim seria possível registrar mais de uma tendência de procedimento se necessário fosse. Mas durante o processo, a partir dos exemplos das joias e da minha experiência como de mais de 25 anos como designer gráfica e mais de 10 anos como designer de joias, comecei a perceber a necessidade dessa classificação ser complementada e até mesmo ampliada, como demonstrado no Quadro 29. Tendência de procedimento criativo (Couturier, 2006) Desviar funções

Estratégias dos outros autores citados no Quadro 21  supressiva  forma  surrealismo

Abordagem criativa subversão da função e/ou forma

Recuperar sucatas

 ecologia

reaproveitamento de materiais

Buscar a hibridização dos materiais

 arte conceitual

combinação de materiais

Revisitar o passado

Fazer coexistir os estilos ((sem referência na autora)) ((sem referência na autora)) ((sem referência na autora))

((sem referência na autora))

 arcaica  orientalismo ou exotismo releitura do passado ou de  arte culturas exógenas  tradição  historicismo híbrido ((ampliado pelo conceito total da mandala, que se propõe a unir diversas abordagens em um só objeto))  Op Art criação de sensações  arte cinética  cultura POP introdução de tecnologias  tecnologia novas ou técnicas exógenas  invenção inspiração na natureza  configuração natural (biônica)  formas imitativas  utópica  retrô-futurismo  futurismo  estética espacial  tendências

previsão do futuro

Quadro 29- Conjunto de procedimentos criativos

Outro ponto que precisou ser também definido era a denominação a ser usada. Alguns autores usavam o termo tendência, outros o termo estratégia, e os termos inspiração, técnica e métodos foram utilizados também. Os termos “estratégias criativas”, “técnicas criativas” e “métodos criativos” eram termos que além de já serem muito usados na literatura sobre criatividade, e por essa razão já estarem com significados cristalizados na mente das pessoas, passam a ideia de ação pré-definidas, de uma “receita de procedimentos” que devem ser sempre executados em uma determinada ordem para se alcançar um resultado específico, possível de ser previsto e pré-

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determinado, antes do processo se iniciar. E, em razão disso vão contra o que os conceitos da metodologia da transdisciplinaridade apregoa. Essa questão de predefinição e de linearidade de ações era o que, a meu ver, também inviabilizava o uso do termo processo. Além disso o termo “processo criativo” na literatura especifica sobre o assunto é um termo amplo, que engloba todos os processos conscientes e inconscientes. O termo tendência, por ser muito usado no universo da moda, ganhou uma significação no inconsciente de muitas pessoas de “modo ou objeto a ser seguido e até mesmo copiado”, de in e out, ou seja, de “dentro ou fora de moda”, de algo que dita as regras, até que uma nova tendência se estabeleça. Enfim algo pouco ligado à criatividade individual, a experimentação livre e aberta a qualquer pessoa e não apenas a dos considerados pela área como “lançadores de tendências”. Restava ainda o termo abordagem, que acabou sendo o escolhido, por ele apontar uma possibilidade que irá se definir durante o processo – não há um modo correto e pré-determinado de se pular a “mureta” e se abordar um navio. Além disso, abordagem denota a ideia de maneira de se encarar um problema ou situação, sem uma linearidade pré-determinada, sem um conhecimento a priori do resultado que se irá alcançar, exatamente o que se queria propor com a mandala transrelacional. Termo

método

estratégia

tendência técnica processo

abordagem

Significado 1. procedimento organizado que conduz a um certo resultado 2. processo ou técnica de ensino 3. modo de agir, de proceder 4. regularidade e coerência na ação 1. (militar) ciência ou arte de combinar ou empregar unidades militares em grandes movimentos e operações 3. uma instância específica de se utilizar desta arte ou ciência 4. uso habilidoso de um estratagema 5. plano, método ou série de estratagemas para obter um objetivo ou resultado específico 1. inclinação; vocação; propensão; queda; pendor. 2. força que faz um corpo mover-se. 1. conjunto de processos duma arte ou ciência. 2. V. processo. 1. ato de proceder, de ir por diante. 2. sucessão de estados ou de mudanças. 3. modo por que se realiza ou executa uma coisa; método; técnica. 1. ação ou efeito de abordar. 2. ato de entrar em um navio. 3. maneira de encarar um problema ou situação. sufixo –AGEM: de origem latina, exprime a ideia de ação ou resultado de ação

Quadro 30 - Definição de termos para escolha de denominação do novo conjunto de procedimentos

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Então, as “abordagens criativas” foram organizadas em círculo, como uma mandala permitindo uma distribuição das peças a partir de proximidade relativizada dentro daquela área demarcada e daquele universo específicos de peças (Figuras 15 e 16).

Figura 15 - Mandala transrelacional de abordagens criativas com os exemplos de peças da joalheria contemporânea

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Figura 16 - Construção da mandala transrelacional de abordagens criativas

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Tomando-se como exemplo o bracelete/broche criado em 1987 pela autora de joias inglesa Arline Fish é possível se perceber que 4 das abordagens podem ser atribuídas a esta peça (Figura 17):    

combinação de materiais -> titânio e prata subversão da função e/ou forma -> múltipla função como bracelete ou broche introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas -> técnica de cestaria adaptada ao metal releitura do passado ou de culturas exógenas -> releitura formal das fíbulas romanas e estética de culturas indígenas

Figura 17 - Abordagens criativas organizada em forma de mandala

É importante se destacar que a classificação de qualquer peça dentro das abordagens depende do conhecimento, do know-how, das referências e da percepção individual de cada pessoa. Quanto maiores, mais abordagens e interligações poderão ser percebidas. Como um sommelier que consegue identificar nuances que um consumidor comum não consegue notar – aumentando assim exponencialmente as possibilidades de percepção de qualidade que tornam ou não o respectivo vinho mais complexo e especial/único ao mesmo tempo –, também na mandala transrelacional quanto mais

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experiência na respectiva área, quanto mais treinada a percepção do indivíduo, mais tendências poderão ser percebidas em cada peça. Outro ponto que deve ser ressaltado, é que mesmo que as abordagens criativas na mandala transrelacional tenham sido restringidas a 8, a materialização dos conceitos dessas abordagens pode se dar de vários modos diferentes. Essa variedade nas materializações depende tanto da área em que as abordagens estão sendo utilizadas, quanto do repertório de experiências e conhecimentos do criador. Experiências e conhecimentos não só relativos àquela área de atuação, mas em relação à todas as áreas de sua vida – pessoal, profissional, visual, estético, etc. – como pode ser visto nos exemplos seguintes:

técnica de se fazer renda: uni ao conhecimento de ourivesaria, com os da técnica das rendeiras para criar padrões na renda que melhor se adaptem à forma do colar

conhecimentos de química: partir dos conhecimentos de química foram criadas rendas através do depósito de cristais de açúcar em fios previamente enlaçados técnica de iluminação: além do conhecimento de ourivesaria para criar o invólucro dos broches, foi preciso ter conhecimento e prática sobre as tecnologias de iluminação através de led – como por exemplo a respeito da bateria – para que a peça emitisse luz e tatuasse o corpo do usuário com “tatuagens” iluminadas técnica de se fazer chocolate: nessa proposta são unidos os conhecimentos de ourivesaria, com os de se fazer chocolate para se criar a forma e a consistência correta do bombom que foi usado como uma gema preciosa neste anel Quadro 31 - Exemplo de materialização de abordagens criativas no design de joias

Essa multiplicidade de conhecimentos do criador corrobora a proposta dos conceitos de Dykes et al. (2009) de design interdisciplinar – onde o designer interdisciplinar demonstra conhecimento especializado em mais de um campo, com a capacidade de combinar os métodos e conceitos de cada um deles como expert – e de design transdisciplinar –onde o designer a partir conhecimentos ou conceitos de pelo menos duas disciplinas sem que nenhuma delas assuma a

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predominância, consegue combiná-los e fundi-los formando uma forma híbrida, recém-unificada. Outro ponto importante que gostaria de abordar é que como essas 8 abordagens criativas são genéricas, acredito que a mandala possam ser utilizadas pelos criadores de diversos áreas, bastando-se adaptar as materializações da ação às respectivas disciplinas. Por exemplo, a abordagem “subversão da função da função e/ou forma” no design pode ser materializar através de uma intervenção no tamanho, na poesia ela pode estar ligada a métrica, na música a introdução de algum instrumento que não fazia parte daquele estilo, na culinária através da desconstrução de um prato mantendo-se o seu sabor tradicional, etc. Na tabela a seguir (Quadro 32), pode-se ver uma sugestão de como como no design – ou seja na configuração de objetos - essa materialização pode ser realizada.

Abordagem criativa: o que? subversão da função e/ou forma

reaproveitamento de materiais combinação de materiais

releitura do passado ou de culturas exógenas criação de sensações

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas inspiração na natureza (biônica) previsão do futuro

Materialização da ação no design: como? - tamanho e comprimento - mutifuncionalidade - deslocamento da função - inversão - humor, brincadeira - estranhamento, bizarro - desconstrução do objeto - ruído perceptivo entre material e função, entre material e sensação, entre material e a simbologia do objeto, etc.... - reciclagem de pedaços de outras peças e/ou de outros objetos - uso de resíduos que seriam descartados - uso de diversos materiais em uma mesma peça - adição de materiais não associados à área -as características de novos materiais redefinindo a forma final do objeto - busca de inspiração no passado - busca de inspiração em tribos culturais - busca de inspiração em culturas externas e/ou exóticas - trabalhar com sensações físicas (tato, olfato, visão, audição e paladar) tradicionalmente não ligadas a área - criação de sensações emocionais através do uso de arquétipos - uso de movimento - uso de inovações tecnológicas - resgate de técnicas antigas - uso de técnicas e tecnologias de outras áreas profissionais - uso de técnicas e tecnologias de outras culturas - pesquisa de novas tecnologias gerando novas formas - inspiração estética (linhas, formas, cores, texturas, proporções, etc.) - inspiração funcional - fazer conjeturas sobre inclusão de novos materiais, técnicas e tecnologias - sugerir estéticas futurísticas - buscar inspiração em estéticas em avanços tecnológicos

Quadro 32 - Exemplos de materialização das abordagens criativas

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É preciso ressaltar que a tabela não tem a pretensão de esgotá-las por completo, já que a cada nova experimentação criativa esse repertório pode ser ampliado. E mesmo nas materializações, se forem olhadas com atenção, podese perceber que elas permitem a cada criador “traduções individuais” – conscientes ou inconscientes – que variam tanto conforme o objeto a ser criado/projetado quanto da capacidade de “tradução formal” dessa ideia por cada indivíduo.Com isso, a mandala transrelacional acaba assumindo uma das principais características da metodologia da transdisciplinaridade ao ser ao mesmo tempo genérica e específica, limitada e infinita (dependendo do repertório de conhecimento de cada um), etc. E confirma a afirmação de Dykes et al. (2009) que no design contemporâneo uma nova capacidade de colaboração está incentivando novas práticas de design, encorajada por novas “interconexões” e “configurações de conhecimentos” que possibilitam novas formas de expressões criativas. Segundo o mesmo autor, um novo enquadramento teórico baseado na multi, inter, e transdisciplinaridade irá propiciar um melhor entendimento sobre a prática emergente da área, onde os limites dos tradicionais domínios do design estão se tornando indefinidos e embaçados. Segundo Cardoso (2011)

objetos com multiplicidade de funções

operacionais, psicológicas e/ou afetivas, ganham sentidos fluídos e “quanto mais um artefato é capaz de agregar e simbolizar valores reconhecidos, mais resistente ele se torna ao esvaziamento e ao descarte” (Cardoso, 2011, p. 167) – tanto um descarte real do objeto ao ser jogado no lixo, quanto um descarte psicológico da falta de interesse em se olhar uma segunda vez para ele. “O cérebro, principal órgão regulador do humor, quer receber estímulos, tem sede de informações, informações novas, tensão, surpresa” (Berns, in: Weber-Lamberdiére, 2008, p.89). Segundo o mesmo autor, a surpresa e atração que o novo causa libera no organismo a dopamina – um neurotransmissor associado à felicidade, como um estimulo antecipado provocado pela novidade. Ao viver uma experiência excitante, resolvendo um problema imprevisto ou solucionando um desafio inesperado, seja ele emocional ou físico, libera-se esse neurotransmissor. O novo causa uma sensação temporária de felicidade. Mas como o novo, com o tempo e o uso acaba se tornando comum, a sensação de felicidade acaba, dependendo da frequência com que o cérebro é submetido a esse estímulo. Quanto mais ele é repetido menos satisfação o estímulo desperta por já ser algo conhecido, obrigando assim aos criadores a gerarem sempre novas surpresas para o cérebro.

163

Esse estímulo pelo novo através da liberação da dopamina também é uma das explicações porque algumas pessoas criativas, segundo Weber-Lamberdiére (2008), não se importam em trabalhar horas a fio, muitas vezes se preocupando menos em acumular riquezas, já que eles estão expostos a esse estimulo do novo 24 horas por dia – pois mesmo no momento em que não está trabalhando a mente pode continuar pensando na resolução dos desafios inerentes à criação. Ao se trabalhar conscientemente com diversas abordagens na concepção do projeto de um objeto, tem-se uma maior probabilidade de torná-lo novo e único, pois a combinação individualizada dos elementos de materialização da ação das abordagens criativas lhe dá uma complexidade difícil de ser “imaginada” por uma segunda pessoa antes de sua concretização. Além disso, é importante se ter em mente que, tomando as funções prática, estética e simbólica do objeto (Löbach, 2001) como base, a materialização da ação das abordagens criativas podem se concretizar tanto a nível funcional, nível estético e/ou nível simbólico de interação sujeito-objeto ampliando assim ainda mais as possibilidades de exploração de “repertórios visuais” únicos. Antes de continuar, gostaria de observar que como nenhum objeto tem uma função fixa, já que ele só se torna objeto a partir de sua relação com algum sujeito, seja ele consumidor, usuário, apreciador de alguma exposição, etc. prefiro fazer uso do termo nível em vez do termo função usado por Löbach (2001). Sendo assim os três níveis variam dependendo de cada sujeito especifico, de seus conhecimentos, suas habilidades, suas experiências de vida, etc. Como na metodologia da transdisciplinaridade, que divide a nossa realidade em três níveis distintos de percepção: i. o mundo “observável” do espaço e tempo contínuos; ii. o mundo do vibratório ou quântico; e iii. o mundo subquântico, entendo que a relação de qualquer objeto com algum sujeito se dá sempre nos três níveis prático, estético e simbólico (Quadro 33). Mesmo que alguns objetos não apresentem algum dos níveis – como, por exemplo, no caso de uma obra de arte onde não se costuma trabalhar com o nível prático do objeto – o sujeito cria uma relação com a sua inexistência, a sua negação – o não-prático, o não-estético e o não-simbólico – podendo-se atribuir a essa ausência um ou mais significados.

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Nível simbólico: que conceitos, vivências, conhecimentos, lembranças, sensações passadas aquele objeto desperta naquele indivíduo especifico Nível estético: que aspectos psicológicos e sensações são despertados pela percepção sensorial daquele objeto naquele indivíduo especifico Nível prático: quais aspectos fisiológicos e mentais são necessários durante o uso daquele objeto por aquele indivíduo especifico

Quadro 33 – Níveis de relação sujeito/objeto

Para ampliar ainda mais a complexidade da questão, cada abordagem pode atuar em um, dois ou nos três níveis simultaneamente. Por exemplo, a abordagem criativa “subversão da forma e/ou função” pode gerar uma mudança apenas no nível prático da relação do sujeito com o objeto, ou apenas no seu nível estético, ou pode expandir sua atuação para todos os três níveis simultaneamente. As possibilidades de se gerar surpresa se tornam assim infinitas. Ainda mais se for levado em consideração que muitos objetos nos dias de hoje não desempenham apenas uma função, como é o caso de telefone celular usado como exemplo no gráfico acima. Se o telefone antigamente era usado apenas para se falar com outra pessoa a distância, o celular atualmente tira fotos, passa mensagens escritas, permite conversas via imagem, grava e toca música, filma, transmite programas de televisão, conecta as pessoas a sites e a redes sociais, realiza pagamentos, etc. Qual seria então a sua função principal? É possível ainda se escolher apenas uma, por exemplo, transmitir conversas faladas entre duas pessoas, e relegar todas as outras a um segundo plano? Ou a relação com o objeto celular varia de usuário para usuário? Se em um primeiro momento isto pode parecer assustador, ter que projetar objetos tão complexos, levando-se todas essas possibilidades em consideração, sob a ótica da transdisciplinaridade e da criatividade quântica de Goswami (2012), onde o nosso inconsciente percebe a totalidade da realidade e das possibilidades e realiza os processos de combinação e de escolhas intuitivamente, esta tarefa se torna bastante corriqueira. Basta abdicar da ilusão do controle do consciente e das amaras da metodologia cientifica no momento de geração de ideias.

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“O procedimento metodológico básico em qualquer atividade cientifica é recortar e fracionar o problema para constituir uma situação experimental passível de averiguação. Esse método funciona extremamente bem para uma série de análises, mas é de pouco valia para lidar com a elaboração de grandes sistemas complexos, sua manutenção e planejamento. [...] Assim como outras áreas projetuais – em especial, a engenharia e a arquitetura – o design parte de uma abordagem bem diferente. Em vez de fracionar o problema para reduzir as variáveis, o designer visa gerar alternativas, cada uma das quais tende a ser única e totalizante” (Cardoso, 2011, p.243-244). Tanto a trivialidade inconsciente desse processo é verdade, que no mundo atualmente as pessoas se encontram cercadas de objetos complexos, e não só os tecnológicos como computadores, telefones celulares, tablets, etc. Até mesmo em uma atividade tão cotidiana como na preparação de alimentos, vê-se que a complexidade de um prato consegue ser percebida e tem o seu valor reconhecido tanto pelos chefs de cozinha que buscam incorporar a novas técnicas e novas matérias primas em seus repertórios de preparação das refeições, quanto pelos consumidores que pagam quantias consideráveis para vivenciarem combinações inovadoras de sabores e texturas, como também pela mídia divulgando esses novos conceitos para a grande massa. “Da nouvelle cuisine [meados de 1970] em diante, a gastronomia passou por uma valorização sem precedentes históricos, auxiliada pela exploração contínua dos ambientes midiáticos que utilizam esse sistema da cultura. Programas de TV, livros e revistas de gastronomia, sites e blogs de internet, todas as mídias possuem hoje veículos que divulgam alguns desses preceitos fundamentais da alta gastronomia contemporânea. A cozinha molecular de Ferran Adrià e Hervé This, que decompõe a estrutura química dos alimentos; os terroirs, produtos regionais que ganharam status de obras de arte; a cozinha fusión que usa ingredientes de todo o mundo globalizado para novas combinações de sabores são algumas das tendências contemporâneas” (Jacob, 2013 p. 47). O chef catalão Ferran Adrià é um exemplo da busca da complexidade de experiências no processo de criação através de sua “techno-emotional cuisine”. Mesmo Adrià tendo fechado em julho de 2011 seu renomado restaurante El Bulli – eleito por quatro vezes o melhor restaurante do mundo pela revista britânica Restaurant, de 2006 a 2009 – por ter avaliado que o modelo sedimentado até então pelo restaurante ao longo dos anos não “permitia mais continuar criando novas receitas e experimentando novos formatos” (Jacob, 2013 p. 47-48), através de artigos de revistas e de jornais on-line de 2012 vê-se que o chef pretende continuar trabalhando com criação, ao transformar o El Bulli em uma fundação de pesquisa de criatividade. Segundo declaração de Adrià, a fundação

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“será um centro para experimentação, onde iremos estudar modos de se fomentar a autoria criativa usando culinária e gastronomia, mas buscando criar um diálogo com outras disciplinas, e divulgando as descobertas através da internet” (Husband, 2012, livre tradução). Adrià pretende por meio dessa imersão na pesquisa criativa repensar a alta gastronomia para através dos conhecimentos levantados oferecer um “guia” de inovação que possa ser transposto para qualquer área de atuação. “Essencialmente ele lutou com a noção que não pode haver nenhum processo na culinária – nos negócios ou na arte – sem uma ideia. A fundação é uma tentativa de Adrià de entender a natureza da criatividade e de enfocar numa questão poderosa: da onde vem as ideias, e como conseguimos promovê-las da melhor maneira possível? Inovação radical e mudanças constantes foram a base do trabalho de Adrià e ajudaram a distingui-lo de seus contemporâneos – mas sempre foram uma raridade na cozinha dos restaurantes.” (Williams, 2012, livre tradução). Nos parágrafos seguintes será apresentada um pouco de sua experiência pela busca de inovação na culinária, para se entender porque Adrià acredita e a mídia mundial espera que ele construa esse “guia” de inovação criativa, transpondo os conhecimentos adquiridos no know-how que ele domina – a gastronomia – para qualquer profissional de outra área que se disponha a ser criativo – proposta semelhante à da mandala transrelacional de abordagens criativas. Partindo de apenas 4 sabores: amargo, salgado, doce e azedo, Adrià cria pratos que convidam as pessoas a se concentrarem “totalmente na consistência, na textura, e no sabor do prato, para que reflita sobre a experiência ou simplesmente sorria devido à surpresa, às vezes devido à alegria” (WeberLamberdiére, 2008, p.17). Segundo Weber-Lamberdiére (2008), a partir de uma simples pergunta: porque o sorvete sempre tem que ser doce, “o chef catalão começou a fazer experiências na busca obsessiva pela milagrosa multiplicação do sabor” (WeberLamberdiére, 2008, p.84). Ao adicionar a um sorvete de frutas normal sal mineral, ele percebeu que era o impacto da quebra de expectativa que tornava o sabor espetacular e tomou a decisão que a partir desse momento tudo que fosse servido no seu restaurante El Bulli deveria surpreender os clientes. Para que isso acontecesse era preciso encarar todos os ingredientes, e também os modos tradicionais da culinária de preparação e apresentação, sob um novo olhar, sempre buscando uma ideia que alguém nunca tivesse tido antes. “Eu quis levar a nouvelle cuisine a um passo adiante, a ponto de se estar desconstruindo a essência do sabor e da sensação, e reconfigurando a comida

167

como uma série golpes intensos na língua” (Adrià, in: Husband, 2012, livre tradução). Supermanipulação dos ingredientes; uso de espessantes, emulsificantes e gelatinas; criação de novas técnicas e apropriação de outras como, por exemplo, espuma, esferização, hidrogênio líquido e liofilização22 permitiram que o chef catalão e sua equipe criassem pratos como: 

sorvete de roquefort, sorvete quente



raviólis, canelones, omeletes e crepes a partir da nata de leite



caviar de melão



gaspacho formado por uma montanha de lascas de pepinos, tomates cortados e carne secadas a vácuo em vez da tradicional sopa fria



arroz caramelizado com chouriço, etc.

Acreditando que se come não só com os cinco sentidos, mas também com um sexto: a mente, Adrià gosta de explora também uma “sexta dimensão” que se dá através da quebra de expectativa entre o nome e o prato que é apresentado, obrigando o cliente a refletir e rever padrões mentais e costumes fixos. Foi essa busca pela “sexta dimensão” que resultou no convite por parte de Roger M. Buergel, curador da Documenta em Kassel, para que Adrià fosse o primeiro cozinheiro a expor na tão renomada exposição de arte. Segundo Weber-Lamberdiére (2008, p.168) Buergel se interessou na culinária de Adrià em primeiro lugar “não pelo sabor, mas pela crise pela qual a pessoa passa quando não consegue identificar imediatamente o que foi posto no seu prato. O artístico não está relacionado com a aparência do prato [...]”. O que não quer dizer que Adrià não se preocupe com a aparência como se pode ver em algumas de suas criações mostradas a seguir no Quadro 34. A imagem ajuda na quebra da expectativa da forma e do conteúdo, possibilitando a geração de uma ambiguidade que serve de estimulo para essa reflexão.

22

Liofilização é o processo de congelamento de produtos em uma câmera de vácuo, que mantém a cor, o tamanho, a forma e a consistência original. Conservando o máximo de sabor, vitaminas, minerais e aromas, o produto pode ser re-hidratado instantaneamente. Os produtos estão disponíveis em flocos, grãos e pó.

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Sopa de letrinhas com letras de merengue de morango

Ventrecha de salmão com confeitos e pérolas de frutas cítricas

Caviar de melão

Ravióli esférico de ervilha e salada de ervilha e menta

Tempura de brotos de funcho

Pirulitos congelados de aspargos e trufas negras

Èspesso Espuma de café criado para Lavanza

Sushi de mexilhão com spray de gengibre

Quadro 34 – Exemplos de criações gastronômicas de Ferran Adrià

Como Adrià se inspirou em uma nova gramática e numa nova ordem dos preceitos da culinária da nouvelle cuisine para a partir de sua mente curiosa e de muita pesquisa ampliar os limites da experiência sensorial na culinária, aumentando os limites da expressão de um chef e do acervo das técnicas e linguagens da alta gastronomia, o chef inglês Heston Blumenthal, se inspirou em Ferran Adrià para ampliar ainda mais essa gramática culinária seguindo um outro caminho: o de questionar antigos conceitos da técnica de preparação de alimentos. Além de ler os clássicos da culinária francesa, ele se interessava pelas novidades que os cientistas escreviam sobre a culinária, como por exemplo, Nicholas Kurti que nos anos de 1960 proferiu palestras na Real Sociedade Britânica como títulos como “O físico e a cozinha”; Hervè This que pesquisou os processos físicos e as reações químicas da culinária e que nos anos 80 fundaram em conjunto com Kurti fundou uma nova disciplina nomeada com o nome da tese de This de Gastronomia Molecular e Física; Harold McGee com seu livro “O cozinheiro curioso: mais ciência da culinária e da tradição popular”, etc. “O que interessava Blumenthal era o porquê (um prato aciona uma determinada sensação). Assim que descobria a resposta, ele passava para o como (acionar tal sensação). Com frequência agia segundo um princípio que se poderia chamar de ‘sabor condicionado’” (Weber-Lamberdiére, 2008, p.109).

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Blumenthal acreditava que dois ingredientes similares em sua estrutura química se completam, porque o sabor é reforçado por esse efeito duplo, e fez diversos testes unindo ingredientes e compilando mais de 3.500 essências de líquidos com sabor, como por exemplo: um líquido com sabor de grama cortada, com sabor de carvalho, com gosto de couro, etc. Ele testou também o reforço do sabor pelo som durante a refeição ou pela experiência múltipla do design sensorial criada para gerar uma experiência única, desde o momento da reserva pela internet, chegada e saída do cliente a seu restaurante The Fat Duck, misturando sabor, imagens, sons e lembranças. “Á sua maneira, ele [Blumenthal] abandona a culinária clássica de forma ainda mais arrojada do que Adrià. Ele pode combinar produtos que normalmente não são combinados: salmão com alcaçuz, chocolate branco com caviar ou escargot com geleia. Os garçons podem fazer mágicas com os pratos, por exemplo, transformar uma pétala de rosa em um ovo, como um mágico profissional. Ficção e realidade se misturam durante esse acontecimento culinário mágico, e o cliente se sente como Alice no País das Maravilhas” (Weber-Lamberdiére, 2008, p.111). Como em qualquer processo de difusão da inovação, todos esses conceitos da culinária, podem ter sido criados por pessoas que os intuíram através de suas pesquisas, mas atualmente já são de domínio de diversos cozinheiros que fazem uso deles em seus próprios restaurantes. Preocupados em trocar os conhecimentos e ideias de forma generosas, foram criados grandes encontros de culinária, onde segundo Weber-Lamberdiére (2008) reina em uma atmosfera de novidade e euforia, compartilhando-se novas técnicas e ideias. Um exemplo que acredito que deveria se tornar prática para aqueles que buscam entender a criatividade, e porque não imitado pelos designers inovadores. Mesmo que não tenham sido criados a partir da mandala transrelacional, ao se analisar os exemplos de inovação na alta gastronomia acima apresentados, pode-se perceber que eles se encaixariam perfeitamente nos conceitos apresentados. Adrià e Blumenthal, na sua busca por novos conceitos para a culinária, trabalham muito com algumas abordagens criativas – usadas simultaneamente ou não –, acrescentando à linguagem da culinária novas possibilidades, novos “como se fazer” para materialização de suas ideias: 

subversão da função e/ou forma: como quando Adrià coloca sabores nas espumas; brinca com o conceito de sorvete salgado ou sorvete quente; desconstrói o gaspacho, cria pirulitos de legumes;



combinação de materiais: como por exemplo quando Blumenthal combina salmão com alcaçuz, chocolate branco com caviar ou escargot com geleia;

170



releitura do passado ou de culturas exógenas: como quando por exemplo Adrià brinca com perdiz marinada – um prato clássico centenário da cozinha ibérica, servido nos restaurantes mais sofisticados da região – transformando-o em um perdiz-lagosta;



criação de sensações: quando por exemplo Blumenthal acrescenta sons a refeição, ou Adrià faz o garçom antes de um prato liberar o aroma de flor-de-laranjeira de um balão de ar para transpor o cliente ao mundo árabe da Andaluzia;



introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas: ao introduzirem técnicas de nitrogênio líquido, criação de espumas com sifão, ou quando por exemplo Adrià busca no Japão a técnica de fazer massas e crepes a partir da nata do leite de soja adaptando ao leite de vaca; etc.

Mostrando assim, que inconscientemente ou sob outra denominação, a prática proposta pela mandala transrelacional de abordagens criativas já vem sendo utilizada por outros criadores. A teoria da transdisciplinaridade proporcionou, através de um novo enquadramento teórico, a possibilidade dessa prática ser percebida em diversas áreas que se propõem à criação de objetos – no sentido anteriormente citado do termo – que buscam se tornar inovadores.

171

6 Mandala transrelacional de abordagens criativas – da teoria à prática

“Compreender significa ser capaz de fazer” (Goethe, in: Westin e Coelho, p.65, 2011).

Para avaliar como na realidade da experiência projetual a mandala transrelacional se inseriria, era preciso experimentá-la na criação de um objeto de “design inovador”. Partindo do design de joias, que é a minha área de atuação como designer, experimentei fazer uso da mandala transrelacional no momento de criação de uma joia de “design inovador” para a 10ª Edição do concurso AuDITIONS da Anglogold Ashanti, que foi documento no subcapítulo seguinte. Percebendo que a mandala transrelacional também poderia ser usada como instrumento de análise e aprendizado, o subcapitulo seguinte se concentra em avaliar se através dela seria possível se tentar definir a existência de abordagens criativas predominantes na criação de design inovador. Tomando como objeto de análise a coleção de joias finalistas do AuDITIONS da Anglogold Ashanti, a análise se focou no número que abordagens criativas que os diversos criadores de joias combinaram em seus projetos. Como nos dez anos do concurso mais de 170 peças foram selecionadas e muitos criadores foram selecionados em mais de uma edição bianual, foi possível se fazer uma avaliação bastante abrangente.

6.1

Mandala transrelacional no processo de design de um projeto Pouco tempo depois da mandala transrelacional de joias contemporâneas

ter sido apresentada naquela palestra sobre criatividade e inovação no design de joias, a edição bianual de um dos mais importantes concursos de design de joias do país, o AuDITIONS Brasil, foi lançada. Para experimentar de que forma a mandala transrelacional funcionaria na prática ao ser usada como uma ferramenta de ampliação do “repertório criativo”, aproveitei a oportunidade para projetar uma peça através de seus preceitos.

172

Como o tema do concurso era Brasilidade, escolhi como tema da peça à multiculturalidade do povo brasileiro. Logo surgiu a ideia de tentar representar esse conceito através de duas possíveis propostas, “resumidas” através dos títulos para os projetos: 1. Casa Grande & Senzala - evocando a ideia proposta por Gilberto Freire do Brasil ser um paraíso tropical e mestiço, onde se daria a confraternização de raças e culturas oriundas da Europa, África e América e materializando o conceito de multiculturalidade através de

formas

icônicas

das

importantes

joalherias

africana

e

portuguesa. 2. Iemanjá - materializando o conceito de multiculturalidade através do sincretismo religioso, e abordando ainda a importância da fé para o povo brasileiro. Depois de uma rápida avaliação mental resolvi trabalhar com a primeira proposta, pois duas imagens de peças usadas na mandala transrelacional me pareciam perfeitas para serem combinadas na criação de uma peça com o tema Casa Grande e Senzala: Broche de Anya Kivarkis O trabalho da autora de joias americana associando a formas tradicionais da joalheria barroca e vitoriana, renegando o metal brilhante e as joias faiscantes ao encobrir a prata com esmalte e ressaltando assim o rebuscado da forma, me lembrava as peças icônicas da joalheria portuguesa da época da colonização do Brasil (fonte: www.anyakivarkis.com) Anel de Diamante de Kim Buck A desconstrução do diamante em uma forma de metal planificada que ao ser montada criava a imediata associação com a gema real, me mostrava que a força da forma é mais forte que o material. (fonte: www.buck.dk) Quadro 35 – peças que serviram de inspiração para o projeto Casa Grande & Senzala

Foram surgindo então diversos pensamentos e micro tomadas de decisões intuitivas, em um processo sem a preocupação uma linearidade, mas que foram criando aos poucos uma conceituação mental do caminho formal que a peça poderia seguir (Quadro 36).

173

Quadro 36 – Processo de conceituação do projeto Casa Grande & Senzala

A partir disso busquei imagens de referências do Brasil Colônia que mostrassem as joias usadas pelas escravas e pelas donas de escravas, e também de ícones da joalheria portuguesa e da joalheria africana que gerassem uma imediata identificação da proposta por quem julgasse o projeto e posteriormente também por quem visse a peça (Figura 18).

174

Figura 18 - Imagens de inspirações para o brinco Casa Grande & Senzala

Algumas abordagens criativas logo se mostraram “perfeitas” para mim nesse projeto: 

releitura do passado ou de culturas exógenas => joalheira portuguesa do século XVIII e joalheria tribal africana;



subversão da função e/ou forma => o tamanho da joalheria africana e da portuguesa;



introdução de novas tecnologias ou técnicas exógenas => a modelagem 3D no computador seria de grande valia para reproduzir a forma das gemas da joalheria portuguesa no metal, repetindo-as, ampliando e reduzindo-as; e também ajudaria para criar uma representação mais precisa do alto ou baixo relevo das joias africanas na prancha de apresentação da proposta do projeto.

E algumas das criações de outros autores exemplificadas na mandala transrelacional de joias contemporâneas (Figura 19) apontavam possibilidades de se materializar essas abordagens, como pode ser visto na mandala a seguir.

175

Figura 19 - Peças de inspiração das respectivas nas abordagens selecionadas para o projeto Casa Grande & Senzala

Comecei então a rascunhar mentalmente duas ideias, para depois passar a desenhá-las no programa de modelagem 3D, o Rhinoceros 

a primeira era de unir os dois conceitos em um só pé de brinco (Figura 20), fazendo-os simétricos; e para simplesmente não fazer uma configuração aditiva de um brinco de gemas com uma argola de metal, resolvi inverter as referências, colocando as gemas na argola e o metal trabalhando em pingente interno. Mas como pode ser visto, nem cheguei a terminar de projetar os detalhes do alto e baixo relevo no pingente de ouro amarelo porque o resultado não estava ficando “claro”. As referências às joalherias portuguesa e africana

tinham

se

perdido,

pois

haviam

sido

muito

descaracterizadas. A peça se tornara apenas um brinco de pedras com um pingente de metal no meio.

176

Figura 20 – Primeira opção de layout para o brinco Casa Grande & Senzala



a segunda opção era fazer o brinco assimétrico, ou seja a argola de um lado, e o brinco de pedra do outro (Figura 21). Além de expressar melhor a ideia de que todo brasileiro tem a cultura europeia e a cultura africana na construção de sua brasilidade (tema do concurso), achei que as referências imagéticas se mantinham desse modo mais intactas. A unidade seria criada pela cabeça do brinco da outra cultura, ou seja, no pé direito do brinco a cabeça do brinco era a argola e a ênfase era dada à forma icônica da joalheria portuguesa; e no pé esquerdo do brinco a cabeça era o brinco de gemas, dando-se maior ênfase a joalheria africana através da argola “entalhada” em baixo relevo.

177

Figura 21 – Segunda opção de layout para o brinco Casa Grande & Senzala

Para enfatizar o ouro, e sua variedade de cores através do uso de ligas diferentes, a argola seria feita em ouro amarelo, os “diamantes” em ouro branco e a gema central em ouro rosa, lembrando uma safira rosa, ou até mesmo um rubi dependendo do tom do ouro alcançado – gemas tradicionais da joalheria mundial (Figura 22).

178

Figura 22 – Render do layout para o brinco Casa Grande & Senzala

Depois das formas definidas, era preciso determinar o tamanho do brinco em relação ao rosto de alguma pessoa para passar a ideia de “grande” – conceito presente tanto na joalheria portuguesa quanto na joalheria africana. Para isso escolhi uma imagem de um rosto de uma mulher, posicionei os brincos construídos no Rhinoceros no ângulo que combinava com a posição do rosto e fiz a montagem das imagens em um programa de imagem – nesse exemplo o Adobe Photoshop. Como uma das categorias de seleção das peças finalistas é a atratividade – que é definida neste concurso como o impacto visual final da peça – resolvi não só fazer os brincos grandes, mas trazer um dos conceitos muito utilizados em desfiles recentes dos grandes estilistas de moda no uso de colares, broches, braceletes e atem mesmo de brincos nas passarelas (Figura 23): o extreme oversized.

Figura 23 - Brincos extreme oversized (Michelle, 2010)

179

Como se pode ver nas imagens da montagem para o projeto (Figura 24), a transposição do conceito extreme oversized, ou seja, de um tamanho exagerado – principalmente no caso de brincos que pesam na orelha –, trouxe um impacto à peça, que acabou garantindo que ela fosse uma das finalistas do concurso, para ser em uma segunda etapa produzido com até as 400 g de ouro fino disponibilizados pelos organizadores para a execução das peças selecionadas.

grande

extreme oversized

Figura 24 – Opções de proporções para o brinco Casa Grande & Senzala

O uso da tecnologia de modelagem 3D na execução do projeto permitiu que os dados tridimensionais criados para a prancha de apresentação do projeto fossem aproveitados diretamente pela indústria de joias responsável pela execução da peça em ouro. Como ela tinha o maquinário respectivo, a indústria patrocinadora pode modelar a peça em resina através da tecnologia de prototipagem rápida por adição e a partir dela fundir as respectivas partes conforme as cores do ouro do projeto: amarelo, branco e rosa. O peso do brinco pela escolha do tamanho exagerado acabou se tornando mesmo um problema, e novamente a tecnologia de modelagem 3D foi de muita importância ao possibilitar um retrabalho dos respectivos versos do brinco: na argola filigranando-se os entalhes da frente, e no brinco de gemas se enfatizando as arestas da lapidação da pedra (Figura 25). Com isso o peso do brinco diminuiu muito, dando ainda um acabamento de verso de joias usado na alta joalheria – termo criado a partir do termo tradicional do mundo da moda “alta costura”, usado para definir peças únicas, exuberantes e consequentemente bastante caras.

180

Figura 25 – Mudanças no do projeto do brinco Casa Grande & Senzala

Se no projeto a percepção das gemas em metal já era considerada uma surpresa, na execução final da peça, pelo brilho do polimento do ouro rosa e branco, acabou sendo gerada uma ilusão de ótica de transparência quase que de um rubi vermelho e de topázio transparentes, acrescentando mais uma quarta abordagem à peça final: criação de sensações materializada através da ilusão de ótica (Figura 26).

Figura 26 – O brinco Casa Grande & Senzala dentro da mandala de peças de inspiração das respectivas nas abordagens selecionadas para o projeto

181

Como havia ainda algum o tempo, mesmo que escasso, a segunda proposta de projeto para o concurso baseada no sincretismo religioso, foi feita sem a preocupação do uso das abordagens criativas, buscando inspiração em imagens da orixá das águas e de elementos do fundo do mar, como podem ser vistas nas pranchas de apresentação do projeto “Mantilha para Iemanjá” enviadas para o concurso (Figura 27). Este projeto acabou não sendo selecionado. Mas a proposta era mesmo a de se fazer algo totalmente diferente, para cobrir possibilidades de diversos enfoques do tema pelo dos juízes.

Figura 27 – Pranchas do segundo projeto “Mantilha para Iemanjá”

É impossível relacionar o sucesso da primeira proposta apenas ao uso das abordagens, já que o modo de apresentação através de desenho realizado em um programa vetorial e não em um programa de imagem, a temática religiosa, uma tradução mais literal do tema, etc. os tornam tão diversos. Mas é inegável que o brinco acabou tendo mais “camadas de percepção” do que a mantilha, proporcionando assim mais nuances para serem descobertas.

6.2

Mandala transrelacional de abordagens criativas como ferramenta de análise da Coleção AuDITIONS Brasil Partindo-se da premissa de Bense (2003), discutida anteriormente no

subcapítulo 2.4 – de que uma nova linguagem de objeto criada por alguém, para ser percebida como inovadora, deve se reportar a algum repertório de linguagem do sujeito já pré-existente, tangenciando e ampliando o seu limite para não ser ignorada pelo observador, como aconteceu por exemplo com os quadros de Van

182

Gogh – perguntou-me se a mandala transrelacional poderia ajudar no reconhecimento desses limites. Seria possível se entender o repertório estético do observador, destacando-se as abordagens mais aceitas e utilizadas por aquele segmento, grupo, atividade, etc. através de uma análise de um universo de objetos por meio da mandala transrelacional? Quem sabe não se diminuiria desse modo os riscos de rejeição de uma criação inovadora? Para testar se a mandala transrelacional poderia ser usada como ferramenta de análise seria preciso encontrar uma “coleção” de objetos criados para e reconhecidos por terem design inovador. Como a minha atual área de atuação e interesse é o design de joias, imaginei que uma análise das abordagens da coleção de joias finalistas do concurso AuDITIONS da Anglogold Ashanti poderia ser muito rica, mostrando tanto o que os designers de joias e o que os observadores – neste caso especifico um júri multidisciplinar – consideram inovador no setor e quais abordagens criativas são mais utilizadas nesses objetos. A Anglogold Ashanti, é uma das maiores mineradoras de ouro do mundo, atuando em 10 países nos quatro continentes. Entendendo a força do design na modernização da cadeia de valores do seu produto, o ouro – uma commodity que ganha mais valor através da criação do homem ao se transformar em uma joia –, a mineradora começou a promover desde de 1999 o maior concurso de design de joias do mundo. “Criado na África do Sul, esse concurso [foi] lançado no Brasil em 2002 e, desde então, consolidou-se como o maior e mais importante da América Latina no ramo. AuDITIONS, expandiu-se e passou a ser realizado também nos maiores mercados consumidores de ouro do planeta – China, Índia e Oriente Médio. O AuDITIONS incentiva artistas a se expressarem por meio de joias inovadoras e sofisticadas que extrapolam os limites do design. As coleções apresentadas evidenciam o ouro em joias fascinantes, atraentes e de grande valor no contexto da contemporaneidade. Os temas propostos em cada edição do concurso inspiram criações que refletem o comportamento da sociedade e que geram tendências para a atual joalheria internacional, sempre em busca de inovação, técnicas e matérias alternativos” (Anglogold Ashanti, 2008). Tomei a liberdade de grifar termos na afirmação dos organizadores do concurso, como joias inovadoras, limites do design, valor no contexto da contemporaneidade, busca de inovação, que destacam a intenção da seleção de joias com design inovador, que extrapolem os limites da linguagem do design no setor. No texto de apresentação do concurso, em outro catálogo, vê-se que no momento do julgamento dos projetos selecionados como finalistas existe a

183

preocupação de que a coleção daquela edição bianual sirva, em âmbito internacional, de “imagem” do design brasileiro de joias. “Além disso, estimula a inovação, contribui para a renovação do design de joias, estabelece tendências e incentiva o uso de novas tecnologias pelo setor joalheiro. E ainda permite a projeção do país no exterior como criador e exportador de capacidade técnica” (Anglogold Ashanti, 2010). Todos os projetos selecionados recebem da mineradora uma quantidade de metal de até 400g de ouro fino – o equivalente atualmente aproximadamente a R$ 40.000,00 – para materializarem suas ideias e muitas empresas do setor tem interesse em se tornarem patrocinadores, produzindo para os designers seus projetos gratuitamente, em troca da divulgação de sua marca. Isso permite aos designers darem asas a sua imaginação, sem as preocupações comuns de custo que limitem o tamanho e não precisei se preocupar com os custos de fabricação. Outra vantagem desse recorte é que as peças foram criadas ao longo desses 10 anos sempre dentro de mesmas especificações, o que permite uma comparação temporal: 

O ouro 18 quilates deverá ser o material predominante das peças, admitindo-se as variações de ligas.



Cada projeto poderá conter uma única peça ou conjunto de peças complementares.



Aos projetos classificados será garantido o fornecimento de ouro fino no limite máximo de 400 gramas para a confecção das peças constantes do projeto.



É permitido o uso das pedras brasileiras que integram os principais grupos gemológicos, como as variedades de berilo, quartzo, granada, espodumênio, turmalina, crisoberilo e topázio.



Não será admitido o uso de diamante, coral, pérola, madre-pérola, tartaruga, marfim e outros materiais oriundos de espécies naturais extintas ou em extinção que contrariem os aspectos ambientais legais vigentes no País.



Materiais naturais ou sintéticos (sementes, fibras, madeira, esmalte, laca,

borracha,

silicone,

etc.)

poderão

ser

utilizados

complementarmente. 

Estão vedados objetos de arte de decoração.

E a seleção das peças finalistas também foram feitas dentro dos mesmos critérios ao longo das 6 edições, sempre por um júri convidado pela mineradora,

184

que reúnem formadores de opinião ligadas a moda (estilistas e jornalistas), design, arquitetura, artes, etc. Os critérios são os seguintes: 

Uso de materiais – atendimento ao disposto no regulamento



Processos – viabilidade técnica e produtiva.



Adequação ao tema – coerência conceitual e formal com o tema.



Inovação – grau de inovação e originalidade.



Atratividade – impacto visual final.

Apenas o ultimo critério foi implantado a partir da 3ª edição, em razão da coleção selecionada da segunda edição ter tido peças pouco impactantes na passarela – um dos itens importantes na divulgação do concurso pela mineradora na mídia nacional impressa e televisiva e em sites e revistas mundiais do setor. A coleção de joias finalistas é formada basicamente por peças de joias femininas – apenas em 2008 houve a preocupação de se premiar joias masculinas, onde foram selecionadas 2 peças uma em cada categoria (designer ou estudante) –, perfazendo um total de 175 como pode ser visto na tabela abaixo. ano 2002 2004 2006 2008 2010 2012

temas Glamour Young & Cool Brazilian Essence Raízes e Formas Calor Glacial Hyper Natur – Natureza Fantástica Sincronicidade Brasilidade

nº de inscrições

nº de peças finalistas

% de selecionados

?

52

-

33 24 24 24 18 175

4,9% 3,4% 1,3% 1,6% 1,3%

680 700 1800 1476 1386 TOTAL

Quadro 37 – Números de projetos inscritos e selecionados por edição do concurso AuDITIONS Brasil

O número de projetos apresentados ao longo desses 10 anos de concurso ultrapassa os 6000 (mesmo sem os números da 1ª edição de 2002 que não pode ser recuperado através de nenhuma fonte, nem tampouco através dos encarregados do projeto lá na Anglogold Ashanti), já que os designers sempre puderam apresentar a quantidade de projetos que desejassem, e não havia taxa de inscrições relativas a cada projeto. 140 designers de joias e estudantes de design, moda, arquitetura, etc. foram finalistas ao longo de suas 6 edições. E pelos números da edição de 2012, apresentados pelos organizadores no infográfico (Quadro 38) divulgado no blog oficial do concurso, pode-se perceber sua relevância e abrangência em relação ao design de joias no Brasil. Dos 1386

185

projetos inscritos, 926 (67%) foram mandados por designers da região sudeste, 250 (18%) da região sul, 95 (7%) da região norte, 75 (5%) da região nordeste e 40 (3%) da região centro oeste. Mesmo que a região sudeste ainda tenha inscrito mais de 2/3 dos projetos, é importante se notar que apenas de 3 estados do Brasil não foram enviados projetos para o concurso: Roraima, Tocantins e Piauí.

Quadro 38 – Números do AuDITIONS Brasil 2012 (AuDITIONS Brasil, 2013)

186

Nesta última edição, como foi uma edição comemorativa, as categorias em vez de serem divididas entre designers – categoria destinada a todos os profissionais interessados em participar do concurso – e revelação – destinada a estudantes de graduação e pós-graduação em Design (especialização, mestrado ou doutorado) ou áreas afins que estejam regularmente matriculados em instituições

de

ensino

nacionais

reconhecidas

por

órgãos

superiores

competentes –, foram definidas duas outras categorias: “Em 2012, o AuDITIONS completa uma década de existência no país. E, para comemorar uma história de ouro, o prêmio apresenta duas categorias: PRÊMIO AuDITIONS (destinado à participação de designers de joias, pessoas envolvidas com a criação e produção em joalheria, joalheiros e estudantes) e o Prêmio 10 ANOS AuDITIONS (categoria especial, exclusiva aos designers já premiados em, pelo menos, uma edição do concurso)” (Anglogold Ashanti, 2012). Na categoria PRÊMIO AuDITIONS aberta a novos designers, já que aos designers que já haviam sido finalistas era vetado se inscrever nesta categoria, foram selecionadas 12 peças e na categoria comemorativa dos 10 anos da premiação foram selecionadas 6 peças. Com isso houve compulsoriamente uma renovação da lista de designers premiados, já que era comum, como poderá ser visto mais adiante, que os designers finalistas se repetissem ao longo das edições. Alguns jurados também participaram de mais de uma edição do concurso, como, por exemplo, Carla Amorim, Natan Kimmelblatt, e Almir Pastore do setor joalheiro, a jornalista de moda Lilian Pacce, a socialite Vivian Carvalho da Silva e os consultores internacionais Jan Springer e Paola de Luca – a única que participou como jurada em de 3 edições. A análise das 173 peças – as duas peças masculinas foram descartadas por só terem tido uma premiação especifica na edição do concurso em 2010 – foi dividida para facilitar a comparação dos resultados ao longo dos 10 anos do concurso. A divisão foi feita não somente por ano, mas também por tema, já que apesar de a partir do AuDITIONS Brasil de 2004 cada edição ter apenas um único tema, a primeira de 2002 deu a opção aos designers de criarem peças para 3 temas distintos. Depois das imagens das peças serem digitalizadas e os textos de inspiração escritos pelos designers para o catálogo transcritos, atribuí, a partir desses dois dados, a cada peça uma ou mais abordagens criativas da mandala transrelacional como pode ser visto nos anexos.

187

A primeira etapa da análise foi criar os mapas de análise de cada um dos 8 temas distintos. Em “pranchas” A3 foram reunidos, como pode ser visto no Quadro 39: uma mandala transrelacional das peças finalistas daquele tema, uma tabela mostrando as mesmas peças organizadas por número de abordagens combinadas em cada uma delas, um gráfico demonstrando qual abordagem foi a mais utilizada em relação àquele tema, em um outro vê-se a porcentagem das respectivas combinações de abordagens e ainda um terceiro gráfico mostrava a qual estado brasileiro aquele designer era oriundo. Finalizando a análise, uma “prancha” apresentava a comparação dos resultados de todas as 6 edições (Gráficos 1 e 2).

Quadro 39 – Exemplo de mapas de análise de abordagens por edição do concurso AuDITIONS Brasil

.

188

AUDITIONS BRASIL 2002 Tema: HOT GLAMOUR 15 peças

4 abordagens

3 abordagens

40%

20%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

21%

1 abordagem

47%

criação de sensações 11%

2 abordagens

inspiração na natureza (biônica) 19%

46%

previsão do futuro reaproveitamento de materiais 19%

releitura do passado ou de culturas exógenas

27%

subversão da função e/ou forma

19% 0% 0%

7%

11% combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

Quadro 40 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002 – HOT GLAMOUR

PARANÁ

7%

7%

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

189

AUDITIONS BRASIL 2002 Tema: YOUNG & COOL 14 peças

4 abordagens

3 abordagens

criação de sensações

2 abordagens

1 abordagem

43%

43%

2 abordagens

1 abordagem

4% 20%

8%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 8%

inspiração na natureza (biônica)

29% 36%

0%

previsão do futuro 8%

reaproveitamento de materiais

12% 40%

7%

7%

4 abordagens

3 abordagens

releitura do passado ou de culturas exógenas

35%

subversão da função e/ou forma combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

Quadro 41 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002 – YOUNG & COOL

190

AUDITIONS BRASIL 2002 Tema: BRAZILIAN ESSENCE 23 peças

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

criação de sensações 5% introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

10% 28%

previsão do futuro 23%

52%

35%

inspiração na natureza (biônica)

48%

30%

reaproveitamento de materiais releitura do passado ou de culturas exógenas

13% 0%

13%

subversão da função e/ou forma

17%

0% 21%

4%

combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

Quadro 42 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002 – BRAZILIAN ESSENCE

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

191

AUDITIONS BRASIL 2004 Tema: RAÍZES E FORMAS 33 peças

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

criação de sensações

3% 3% introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

14%

inspiração na natureza (biônica)

25% 10%

24%

42%

previsão do futuro

49%

reaproveitamento de materiais 12% 20%

0% 0%

releitura do passado ou de culturas exógenas

21%

subversão da função e/ou forma

21%

21%

2 abordagens

1 abordagem

15%

19% combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

PARANÁ

SANTA CATARINA

RIO DE JANEIRO

4 abordagens

Quadro 43 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2004 – RAIZES E FORMAS

3 abordagens

1 abordagem

192

AUDITIONS BRASIL 2006 Tema: CALOR GLACIAL 24 peças

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

criação de sensações

19%

8%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

15%

4%

50%

inspiração na natureza (biônica) previsão do futuro 15%

55% reaproveitamento de materiais 28%

29%

33%

releitura do passado ou de culturas exógenas

17%

15% 8%

0% 0%

subversão da função e/ou forma

4% combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

PARÁ

4 abordagens

Quadro 44 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2006 – CALOR GLACIAL

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

193

AUDITIONS BRASIL 2008 Tema: HYPER NATUR – NATUREZA FANTÁSTICA 22 peças (sem as 2 peças masculinas)

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

45%

criação de sensações

4%

14%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

18%

23%

inspiração na natureza (biônica)

23% 18%

previsão do futuro 14%

14%

55%

reaproveitamento de materiais 28% releitura do passado ou de culturas exógenas

18%

subversão da função e/ou forma 20%

2% 2%

4 abordagens combinação de materiais

2%

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

PARAÍBA

Quadro 45 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2008 – NATUREZA FANTÁSTICA

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

1 abordagem

194

AUDITIONS BRASIL 2010 Tema: SINCRONICIDADE 24 peças

4 abordagens

4%

3 abordagens

2 abordagens

4%

4%

50%

8% criação de sensações

42%

14%

16%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas inspiração na natureza (biônica)

25%

21%

10%

17%

previsão do futuro 8%

26%

8%

17%

reaproveitamento de materiais releitura do passado ou de culturas exógenas

16% 8%

subversão da função e/ou forma

2%

combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

PARANÁ

SANTA CATARINA

PARA

PARAÍBA

Quadro 46 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2010 – SINCRONICIDADE

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

1 abordagem

195

AUDITIONS BRASIL 2012 Tema: BRASILIDADE 18 peças

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

6% criação de sensações 15%

19%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

6%

6%

39%

0%

33%

6%

inspiração na natureza (biônica)

49%

28%

11% 15%

previsão do futuro reaproveitamento de materiais

16% 26%

releitura do passado ou de culturas exógenas

2% 0% 0%

23%

subversão da função e/ou forma combinação de materiais

MINAS GERAIS

SÃO PAULO

RIO DE JANEIRO

PARANÁ

SANTA CATARINA

PARA

PARAÍBA

RIO GRANDE DO SUL

Quadro 47 – Mapa de análise de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2012 – BRASILIDADE

4 abordagens

3 abordagens

2 abordagens

1 abordagem

1 abordagem

196

AUDITIONS BRASIL 2002 - 2012 Gráfico de abordagens divididos por tema e por nº de abordagens por peça período de 10 anos

30%

28%

29%

26%

26% 24%

25%

23%

22% 21%

20%

20% 19%

18% 15%

15%

20%

19%

18%

15% 15% 15%

14%

12%

19%

14%

14%

16% 15% 15%

16% 14%

12%

10%

10%

10%

10%

8%

5%

8%

8% 2% 2% 2%

2%

2%

2%

0% 2002

2004

2006

2008

2010

2012

criação de sensações

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

inspiração na natureza (biônica)

previsão do futuro

reaproveitamento de materiais

releitura do passado ou de culturas exógenas

subversão da função e/ou forma

combinação de materiais

Gráfico 1 - Gráfico comparativo de tipos abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002-2012

50%

50%

46%

45% 42% 39%

38%

33% 29%

28% 25%

23%

21% 21%

18%

17%

15%

17%

14%

10%

8%

6%

4%

2002

2004

2006 4 abordagens

3 abordagens

2008 2 abordagens

Gráfico 2 - Gráfico comparativo de número de abordagens criativas AuDITIONS Brasil 2002-2012

2010 1 abordagem

2012

197

Como pode ser visto no Gráfico 1 de abordagens divididos por tema que apresenta uma comparação dos 10 anos do concurso, a abordagem “subversão da função e/ou forma” é sempre uma das mais usadas – com valores que variam entre 20% a 30 % das peças ao longo das 6 edições –, sendo ultrapassada apenas na edição de 2004 pela abordagem “combinação de materiais” presente em dezessete das 33 peças – ou seja mais de 50% das peças selecionadas. A abordagem “combinação de matérias” está sempre entre as 3 primeiras mais usadas. Nas primeiras edições as sementes eram os materiais mais presentes, mas atualmente os materiais sintéticos como acrílicos, plásticos, vidros, etc. tomaram esse lugar. As gemas – mesmo sendo uma matéria prima comum a joalheria – como são consideradas neste concurso um material que pode ser acrescido ao projeto, que deve ser primordialmente de ouro, foram enquadradas também nesta categoria. A abordagem “releitura do passado” que nas edições de 2002 e 2004 foi a terceira mais usada, ao longo dos outros anos acabou ficando abaixo dos 10%, e o terceiro lugar de abordagens mais usadas passou a ser ocupada pela abordagem “inspiração na natureza”. Uma possível explicação para essa mudança pode estar no tema ligado diretamente a natureza da edição de 2006, mas também a associação de Brasil e/ou brasilidade com a natureza. Abordagens como “previsão do futuro” e “reaproveitamento de materiais” são sempre as menos identificadas ao longo do concurso, com exceção apenas da edição de 2010, cujo tema sincronicidade fez com que muitos designers usassem esse tema de abordagem para a criação de seus projetos – 30% das 24 peças selecionadas. criação de sensações introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

14%

19%

inspiração na natureza (biônica) 12%

previsão do futuro reaproveitamento de materiais

26% 15% 2% 11%

releitura do passado ou de culturas exógenas subversão da função e/ou forma

1% combinação de materiais

Gráfico 3 - Divisão das % de abordagens no total das 6 edições do concurso

198

No Gráfico 3, que apresenta a soma de todas as 6 edições, pode-se ver que as abordagens “subversão da função e/ou forma” (26%), “combinação de materiais” (19%) e “inspiração na natureza” (15%) estão presentes em respectivamente ¼, 1/5 e 1/6 das peças selecionadas, mostrando que ainda existem muitas possibilidades dos designers fazerem uso das outras abordagens criativas para criarem peças inovadoras. Quanto à quantidade de abordagens por peças, pode-se perceber que, ao longo dos anos, cada vez mais designers criaram peças usando mais de uma abordagem (Gráfico 2). Se na edição de 2002, apenas 1/6 das peças combinavam 3 a 4 abordagens e quase a metade das peças faziam uso apenas de uma abordagem, na última edição de 2012 os números se inverteram: quase 70% das peças combinavam 3 a 4 abordagens, e não havia nenhuma peça que fizesse uso de apenas uma abordagem. Se na primeira edição apenas 6% das peças combinavam 4 abordagens, na última edição de 2012 esse número saltou para 28%, ou seja um crescimento de quase 500%. Este salto, já que nas edições intermediarias o número sempre variou (para cima ou para baixo) por volta dos 10%, pode estar relacionado ao menor número de peças selecionadas nesta edição – uma diminuição de ¼ do número de peças.

11% 26% 4 abordagens 3 abordagens 2 abordagens 27%

1 abordagem

36%

Gráfico 4 - Divisão de % por número de abordagens no total das 6 edições do concurso

Na soma total da coleção (Gráfico 4) vê-se que quase 65% das peças combinam 2 a 3 abordagens, e que apenas 11% das peças combinam 4 abordagens diversas, como pode ser visto no Quadro 48.

199

2002 6%

2004 15%

2006 4%

2008 14%

2010 8%

2012 28%

Quadro 48 - Peças que combinam 4 ou mais abordagens criativas e as respectivas percentagens

Mas avaliando a média de abordagens por peças ao longo das 6 edições (Gráfico 5), pode-se perceber que houve um crescimento de quase 70% – de 1,75 para 2,94.

200

2,94 2,52

2,55 2,21

2,08

1,75

2002

2004

2006

2008

2010

2012

Gráfico 5 - Média de abordagens por peça nas 6 edições do concurso

Acho importante ressaltar também que houve um aumento também do número de peças acima da média de abordagens de cada coleção (Gráfico 6). Por exemplo, se em 2002 a média de abordagens arredondada era de 2 abordagens, 15% das peças combinaram 3 ou 4 abordagens – ou seja acima da média arredondada. Este crescimento foi de quase 200%. Pode-se ver que há uma curva, que de 2002 até 2006 era decrescente, caindo de 15% para 4% – ou seja mais de 70% – mas a partir de 2006 ela se tornou ascendente. Aumentando de 2006 para 2008 em 350%, de 2006 para 2010 o aumento foi de mais de 620% e de 2006 para 2012 de 700%.

15%

15%

85%

85%

2002

2004

4%

96%

2006 na média

14%

86%

2008

25%

28%

75%

72%

2010

2012

acima da média

Gráfico 6 - Peças acima e dentro na média arredondada de abordagens das 6 edições

Em relação aos dados dos jurados que selecionaram os projetos, pode-se ver que tirando a edição de 2002 onde havia uma prevalência de pessoas ligadas a moda e nenhuma ligada a setor joalheiro, a partir da edição de 2004

201

sempre houve a presença de pessoas ligadas a moda (jornalistas e estilistas), a joia (designers, empresários e fotógrafos) e a área de luxo (consultores, profissionais de marketing e consumidoras), como pode ser visto no Gráfico 7. A dominância de jurados ligados a área de joia nas edições de 2006, 2008, 2010 a 2012, respectivamente 38%, 43%, 45% e 50%, pode ser a explicação também para a curva ascendente citada anteriormente. Já que para especialistas em qualquer setor a combinação de abordagens aumenta a possibilidade de se criar objetos inovadores, ou seja nunca visto anteriormente. 33% 2012 17% 50% 9% 9% 9%

2010

27% 45%

14% 2008 43% 43% 23% 8%

2006

31% 38% 42% 17%

2004

8% 33% 20% 10% 10%

2002

60%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

joia

moda

artes plásticas

design e/ou publicidade

arquitetura e decoração

luxo: consultor e ou consumidora

Gráfico 7 - Áreas de expertise dos jurados por edição do concurso

202

É interessante perceber que houve também por parte da organização do concurso uma preocupação de internacionalizar o corpo de jurados, já que apenas em 2004 não houve representantes internacionais presentes. Em 2010 e em 2012 por volta da metade dos jurados eram estrangeiros (Gráfico 8). 120% 100%

100% 86%

80% 69%

80% 60% 40%

55% 45%

50% 50%

2010

2012

31% 20%

14%

20% 0% 2002

2004

2006

2008

brasileiros

estrangeiros

Gráfico 8- Nacionalidade dos jurados por edição do concurso

Para melhor poder comparar visualmente as peças que combinam mais abordagens com as que combinam menos, resolvi dividir a coleção da AuDITIONS Brasil, não mais por edição mas por tipos de peças. Foram criadas 8 categorias distintas e mais uma com o nome de diversos (20%) que englobasse as peças que não pertencessem a nenhuma das categorias anteriores.

20% COLARES 37%

PULSEIRAS BRINCOS

3%

ANEIS CINTOS 8%

CONJUNTOS AD. CABEÇA AD. PÉS E PERNAS

5%

DIVERSOS 3% 4% 6%

14%

Gráfico 9 - Gráfico de divisão da coleção AuDITIONS Brasil por tipos de peça

Como pode ser visto no Gráfico 9 acima, quase 40% das peças selecionadas foram colares, seguido por pulseiras (14%), e surpreendentemente, adornos de cabeça (8%). E nas próximas 8 “pranchas” A3 pode se ver as 173 peças divididas em tipos de peças.

203

COLARES - 63 peças => 36% 1 abordagem 2012

2010

2008

2006

2004

2002

2 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

204

Quadro 49 – Colares divididos por edição e por número de abordagens identificadas

Tipo: BRINCOS - 11 peças => 6% 1 abordagem

2 abordagens

2012

2008

2004

2002

Quadro 50 – Brincos divididos por edição e por número de abordagens identificadas

3 abordagens

4 abordagens

205

Tipo: PULSEIRAS - 24 peças => 14% 1 abordagem

2 abordagens

2012

2010

2008

2006

2004

2002

Quadro 51 – Pulseiras divididos por edição e por número de abordagens identificadas

3 abordagens

4 abordagens

206

Tipo: ANÉIS - 7 peças => 4% 1 abordagem

2 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

2010

2008

2006

2004

2002

Quadro 52 – Anéis divididos por edição e por número de abordagens identificadas

Tipo: Tipo: ADORNOS DE PÉS E PERNAS - 5 peças => 3% 1 abordagem

2 abordagens

2006

2004

2002

Quadro 53 – Adornos de pés e pernas divididos por edição e por número de abordagens identificadas

207

Tipo: Tipo: ADORNOS DE CABEÇA - 14 peças => 8% 1 abordagem

2 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

2010

2008

2006

2004

2002

Quadro 54 – Adornos de cabeça divididos por edição e por número de abordagens identificadas

Tipo: CINTOS E SAIAS - 6 peças => 3% 1 abordagem 2010

2008

2 abordagens

208

2004

2002

Quadro 55 – Cintos e saias divididos por edição e por número de abordagens identificadas

Tipo: CONJUNTOS - 9 peças => 5% 1 abordagem

2 abordagens

2012

2010

2006

2004

2002

Quadro 56 – Conjuntos divididos por edição e por número de abordagens identificadas

3 abordagens

4 abordagens

209

Tipo: Tipo: DIVERSOS - 34 peças => 20% 1 abordagem

2 abordagens

2012

2010

2008

2006

2004

2002

Quadro 57 – Peças diversas divididas por edição e por número de abordagens identificadas

3 abordagens

4 abordagens

210

Nesta organização por tipos e por edições, notou-se também que apenas os itens colares e pulseiras foram selecionados nas 6 edições (Gráfico 10).

10

DIVERSOS

5

7

3

3

6

3 11

AD. PÉS E PERNAS

AD. CABEÇA 1

4

5

CONJUNTOS

3

2

4

1111

2 1 21

CINTOS

2 2 11 1

ANEIS

7

BRINCOS

6

PULSEIRAS

11 2

5

2

4

4

16

COLARES 0

13

10

2002

3

9

20

2004

30

2006

9

10

40

2008

6

50

2010

60

70

2012

Gráfico 10 – Tipos de peças por edição do concurso

E em relação ao número de abordagens, no Gráfico 11 pode-se ver que a partir do universo das 173 peças da coleção AuDITIONS Brasil, o maior número de peças de combinam 4 abordagens se concentram em colares (5%); brincos (1%), adornos de pés e pernas (1%). Diversos (2%) são os outros tipos de peça em que 4 abordagens também foram combinadas. Em muitos tipos de peças, como pulseiras, anéis e conjuntos não houve a combinação de 4 abordagens. E que a combinação de 2 abordagens é a mais presente em quase todos os tipos, com exceção das pulseiras e dos cintos. 16% 14% 14% 12% 10% 10% 8% 6%

9% 6% 5%

4%

6% 4% 4%

2%

4%

3% 3% 2% 2% 1% 1%

2% 2% 1%

2%

1%

2% 2%2%

2% 1%

1%

5%

1%

1%

1% 1%

0% COLARES

PULSEIRAS

BRINCOS

ANEIS

1 abordagem

CINTOS

2 abordagens

CONJUNTOS

3 abordagens

AD. CABEÇA

4 abordagens

Gráfico 11 – Tipos de peças por número de abordagens combinadas

AD. PÉS E PERNAS

DIVERSOS

211

Imaginando se a seleção de muitos designers em mais de uma edição, influenciaria essa divisão de combinação de mais de uma abordagem, resolvi fazer um levantamento da produção individual de cada designer que foi selecionado em mais de uma edição. Foi surpreendente perceber que das 19 peças que combinavam 4 abordagens apresentadas na Quadro 54, mais de 75% das peças eram desses designers. Apenas 4, a primeira era uma designer que só deve ter se inscrito no concurso em 2002 – em razão de um problema de direito autoral com uma grande empresa do setor joalheiro relativo a uma de suas criações para o concurso – e as outras 3 da edição de 2012 na categoria aberta aos designers que nunca haviam sido finalistas do concurso. Foram ao todo 29 designers. Esse número se explica em razão de muitos designers trabalharem em dupla, prática muito comum principalmente entre os designers mineiros. O que explicaria sobrepujança de 66% de designers selecionados serem mineiros (Gráfico 13).

3% 3% 14% MINAS GERAIS SÃO PAULO RIO DE JANEIRO 14%

PARANÁ 66%

PARAÍBA

Gráfico 12 – Designers pressentes em mais de uma edição dividido por estado de origem

As próximas “pranchas” A3 irão apresentar as o trabalho desses designers divididos por número de abordagens de suas respectivas peças.

212

AUDITIONS BRASIL – PRODUÇÃO DOS DESIGNER SELECIONADOS EM MAIS DE UMA EDIÇÃO

DESIGNER / Ano Rodrigo Robson 2002 2004 2010 Carla Abras 2008 2010 2012 Renata Bessa 2004 2006 2010 2012 Carlos Godoy 2004 2006 2010 Dulce Goettms 2006 2008 2010 Lena Garrido 2002 2008 2012 Sergio Povoa Pires 2002 2004 2010

1 abordagem

2 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

213

DESIGNER / Ano Fernanda Barcellos 2002 2004 2006 Ida Benz 2002 2008 2012 Heloisa Azevedo 2002 2006 2010 Cyntia Maffra Vieira 2002 2006 2008 Eliânia Rosetti 2006 2008 2012 Déborah Camisasca 2002 2008

Juliana Pellegrini 2004 2006 2010 Sancha Lívia Resende 2002 2004

1 abordagem

2 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

214

DESIGNER / Ano Liliane Lima 2002 2004

Margarida Recorder 2002 2008

Gui Marin 2004 2006

Adna Salles 2004 2006

Lorena Gomes Ribeiro 2006 2008 Carolina Monteiro 2006 2008

Emy Kyouho 2002 2010

Ana Paula Feijó 2004 2008

1 abordagem

2 abordagens

3 abordagens

4 abordagens

215

DESIGNER / Ano

1 abordagem

2 abordagens

3 abordagens

Claudia Lamassa 2004 2006

Junia Fontenelle 2008 2010

Victor Falcão 2010 2012

Guilherme Canabrava 2006 2008

Janaina Monteiro 2008 2010

Luiza Seixas 2002 2004

Quadro 58 – Peças dos designers selecionados em mais de uma edição divididas por número de abordagens identificadas

4 abordagens

216

Luiza Seixas

1 1

Janaina Monteiro

1

2

Guilherme Canabrava

1

2

1

Victor Falcão

1 1 1 1

Junia Fontenelle

1 1 1 1

Claudia Lamassa

2

Ana Paula Feijó

2

1 1 1 1

Emy Kyouho

2

Carolina Monteiro

2

1 1 1 1

Lorena Gomes Ribeiro

1 1

Juliana Pellegrini

1

Adna Salles

2 2

2

Margarida Recorder

1 1 1 1

1 1 1 1 1

Liliane Lima

1 1

2

2

1 1

2

1

2

Gui Marin 1

Sancha Lívia Resende

2

1

1 1 1

Déborah Camisasca

3

1

Cyntia Maffra Vieira

2

2

1 1 1

Eliânia Rosetti

2

1 1

Heloisa Azevedo

2

1

Fernanda Barcellos

2

2

Sergio Povoa Pires

2

1 1

4

Lena Garrido

2

1 1

4

2

Dulce Goettms

1 1

2

4

2

Renata Bessa

1 1 1 1

2 3

2

Carla Abras

0

3

3

2

1 1 1 1

3

Rodrigo Robson

2

3

4

Carlos Godoy

1 1 2

3

Ida Benz

2

3

2

1

4

2

1 1

2

1

4

2

5

4 6

10

4 15

20

criação de sensações introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas inspiração na natureza (biônica) previsão do futuro reaproveitamento de materiais releitura do passado ou de culturas exógenas subversão da função e/ou forma combinação de materiais

Gráfico 13 – Tipos de abordagens mais utilizadas pelos designers selecionados em mais de uma edição

217

No Gráfico 14 pode-se ver as abordagens presentes nas peças de cada um desses designers. Por exemplo no caso do designer mineiro Rodrigo Robson, que foi o designer com mais peças finalistas, num total de 6, em 3 de suas peças ele fez uso da abordagem “criação de sensações”; em 2 a abordagem “inspiração na natureza”, em 1 a abordagem “previsão do futuro”, em 2 a abordagem “releitura do passado ou de culturas exógenas”, em 4 a abordagem “combinação de materiais” e em todas das suas 6 peças ele se utilizou da abordagem “subversão da função e/ou forma”. Dos 29 designers, 23 designers fizeram uso da abordagem “subversão da função e da forma” (79%), 21 fizeram uso de “criação de sensações” (72%), 20 da abordagem “inspiração na natureza” (69%). Transformando esses números em porcentagens, pode-se perceber melhor que alguns designers se utilizam de algumas abordagens em 100% de seus projetos selecionados. Carla Abras é uma das designers que mais fez uso de abordagens distintas: 7 das 8 abordagens. Além disso, a designer não apresentou nenhuma peça em dupla, mostrando que essa flexibilidade faz parte de sua criatividade. Carlos Godoy, Rodrigo Robson e Renata Bessa fizeram uso de 6 abordagens distintas, mas todos os 3 apresentaram projetos em dupla – não sendo possível afirmar-se se o uso do alto número de abordagens se deriva de uma flexibilidade criativa individual, ou se acontece em razão da criação em parceria. Por outro lado, outros designers que trabalharam também em duplas, como por exemplo Guilherme Canabrava apresentou em seu rol de abordagens das 2 peças selecionadas apenas 3 abordagens distintas. Eu mesma percebi, como pode ser visto no Gráfico 15, que em 100% de minhas 3 peças selecionadas as abordagens “criação de sensações” e “introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas” estavam presentes, e que 67% de minhas peças também faziam uso das abordagens “releitura do passado ou de culturas exógenas” e “subversão da função e/ou forma”. Isso me mostrou que ainda existem muitas abordagens, e por conseguinte, universos criativos para serem experimentados. Ao lado de Adna Salles, Margarida Recorder, Liliane Lima, Gui Marin e Sancha Lívia Rezende fui uma das que tiveram uma média de abordagens por peça superior ao número de peças selecionadas (Gráfico 16). Com uma média de abordagens por peça de 3,7; ao lado de Carlos Godoy com uma média de 3,3; Carla Abras com uma média de 3,2; e Rodrigo Robson, Sancha Lívia Rezende, e Gui Marin com uma média de 3,0 abordagens por peças fui uma das que mais fizeram uso da combinação de abordagens criativas.

218

Luiza Seixas

50%

Janaina Monteiro

50%

100%

Guilherme Canabrava

50%

100%

Victor Falcão

50%

50%

50%

50%

Junia Fontenelle

50%

50%

50%

50%

Claudia Lamassa

50%

100%

Ana Paula Feijó

50%

Emy Kyouho

100%

50%

50%

Lorena Gomes Ribeiro

50%

50%

33%

Adna Salles

100%

67%

33%

Margarida Recorder

50%

50%

Liliane Lima

50%

50%

50%

50%

50%

50%

50%

50%

50%

100%

100%

Sancha Lívia Resende

50%

50%

100%

Gui Marin

50%

100%

50%

Déborah Camisasca

50%

100%

Carolina Monteiro

Juliana Pellegrini

50%

50% 100%

33% 33% 33%

50%

100%

50%

100%

100%

Cyntia Maffra Vieira

67%

67%

Eliânia Rosetti

67%

33% 33%

Heloisa Azevedo

67%

33% 50%

50%

33%

33% 33% 33% 67%

67%

100% 50%

33% 33%

Fernanda Barcellos

50%

Sergio Povoa Pires

50% 25%25%

100%

Lena Garrido

50% 25%25%

100%

50%

100%

50%

Dulce Goettms 25%25% 50% Renata Bessa 25%25%25%25% Ida Benz

100%

Carlos Godoy

100%

Carla Abras

50%

75%

75%

100% 25%25%25%

40% 20% 60% 20% 20%

Rodrigo Robson

50% 33%17%33% 0%

50%

67%

67%

100% 80%

100%

33%

50% 80% 67%

100% 150% 200% 250% 300% 350% 400%

criação de sensações introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas inspiração na natureza (biônica) previsão do futuro reaproveitamento de materiais releitura do passado ou de culturas exógenas subversão da função e/ou forma combinação de materiais

Gráfico 14 – Percentagem dos tipos de abordagens mais utilizadas pelos designers selecionados em mais de uma edição

219

1,0

Luiza Seixas

2 1,5

Janaina Monteiro

2

Guilherme Canabrava

2,0 2

Victor Falcão

2,0 2

Junia Fontenelle

2,0 2

Claudia Lamassa

2,0 2

Ana Paula Feijó

2,0 2

Emy Kyouho

2,0 2

Carolina Monteiro

2,0 2

Lorena Gomes Ribeiro

2,0 2 1,3

Juliana Pellegrini

3

Adna Salles

2

Margarida Recorder

2

Liliane Lima

2

Gui Marin

2

Sancha Lívia Resende

2

2,5 2,5 2,5 3,0 3,0

Déborah Camisasca

2,3

Cyntia Maffra Vieira

2,3

3 3

Eliânia Rosetti

2,7 3

Heloisa Azevedo

2,7 3

Fernanda Barcellos

2,0

Sergio Povoa Pires

2,0

4 4

Lena Garrido

2,5

Dulce Goettms

2,5

Renata Bessa

2,5

Ida Benz

4 4 4 3,7

3

Carlos Godoy

3,3

Carla Abras

3,2

4 5

3,0

Rodrigo Robson 0 nº de peças

1

2

3

6 4

5

6

7

média de abordagens por peças

Gráfico 15 – Comparação entre número de peças e média de abordagens por peça mais dos designers selecionados em mais de uma edição

220

Ficou evidente que, conscientemente ou não, a prática da combinação de diversas abordagens criativas para se criar um objeto inovador é usada por muitos designers de joias. Através dos exemplos de minhas peças, onde mesmo naquelas selecionadas nas edições anteriores à de 2012 – onde não busquei a combinação de diversas abordagens conscientemente – já apresentavam no mínimo 3 abordagens por peça, percebi a força do inconsciente neste processo. Notando que muitas das peças vencedoras das duas categorias de cada edição pertenciam aos designers que participaram de mais de uma edição, resolvi analisá-las como um grupo em separado (Quadro 59). É preciso, antes de nada, registra que a escolha das peças vencedoras é feita internamente dentro da empresa Anglogold Ashanti, depois que eles recebem as peças finalistas produzidas em metal, sem a participação de jurados. Apenas na primeira edição de 2002, foi realizada uma votação digital durante a apresentação da festa de divulgação das peças do concurso.

Peça vencedora

Nº de abordagens

Nº de edições selecionado

Designer / categoria / edição

1

1

Ruth Grieco / Hot Glamour / 2002

4

1

Pitti Paludo / Young & Cool / 2002

4

1e3

Melissa Maia e Rodrigo Robson / Brazilian Essence / 2002

3

3

Fernanda Barcellos / Designer / 2004

4

4

Renata Bessa / Revelação / 2004

221

Carlos Godoy e Gui Marin Kessedjian / Designer / 2006

3

2e3

3

3

2

2e2

3

1

3

3e1

2

1

Thayane de Carvalho da Silva / Revelação / 2010

4

3

Carla Abras / Prêmio 10 anos AuDITIONS / 2012

2

1

Camila Schmitt / Prêmio AuDITIONS / 2012

Dulce Goettems / Revelação / 2006

Junea Fontenelle e Guilherme Canabrava / Designer / 2008

Thayana Cordeiro de Menezes / Revelação / 2008

Heloisa Azevedo e Leandro Portela / Designer / 2010

Quadro 59 - Peças vencedoras das respectivas edições

Das 13 peças vencedoras, 5 foram de designers que só foram finalistas em uma edição do concurso, o que quer dizer que mais de 60% das peças vencedoras foram projetadas por designers que foram selecionados em mais de uma edição.

222

criação de sensações 13%

15%

introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas inspiração na natureza (biônica) previsão do futuro 22% reaproveitamento de materiais

24%

releitura do passado ou de culturas exógenas subversão da função e/ou forma 13%

10%

combinação de materiais

0% 3%

Gráfico 16 – Tipos de abordagens mais utilizadas nas peças vencedoras

Como pode ser visto no Gráfico 17, as abordagens mais usadas foram “subversão da função e/ou da forma” (24%), “introdução de novas tecnologias ou técnicas exógenas” (22%) e “combinação de matérias” (15%). E comparando às principais abordagens da coleção inteira, vê-se que “subversão da função e/ou forma” e “combinação de materiais” continuaram entre as principais, mas a abordagem “introdução de novas tecnologias ou técnicas exógenas” deixou o quinto lugar (12%) para assumir o segundo lugar em número de abordagens mais utilizadas entre as peças vencedoras do concurso (Gráfico 18). 15%

combinação de materiais

19% 24% 26%

subversão da função e/ou forma 10% 11%

releitura do passado ou de culturas exógenas 3%

reaproveitamento de materiais previsão do futuro

1% 0% 2% 13% 15%

inspiração na natureza (biônica) introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

22% 12% 13% 14%

criação de sensações 0% coleção inteira

5%

10%

15%

20%

25%

30%

vencedoras

Gráfico 17 – Comparação das percentagens dos tipos de abordagens na coleção como um todo e apenas nas peças vencedoras

223

Outro fator interessante é que nem pulseiras, nem anéis, nem brincos, nem conjuntos – ou seja, peças tradicionais da joalheria – foram selecionadas como vencedoras (Gráfico 19).

31%

diversos adornos de cabeça

15%

adornos de pés e pernas

8%

cintos e saias

15%

colares

31% 0%

5% 10% 15% 20% 25% 30% 35%

Gráfico 18 – Peças vencedoras divididas por tipos

Mas o que chama a atenção em relação a coleção inteira do AuDITIONS BRASIL de todas as edições com 173 peças, é que a proporção do número de combinação de abordagens usados nas 13 peças vencedoras aumenta: quase 70% das peças combinam 3 ou 4 abordagens, enquanto na coleção inteira esse número é menor que 40% (Gráfico 20).

38% 36% 26%

27% 23%

11%

8%

1 abordagem

31%

2 abordagens

3 abordagens

vencedores

coleção inteira

4 abordagens

Gráfico 19 – Comparação da percentagem do número de abordagens combinadas na coleção como um todo e apenas nas peças vencedoras

Voltando-se novamente as questões iniciais desse subcapitulo, se: 

seria possível através de uma análise por meio da mandala transrelacional se entender o repertório estético do observador, destacando-se as abordagens mais aceitas e utilizadas por aquele segmento, grupo, atividade, etc.?

224



através do levantamento das abordagens mais presentes também seria possível se diminuir os riscos de rejeição de uma criação inovadora usando-se abordagens mais frequentes?



a mandala transrelacional poderia ser usada como ferramenta de análise?

acredito que o risco da inovação sempre vai estar presente. Ele poderá sim ser diminuído, já que na comparação temporal, percebe-se que algumas abordagens sempre estiveram mais presentes – no caso especifico do que pode ser considerada inovação no design de joias brasileiro foi a “subversão de formas e/ou conceitos”. Considero também que a mandala transrelacional de abordagens criativas, pode gerar dados passiveis de serem comparados permitindo que ele seja usado como uma ferramenta de análise de um universo específico de objetos. Mas percebi que, além de destacar as abordagens mais aceitas no setor joalheiro como as abordagens inovadoras, a análise das abordagens pode vir a servir também de ferramenta de autoconhecimento sobre a criatividade dos próprios designers. No meu caso, por exemplo, através das descobertas que fiz em relação ao uso das mesmas abordagens nas 3 peças selecionadas no concurso AuDITIONS Brasil, decidi que para a sua próxima edição irei buscar o desafio incluir as outras abordagens, e quem sabe até mesmo buscar combinar 5 a 6 abordagens em única peça. A análise também pode servir de ajuda para que os designers entendam como outros designers combinam as abordagens naquele setor, naquela área, naquele “mercado” especifico. Servindo assim de instrumento de aprendizado. Qualquer universo da área do design pode vir ser analisado sob está proposta, e acredito que quanto mais análises forem feitas, maiores serão os repertórios criativos codificados – ou seja, que sairão do universo do inconsciente e passarão para a do consciente – permitindo que eles sejam acessados e ensinados a qualquer pessoa, e abrindo assim um novo caminho que levará, como acredita Morris (2005), a novas soluções, novos lugares, novos níveis de criatividade.

225

7 Consideração Finais

O design pelas suas peculiaridades em relação a outras áreas ligadas a inovação enfrenta, principalmente por sua característica ambígua de abranger tanto um aspecto abstrato de conceber/projetar/atribuir quanto um aspecto concreto de registrar/configurar/ formar (Cardoso, 2005), muitas dificuldades em apresentar conceitos e parâmetros de fácil compreensão a estudiosos e profissionais externos à atividade que demonstre o papel de seu desempenho nos negócios ligados a inovação (Alanen 2005, Calonius 2002). Unindo ciência e arte, ou seja, unido a contradição do pensamento objetivo e do pensamento subjetivo, durante muitos anos, os designers não conseguiam transmitir seu modo particular de saber, de conhecer e de descobrir sobre as coisas já consolidado na área por Cross (1982) desde o final do século passado. Para poder se encaixar no sistema vigente da rigidez da lógica clássica, ou os designers direcionavam sua prática sob um viés “científico” negando fatores como talento, habilidade ou intuição – que os manteriam ligados a tradição artística (Cipiniuk e Portinari, in: Coelho, 2006) –, ou eles seguiam um viés ligado às artes rejeitando as “amarras” de métodos projetuais “cientificados”, já que entre os designers, tanto no meio profissional quanto no acadêmico, existiria a crença de “que design se aprende fazendo” e não pelo domínio de saberes teóricos (Pazmino, 2010). Essa postura se traduzia também em relação a inovação: ou os designers buscavam seguir os modelos de gestão da inovação desenvolvidos pelas disciplinas ligadas à economia da inovação – por exemplo modelo linear de inovação, modelo science-push, modelo technology-push, modelo market-pull, etc. – traduzindo-os em seus processos projetuais ou eles assumiam uma postura de “diferenciadores de produtos” preocupados em dominar os estilos da época, atribuindo o rótulo de inovação em design a rupturas em proporções muito limitadas em relação às normas estéticas de configuração vigente. Buscando ao longo da pesquisa responder a sua questão norteadora, que indagava se para se entender a relação da inovação com o design é necessário se fazer uso de teorias que ampliem os paradigmas da ciência, pode-se

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perceber que através da teoria da transdisciplinaridade a prática do design em relação a inovação torna-se mais fácil de ser compreendida. Os 3 pilares em que ela se baseia, apresentados a seguir, dão ao designer ferramentas para explicar o seu modo de pensar (Benz e Magalhães, 2012): 1. a física quântica e os níveis de realidade - permitem os saltos de pensamento tão característicos da lógica abdutiva dos designers; 2. a complexidade - permite que o design seja entendido em toda a sua integralidade; e 3. a lógica do terceiro incluído - “explica” o modo tácito do designer criar objetos unindo contradições através de seu pensamento intuitivo e também do “pensamento equivocado” que Neumeier (2010) afirma ser cultivado pelos designers mais inovadores. Sendo nutrida pelos conhecimentos de diversas disciplinas, como Iribarry (2003) afirma, através da transdisciplinaridade a inovação é esclarecida de maneira nova e fecunda. E como na teoria da transdisciplinaridade não há a disjunção entre objeto e sujeito, o entendimento da relação da inovação com o design traz uma visão mais humanizada ao tema, onde é impossível se reduzir a inovação apenas a suas dimensões econômicas e se reconhece a importância de suas dimensões qualitativas e sociais. Outra vantagem da teoria da transdisciplinaridade é que ela não é restritiva nem tampouco redutora. Como Nicolescu et al. (2000) afirma, a pesquisa transdisciplinar não é antagônica a pesquisa disciplinar, elas se complementam. Do meu ponto de vista, a teoria da transdisciplinaridade não negaria nem substituiria a lógica clássica no processo de inovação, mas abriria novas possibilidades de se entender e inovar a partir de suas premissas. Como ela não nega o potencial individual de cada pessoa ao valorizar a não linearidade lógica através dos saltos quânticos criativos e ao estimular o diálogo de conhecimentos, ela é capaz de conceber noções ao mesmo tempo complementares e antagonistas (Morin, 2003). E também explicaria porque ao se apresentar um mesmo briefing e/ou tema a diversos criadores, seus resultados podem ser tão dispares, como pode ser visto no exemplo de peças da coleção AuDITIONS Brasil (Quadro 60). Traçando um paralelo com que Goswami (2012) explica, a partir da mesma onda – ou seja, do mesmo briefing e/ou tema – vários acontecimentos ligados a olhares diversos podem ser gerados, ou seja, como no salto quântico, é o “olhar” do criador que ao entrar em colapso com a onda de possibilidades criativas provoca um “acontecimento único”.

227

Multiculturalidade

Influência Africana

Crenças

Borboleta

Quadro 60 - Resultados diversos para mesmos briefings e/ou temas

E como Bohr (1995) comenta é a complementaridade de “acontecimentos” – que o autor denomina de fenômenos – que dá uma totalidade e juntos esgotam todo o conhecimento definível sobre o objeto em questão. Ou seja, não há um

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quadro único a ser “perseguido e alcançado”, a dualidade onda-corpúsculo torna impossível de se traçar uma linearidade de um ponto inicial a um ponto final, e, portanto, só é possível de se prever as características que algo vá assumir quando ele é observado. Essa indefinição me remete à afirmação de Picasso “eu não procuro, eu acho” (Mac, 19660) ou a de Gullar (2006) para quem a arte inovadora é uma experiência permanentemente aberta que tem que ser descoberta, inventada a cada momento durante o seu processo. Com a suplantação da descrição determinista da física clássica, Bohr (1995) levanta uma questão muito importante, a meu ver, ao afirmar que “qualquer forma, por mais útil que tenha se mostrado antes, pode revelar-se estreita demais para abarcar novas experiências” (Bohr, 1995, p. 80). A complexidade do mundo atual está fazendo com que padrões fixos de pensamento comecem a desmoronar em todas as áreas de nossa vida contemporânea e é preciso se criar uma nova matriz de observação da realidade ao nosso redor. Traçando um paralelo com o surgimento da física quântica, a estranheza inicial que a teoria da transdisciplinaridade possa causar em um primeiro momento, não deve impedir de se perceber que através dela se abrem novas possibilidades para um entendimento e uma valorização da união da objetividade e da subjetividade, do uso da intuição, da memória implícita formada através dos anos de prática descrita por Carson (2012), enfim daquilo que não pode ser descrito em palavras, como, por exemplo, o viés da validez do design thinking apresentado por Martin (2010) no processo de inovação em relação ao design. A teoria da transdisciplinaridade, através da teoria do 3º incluído, explicaria também o conceito de Cross (1982) do design ser uma “terceira cultura” do conhecimento, e não apenas uma soma “simples” das culturas da ciência e humanas. Ao unir a ciência e arte, o design iria “além” da soma dessas duas culturas, já que ao atuarem simultaneamente elas geram uma “zona de superposição” onde é impossível de se prever qual dos dois modos de pensamento está atuando naquele exato momento. Em razão de todas essas demonstrações, pude concluir que o objetivo geral da pesquisa de avaliar relação da inovação com o aspecto abstrato e o aspecto concreto do design foi alcançado. Já os objetivos específicos também foram discutidos e alcançados ao longo da pesquisa. Foram levantados conceitos de inovação vigentes nas áreas ligadas ao modo de geração de conhecimento nas ciências para, como Alanen (2005) propôs, criar uma base teórica unificada da relação do design com a inovação e da definição de seu papel dentro dela. E também conceitos de

229

“inovação” nas artes que ajudam o designer a entender a inovação sob uma ótica mais centrada no indivíduo que não é priorizada normalmente nos estudos tradicionais de inovação. Para se mapear os conceitos de inovação sob a ótica do design e, através de sua união com os conceitos nas ciências e nas artes, ampliar o entendimento da relação do design com a inovação de maneira nova e fecunda. Foi a partir disso, que identifiquei a necessidade de se buscar uma diferenciação entre os conceitos de “inovação pelo design” e “design inovador”. Como o primeiro conceito é mais ligado aos aspectos abstratos do design ele não precisa se materializar necessariamente em um objeto, como o design thinking defende. O modo de pensar do designer seria mais um instrumento de se criar inovação através do design e pode gerar não só inovações de produto e de marketing, como o Manual de Oslo (OCDE – FINEP, 2005) descreve, mas também inovações de processo ou organizacional. Os conceitos e parâmetros de inovação tradicionais, como por exemplo, o grau de novidade, de intensidade, de continuidade e de difusão, as estratégicas competitivas, etc. apresentados no segundo capítulo, podem ser também empregados na avaliação dos resultados da “inovação pelo design”. Em contrapartida, o conceito de “design inovador” necessita de um objeto, pois levaria em conta a sua percepção pelo consumidor, baseando-se em um dos principais papeis do design que é criar uma comunicação entre o objeto e o usuário, suprindo além de necessidades físicas, necessidades psicológicas do mesmo (Löbach, 2001). Como o mesmo autor afirma os objetos não se definem apenas pelas suas funções práticas; existem também as funções estéticas, definidas por sua percepção sensorial (cores, formas, texturas, tamanhos, etc.) e as funções simbólicas gerada através das associações derivadas dos aspectos estéticos, psíquicos e sociais. Para ressaltar que o objeto não pode ser disjunto de sua percepção pelo o sujeito como o termo função indica, foi proposto, que a sua percepção se relacionaria através de três níveis: o nível prático, o nível estético e o nível simbólico. E que eles variam dependendo, dos conhecimentos, das habilidades, das experiências de vida, etc. de cada sujeito especifico. Aproveito para ressaltar que, no seu entender, enquanto a ciência foca sua atenção primordialmente no nível prático e a arte se preocupa basicamente com os níveis estético e simbólico, do design se espera que abranja os três níveis. Como os três níveis estão interligados, o “design inovador” seria portanto uma inovação de design perceptível ao usuário em algum desses três níveis distintos.

230

Portanto a definição de “design inovador” não poderia seguir apenas os padrões monetários quantitativos comumente aceito pelos estudiosos do tema, que restringiriam a inovação apenas a “lançados no mercado com sucesso comercial” – que poderiam ser empregados normalmente ao se avaliar projetos de “inovação pelo design”. Essa definição excluiria as experimentações funcionais, estéticas e simbólicas realizadas pelos designers que trabalham com peças únicas e pequenas tiragens, onde normalmente são realizadas as inovações mais radicais no design e que transformam ideias sobre o mundo e relações sociais na forma de objetos (Forty, 2007). Com os novos paradigmas de produção, radicalmente divergentes da produção de massa (Cardoso, 2011) abertos pelas tecnologias digitais, foi proposto que a definição de “design inovador” – ou seja do que é percebido pelo sujeito ao interagir com qualquer objeto – estejam ligados às rupturas estéticas, à busca de novas formas, novas técnicas, novos materiais tão presentes no mundo das artes. Este conceito se difere do conceito de design driven innovation (Verganti, 2006) que também apresentariam em intensidades diferentes, ou seja de incrementais a radicais. O “design inovador” equivaleria ao conceito radical design-driven innovation de Dell’Era e Verganti (2009), ou seja a inovação radicais guiadas pelo design. O “design inovador” seria aquele que constitui um valioso patrimônio da experiência estética, marcando a ampliação dos limites da expressão estética e o aumento do acervo de sua linguagem – que poderia ser definido por “inovação de significação”. Como Cocco (in: CGEE, 2010) afirma, é na significação dos objetos que residem muitas das inovações de mercado atualmente, já que ela é a responsável por todo um world making em torno do produto e da marca e é esse mundo que é comprado ou vendido, não só a função física e/ou prática do produto em si. Acreditando que no design a teoria não deve ser dissociada da prática, a pesquisa não se ateve apenas a conceituar a relação do design com a inovação mas também buscou entender como se faz o “design inovador”. E foi no levantamento de estratégias adotadas por designers em sua prática coletado através de dados bibliográficos, apresentado no quinto capítulo, que surgiu a proposta da criação da mandala transrelacional de abordagens criativas, ao se perceber de que muitos objetos criados pelos designers – neste caso especifico designers de joias – combinavam diversas abordagens em um único objeto. A multiplicidade de abordagens gera uma ambiguidade – ou seja, uma situação que não é clara nem objetiva desencadeando um processo de um

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pensamento que força a criação de novos padrões mentais –, ampliando a complexidade e o repertório de experiências do usuário. E através do exemplo do sucesso e reconhecimento da criatividade de grandes chefs da gastronomia, como Ferran Adrià e Blumenthal – que não é uma área tradicionalmente inserida nos estudos de inovação, assim como o design –, pode-se perceber que o impacto da quebra de expectativa e a complexidade de experiências são fatores difundidos e percebidos em nossa sociedade contemporânea como geradores de inovação. Mas acredito que seja importar ressaltar, mais uma vez, que para se criar algo inovador estratégias e abordagens criativas não bastam: é preciso que o criador tenha a intenção de criar algo que busque por essa ruptura que faça com que o objeto sem referências em padrões pré-formados seja considerado inovador. Para alcançar o último objetivo específico da pesquisa que se constituía na avaliação das abordagens criativas na criação e na análise de “design inovador”, o sexto capítulo documenta a criação de uma joia para um concurso de design de joias utilizando-se da mandala transrelacional no desenvolvimento de um projeto selecionado como finalista do concurso e de uma segunda proposta de projeto, que não foi selecionada, através do processo que se desenvolveu empiricamente ao longo de sua prática como designer de joias. Posteriormente, na análise das joias finalistas das 6 edições do mesmo concurso, esse padrão se confirmou já que as outras duas peças selecionadas em edições anteriores – e que não foram criadas através da mandala transrelacional – também combinavam intuitivamente 3 ou 4 abordagens diferentes. O mais interessante é que mesmo criadas pela mesma pessoa usando as mesmas abordagens: “criação de sensações”, “introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas”, “releitura do passado ou de culturas exógenas” e “subversão da função e/ou forma”, os resultados formais não poderiam ser mais distintos, pois as abordagens se materializaram através de diferentes formas, como pode ser visto no Quadro 61. Isso demonstra que a mandala transrelacional não é um modelo que engessa a criatividade, pois ela mesmo limitada a 8 abordagens permite que estas sejam materializadas de modo “infindável”.

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Peça

Abordagem criativa

Materialização

1. criação de sensações 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. combinação de materiais 4. releitura do passado ou de culturas exógenas

1.sons criados pelo balanço das gotas de ouro 2. montagem usada pulseiras de miçangas 3. uso de fios de silicone para unir as peças e dar elasticidade 4. liga usada nos anos 40 e 50 pelas pinups 1. reflexos criando ilusões de ótica, sons das bolinhas balançando dentro das “borbulhas” 2. modelagem 3D e prototipagem rápida 3. tamanho exagerado

1. criação de sensações 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. subversão da função e/ou forma

1. criação de sensações 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. subversão da função e/ou forma 4. releitura do passado ou de culturas exógenas

1. ilusões de ótica em relação a gema de metal 2. modelagem 3D e prototipagem rápida 3. tamanho oversized 4. combinação de ícones da joalheria portuguesa e africana

Quadro 61 - Materialização das mesmas abordagens criativas em objetos totalmente diversos

Outro ponto que gostaria de ressaltar, é que a partir da análise das 170 peças finalistas se pode perceber que na comparação das 13 peças vencedoras do concurso em relação as selecionadas como finalistas do AuDITIONS BRASIL houve um aumento considerável do número de combinações de abordagens criativas usadas em uma mesma peça, como foi apresentado detalhadamente no sexto capitulo. Nas peças vencedoras a combinação de 3 e 4 abordagens chega a quase 70%, enquanto nas selecionadas ela se aproxima dos 40%. Isto pode sugerir um possível caminho para a criação de indicadores de inovação de significação a partir do número de combinações de abordagens criativas no mesmo objeto. Mas antes que se possa determinar a viabilidade do emprego do número de combinações de abordagens criativas como parâmetro ou indicador de design inovador, seria preciso que a mandala transrelacional fosse mais estudada. Era preciso difundir o seu conceito para colher as impressões sobre a sua proposta e analisar os resultados de seu uso por outros designers, ou até mesmo por outras áreas de conhecimento que não conseguem ter o grau de inovação determinado através de indicadores financeiros. Quem sabe, ela não poderia até mesmo se transformar em um dos parâmetros de mensuração do “conhecimento gerado por meio de conhecimento”, preenchendo a lacuna identificada por Cocco (in: CGEE, 2010). Como o autor afirmou, sem uma nova métrica que entenda o

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papel da inovação cognitiva não se conseguirá percebê-la; utilizando-se de parâmetros e indicadores tradicionais ligados apenas ao capital aplicado à inovação tem-se a impressão inverídica de que não existe inovação nestas áreas, já que não existe também instrumentos para mensurá-la. Outras possibilidades, vislumbradas até o momento, de desdobramentos futuros que se originaram através da pesquisa – além das já citadas acima –, seriam: 

escrever artigos que sensibilizem instituições e outras áreas ligadas a inovação sobre a relação do design com a inovação;



difundir entre os designers através de artigos, cursos, palestras os conceitos de inovação e sua relação com o design para que eles estejam preparados para os editais e chamadas públicas que estão sendo disponibilizados pelos órgãos governamentais;



demonstrar a outros agentes de inovação como a prática do design pode

ser

de

grande

auxilio

na

discussão

por

novos

enquadramentos teóricos e metodológicos que façam avançar o conhecimento sobre um melhor entendimento do processo de inovação e ajudem a desenhar políticas para o cenário de desmaterialização do trabalho e dos bens que se aproxima através do capitalismo cognitivo citado por Cocco (in: CGEE, 2010); e 

desenvolver

pesquisas aprofundadas sobre a inovação de

significado sob a ótica do design e para conseguir definir o seu papel na economia da inovação.

234

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9 Anexos

AUDITIONS BRASIL 2002 Tema: HOT GLAMOUR 15 peças Inspiração Na primeira etapa do Fórum, foi realizado um workshop onde foram ministradas palestras pelos estilistas Lino Villaventura, Renato Loureiro e Icarius que falaram sobre as tendências da moda. peça

Designer/ UF Sérgio Povoa Pires / PR

Descrição do catálogo Uma corrente de 15 metros de comprimento, com diferentes elos, concebida para ser usada para enlaçar o corpo, nu ou vestido, instigando a criatividade e a imaginação

Abordagens 1.subversão da função/ e ou forma

Mônica Braga / MG

Brinco inspirado nas joias africanas, confeccionado em ouro 18K, composto por 312 bolas foscas e polidas. A parte inferior é totalmente flexível

1.releitura do passado ou de culturas exógenas

Ruth Grieco / SP

Uma escultura única. Sua execução possibilita que seja usada confortavelmente de várias formas: como alça de vestido, dois braceletes, colar curto ou longo ou, ainda, broche, sofisticada e prática.

1.subversão da função/ e ou forma

Lena Garrido e Débora Camisasca / MG

Gargantilha em ouro amarelo 18K, formada por módulos de diversos tamanhos e formas, articulados entre si, sugerindo uma renda, e por correntes finas dispostas irregularmente, como se jogadas ao acaso. Para fechar a peça, foi utilizada uma fita de veludo preta

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. combinação de materiais

248

O brinco “Chuva de Ouro” foi inspirado nas mulheres que trabalham no garimpo, na sua sensibilidade e força, no movimento das batelas e na magia provocada por esse metal. Peça toda articulada, com cordões saindo por trás dos três tipos de módulos.

1.subversão da função/ e ou forma (comprimento)

Inspirada em várias imagens, como uma festa, brilho, risos. Prazer cristalizado no pulso de uma mulher. Este bracelete é confeccionado em esferas polidas e texturizadas no ouro amarelo 18K.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

O colar “Onça Pintada” foi inspirado na força, sensualidade e beleza do imponente animal, de características só comparáveis às da mulher brasileira.

1. inspiração na natureza (biônica)

Inspirada na sensualidade da mulher glamourosa, valoriza todo esse charme com uma joia que sai do casual e ganha uma nova maneira de ser usada, dando um acabamento único e cheio de brilho e glamour. Maleável, adorna e molda o corpo da mulher especial.

1. criação de sensações

Adriana Soares e Patrícia Rebelo / RJ

A inspiração para essa joia veio das bandeiras de Volpi, utilizando retalhos de tecidos como material principal, transformados em ouro. É uma associação da moda vestuário com a arte; tudo isso traduzido como adorno, inspirando movimento, brilho, sensualidade e glamour.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

Verônica Arrigoni / RJ

“Cascata Dourada” – para de brincos formados por gotas articuladas de ouro amarelo polido que caem ao longo do rosto e pescoço, numa cascata preciosa.

1. inspiração na natureza (biônica)

Rodrigo Robson / MG

Fernanda Barcelos Correa / MG

Luciano Guilherme / RJ

Clotildes Silveria Teixeira / MG

2. criação de sensações

2. inspiração na natureza (biônica)

2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (técnica de união dos aros)

2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

249

Ida Benz / RJ

Inspirada no glamour das grandes stars de Hollywood dos anos 40 e 50, esta liga em ouro amarelo 18K foi idealizada para realçar o gingado e a sensualidade da mulher brasileira. O balanço das gotas de ouro acompanha o ritmo de cada movimento.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. combinação de materiais (fios de silicone) 3. criação de sensações

Rodrigo Robson / MG

Sérgio Povoa Pires / PR

Silvia Döring / PR

Heloisa Azevedo / MG

O colar foi inspirado na fertilidade da mulher, nos ciclos que viveu ao longo dos anos, suas conquistas e merecida tomada de território. É composto por módulos texturizados e lisos, unidos uns aos outros por fios.

4. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (montagem de bijuteria) 1.subversão da função/ e ou forma (comprimento) 2. criação de sensações

Socialmente responsável, este novo conceito de joia, composto de broche e anel em ouro fosco com inscrições em Braille, proporciona uma nova percepção às pessoas portadoras de deficiência visual

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Inspirada no luxo das rendas francesas e na sensualidade dos corseletes, a coleira de ouro arrematada por uma fita negra de cetim lembra que as joias ultrapassam sua mera função de adorno, resgatando o glamour e a sensualidade.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

Alfinete de lapela trabalhado em fios rígidos de ouro polido, que contrastam com o centro escovado. Inspirada nos babados da moda, a peça traduz para o metal a fluidez, leveza e transparência dos tecidos e fitas

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

2. criação de sensações

2. combinação de materiais

250

Tema: Young & Cool 14 peças Inspiração Na primeira etapa do Fórum, foi realizado um workshop onde foram ministradas palestras pelos estilistas Lino Villaventura, Renato Loureiro e Icarius que falaram sobre as tendências da moda. peça

Designer/ UF Vanessa Lages / RJ

Descrição do catálogo Gargantilha de corpo em ouro amarelo, com fios serpente e fecho em forma de cadeado esmaltado.

Abordagens 1.subversão da função/ e ou forma 2.releitura do passado ou de culturas exógenas

Fernanda Barcelos Correa / MG

A inspiração para o anel surgiu da imagem de uma mulher simples apanhando gravetos espalhados no chão, unindo-os num feixe e prendendo-os com uma corda. Do ouro amarelo 18K, fizeram-se os feixes polidos e a cinta acetinada que arremata o anel.

1. inspiração na natureza (biônica)

Pitti Paludo / SP

As Havaianas são um autêntico produto brasileiro, usado por todas as faixas etárias, classes sociais e sexos, aparecendo nos mais variados ambientes e situações. A tira em ouro eleva este autêntico símbolo do consumo brasileiro à categoria de joia, enquanto a figa no pé direito significa proteção a todos os usuários, valorizando sua brasilidade.

1.subversão da função/ e ou forma

Marcos Augusto / MG

A coleção “Cápsulas Ecológicas” são joias versáteis. Através da parte superior, que se abre, podese trocar os materiais do interior das cápsulas, possibilitando alterações na cor, forma e textura.

2.reaproveitamento de materiais 3. combinação de materiais (borracha) 4. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (trançado de cestaria) 1. combinação de materiais 2.subversão da função/ e ou forma

251

Maria Anita Esteves Damy / SP

O cinto foi idealizado para ser uma joia versátil, que pode se desdobrar em alça de vestido, alça de bolsa, pulseira, tornozeleira ou colar. Podem ainda ser usadas só as placas, aplicadas sobre vestidos ou echarpes, do lado polido, do lado fosco ou então alternadas. É, enfim, um coringa no porta joias.

1.subversão da função/ e ou forma (comprimento)

Teresa Xavier / RJ

“Flor da vida” – emblema da geometria sagrada, traz codificada toda a origem da criação. O padrão do holograma da flor é o padrão do amor incondicional, semente da criação. É conhecido também como holograma do amor.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

Conjunto inspirado na criatividade dos jovens brasileiros e sua maneira descontraída de se vestir. Broche, que, junto com a faixa de couro e ouro, pode ser usado também como pulseira ou gargantilha. Sozinha a faixa pode ser usada na cabeça, no braço ou onde a imaginação permitir.

1. combinação de materiais

Buscando inspiração em linhas e formas encontradas no nosso meio, a peça cria uma união de leveza e transparência para a estruturação figurativa do piercing.

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Aleuda Prata / MG

“Fantasia” – um adorno para os cabelos, inspirada na magia e essência mutante e atraente das jovens, que traduz um universo de romantismo e glamour. A peça em ouro é composta de um passador com corrente, tendo na ponta um encaixe que permite a troca dos seis pingentes acompanhantes.

1. subversão da função/ e ou forma

Elka Freller / SP

O porta-camisinha foi idealizado para dar sofisticação e charme a um objeto do cotidiano. Com fecho tipo mosquetão, pode ser usado como centro de colar, preso ao chaveiro, ao cinto ou à bolsa.

1.subversão da função/ e ou forma

Emi Kyouho Hirose / MG

Cláudia Machado / RJ

2. combinação de materiais (fio de algodão)

2.subversão da função/ e ou forma

2. inspiração na natureza (biônica) (borboleta)

2.reaproveitamento de materiais

252

Talismã “Duvvel Varter Opré Mandi”. Interativa, a inspiração ciganamente brasileira aparece trançada com pailletes de ouro e nos acessórios: saquinho de seda de ouro 24K, com ervas para a saúde, amor e prosperidade, e uma argola com fitas coloridas e símbolos de projetos beneficiados com as vendas dessa linha, que incluem campanhas contra a AIDS e o câncer de mama. A sinuosidade das curvas em harmonia com as hastes retas, vestindo os dedos de ouro, personalidade e ousadia. Confeccionado em ouro amarelo, com aro polido e as hastes em degrade de diferentes texturas.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

Maria Anita Esteves Damy / SP

Os pingentes foram idealizados para uma mulher sofisticada que usa calça jeans, relógio de marca e poucas joias, e que além disso, adora o pretinho básico. O pingente pode ser colocado na alça da bolsa, no cinto de couro, fechando o casaco, ou simplesmente no passante do jeans.

1.subversão da função/ e ou forma

Mariana Dupas / SP

O acessório é formado por três finos círculos que contornam os ombros, evocando toda a sensualidade da mulher. Vestido como pulseira, passa pelo braço e se acomoda no ombro. As argolas de fio maciço de 1,6mm de diâmetro são unidas por um ponto de solda. Possui acabamento fosco acetinado.

1.subversão da função/ e ou forma

Teresa Xavier / RJ

Denise Maffizzoli / RJ

2. combinação de materiais (fitas) 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 1. criação de sensações

Tema: Brazilian Essence 23 peças Inspiração Na primeira etapa do Fórum, foi realizado um workshop onde foram ministradas palestras pelos estilistas Lino Villaventura, Renato Loureiro e Icarius que falaram sobre as tendências da moda.

253

peça

Designer/ UF Guida Pels / RJ

Descrição do catálogo “Gabriela” foi inspirada no “imortal” Jorge Amado. São círculos irregulares encaixados como um origami, formando uma flor. Atas, uma caixinha para colocar o cravo e a canela, de aroma místico e agradável.

Abordagens 1. inspiração na natureza (biônica)

Luciana Preuss / RJ

Brinco “Bambu”, inspirado no movimento dos bambus ao vento. Toda articulada, em ouro amarelo fosco, com detalhes polidos.

1. inspiração na natureza (biônica)

Sancha Lívia Resende / MG

Colar inspirado em cocar, com penas de ouro amarelo 18K, distribuídos em fios torcidos de tucumã.

1. combinação de materiais

O colar ‘Amazônia” representa o mito do Eldorado. Na altura do chacra laríngeo, possui uma espiral áurea – demonstração que tudo no universo se movimenta em espiral. No chacra cardíaco, o sol representa o coração do Eldorado, com seus guardiões “tribos indígenas” e pirâmides de base quadrangular. No chacra do plexo solar, o Brasil desponta, com o coração gravado na Amazônia, ostentando sua merkaba. O conjunto valoriza a crendice e as crenças brasileiras, unindo religião, folclore e superstição – uma miscigenação cultural. Uma simples fita do Senhor do Bonfim tem seu valor simbólico mantido e seu valor de consumo elevado à categoria de joia. Tanto o colar quanto a pulseira são montadas a partir de peças individuais, permitindo diferentes combinações e troca de fitas.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

Teresa Xavier / RJ

Pitti Paludo / SP

2. criação de sensações

2. releitura do passado ou de culturas exógenas

1.subversão da função/ e ou forma 2. combinação de materiais 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (montagem)

254

Liliane Lima / MG

Colar em ouro amarelo texturizado, inspirado no crescimento da soja. Esse ciclo inicia-se com a germinação dos primeiros ramos e termina com o amadurecimento dos grãos.

1. inspiração na natureza (biônica)

Juliana Faria / RJ

“Conjunto Kaxinawa” - gargantilha e bracelete inspirados nas formas de pintura corporal Kashinawá do Rio Jordão. As formas pintadas na pele dos índios, utilizadas na cestaria, vestimenta e artesanato, são recriadas pelo ouro, originando um conjunto que adere ao corpo e dá continuidade à pintura e cultura indígena. O conjunto foi inspirado na exuberância da mulher brasileira, com mistura de etnias que lhe é peculiar. As argolas são uma referência aos colares afro; as gotas e o trançado representam a porção indígena; a grandeza das peças, a riqueza europeia. Desta maneira surgem joias vistosas e, ao mesmo tempo, simples como nossa origem. A gargantilha “Maria Bonita” foi inspirada no cangaço, forte expressão da cultura nordestina. A peça busca contrastar a rusticidade do cangaço e a sutileza da sensibilidade artística de Lampião e Maria Bonita.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

“Trançado Brasileiro” foi inspirado na riqueza dos detalhes da cestaria indígena, utilizando o contraste de cores do ouro com a piaçava, um material rústico e resistente

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

Brinco em ouro amarelo 18K inspirado em uma trama de fios de fibra natural (juta). A peça é formada por hastes articuladas, com movimentos sinuosos, entrelaçados com fios de juta tingidos de vermelho.

1.subversão da função/ e ou forma (comprimento)

Christiane Joyce Cardoso / RJ

Luciana Barros / SP

Luciano Guilherme / RJ

Lena Garrido e Débora Camisasca / MG

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

1. combinação de materiais (couro)

2. combinação de materiais

2. combinação de materiais

255

Rodrigo Robson / MG

O brinco “África-Brasil” foi inspirado nas escravas trazidas durante a colonização portuguesa. É uma homenagem às mulheres que trouxeram a sensualidade, alegria e força típicas do Brasil. No brinco são utilizadas sementes de olho de boi, de olho de cabra e de pau-brasil. O par é todo articulado.

Margarida Recorder / MG

O bracelete foi inspirado no vestuário, alimentação e costumes das tribos áfricas: tecidos rústicos, panos sobrepostos e estampados.

Melissa Maia e Rodrigo Robson / MG

O cinto “Sensualidade Indígena” foi inspirado no charme da mulher brasileira. É uma celebração à força das mulheres de tribos indígenas. A peça é amarrada na lateral; foi utilizado couro na sua confecção.

1.subversão da função/ e ou forma (comprimento) 2. combinação de materiais 3. inspiração na natureza (biônica) 1. releitura do passado ou de culturas exógenas

1.subversão da função/ e ou forma 2. releitura do passado ou de culturas exógenas 3. inspiração na natureza (biônica) (folhas)

Lílian Granado / RJ

Cynthia Maffra Vieira / MG

Inspirado na riqueza e beleza das cores da fauna brasileira, o brinco em formato de pena ressalta mais uma vez a importância da preservação ambiental.

É inspirada no melhor do Brasil: sua essência. Uma coleira que mostra as raízes de forma harmônica, demonstrando a natureza em sua simplicidade, transmitindo beleza e feminilidade de forma leve.

4. combinação de materiais 1. inspiração na natureza (biônica) 2. combinação de materiais

1. inspiração na natureza (biônica)

256

“1005 Nacional” um tributo a Aleijadinho; vai do barroco à modernidade em inusitada sandália de couro. Original em toda a sua brasilidade, o sensual, a graça e a exuberância da peça valorizam nossas raízes, com materiais – ouro e couro – 100% nacionais.

1.subversão da função/ e ou forma

Lílian Granado / RJ

Para fazer exaltação às belezas naturais brasileiras, este pendente em ouro e fibra de sisal representa o sol do nordeste, seu calor e a seca, chamando a atenção também para os contrastes do nosso Brasil.

1. combinação de materiais (couro e sisal)

Fernando Siena / SP

O bracelete foi inspirado nas tradições indígenas brasileiras, especialmente as do alto Xingu e de seus rituais, onde a ondulação dos adereços e plumagens usados como braceletes e tornozeleiras proporcionam riqueza de sons e de movimentos.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

Eliana Gola / SP

Cathrine Clarke / RJ

Bambus tropicais, utilizados como adornos por índios nativos, são esculpidos e texturizados com buril. O colar faz alusão ao peitoral indígena, coberto de amuletos. O pente de cabelo, ao cocar. O anel remete à magia do feitiço: os bambus sinuosos dos dedos, surpreendem, subindo pela mão.

Clotildes Silveria Teixeira e Luiz Cláudio da Silva / MG

Colar com contas de café, puros e primitivos. Matérias-primas que são cúmplices. Resultado visual para uma mulher poderosa, estimulante e excitante, como o café e o ouro. Lembrança de que as plantações da fruta são como uma mina do metal. Recordações de um Brasil que os escravos ajudaram a construir.

2. combinação de materiais

2. criação de sensações 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (montagem) 1. inspiração na natureza (biônica)

1. inspiração na natureza (biônica)

257

Lílian Granado / RJ

Luiza Seixas / MG

O colar inspirado no “fuxico”, trabalho manual feito em tecido, recria em ouro e coco a beleza do artesanato feito no Brasil. Também ressalta a importância de resgatar essas técnicas, utilizando criatividade unida à matéria-prima.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

Inspirado no movimento das serpentinas, confeccionado em ouro fosco.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

2. combinação de materiais

258

AUDITIONS BRASIL 2004 Tema: RAÍZES E FORMAS 34 peças Inspiração Raízes e Formas – A expressão da visão dos designs brasileiros de joias em ouro das raízes brasileiras, sejam culturais, étnicas ou, simplesmente, dos aspectos responsáveis pela formação do povo brasileiro e da construção da personalidade do País. Uma leitura própria e inovadora do tema capaz de motivar a escolha da joia em ouro como objeto de desejo do consumidor, no Brasil e no mundo. peça

Designer/ UF Fernanda Barcellos / MG

Adna Salles / MG

Ana Paula Feijó / RJ

Descrição do catálogo “Volpi” - Volpi foi um dos maiores artistas brasileiros, homem simples, ex-carpinteiro, ex-entalhador, um autodidata. Retratou o “simples” com sofisticação. Representou o gosto popular numa comunicação direta. As bandeirinhas transformaram-se em módulos geométricos que, abstratos e repetidos infinitamente, passam a construir exercícios de luz, cor, ritmo, equilíbrio, espaço e simetria. Simplificava para extrair a essência. Esta peça resgata o maravilhoso trabalho de Volpi juntamente com a técnica de côco e ouro, representando a brasilidade e universalidade sintetizada em suas obras. “Etnias” – A ideia do pingente Etnias surgiu da lembrança de um brinquedo de infância feito originalmente em areia e água. No pingente, a areia foi substituída por ouro em pó nos tons amarelo, negro e branco que simbolizam, respectivamente, nossas origens étnicas: índio, negro e branco. Ao girá-lo, as cores se misturam criando sempre uma nova forma, reapresentando a miscigenação entre as raças que constituem o povo brasileiro. “Emilia” – A peça tem como inspiração a personagem Emilia, do Sítio do Picapau Amarelo. “A boneca mais esperta do Planeta” foi criada por Monteiro Lobato em 1920, colorindo e enchendo de fantasia o mundo das histórias infantis. Monteiro Lobato foi o pioneiro da literatura paradidática – aquela na qual se aprende brincando.

Abordagens 1.subversão da função/ e ou forma (minisaia) 2. combinação de materiais 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (montagem no couro)

1. combinação de materiais 2. criação de sensações 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (vidro de relógio)

1. combinação de materiais (franjas de lã) 2. criação de sensações (lã)

259

Aline Motta e Beth Leste / MG e MG

Andréa Nicácio / RJ

Angela Sampaio / MG

“Metamorfose – Raízes Orientais” – A peça é um conjunto composto por anel, bracelete, e broche em ouro amarelo 18k intercambiáveis, representando as fases do desenvolvimento do bicho da seda: lagarta, casulo e borboleta, conectados por fios de ouro e seda natural. As joias foram criadas em homenagem às nossas raízes orientais, que há cinco mil anos, descobriram a arte da seda. Durante a II Guerra Mundial, a Sericultura foi introduzida no Brasil, nas regiões Sudeste e Nordeste quando, em razão do conflito, as nações produtoras, Japão e china, ficaram fora do mercado. A indústria de seda tão bem se desenvolveu aqui, que transformou nosso país num expoente em termos de produção. O ouro e a seda são símbolos de opulência desde tempos imemoriais. Essa simbiose retrata a feminilidade e a elegância da mulher atual. “Sensualidade” – O Colar sensualidade foi inspirado nos peitorais indígenas. Além de retratar as nossas raízes, leva consigo a sensualidade brasileira. A flexibilidade do ouro no couro e a leveza das penas, acompanham os movimentos da silhueta, o que expressa a beleza sensual da mulher brasileira. “Jogo dos Búzios” – A peça “Colar Jogo dos Búzios” foi inspirada na influência da cultura negra brasileira, trazida pelos africanos e introduzida na mística e na religiosidade do Candomblé. Os búzios são um tipo de concha do mar que percorrem todo o mundo, trazendo consigo os segredos das águas, do céu, da terra e da energia de tudo que existe. Os colares utilizados no jogo (brajás) são feitos no formato de gomos (inspiração da parte superior do colar), o que representa a senioridade do Candomblé, e em forma de círculo, o que circunscreve o campo de jugo. Os búzios foram fixados em movimento para que pareçam jogados sobre o colo, caracterizando o próprio jogo de búzios. A proposta da peça é mística e tem como finalidade mostrar o mundo dos orixás (anjo ida guarda ou o “Deus” interno de cada um).

1.subversão da função/ e ou forma 2. combinação de materiais 3. inspiração na natureza (biônica)

1. combinação de materiais 2. releitura do passado ou de culturas exógenas 3. criação de sensações 1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. inspiração na natureza (biônica) 3. criação de sensações (corrente de búzios nas costas) 4.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

260

Beth Leste / MG

Carlos Godoy e Gui Marin / SP e SP

“Mucama – Raízes Africanas” – A peça Turbante, foi confeccionada em tela de ouro amarelo 18K, cujas pontas são arrematadas por grega e franja. A parte de trás é conectada por faixa de seda da Bandeira do Brasil. Essa faixa é intercambiável, podendo ser substituída por várias fitas, tiras de renda ou outros tecidos de cores diversas. Foi inspirada pela maneira como as escravas usavam o lenço quando aqui chegavam e tinham a cabeça raspada (Debret – Retratos do Brasil). Tal moda foi copiada por D. Carlota Joaquina e, consequentemente, pela Corte, eternizada por Carmem Miranda, repetindo-se os ciclos, aparecendo muitas vezes como característica do nosso País. “Samambaia” – A Inspiração – ao lançar um olhar mais atendo sobre as primeiras formas do território brasileiro, percebe-se que as capitanias hereditárias dividiam o País em pedaços longos e estreitos, que lembravam as folhas de uma samambaia. O nome samambaia vem do tupi-guarani e significa “aquele que se torce em espiral”. A samambaia representa a síntese ideal do Brasil e de seu povo. Para retratar a formação da nossa identidade e a ímpar miscigenação de raças em nosso País, foram produzidas algumas folhas da peça em mokume–gane. Juntas as folhas fazem alusão ao mapa do Brasil. Mokume-gane, em japonês, significa “metal com veios de madeira”. A técnica consiste na fusão de blocos de diversas laminas de diferentes metais. No caso da peça, foram usadas três colorações de ouro que, forjadas, resultam em chapas com diferentes padrões. Por se tratar de um processo artesanal e essencialmente orgânica, os padrões alcançados nunca são idênticos. E esse é o grande valor que a técnica agrega ao ouro: a personalização e a unicidade que conferem a cada peça uma história própria e singular.

1.subversão da função/ e ou forma 2. combinação de materiais 3. releitura do passado ou de culturas exógenas

1. inspiração na natureza (biônica) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. subversão da função/ e ou forma (adorno de cabeça)

261

Cláudia Lamassa / MG

Cláudia Matandos / SP

Cleone Ribeiro / SP

Ditling Karin Lenk / SP

“Angel” – A joia como adorno divino, do espiritual, completa o meu imaginário de elegância, feminilidade e beleza. É capaz de elevar a mulher ao céu, transformando-a em anjo, puro e inocente, porém super sensual. Representa a delicadeza e a inocência dos anjos barrocos que ornamentam as igrejas mineiras, a tradição das crianças de se vestirem de anjos, na Semana Santa, e remete à lembrança de quando fiz a 1ª Comunhão e me vesti de anjo. “Acapu” – O anel foi inspirado nos dois tons contratantes que compõe o veio da madeira. O cerne de coloração escura e suas estrias mais claras. Foi utilizada a madeira Acapu pro seu aspecto mais fibroso, resistência e baixa absorção de umidade. A árvore é nativa das matas de terra firme do amazonas, Pará, Amapá e Maranhão. “Escrava” – inspirada na raça negra, na beleza e na sensualidade de seus representantes. No momento em que as autoridades brasileiras se mostram preocupadas com as injustiças sociais das quais o povo negro tem sido vítima, manifesta sua solidariedade à causa, homenageando o escravo como elemento de fundamental importância na formação do povo brasileiro. A pulseira, em parte presa por correntes e em parte liberta, simboliza tanto o período de escravidão como o de libertação do povo negro no Brasil. Elaborando uma joia valiosa, colabora para elevar o negro à posição social merecida. “Odoyá” – As peças foram inspiradas na cultura africana e a importância dela para o desenvolvimento da cultura brasileira. Os desenhos foram inspirados em grafismos utilizados em artefatos africanos.

1. subversão da função/ e ou forma (esplendor) 2. combinação de materiais (penas)

1. inspiração na natureza (biônica) 2. combinação de materiais

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. subversão da função/ e ou forma (adorno de cabelo)

262

Fernando Pires Jorge / SP

Francisco Carlos / MG

Juliana Pellegrini / SP

“Atabaque” – O par de braceletes “Atabaque” é composta de ouro amarelo, couro e sementes brasileiras: Pau Brasil, Açaí e Palmeira Sabonete. As cores vermelho, branco e preto representam, respectivamente, os índios, brancos e negros, etnias que compões o povo brasileiro, resultando numa forte combinação. A construção da peça foi inspirada na amarração do atabaque, instrumento de percussão usado nas danças e cerimônias afro-brasileiras, como candomblé e capoeira. O uso das peças nos dois braços reforça seu caráter étnico, remetendo a adornos tribais indígenas e africanos. “Xingu” – neste trabalho, encontrei no Xingu inspiração para minha peça: seu povo, seu artesanato, seus rituais e festas ilustram a grandeza e a delicadeza dessa gente que aqui se encontrava quando este País foi descoberto. A coleira Xingu foi uma peça elaborada com o cuidado de passar um pouco de nossas raízes, através do brilho do rico ouro brasileiro. “Apapàatai Mihiza (Espírito Vermelho)” – O colar foi inspirado pela cultura e pela arte dos povos nativos do Alto Xingu, em especial dos povos Mehinaku e Waúra. O trabalho artístico indígena está a serviço da manutenção de suas tradições, da perpetuidade da sua identidade, através da continuidade da sua cultura. A arte está presente em cada momento da vida dos povos indígenas e surge como expressão de força e conexão com o mundo mítico e espiritual. Os principais elementos da cultura considerados para o projeto foram: os adornos, tendo como base o colar caramujos brancos e as artes plumárias; as cestarias, presentes nos mitos impressos em algumas plaquetas; os instrumentos musicais, nos pendentes das costas e a ênfase na cor vermelha extraída do urucum, simbolizada pelas Granadas.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. combinação de materiais

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. combinação de materiais (penas) 3. criação de sensações (penas) 1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. combinação de materiais (penas)

263

Liliane Lima / RJ

Luiza Seixas / MG

Marga Premen / MG

Maria Luiza Castro / MG

“O Brilho das Cataratas do Iguaçu” – O colar em ouro amarelo foi inspirado na foz do rio Iguaçu. O fluxo das águas inicia-se com a nascente, na altura dos ombros. Simbolizando os caminhos sinuosos do rio, fios em ouro percorrem o colo e as fibras óticas destacam as quedas d’água. A luz emitida por essas fibras nos faz lembrar o reflexo do sol, realçando o brilho da névoa e dos respingos d’água, formados por uma das mais belas paisagens brasileiras, as cataratas do Iguaçu. “Águas do Brasil” – O bracelete que ela apresenta foi modelado em cera pela própria designer e inspirado no movimento ondulatório das águas que trouxeram e elevaram muitas de nossas riquezas, promovendo encontros de diferentes raças e culturas. O Brasil é um grande encontro de contrastes e as águas foram nossa primeira via de integração. “Batida do Samba, Batida do Coração” – este top joia viva é um convite para celebrar a batida redonda do samba ressoando alegria e amor no coração. A escultura foi feita pela autora e o tear em seda é criação de Maria Inês Valadares. Premem deu forma ao samba, joia do coração brasileiro. “Dourado é a cor do sangue do samba que ecoa redondo o Coração do Brasil. O sangue do branco, do preto e vermelho que cria alegria com o som de ouro do couro”. “Aracê” – Ritmo, volume e movimento são características sempre presentes em seu trabalho. Em Aracê, esses elementos fundemse no dourado do ouro e da palha, em busca das Raízes do Brasil. “Raízes sugam do solo a vida e o sustento. A vida ostenta o sol, penetra o solo. A aurora raia e os raios coroam a vida em ritmo de pulsação fecunda. O sol doura no solo as nossas raízes – as raízes da natura e cultura do Brasil”.

1. inspiração na natureza (biônica) 2. combinação de materiais 3. criação de sensações 4. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

1. inspiração na natureza (biônica)

1. subversão da função/ e ou forma (bustiê) 2. combinação de materiais 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

1. combinação de materiais 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (amarração da palha)

264

Marta Allemand / RJ

Minda e Marcio Grantowicz / RJ e RJ

Patrícia Amorim e Sonaya Cajueiro / MG e MG

“Seringueira” – a inspiração do bracelete “seringueira, dos povos da floresta”, surgiu da pesquisa de nossas raízes, que são múltiplas. Também da indagação sobre processos produtivos que, ainda hoje, ocorrem da mesma forma que há séculos atrás e são vivenciados pelos mesmos grupos de brasileiros. Daí, a ideia da seringueira, presente nas nossas distantes matas da Amazônia, e dos seringueiros – povos da floresta – que subsistem da extração do látex, prática não depredadora do meio ambiente, e que hoje produz o couro vegetal através da incorporação de novas técnicas, demonstrando, assim, sua capacidade de renovação inserida no contexto da preservação. O conceito da peça buscou sintetizar um fragmento da própria seringueira, no momento do processo de “sangramento”, extração do látex, simbolizando o dia de trabalho do seringueiro. Ele fez um corte transversal em cada seringueira encontrada, para, ao final da jornada, retornar ao ponto de partida, a fim de recolher seu produto. “Ritmo – Brasil” – A peça intitulada “ritmo – Brasil”, seria uma réplica estilizada do bongô, instrumento de percussão que demonstra a influência rítmica legada pelas raízes culturais do povo africano ao povo brasileiro. Este anel de Minda e Marcio Granatowicz, [...], demonstra simplicidade e harmonia ao interagir conceitos culturais e feminilidade. “Abati” – O capim dourado foi fonte de inspiração dos braceletes criados por Patrícia e Sonaya. Fibra nativa do Tocantins, de sua exploração advém o sustento de grande parte da população da região. Abati é uma harmoniosa união do rústico com o requintado, tendo como elemento de ligação a cor e o brilho da fibra, que por si só nos remetem a conceitos de riqueza e preciosidade. A peça consiste em dois braceletes em capim dourado, sobrepostos por uma raiz em ouro texturizado e franjas de longos fios compostos de pequenos discos de ouro e topázio imperial.

1. inspiração na natureza (biônica)

1. subversão da função/ e ou forma (anel de instrumento) 2. combinação de materiais (couro) 3. criação de sensações (som) 1. subversão da função/ e ou forma 2. combinação de materiais 3. criação de sensações

265

Patrícia Amorim e Sonaya Cajueiro / MG e MG

Rosana Rossi / SP

Sancha Lívia Resende e Rodrigo Robson / MG e MG

“Segredo Marajoara” – A inspiração de “Segredo Marajoara”, foi a partir da pesquisa sobre a requintada cerâmica Marajoara, produto de uma das maiores nações indígenas da Amazônia, na ilha de Marajó, entre os anos 400 e 1300 depois de cristo, Versátil a peça assume multi funções, tais como broche, gargantilha, cinto e até um inusitado colar, que agregado ao vestuário, transforma-se em alça de blusas ou vestido. O elemento central da peça é um disco de fibra de buriti, sobreposto por figuras geométricas feitas em ouro amarelo. Os cordões são cordões de cilindro e cristal rutilado. “Aram” – ARAM – sol na língua tupi guarani, é um adorno usado para saudar o Sol. Os fios de ouro são raios de sol que abrem os braços para a magnitude do universo em cores frias (Branco), Mornas (Amarelo) e ardente (Vermelho).

1. subversão da função/ e ou forma

“Amuleto” – A peça amuleto associa o esplendor do Auro amarelo a um dos símbolos populares mais conhecidos do povo brasileiro: a figa. Diz-se que “fecha o corpo” e atrai bons fluidos para quem a usa.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas (penca da baiana)

2. combinação de materiais 3. releitura do passado ou de culturas exógenas 4. criação de sensações

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

2. subversão da função/ e ou forma (colar atravessado) 3. criação de sensações (correntes e figas)

Virginia Moraes / RJ

“Floresta” – A peça “floresta” é inspirada na riqueza natural do Brasil e de seus primeiros habitantes. Na forma de cocar indígena, a joia estiliza as penas utilizadas na confecção deste adorno com ouro e três espécies de madeira: roxinho, muirapiranga e angelim pedra.

4. combinação de materiais (ônix) 1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. subversão da função/ e ou forma (adorno de cabelo) 3. combinação de materiais

266

Sergio Povoa Pires / PR

Weyseller Nunes e Maíra Paiva / MG e MG

Renata Bessa / MG

“Paraná” – Era uma vez um Brasil. Nele desponta o Paraná cercado de gigantes pinheiros: as Araucárias. Árvores desenhadas por arquitetos, como diria um amigo alemão. Símbolo do Estado do Paraná, tem como órgão reprodutor feminino a Pinha, recheada de sementes: os pinhões. As minhas “Raízes e Formas do Brasil” foram encontradas nesses pinhões. O Colar Paraná, colares múltiplos com pinhões, é uma homenagem a esta semente que ajudou a semear o Paraná, terra de todas as gentes. Neste colar, os pinhões são alvo de uma releitura. Estilizados, pendurados, são parte central desta nova proposta de colar. Trata-se uma joia, composta por três colares separados, com vários pinhões, de 3 tamanhos diferentes, pendurado nestes colares por correntes. A proposta desta joia e ser usada de várias formas. No pescoço, na cintura, diagonalmente no corpo. Ela pousa leve, atrevida e envolvente sobre o corpo de quem a usa. “Axis” – A peça, a espinha dorsal, está relacionada a notocorda e a origem dos vertebrados. É a estrutura que sustenta o corpo e o mantém ereto. Aqui é uma analogia à formação do povo brasileiro, seus valores fortes e suas origens miscigenadas. A joia Axis foi inspirada na rica simbologia da origem e estrutura do Brasil, entretanto, sob o olhar tecnológico do design limpo e audacioso. “Raízes e Formas Brasileiras” – O cachecol “Raízes e Formas Brasileiras” é inspirado no artesanato nordestino e na arte plumária do indígena brasileiro. É confeccionado em renda Renascença e bordado com lâminas de ouro. Suas franjas são de sementes de morototó, árvore nativa brasileira, com penas vermelhas e amarelas, fazendo alusão aos rituais indígenas e às plumas da ave Araracanga.

1. inspiração na natureza (biônica) 2. subversão da função/ e ou forma 3. criação de sensações

1. inspiração na natureza (biônica)

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. subversão da função/ e ou forma (xale) 3. combinação de materiais 4. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

267

Daniela Luna / RJ

Raquel Távora / MG

Talita Cardoso Borges / SC

“Tornozeleira Indígena” – Cada vez mais envolvida e fascinada por joias resolveu participar desse concurso divulgado na faculdade, com o apoio de seus orientadores. Desenvolveu a tornozeleira, inspirada na cultura indígena, que representa a nossa verdadeira raiz, resgatando o símbolo mais utilizado por aqueles povos: “a pena”. Avaliando a borracha, o ouro amarelo e as pedras preciosas brasileiras, esse adorno transformou-se em uma verdadeira joia. “Caravelas” – Inspirada na viagem do descobrimento, esta peça traz como argumento a romântica versão de que teriam as caravelas de nossos colonizadores se desviado do caminho às Índias, em busca de especiarias. Com a mudança dos ventos, durante a calmaria no Caba das Tormentas, vieram parar em costas brasileiras, onde encontraram riquezas naturais abundantes, raras e sedutoras como o ouro. Esta joia perfumada, representada pela canela, especiaria de aroma e sabor tão peculiar; traz também a legitimidade das cores, dos sabores e dos perfumes do povo e da culinária brasileira, resultado dessa incrível miscigenação de povos e culturas, com raízes naquela histórica viagem. Mistura descrita por Jorge Amado entre tantos outros, como retrato de brasilidade. A joia dupla face traduz a mudança dos ventos, a descoberta do ouro, o aroma das especiarias e a versatilidade dos brasileiros. “Miscigenação” – Miscigenação de um povo, de raças, de cores, o início de uma civilização. O adorno retrata a união dos corpos, homem branco e índia e homem branco e negra, num momento de ato sublime entre eles, trazido com maior leveza do que relatos encontrados em obras como a de Freyre (2000), no qual o ato sexual muitas vezes não era voluntário. A leveza nos traços se dá de forma a expressar a beleza do povo, resultado de uma raiz tão singular como a do início da colonização do Brasil. Sendo assim, os objetos de destaque estão no corpo masculino representando o homem branco, o corpo feminino representando a mulher índia/negra

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. subversão da função/ e ou forma 3. combinação de materiais

1. inspiração na natureza (biônica) 2. criação de sensações

1. subversão da função/ e ou forma (adorno de corpo)

268

Vanessa Robert / RJ

e, posteriormente, outras raças, além das matas onde atos de intimidade selvagem e primitivo aconteciam e patrimônio de orgulho dessa nação miscigenada, a nação brasileira. “Aracê” – O Colar Aracê está diretamente associado à ideia de raízes brasileiras, nas quais estão as culturas indígena e africana. São povos que fazem parte da história do Brasil, um sendo originário da própria terra, outro, importado da África. Povos que apesar de oprimidos, marcaram a nossa cultura de forma incontestável. Baseado neste sincretismo, que segundo o Aurélio é a “... Fusão de elementos culturais diferentes, ou até, antagônicos, em um só elemento continuando perceptíveis alguns sinais originários”, surgiu o colar “Aracê”, em tupi significando “aurora, ao nascer do dia, o canto dos pássaros”. Dessa maneira, chegou a uma forma que remete a objetos dessas culturas e evidencia a influência dos costumes desses povos em nossa terra.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

269

AUDITIONS BRASIL 2006 Tema: CALOR GLACIAL 24 peças Inspiração O AngloGold Ashanti AuDITIONS 2006 propôs a criação de joias que refletissem atitude da modernidade e sua inerente diversidade. Emoção e razão, frio e quente, ousadia e recato, excitação e paz, suavidade e agressividade, flexibilidade e rigidez. peça

Designer/ UF Carlos Godoy e Gui Marin Kessedjian / SP e SP

Adna Salles / MG

Adriana Silveira / SP

Camila Rossi / SP

Descrição do catálogo “Guerreira Real” – Peça feita em ouro 18 K, com detalhes de mokume-gane de ouro 18K com Shakudo (liga japonesa de 93% cobre e 7% de ouro). A peça Guerreira Real é uma metáfora dos múltiplos papéis que a mulher exerce na sociedade moderna. O adorno para a cabeça quando fechado tem forma de um elmo medieval e, com um simples movimento, abre-se, evidenciando uma tiara típica de princesa. “Rosa dos Ventos” – O colar “Rosa dos Ventos” foi elaborado com 370 gramas de ouro; suas articulações alternam a milenar técnica da filigrana e correntes de ouro, representando o ciclo de transformações da natureza, em que os opostos se alternam entre o rígido e flexível, sólido e líquido, calor e frio. “Explosão” – Chapas e fios redondos trabalhados artesanalmente e que, unidos pela seda, expressam o âmago do ser humano e suas reações quando exposto à diversidade da modernidade. O ouro branco, a frieza do mundo tecnológico compõe essa Explosão do homem e da mulher modernos.

Abordagens 1.subversão da função/ e ou forma

“Colar Calor Glacial” – O Colar Calor Glacial é composto por cubos de ouro branco e correntes de ouro amarelo e foi inspirado no choque provocado pelo encontro dos opostos. É o sólido se transformando no fluido, o branco gelado passando para o amarelo quente. O estático contra o movimento; a razão contra a emoção.

1. criação de sensações

2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. releitura do passado ou de culturas exógenas 1. criação de sensações 2. subversão da função/ e ou forma (colar de costas)

1. combinação de materiais

270

Carolina Monteiro e Cynthia Maffra / MG e MG

Christiane Pacheco de Angelo / SP

Clara Amorim / PA

Claudia Lamassa / MG

Eliânia Rosetti / SP

“Sensações” – O bracelete em ouro branco e amarelo com vazados, possui de um lado uma gota; de outro o leque. O leque é produzido de ouro amarelo, rosa, vermelho e branco. As palhetas são unidas com fio de nylon, para abrir e fechar. A natureza está sempre em equilíbrio. Nos tons de ouro, o calor e o glacial foram explorados para despertar estas sensações. “Mulher” – A inspiração para a criação da peça veio do contraste proposto pelo tema, refletido para o cotidiano da mulher. Essência, feminilidade, elegância e fragilidade representadas pela parte frontal, a gargantilha. Atitude, desejo, ambições e sonhos nas costas, representadas pela asa.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas

“Fogo sob Gelo” – Fogo sob Gelo representa o ser mutante e antagônico que existe em todos nós (por isso a joia assume diversas formas); hora somos frios e racionais como o gelo de linhas retas e cores frias, que escondem por trás de um olhar mais atento, um sol de calor e emoção expressado em formas sinuosas e cores quentes. “A Dama das Geleiras” - Colar de ouro branco e pontas lapidadas de cristal (gelo) e ouro amarelo (chamas). Inspirado no conto infantil “A Dama das Geleiras”, de Hans Christian Andersen. Fala desta deusa, que seduz os homens (calor) e depois os mata com um beijo congelante (glacial). Faz uma analogia dos múltiplos papéis assumidos pelo ser humano. “Ouro aos seus pés”” – Par de sandálias de couro, ouro velho e placas de metal de ouro 18 K. Esta peça surgiu da observação do emaranhado tecnológico e, que vivemos. As placas desordenadas na joia são fragmentos do nosso dia-adia que se unem em um único universo. O calor da paixão é representado pelo poder do ouro aos nossos pés. O poder do conhecimento somente é superado pela paixão da imaginação.

1.subversão da função/ e ou forma

2. criação de sensações

1. inspiração na natureza (biônica) 2. subversão da função/ e ou forma (tamanho)

2. inspiração na natureza (biônica)

1. combinação de materiais 2. subversão da função/ e ou forma (colar gola)

1. subversão da função/ e ou forma 2. combinação de materiais

271

Fátima Cavalieri / MG

Fernanda Barcellos / MG

Fernando H. Sá Motta / MG

Flávia Vaz / SP

Juliana Pellegrini / SP

“Vestido Sensual” – Ousado e insinuante, o “Vestido Sensual” foi inspirado no perfil do homem e da mulher contemporâneos, neste mundo que está cada vez mais sensual. Formas e curvas abstratas em ouro amarelo polido representam o despertar da imaginação A razão fica para trás, a mente delira e se descontrola. O poder de um tão nobre metal vai sendo derretido: é o Calor da Paixão. “Caso de Amor” – Top em crinol sobre estrutura de ouro com aplicações em pastilhas foscas de ouro branco e amarelo e hastes em ouro branco polido com acabamento em quartzo leitoso. Inspirada no universo humano em que o movimento orgânico, feminino, se deixa envolver pelo calor protetor, masculino, do ouro. “Kilimanjaro” – Inspirada nos contrastes entre o calor e os mistérios do continente africano e do topo do monte Kilimanjaro, um vulcão coberto de gelo; o frio do metal e o calor, mistérios e sensualidade da mulher. Como um manto de neve repousando sobre o topo e encostas de uma montanha, essa joia recobre os ombros e os contornos sem esconder a beleza e conservando o calor interno. Utiliza ouro 18K (750) trabalhado no processo de fundição dos “cristais de gelo” e fios de ouro trefilados para os bordados. “Colar Estrela Glacial” – Buscou no Origami formas modernas e, ao mesmo tempo, simples, que se encaixam perfeitamente e se identificam de alguma maneira com a dualidade do tema Calor Glacial, expressando o perfil do homem e da mulher contemporâneos.

1. subversão da função/ e ou forma

“Gelo Ardente – A peça foi inspirada a partir do contraste de relações e emoções. Visualmente, o contraste está presente nas cores e no volume. O colar parte da forma geométrica e rígida dos aros foscos de ouro vermelho e amarelo para a flexibilidade e o conforto das correntes polidas de ouro amarelo e branco.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas (argolas no pescoço)

1. combinação de materiais 2. subversão da função/ e ou forma

1. subversão da função/ e ou forma 2. inspiração na natureza (biônica) 3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (técnica de rede)

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2. inspiração na natureza (biônica) (cristais de gelo)

2. criação de sensações

272

Heloisa Azevedo / MG

Kika Alvarenga e Guilherme Canabrava / MG e MG

Lorena Gomes Ribeiro / MG

Malena Comesana / RJ

“Maria Antonieta” – Peça confeccionada à mão e é composta por fios rígidos e flores com núcleo em quartzo fume. A peça, inspirada nas armaduras medievais, mistura a razão dos guerreiros com a emoção feminina. Dessa mistura surge uma peça com efeito luxuoso e sensual.

“Ethos” – O tema Calor Glacial traz, de forma intrínseca, a discussão sobre a vida contemporânea e o homem moderno. Esse tema possibilitou lidar com conceitos e formas dicotômicas tanto nas questões estéticas quanto nas técnicas. “Ethos” é um trabalho com caráter acentuado de experimentação criativa e por isso traz uma carga inovadora extremamente forte e uma nova linguagem para a joalheria contemporânea. “Psique” – Inspirada na metamorfose de Psique – do grego, “borboleta” o bracelete remete a esse processo de transformação do ser, destacando as fases casulo e borboleta. Enquanto o casulo (elipses foscas e polidas) traduz o recato, a rigidez e a frieza, a borboleta (filetes da asa) remete à leveza, a liberdade, a beleza e a delicadeza próprias da espécie. O quartzo rutilado compõe a peça como ponto de transição entre as fases descritas. “As Cajazeiras de Ouro” – Módulos iguais pétalas, que quando unidas dão formas únicas aos dois colares e ao bracelete. A Cajazeira, árvore frutífera brasileira produz uma casca renovável. O ouro com a nobreza que lhe é própria, abraça essa madeira, que envolta em brilho, transcende seu valor. Unidos representam a síntese da força do universo, da renovação e preservação.

1. releitura do passado ou de culturas exógenas 2. criação de sensações (pingente costas) 3. combinação de materiais 4. inspiração na natureza (biônica) 1. subversão da função/ e ou forma (joia de cabelo) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

1. subversão da função/ e ou forma 2. inspiração na natureza (biônica) 3. combinação de materiais

1. combinação de materiais 2. inspiração na natureza (biônica) (pétalas de flores tropicais)

273

Renata Bessa / MG

Terezinha Géo Rodrigues / MG

Dulce Goettems / RJ

Aline Miranda / MG

Letícia Landgraf / SP

“A Teia da Vida” – O top “A Teia da Vida” é inspirado no livro homônimo do físico austríaco Fritjof Capra e representa, a partir de um paradigma alicerçado pela ciência moderna, a dinâmica emocional do indivíduo em seu perfeito entrosamento nos processos cíclicos da natureza. Ele é confeccionado em ouro branco e tecido ecológico. “Vulcano” – Filho de Zeus e de Hera, correspondente na mitologia grega a Hefestos. Peça de ouro utilizando degrade de ródio negro ao rádio ultra white. Escultura em cristal preenchida por óleo vegetal trifásico.

“Cachecol Glacial” – A inspiração surgiu de uma peça do vestuário usada para nos aquecer – o cachecol. Daí veio a sua forma, a maleabilidade e a versatilidade nas maneiras de vestir. Em sua confecção, foram utilizados elementos que lembram o clima glacial, como cilindros de ouro branco fosco e pedras água marinha. “Anel Cosmopolita” – A peça brinda s cidades e seus aglomerados urbanos, seus múltiplos caminhos que transpassam, mas não se tocam. A individualidade é representada por uma peça central de características particulares que se funde e escoa pelos caminhos urbanos em seres formatados para o mundo que os torna mais um em meio a tantos personagens. “Bracelete Worldtec” – Inspirado no paradoxo entre a racionalidade do tecnológico e a motivação do natural. A tecnologia e a interface homem x máquina conceituam a frieza e a racionalidade do glacial (parte interna, de ouro rosa polido). O globo terrestre, as formas orgânicas, a interatividade, a agilidade de informações inspiraram o desenho externo, de ouro amarelo escovado, remetendo ao calor emocional.

1. combinação de materiais 2. criação de sensações (correntes) 3. subversão da função/ e ou forma 1. inspiração na natureza (biônica) (formas orgânicas) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. combinação de materiais 1. subversão da função/ e ou forma 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. criação de sensações 1. combinação de materiais (ametista)

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (modelagem 3D)

274

Marina Assreuy / MG

“Bolero Dual” – Bolero de tricô em fio de ouro, com placas de ouro aplicadas em uma das mangas e na outra, recortes com o mesmo desenho, representando a dualidade entre o racional e o emocional. Os pingentes nas costas remetem a um eclipse cuja relação cheio/vazio muda constantemente, de acordo com o movimento de quem o utiliza.

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 3. criação de sensações

275

AUDITIONS BRASIL 2008 Tema: HYPER NATUR – NATUREZA FANTÁSTICA 22 peças (sem as 2 peças de joalheria masculina) Inspiração O Auditions Brasil 2008 propôs uma reflexão sobre a natureza e suas infinitas possibilidades e interpretação – Hyper Nature | Natureza Fantástica é o tema com base no qual os participantes expressaram, por meio de joias conceituais, suas múltiplas visões sobre a natureza. O que é Hyper Natur? É o real sem o compromisso literal e figurativo. Transpões interpretações tradicionais da natureza. Liberta a imaginação e, por sua vez, possibilita a liberdade de formas, efeitos, texturas e cores. Há algo de Mistério entre o céu e a terra. | Algo que brilha, que vive. | Água, terra, fogo, ar. Elementar. | Uma natureza fantástica que surpreende, | respira, transpira, inspira. | De seres humanos, de vida animal, | de mágica vegetal. ! Descompasso mineral. | A folha envolve o corpo, | a água até o pescoço, planeta, mar. | Mundo fractal, onde nos encontramos. | Cenário de arte e ouro. | É preciso ver. Tocar. | Palavras não seriam bastante. peça

Designer/ UF Junea Fontenelle e Guilherme Canabrava / MG

Descrição do catálogo “Poli” - Conjunto complexo e único de estruturas simples dispostas em uma trama, formado por cones de formatos irregulares, em combinação inovadora, num padrão complexo que movimenta-se diante da luz criando sombras de ouro.

Abordagens 1. criação de sensações

Angela Geo e Maria Teresa da Conceição / MG

“Explosão Vulcânica” – Homem (sangue) x molusco x vulcão: “gladiando” de forma imaginária a preservação de si próprio.

1. previsão do futuro (formas de astros e estrelas)

Carla Abras / MG

“Essência” - Água fonte de vida. Purificação, movimento. Base de teoria na perpetua evolução dos seres.

1. combinação de materiais (semente)

2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (montagem)

2.subversão da função/ e ou forma (bolsa) 3. criação de sensações

276

Ida Benz / RJ

“Borbulhas” - Borbulhas douradas de champagne: o côncavo e o convexo criando texturas e movimentos visuais.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Janaina Monteiro / MG

“Colar Saturno” – Os anéis de Saturno, com as cores do ouro unindo beleza e tecnologia.

Imara Angélica Macedo Duarte Sales / PB

“Festival” – O “festival” d natureza se apresenta claramente no rico fruto do qual se extrai o óleo de dendê.

3. criação de sensações 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

1. combinação de materiais (resina colorida) 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Dulce Goettms / RJ

Daniel Alvim / MG

“Desabrochar do Globo”. – Interesse do homem pela natureza e o seu desejo de mudança para uma vida melhor, mais vibrante, imbuída de um poderoso sentido de responsabilidade ambiental.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

“Bracelete Fractal Evolution” – Natureza e tecnologia como geometria fractal

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

2. inspiração na natureza (biônica) (flor)

277

Cynthia Maffra e margarida Recorder / MG e MG

“Fragmentos” – A serpente comparada com uma linha, que não tem começo nem fim, ao movimentar-se torna suscetível a todas as representações.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. criação de sensações 3. combinação de materiais (couro)

Thais Vilela e André Faria / MG e SP

“Lightness” – O colorido e efêmero mundo das borboletas.

4. inspiração na natureza (biônica) 1. releitura do passado ou de culturas exógenas (tiara) 2. inspiração na natureza (biônica)

Raquel Neves / MG

“Casulos” – o mundo fantástico da natureza, a força solitária do nascer da borboleta.

3. criação de sensações (movimento) 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Vanessa Broglio / SP

“Skin” – Cobra: perigo mortal e fascínio. Formas de beleza única construídas pela beleza de suas escamas, cores e desenhos.

3. inspiração na natureza (biônica) 1. combinação de materiais (couro) 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. inspiração na natureza (biônica)

Ana Paula Valladares Feijó / RJ

“Buquê de borboletas” – Casais como dobradiças... pares. Duas metades imaginárias: asas.

1. inspiração na natureza (biônica) 2. subversão da função/ e ou forma

278

Dulce Goettms / RJ

“Chapéu de borboletas douradas” – Acasalamento das borboletas e chapéus da alta costura.

1. combinação de materiais (acetato) 2.subversão da função/ e ou forma (chapéu) 3. inspiração na natureza (biônica)

Eliânia Rosetti / SP

“Sensi” – Padrões infinitos de repetição abstrata, formados por fractais e que abrem a possibilidade de enxergarmos não apenas com os olhos, mas com todos os sentidos – SENSI.

1.subversão da função/ e ou forma (xale) 2. criação de sensações 3. combinação de materiais (tecido)

Tetê Valdataro / SP

“Movimento Circular” – no micro o macro: energia primordial em esferas translúcidas de ouro.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Ana Cecília Artiaga e Manuela Heffner / MG

“Asas de Ícaro” – exposição, através da biônica, do encanto do homem pela liberdade de voar.

3. criação de sensações 1.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. criação de sensações (fios ligados aos pulsos)

Carla Abras / MG

“Sintonia” – Vegetação é o oxigênio da água do rio; consciência ecológica de despoluição pela reciclagem.

1.reaproveitamento de materiais 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. inspiração na natureza (biônica) 4. combinação de materiais (pet)

279

Lena Garrido e Débora Camisasca / MG

“Natureza Exuberante” – o desejo de equilíbrio e harmonia, paz e possibilidades infinitas.

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. criação de sensações (comprimento)

Thayana Cordeiro de Menezes / MG

“Purity” – Água- símbolo máximo de purificação, imaginário vital.

3. inspiração na natureza (biônica) 1. inspiração na natureza (biônica) 2. subversão da função/ e ou forma

Lorena Gomes Ribeiro / MG

“Iara” – A lenda da Iara remete à beleza e à sensualidade, através da representação da cauda com sobreposição de Lâminas de ouro e escamas de peixe.

Roxana Galli / RJ

“Cristal de Primeira Água” – Águaviva, com suas formas misteriosas, arredondadas, transparências iridescentes e filamentos fluidos, vagando pelas ondas do mar. Como Cristal de primeira água, é a excelência em ouro e gemas que fascina o olhar e encanta a mulher que a veste.

3. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 1. combinação de materiais

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. criação de sensações 4. inspiração na natureza (biônica)

280

AUDITIONS BRASIL 2010 Tema: SINCRONICIDADE 24 peças Inspiração Quem somos, de onde viemos e para onde vamos? Uma das mais importantes tendências da sociedade moderna está pautada na busca de novas crenças e valores, no plantar de sementes para colher um novo futuro e vislumbrar sida, uma tarefa de todos. Sincronicidade apresenta-se como o conjunto de ações que acontecem no mundo, ao mesmo tempo, a favor do humano e da busca por valores. Todas as ações convergem para a valorização e preservação do humano. Percebe-se mais nitidamente que para existir, devemos coexistir e dividir o mundo com o outro. Compartilhar, trocar, aproximar, reduzir distâncias e diferenças. A Humanidade está à procura de estabelecer alianças dentro da sua vasta diversidade, combinando valores individuais e coletivos; culturas minoritárias e de massa; virtual e o real, meio ambiente e interesse econômico, diferenças sociais e culturais. Conectividade sem fronteiras, barreiras ou dogmas. Sustentar a si, ser parte do todo, entender que o problema ou a solução é uma questão global. Um movimento de crescente interesse pela condução de melhores práticas ambientais e sociais, valorização do humano e dignidade então se apresenta como uma crença no futuro, apoiada em novas atitudes. A Casa e de todos e todas são a casa. Conviver e aprender com as diferenças e diversidades é uma fonte inesgotável de ideias... peça

Designer/ UF Sergio Povoa Pires / PR

Carla Abras / MG

Descrição do catálogo “Big Bang” – O Big Bang formou um universo de partículas sincrônicas, uma teia de relações interligadas. A imagem conhecida do Big Bang (cone cósmico), no qual por mais de 13 bilhões de anos, os planetas, estrelas e galáxias foram formadas, serviu de fonte de inspiração desta joia.

Abordagens 1. previsão do futuro

“Bandô” – O que faz a sua cabeça? Preservação do meio ambiente, melhoria das condições de vida, integração cultural, igualdade social, o que levará a um futuro sustentável? A peça representa a busca pela harmonia universal através do conceito de união da diversidade.

1. combinação de materiais (acrílico preto)

2.subversão da função/ e ou forma (capacete)

2.subversão da função/ e ou forma (enfeite de cabeça) 3. releitura do passado ou de culturas exógenas 4. criação de sensações (movimento)

281

Lis Haddad e Raquel Rocha / MG e MG

“Elos” – Elos Unidos sobre uma cadeia de DNA, Um marcador temporal, relógio do grande tempo da raça humana e espécies. Elos que podem deslocar-se, competir, mas do que nunca desgarram-se da vida. Uma narrativa sobre um fato e um sonho, que deriva também de narrativas imemoriais.

1. previsão do futuro

Heloisa Azevedo e Leandro Portela / MG e MG

“Mística” – Sincronia da vida com o misticismo, a união do homem à natureza e à Deus, na qual o ser busca uma relação direta e intima com a espiritualidade. O místico é aquele que aspira uma sincronia pessoal com absoluto.

1. criação de sensações (maleabilidade)

Carlos Godoy / SP

“Pluri” – A busca por um produto esteticamente impactante, novo, diferenciado e ambientalmente e socialmente responsável, baseado no resgate de técnicas ancestrais, no uso de materiais atuais recicláveis. Cores, formas, ritmo, texturas, padronagens e transparências.

Ana Julia Vinhal Gonçalves / RJ

“Ritmo do Caos” – Espelho da gritante desigualdade social, a paisagem das favelas tem um ritmo visual único onde formas, cores, volumes, diferenças e movimentos se configuram como um jogo de cubos em uma estampa orgânica do caos.

Thayane de Carvalho da Silva / SP

“Cardume” – Inspiração nos grandes cardumes que habitam os mares e oceanos, grupos de peixes que demonstram sincronicidade através da harmonia dos movimentos organizados. A peça representa os cardumes e reflete o movimento do ambiente.

2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. releitura do passado ou de culturas exógenas (mantilha) 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. combinação de materiais 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (modelagem 3D e prototipagem rápida)

1. criação de sensações 2. inspiração na natureza (biônica)

282

Carla Abras / MG

“Mundi” – “milhões de pessoas, Milhões de valores”. A forma circular representa o Mundo, Sol, Terra e Mandala, o equilíbrio da vida; a mistura das cores é a mistura dos povos; as texturas retratam as etnias, e as chamas de ouro são o fogo, simbolizando a inteligência suprema do homem.

1. inspiração na natureza (biônica)

Carlos Godoy / SP

“Enigma” – A busca por um produto esteticamente impactante, novo, diferenciado e ambientalmente e socialmente responsável, baseado no resgate de técnicas ancestrais, no uso de materiais atuais recicláveis. Cores, formas, ritmo, texturas, padronagens e transparências.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. combinação de materiais

Flávia Marietta Rigoni / MG

“Anthea” – As transformações continuas do reino vegetal, sua decadência e renascimento, revelam a força dinâmica da vida orgânica, traduzida em formas assimétricas, linhas sinuosas recortes e volumes.

Rodrigo Robseon e Renta Bessa / MG e MG

“Imagem e Semelhança” – Principio da fé cristã, seus símbolos e conceitos. Novos volumes, nova forma de ver e pensar sobre joias. Vidro, ouro e cores em harmonia sensual e velada, para falar sobre a fé.

4.reaproveitamento de materiais 1. inspiração na natureza (biônica)

1. previsão do futuro 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. combinação de materiais

Milielton Brito Cardoso / SC

“Universalismo” – Universalismo, a realidade como um todo único.

1. previsão do futuro 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

283

Felipe Guerra Assumpção / PA

Victor Falcão / PB

“Big Bang” – Revés do Big Bang, união da cultura do mundo em um ponto e tempo. Imagine a grande explosão, como se as criações do Homem viajassem para um centro vazio. Imagine esse vazio, cheio de diversidade e SINCORNICIDADE. A joia apresenta a imagem dessa explosão “Hi Tech” – Formas modernas, circuitos de uma placa de computador. Cada época é responsável pela captura de uma significância. A preocupação com o meio ambiente está presente na peça. A combinação “lixo e luxo” arraiga valor aquilo que outrora demoraria anos para se decompor.

1. criação de sensações (luz) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (leds) 3. combinação de materiais (leds) 1. previsão do futuro 2. combinação de materiais (resina)

Ricardo Semeles / RJ

“Gênesis” – Como nada é por acaso, “conseguir que as gerações futuras sejam mais felizes que a nossa, será o prêmio mais grandioso a que se possa aspirar”. Raumsol

1. previsão do futuro

Júnea Fontenelle e Suka Braga / MG e MG

“Etérea” – A mente é suprema. O ser intangível. O universo, metáfora de Adão, nossa roupa biológica. Mistério de fios filigranados estruturando a costela humana.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

“Círculo Mágico” – Mandala tridimensional que se transforma em diversos símbolos, impregnados de significados e representações, encontradas na raiz de todas as culturas e presente em todo ser humano, é símbolo de centro, da meta e do si mesmo (Self).

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

“Sincronia Digital” – Atitudes sincronizadas das pessoas pela conectividade. Os seus imãs que se conectam de várias formas, com cristais rutilados e os desenhos de impressões digitas foram enaltecidos pela beleza impar do ouro para demonstrar a atual forma de sincronicidade: a sincronicidade digital.

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Juliana Pellegrini / SP

Emi Kyouho e Ligia Muzzi Henriques / MG e MG

2. releitura do passado ou de culturas exógenas (peitoral de armadura)

2. criação de sensações (ludicidade)

2. combinação de materiais

284

Iolene Lima / RJ

“DNA et MOI” – O que somos hoje depende dos fatores que nos formam. Tanto os que não podemos mudar como o DNA da pessoa, como os fatores culturais que aceitamos ou não na construção do nosso personagem.

1. previsão do futuro

Janaina Monteiro e Laura Barreto / MG e MG

“Colar Nós” – “Nós”: eu mais o outro, elos, compromissos. É o “sou” espelhado, coroado por um acento. A tipografia remete ao cuidado do gesto e a referência cultural representada por meio das diferentes línguas. Vivemos tentando nos completar na incompletude do outro. Somos “nós”. “Prece” – composta por dois anéis, que com a união das mãos em posição de oração formam duas asas, como as de um anjo, e delas feixes de energias emanam, simbolizando o poder de transformação da fé na Humanidade.

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (corte a laser)

“Trama” – Somos miscigenados como uma colcha de retalhos cujos fios são entrelaçados e desuniformes, como os pedaços unidos e sincronizados, ajudando o outro a suportar, se completando, compartilhando, respeitando diferenças, formando um todo harmonioso.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Carolina Monteiro Gonçalves e Paula Gonçalves Reis / MG e MG

“Ausência” – Solo morto, os restos da destruição. A degradação do meio ambiente em função dos interesses globais. As queimadas da Amazônia na qual a natureza padece... Ausência de uma área exuberante, objetivos comuns e amor próprio!

1. previsão do futuro

Dulce Helene Goettms / RJ

“Conexões de Ouro” – Ao redor de uma esfera transparente, peças de ouro se conectam e movimentam-se através da atração magnética em analogia a tendência da sociedade moderna que conduz a união de todos aos povos a favor do humano e da busca por valores.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho)

Lídia Mama Pereira Abrahim / PA

Luiz Eduardo Carvalho / RJ

2. criação de sensações (maleabilidade) 1.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. releitura do passado ou de culturas exógenas (exotismo oriental)

2. criação de sensações (ludicidade)

2. inspiração na natureza (biônica)

2. combinação de materiais

285

AUDITIONS BRASIL 2012 Tema: BRASILIDADE 18 peças Inspiração Eis a travessia: nesse momento, mais do que nunca, sei o que sou. Encontreime em Pindorama, na Terra de Vera ou de Santa Cruz. Estados Unidos daqui. Império ou república, mas sempre Brasil. Aqui, somos assim: uma bela mistura. Alquimia que transforma nossa cultura na mais preciosa joia. Yes, temos bananas e balangandãs. Nossa identidade tupiniquim está na pele e é reconhecida de longe. Sim, descobrimos a felicidade muito antes dos outros. O carnaval, agora é nosso. A festa sempre foi mesmo nas senzalas. Em março, as águas fecham o verão. Mas nada que nos faça parar. Juntos, vamos pra frente. A vida continua. O progresso chegou. Nas ruas das cidades, entusiasmo. Explode a revolução cultural. O Brasil é tendência. Arranha-céus aparecem de norte a sul e o que todos veem, brasileiros ou não, é oportunidade. Construções lembram curavas sinuosas de rios, nuvens do céu e belas mulheres. Algumas formas surpreendem pela leveza e pela liberdade de criação. A arquitetura e o urbanismo são moda em tanto crescimento. Nossa natureza tem nova companhia. Mesmo assim a riqueza brota. Quase sempre visível aos olhos. Outras vezes, escondida e nem por isso menos bela. Nosso ouro é diferente. Não se acha apenas em jazidas e em formas de pepitas. No Brasil, o brilho vem também das pessoas. peça

Designer/ UF Carla Abras / MG

Eliânia Rosetti / SP

Descrição do catálogo “A Rara” – Inspirado nas obras do artista brasileiro Vik Muniz, criou-se o acessório “A Rara”, o colar-bolsa em forma estilizada de Arara, cujas penas de ouro possuem fotogravações de toda a pluralidade do Brasil origem, fazendo conexão com as fotos digitais do “olho” de LCD, propondo uma “visão” atual e contemporânea do país.

“Carnival” – O carnaval é a maior festa popular do mundo. Suas cores e ritmo hipnotizam e seduzem. As cores e texturas de suas alegorias buscam em nossa cultura indígena um significado atual. A explosão apoteótica da alegria, o colorido das nossas tribos indígenas e os sons da bateria foram inspiração para esta joia. O ritmo de uma escola de samba desfilando pode ser considerado como uma imensa ópera tropical, mostrando a grandiosa aventura humana. O samba harmonioso fala da arritmia natural da vida unindo diferenças.

Abordagens 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas 2.subversão da função/ e ou forma 3. inspiração na natureza (biônica) 4. combinação de materiais 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (corte a laser) 2. inspiração na natureza (biônica) (folhas) 3. criação de sensações (tilintar dos elementos)

286

Lena Garrido / MG

Victor Falcão / PB

Ida Benz / RJ

Renata Bessa / MG

“Chica Chica Boom” – Carmem Miranda, “a pequena notável”, é a representação máxima da brasilidade: cores, brilhos, frutas, gingado, samba, badulaques e carnaval. Ela é influencia e tendência sempre. A famosa coreografia feita com os braços inspirou a criação das pulseiras “Chica Chica Boom”. “Jazida” – O Brasil se mostra grandioso pela sua parte interior. A terra generosa nos dá sua identidade de forma singular com a ocorrência de pedras únicas como Topázio Imperial e Turmalina Paraíba. A fim de coroar esses recursos naturais e a unicidade das riquezas minerais, o colar Jazida representa uma formação mineral Cada uma de suas irregularidades faz menção à raridade dos seus minérios. Suas formas únicas, mais que perfeitas, dão autenticidade, um presente da natureza. “Casa Grande & Senzala”” – Por meio da releitura de formas icônicas da joalheria portuguesa e africana, o brinco Casa Grande & Senzala simboliza a multiculturalidade do povo brasileiro, enaltecida por essa importante e polêmica obra literária escrita por Gilberto Freire, que acabou criando uma nova autoimagem do brasileiro e do Brasil como um paraíso tropical e mestiço, no qual raças e culturas se mesclam.

“Yawara” – Yawara, em tupiguarani, significa onça-pintada. Encontrada na região do Pantanal e ameaçada de extinção, é acara do Brasil e traduz o valor da diversidade de nossa fauna e está impressa na moeda do país. Representada pelo ouro amarelo e cascas recicladas de coco, matéria-prima popular e abundante no Brasil, Yawara realça o poder da sedução da mulher brasileira: misteriosa e sensual.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. criação de sensações (som) 3. combinação de materiais (fitas e contas) 1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (modelagem 3D e prototipagem rápida) 2. inspiração na natureza (biônica)

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (modelagem 3D e prototipagem rápida) 2.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 3. releitura do passado ou de culturas exógenas 4. criação de sensações (estranhamento pedra de metal) 1. subversão da função/ e ou forma (maiô) 2. inspiração na natureza (biônica) 3. combinação de materiais

287

Camila Schmitt / RJ

Celine Geara / PR

Cris Dinardi e Mara Guerra / MG e MG

Douglas Soares / MG

“Cana do Brasil” – A peça Cana do Brasil foi inspirada nas características marcantes da canade-açucar, que traduz o Brasil em sua variedade, texturas e cores que exibem a beleza da natureza do país, no potencial que demonstra a força do povo brasileiro, na grandeza cultural e histórica que carrega, no exemplo de sustentabilidade e, por fim, na brasilidade que exala. “Olhos da Floresta” – Considerando o sentimento de valorização das riquezas naturais do país como brasilidade, o tema escolhido foi a preservação da Floresta Atlântica, por meio de seus próprios recursos. Como inspiração, as mancas desenhadas nas asas da borboleta corujão, que lembram os olhos das corujas, confundindo os predadores, e as máscaras indígenas que representavam as forças da natureza em seus rituais sagrados. “Balangandã” – O nome Balangandã tem sua origem nas diversas peças em formato de contas, figas, medalhas e outros que juntas formam um conjunto que pende de colar, broches e adornos corporais diversos. Cada peça é um amuleto. Seu nome se refere ao som dos objetos dependurados quando em movimento. Nos séculos XVIII e XIX, em dias de festa, era comum negras e mulatas usarem seus balangandãs com a intenção de sorte, lembranças, pedidos e proteção. “Brasil de Montanhas” – A beleza das montanhas brasileiras e as riquezas escondidas sob o chão, em estado bruto, à espera de tomarem forma pelas mãos do homem. Através de seus tortuosos caminhos, muitos já se aventuraram a buscar o ouro que constrói sonhos, enriquece e encanta.

1. inspiração na natureza (biônica) 2. combinação de materiais (palha de buriti)

1. inspiração na natureza (biônica) 2. combinação de materiais (gemas) 3.subversão da função/ e ou forma (máscara/anel)

1.subversão da função/ e ou forma (adorno de costas) 2. criação de sensações

1. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (modelagem 3D e prototipagem rápida) 2. inspiração na natureza (biônica)

288

Anne Pacheco / MG

Henrique Slomp Ramos / RS

Lorena Batista / MG

Maíde Lança/ SP

“Jequitinhonha” – Com raízes humildes, marcadas pela seca e a profunda desigualdade social, a cerâmica do Jequitinhonha floresce por meio de mãos habilidosas, que retiram do ambiente castigado os mios de sua subsistência. Graças ao seu potencial transformador e à sua beleza característica, as cerâmicas do vale do Jequitinhonha são símbolo de fé, trabalho e criatividade – enfim, de brasilidade.

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho)

“Víscera” – Regente de lendas antigas, a serpente foi o animal semblante escolhido para das forma e representação ao Brasil nesta peça. Um animal que possui na pele tantos tons e formas, quanto possui em pele o povo brasileiro.

1.subversão da função/ e ou forma (gola)

“Águas de Março” – Com uma aliança de sofisticação harmônica e qualidade de letrista, Tom Jobim compôs “Águas de Março”, uma canção envolta de movimentos e rica em brasilidade. Esta obra serviu de inspiração para criar brincos em ouro e pedras brasileiras, que imprimem o suave movimento das águas e a leveza das gotas de orvalho, límpidas ao cair. Uma homenagem a este grande expoente da cultura brasileira. “Maria Bonita” – O cangaço é a mais conhecida expressão histórica da força do povo nordestino e da sua soberania ao enfrentar as intempéries da vida. No ambiente hostil do sertão, os trajes de época eram um oásis de cores, formas e misticismo que, além de vestir, eram uma forma de expressão. A peça Maria Bonita é a tradução desse marco histórico e retrata a riqueza e simbologia das vestimentas do Brasil Cangaço.

2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (esmalte) 3. inspiração na natureza (biônica) (flores)

1. inspiração na natureza (biônica) 3. criação de sensações (som e movimento) 4. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas (montagem de bijuteria) 1.subversão da função/ e ou forma (comprimento) 1. inspiração na natureza (biônica) 3. combinação de materiais 4. criação de sensações (movimento) 1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. combinação de materiais (couro)

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Mara Guerra e Paulo Armando / MG e MG

Selma Montenegro / PA

Taciana Scalon / MG

Maira Rebelo e Vivian Lima / SP e SP

“Yes, nós temos bananas” – Carmem Miranda e seu “Tuttti-Frutti hat” inspiraram essa joia. A artista, símbolo Máximo do tropicalismo, ícone da exuberância brasileira, é lembrada nessa peça multiuso (brioche/brincos), salpicada de gemas com as cores da bandeira do Brasil. Uma dedicatória de amor àquela que foi a estrangeira mais brasileira que o mundo já conheceu e que, até hoje, é motivo de orgulho para o país que escolheu amar. “Açaí” – A joia foi inspirada no açaí, uma fruta energética que provém das palmeiras amazônicas. No Pará, o cultivo do açaí e de grande importância em virtude de sua utilização constante por boa parte da população, principalmente os ribeirinhos (moradores tradicionais das margens dos rios). É considerado por muitos uma iguaria exótica, sendo apreciada em várias regiões do Brasil e do mundo. “Identidade” – As tramas de cestaria indígenas e típicas do nordeste foram a base de inspiração da peça, que também abrangeu as pinturas corporais indígenas.

“Encontro das Águas” – Quando as águas escuras do Rio Negro encontram as águas barrentas do Rio Solimões, realizam um dos mais belos eventos naturais. O encontro dos rios, que não se mistura, em cor, origina o Amazona, um dos rios mais conhecidos do mundo. Esse belo encontro é representado na peça pelo brilho do ouro amarelo com esferas de vidro e pelas águas escuras e barrentas que se cruzam no colo da mulher, assim como os rios cruzam a Amazônia.

1.subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. criação de sensações 3. combinação de materiais

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. inspiração na natureza (biônica) 3. combinação de materiais 4. criação de sensações (movimento) 1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. introdução de tecnologias novas ou técnicas exógenas

1. subversão da função/ e ou forma (tamanho) 2. inspiração na natureza (biônica) 3. combinação de materiais

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