Desiderando

DESIDERANDO J. A. Medeiros da Luz Minha doce Horacina põe reparo Nisso que lhe confesso por agora: Como medrosa rã nos atiramos A este charco da vida, à nossa frente, Inscientes dos riscos subaquáticos... E por aí nós vamos prosseguindo, Sendo assim cada dia uma conquista, E, assim, cada conquista mais um dia. Que ao fim, entanto, possa este batráquio Haver por galardão um bom destino. Depois de atravessar umas centenas De luas pela estrada do viver, Ter um trato de terra nos domínios Do poderoso Osíris, quando for A hora de fazer o balancete. Quando, então, na amplíssima e frígida, Silente Sala das Duas Verdades (Onde o tempo é apenas a lembrança Do que se foi) e Anúbis, deus chacal, Com criteriosíssima balança Vier a sopesar meu coração, – A pluma da verdade no outro prato – , Que o Devorador, com os seus dentes De grande crocodilo, com aquela Inclemência dos seres do silêncio, Mantenha-se o mesmo lá, jejuno, Havendo de aguardar outras futuras Vísceras que por certo lá virão. E nos reste esse honesto galardão: Um paludoso trato de terreno Onde de novo possa semear Arroz, centeio, trigo e até tâmaras; E remar meu batel para fruir A música do junco contra o vento, Roçando-lhe os dedos vegetais, No alvorecer de dias eternais. Ouro Preto, 19 de fevereiro de 2015. De: Um Óvni em Meu Jardim, a sair pela Jornada Lúcida Editora.