Attractivity of teaching career in students from popular classes of Projeto Educacional Compartilhando Saberes (PECS), of Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

May 23, 2017 | Autor: Gustavo Silva | Categoría: Sociologia da Educação, Ensino Superior
Share Embed


Descripción

ATRATIVIDADE DA CARREIRA DOCENTE EM ESTUDANTES DE CAMADAS POPULARES DO PROJETO EDUCACIONAL COMPARTILHANDO SABERES

Gustavo Santos Silva Universidade Federal do Espírito Santo

Resumo Este artigo tem como objetivo analisar a atratividade da carreira docente em estudantes de camadas populares do Projeto Educacional Compartilhando Saberes (PECS) um prévestibular comunitário da Universidade Federal do Espírito (UFES). Pesquisas atuais demonstram que a carreira docente sofre com um baixíssimo interesse dos jovens, portanto a proposta foi ouvir deles, a partir de técnica de grupos focais quais são os fatores que caracterizam essa baixa atratividade, assim como os fatores que influenciam na aposta de parte dos jovens em se aventurar na carreira docente. Neste trabalho constam as aspirações, as tensões e os conflitos que os estudantes de origem popular - vinculados à um projeto de extensão da UFES – construíram em relação a profissão docente. Também apontamos a importância da Universidade nesse contexto e suas atribuições em relação a amostra da Grande Vitória, que indicam os possíveis caminhos que a Universidade deve trilhar na coresponsabilidade da construção da carreira docente no imaginário de jovens extesionistas em situação de vulnerabilidade social. Palavras chaves: Atratividade da carreira docente; Estudantes de camadas populares; Escolha profissional; Projeção de carreira.

Introdução Durante muitos anos, a docência vem tendo uma grande atenção dos pesquisadores em educação, mais especificamente aqueles ligados a linha de pesquisa em formação de professores e carreira docente, sobretudo por conta de diversos fatores que influenciam a carreira. Dentre estes inúmeros fatores, teremos como foco a atratividade da carreira docente e todas as problemáticas imersas nesta discussão. Um dos maiores anseios dos jovens matriculados em cursos pré-vestibularestem cerne no ingresso ao ensino superior. Com a conclusão da educação básica, muitos questionam a profissão que querem, frente as diversas possibilidades de alcançar o sucesso escolar e a realização profissional, no entanto como afirma Block (2002), a construção da profissão acontece por uma vontade pessoal que é fomentada pelo contexto histórico e pelo ambiente

cultural de inserção do jovem. Fazemos uso das coesas palavras de Tartuce, Nunes e Almeida (2010): A perspectiva subjetiva inclui o modo pelo qual os indivíduos percebem as carreiras e a si próprios no contexto do trabalho, aí interferindo aspectos como identificação, autoconceito, interesses, habilidades, maturidade, valores, traços de personalidade e expectativas com relação ao futuro. Ao mesmo tempo, deve-se levar em conta que os contextos sociais em transformação interferem nas relações entre o indivíduo e o social e, dessa maneira nas identidades sociais e profissionais.

Fica claro, que os contextos sociais e culturais influenciam veementemente no esculpir da profissão. As instituições sociais têm um papel fundamental na construção de um ideal profissional no imaginário jovem. Com a carreira docente não acontece diferente. A diversidade das realidades influi na escolha e personificação da carreira. O contato que tem com os profissionais, a relação que tem com os mesmos, valorização do profissional e construção histórica da profissão converge na escolha profissional.Utilizando como objeto Estudantes de camadas populares do Projeto Educacional Compartilhando Saberes (PECS), conseguiremos observar a influência das realidades de marginalização, pobreza e demais situações de vulnerabilidade social. As dificuldades na escolha do curso, a atratividade da carreira docente, também conversam com a realidade do estudante de camada popular que socialmente representa um grupo social que, pela força de políticas recentes no Brasil, torna pouco a pouco a universidade cada vez mais um espaço com múltiplos atores, vindos de diferentes classes sócio-econômicas, etnias, credos, gêneros, etc. Destacamos nesta produção os estudantes de origem popular que, historicamente sofreram com um projeto de educação superior exclusório e perverso, não garantindo sequer sua entrada em instituições públicas de ensino superior em tempos atrás. Um recorte histórico das cotas como políticas afirmativas na área da educação. No final da década de 1970, emergem as camadas populares no cenário da política brasileira através da organização de sindicatos, entidades de base e movimentos sociais representantes de diversos grupos, juntamente com intelectuais das mais distintas academias do Brasil, a partir do enlace de ideais de justiça, fraternidade, igualdade e emancipação humana (LEITE, 2011). Neste contexto, há uma expressiva pressão dos referidos setores marginalizados pela criação, fomento e efetivação de políticas de inclusão. Atualmente, essas políticas são chamadas Políticas de Ação Afirmativa (PAA). Como afirma Santos (2012), “O uso recente da expressão ação afirmativa é resultado da influência estadunidense no debate

das ações afirmativas direcionadas para a população negra”. Haja vista que a gestação das referidas políticas sociais ocorreu tendo como objeto de comparação os Estados Unidos e o processo de segregação racial do país, assim como seu pioneirismo nas discussões em torno do tema. As políticas afirmativas no Brasil tiveram início efetivamente no século XXI. No processo de redemocratização já havia pressão dos movimentos sociais pela inclusão de grupos historicamente marginalizados. Santos (2012) contextualiza um pouco da mobilização popular na elaboração de políticas afirmativas: “...a própria expressão ação afirmativa, nos últimos anos, deve ser vista no Brasil com sentido que cada vez mais se alarga, a partir de sujeitos que estão inseridos no contexto de reivindicações de movimentos sociais. A tendência indica a perspectiva do ativismo social com discursos acadêmicos sobre o que seja a produção do conhecimento”.

No entanto iremos nos ater as cotas como importante política de ação afirmativa, tendo consciência de que as cotas são exemplos de PAA, como afirma Pinheiro (2014): “ações afirmativas são medidas para reduzir o desequilíbrio entre grupos sociais, eliminando barreiras formais e informais que restringem, ou impedem o acesso de grupos sociais de trabalho, à educação ou a posições de liderança”. Em 2003 começaram a ocorrer várias ações para efetivação das políticas de cotas nas Universidades Federais. As pioneiras na aplicação das referidas políticas foram: Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) e Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Amplamente, essas políticas tiveram que alcançar todas as instituições públicas de ensino superior pela força da lei. Em 2008 na câmara dos deputados a proposta - PL 73/99, da deputada Nice Lobão (DEM-MA) - foi aprovada na forma do substitutivo aprovado em 2005 pela Comissão de Educação e Cultura, elaborado pelo deputado Carlos Abicalil (PT-MT), o projeto seguiu para o senado federal tendo como relator o senador Paulo Paim (PT-RS), sendo aprovado e depois sancionado pela Presidente da República Dilma Rousseff (PT) no dia 29/08/2012. Na UFES, os debates tiveram início em 2005, com a formação de uma comissão especial pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE) da Universidade. A partir dessa decisão se desdobraram amplas discussões sobre a referida política e a política de cotas começou a ser aplicada em 2008. Passando por diversas resoluções substitutivas hoje, vigora a resolução 35/2012, nela a UFES decidiu pela integralidade da reserva, ou seja, 50% das

vagas destinadas a alunos de rede pública, sendo 12,5% para famílias com renda de até um salário mínimo que se declararem pretos, pardos e índios; 12,5% para famílias com até um salário mínimo e que não auto se declararam preto, pardo e índio; 12,5% para famílias com renda superior a 1,5 salário mínimo cujos alunos ingressantes se auto declararam pretos, pardos e índios e 12,5% para famílias com renda superior a 1,5 cujos alunos ingressantes não se declaram pretos, pardos ou índios (PINHEIRO, 2014). Carreira docente e estudantes de camadas populares: esses temas se conversam? Depois de refletirmos sucintamente sobre os vetores que influenciam na escolha profissional de jovens de camadas populares e pensarmos nas políticas atuais que os dignificam, somos convidados a refletir se a carreira docente conversa com estes estudantes de origem popular, retornando a proposta central do artigo. Dados de Gatti e Barreto (2009) evidenciam os atores da carreira docente a partir de uma pesquisa recomendada pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e Organização Internacional do Trabalho (OIT). Dados expressivos mostram que 39,2% dos estudantes de licenciaturas pertencem a faixa de renda mensal menor/igual a 3 salários mínimos. Também é notado uma escassa frequência de sujeitos nas faixas mais elevadas de renda 7,3%, 1,5% e 0.7% dos estudantes compõem as respectivas faixas de renda de 11 a 20 salários mínimos, 21 a 30 salários mínimos e maior que 30 salários mínimos. Estes dados endossam a tese de Pucci, Oliveira e Sguissard (1991) quando versam sobre a proletarização da carreira docente assim como a ascensão de certos estratos populacionais a carreiras mais qualificadas. Também podemos destacar que 35% dos alunos de instituições privadas recebem bolsas de estudos ou algum tipo de financiamento, integral ou parcial. Em relação a bagagem cultural o referido estudo mostra que 41,5% dos pais e 37,6% das mães frequentaram apenas até a 4ª série do ensino fundamental. Vale ressaltar que se constatou que 68,4% dos estudantes cursaram todo o ensino médio no setor público e 14,2% fizeram-no parcialmente em escolas públicas. Os dados elucidados expressam quem de fato compõe a profissão docente, o estudo de Gatti e Barreto (2009) evidencia características importantes que endossam interpretações fundamentais inerentes a proposta deste artigo. De fato, podemos observar que existe um estereótipo forte do profissional docente. São normalmente estudantes advindos das escolas públicas, que pertencem a uma faixa de renda baixa e com pouca bagagem cultural (pais a mães com baixa escolaridade). Estamos, portanto, falando dos estudantes de camadas

populares que como já versei, (SILVA, 2016) são estudantes do ensino público, rodeados por situações de pobreza, criminalidade e narcotráfico, vítimas de um processo históricoexclusório que só agora começa a se fragilizar a partir da efetivação de políticas afirmativas na área da educação. Por isso, optamos pelo uso de estudantes de origem popular, já que são eles que majoritariamente estarão engajados com a profissão docente e nos propomos a ouvir deles suas aspirações, críticas e intimidades com a carreira docente. Metodologia O método de pesquisa utilizado para produção e interpretação de dados foi o método de Grupos Focais, popularizado no Brasil pela Profa. Bernadete Gatti sendoum método que reúne pessoas para se discutir um tema, com vistas a produzir dados. Ressalta-se queessa técnica vem sendo usada gradativamente pelos pesquisadores em educação, de acordo com o objetivo da pesquisa e com o potencial da técnica na obtenção de resultados. O grupo focal começou a ser utilizado na década de 1920 por Robert Merton com objetivo de estudar as reações de pessoas à propaganda de guerra. Já em 1980 houve a preocupação em adaptar essa técnica ao uso da investigação científica (GATTI, 2005). Logo a partir da utilização dessa técnica percebeu-se que os grupos focais, segundo Melo e Araújo (2010) têm como principais aspectos: (...) processos de construção da realidade por determinados grupos sociais; práticas cotidianas, ações e reações a fatos e eventos, comportamentos e atitudes. Assim, constitui-se uma técnica importante para o conhecimento das representações, percepções, crenças, hábitos, valores, restrições, preconceitos, linguagens e simbologias prevalentes no trato de uma dada questão por pessoas que partilham alguns traços em comum, relevantes para o estudo do problema visado.

Segundo Morgan (1998), o grupo focal também deve contar com traços homogêneos que permitam uma ligação entre os componentes do grupo e traços heterogêneos que sustentarão as discussões e reflexões do grupo. Como essa é a única forma que usamos para produzir dados, o nosso grupo focal é chamado auto-referente por ser a principal fonte de dados (GODIM, 2002). O uso dessa metodologia justifica-se pelo fato de que as interações entre os participantes podem ser mais expressivas, através de uma dimensão coletiva. Ou seja, as respostas, os dizeres e explanações são construídos coletivamente, permitindo que os

componentes usem seus saberes cotidianos e desse modo, instiguem os saberes do outros para uma construção coletiva. Por isso Barbour (2009) tece considerações favoráveis sobre os grupos focais: “grupos focais são ótimos para nos permitir estudar o processo de formação de atitudes e os mecanismos envolvidos e na interrogação e modificação de visões”. Enaltecemos também a dimensão qualitativa desse método uma vez que as informações produzidas por meio de conversações que expressem suas concepções e impressões de um determinado tema conduzem ao aprofundamento amplo das discussões suscitadas (CRUZ NETO; MOREIRA; SUCENA, 2002). O grupo foi conduzido pelo autor do artigo que também é professor do cursinho comunitário. Foi composto um roteiro prévio com perguntas inspiradas no estudo de Tartuce, Nunes e Almeida (2010), que serviu de guia para articulação dos debates, sempre tendo em vista sua flexibilidade diante de temas acendidos pelos componentes. Esse roteiro só era acessível ao pesquisador que conduzia os trabalhos do grupo. Foram utilizadas gravações de áudios como recomendam Gatti (2005), Melo e Araújo (2010), que foram posteriormente transcritas. Esse acontecimento ocorreu tendo em vista o volume de dados e a importância do registro de todas as manifestações. Coube ao pesquisador realizar apenas algumas anotações durante a sessão. É necessário lembrar que todos os estudantes participaram voluntariamente da sessão e demonstraram prévio interesse e ativa participação nos debates. A sessão ocorreu no dia 06/09/2016 das 21:00 ás 22:00, na sala 205 do Centro Tecnológico 12, da UFES campus Goiabeiras. 1. CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA O grupo focal utilizado teve como amostra estudantes de origem popular da Grande Vitória, uma região metropolitana do Estado do Espírito Santo composta pelos municípios: Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica, Fundão, Viana e Guarapari. Estes estudantes fazem parte do Projeto Educacional Compartilhando Saberes (PECS), um pré-vestibular comunitário vinculado à Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). 1.1 CARACTERIZAÇÃO DOS ALUNOS Contamos com nove alunos na composição do grupo, seguindo as indicações de Gatti (2005) que recomenda de 5 a 10 componentes. Estes estudantes são provenientes de escolas

públicas da Grande Vitória. 66,7% dos estudantes cursam o último ano do ensino médio, enquanto 33,3% já concluíram o ensino médio. Foi constatado também que 44,4% dos estudantes exercem alguma atividade remunerada (estágios, trabalho forma e/ou informal).Quanto ao sexo, 66,7% pertenciam ao sexo feminino e 33,3% pertencem ao sexo masculino. Vale ressaltar que os alunos pertencem a faixa de 16 à 22 anos. 1.2 CARACTERIZAÇÃO DO CURSINHO POPULAR Como já destacado, o que torna esse grupo homogêneo é camada popular que eles ocupam. Para isso usamos amostras do PECS/UFES. Como existe uma grande importância nessa característica comum entre os componentes, achamos por bem versar um pouco sobre o Projeto. O Projeto Educacional Compartilhando Saberes (PECS)é um pré-vestibular comunitário da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), criado pela Pró-reitoria de Extensão (Proex), junto à comunidade em 2010. O principal objetivo do projeto é possibilitar aos pré-vestibulandos envolvidos a possibilidade de aumentarem suas chances de ingressar no ensino superior, por meio de aulas ministradas por alunos de cursos de graduação e pósgraduação da UFES e de outras instituições do Estado, democratizando assim, o acesso de comunidades em vulnerabilidade à Universidade. As aulas são ministradas de segundas as sextas-feiras, à noite (das 18h20 às 22h), e aos sábados, das 13 às 17h, com foco na preparação para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Considerando-se que os prévestibulares gratuitos da Grande Vitória não têm atendido à demanda de estudantes de baixa renda interessados em se preparar para o ENEM, este projeto justifica-se porque surge com o intuito de contribuir para que essa lacuna seja suprida. Podemos então afirmar que o PECS é resultado de Políticas de Ações Afirmativas propostas pelo Ministério da Educação (MEC) (SILVA, 2016). Resultados e Discussões A primeira parte do grupo focal se alicerçou na pergunta: “Quem aqui deseja ser professor?” 22,2% dos estudantes responderam que queriam seguir preferencialmente a carreira docente, enquanto 77,8% optam por seguir outras carreirascomo mostra o Gráfico 1. Dos que optaram por seguir outras carreiras 90% tem como segunda opção seguir carreira docente, como mostra o gráfico 2.

GRÁFICO 1: Carreira Docente como primeira opção

22%

78%

- Estudantes que querem seguir carreira docente como primeira opção. - Estudantes que não querem seguir carreira docente como primeira opção.

GRÁFICO 2: Carreira docente como segunda opção

10%

90%

- Estudantes que querem seguir carreira docente como segunda opção. - Estudantes que não querem seguir carreira docente como segunda opção

Os dados expressados pelos Gráficos 1 e 2 mostram que normalmente a docência não se encaixa como primeira opção de carreira, no entanto os gráficos elucidam um interesse na carreira docente como segunda opção. Logo, somos convidados a refletir sobre o que

influência o jovem a não escolher a docência como primeira opção e inerentemente compreender o que o faz ter expressivamente a docência com uma segunda opção de carreira. Tentando entender um pouco dos vetores que influenciam esses gráficos, o grupo focal pelo protagonismo dos estudantes, trouxe presente alguns fatores que justificavam a maioriaem não escolher a docência como primeira opção. A tabela 1 mostra alguns apontamentos para análise. TABELA 1: Razões para não escolher a docência como primeira opção de carreira.

Razões

%

Remuneração e desvalorização

22,3 %

Problemas de saúde

22,2%

Escola pública

11,1%

Desinteresse dos alunos

11,1%

Infraestrutura/Local de trabalho e periculosidade

33,3%

A tabela 1, mostra como os estudantes valorizam a infraestrutura, o local de trabalho e as situações de perigo que permeiam a atuação docente. Para eles, a falta de infraestrutura nas escolas é o fator que mais os afasta da opção preferencial pela carreira docente. Destacamos a frase de uma estudante no grupo focal: (...) infelizmente a realidade na nossa escola faz com que os professores não desempenhem bem o seu trabalho. Comparadas a outras profissões eles normalmente estão em escolas sucateadas, sem infraestrutura, lecionando no calor e sem nenhuma atenção do sistema escolar. (Marina², egressa do ensino público)

Somado a isso, os alunos também compartilharam que a escola não tem sido um espaço atrativo. A estrutura física, os conflitos e tensões criados e/ou não resolvidos fazem com que os estudantes não criem vínculo com aquele tipo de ambiente de trabalho e sim, desenvolvam aversão e antipatia. Outro estudante versa um pouco sobre essa realidade: ² Os nomes utilizados são todos fictícios. A escola não tem nada de atrativa. A disposição das salas, das carteiras, dos corredores, enfim, é um espaço em que não nos sentimos bem e confortáveis. Isso contribui muito para não fazermos desse local, uma opção de trabalho para o resto da vida. (José, finalista do ensino médio)

Essas falas fortalecem a posição de que a escola no seu modelo atual contribui para que a carreira docente não seja atrativa. A Profa. Maria Rezende, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em uma entrevista a revista Nova Escola afirma: "Se queremos melhorar a atratividade, precisamos melhorar a escola pública porque é de lá que vem a maioria dos novos professores”. Soma-se a ultima afirmação os apontamentos de Gatti (2010) em relação a precarização do ambiente de trabalho e suas consequências, entre elas a falta de interesse à profissão. Outro dado expressivo e que permeou intensamente a discussão do grupo foi a porcentagem de estudantes que optaram não seguir carreira docente por conta do fator remuneração e desvalorização, que juntos somaram 22,3%. Algumas falam podem explicitar melhor o que os estudantes pensam em relação ao tema. O salário também é algo que conta muito. Eu quero me formar, conseguir ter conforto. Quero ter um carro, uma casa e conseguir dar uma educação de boa qualidade para meus filhos. Ser professor e conseguir isso tudo não tem como nos dias de hoje. (Marina, finalista do ensino médio) (...) fora que o salário não ajuda. O professor estuda quatro anos, investe na sua formação, pra no fim ganhar pouco e ter que trabalhar vários turnos. É raro encontrar um professor que só trabalhe um turno. Acho que deve ser frustrante. (Eliana, egressa do ensino médio)

Os estudos atuais sobre carreira docente apontam consideravelmente que o baixo salário também é responsável pela falta de atratividade, sobretudo por conta do contato diário que tem com estes profissionais. Gatti e Barreto (2009) endossam: "Salários pouco atraentes, como exposto no capítulo IX, e planos de carreira estruturados de modo a não oferecer horizontes claros, promissores e recompensadores no exercício da docência interferem nas escolhas profissionais dos jovens e na representação e valorização social da profissão de professor". Tartuce, Nunes e Almeida (2010) também tecem algumas considerações válidas: "Pode-se dizer resumidamente que as justificativas dos estudantes para afastá-los da docência estão associadas às seguintes ideias: 1. O professor é mal remunerado; 2. As condições de trabalho do professor são ruins." Em relação aos fatores positivos da carreira docente que fazem os estudantes escolhela como segunda opção de carreira, os estudantes apresentaram algumas opções explicitadas na tabela 2.

TABELA 2: Motivos de atratividade da carreira docente.

Motivos

%

Potencial de transmissão de conhecimento

36,5%

Potencial de mudança social

52,4%

Contato com professor motivador

11,1%

É expressiva a porcentagem de estudantes que optam secundariamente pela carreira docente motivados pelo potencial de transformação social da profissão. Valle (2006), chama o professor de “agente de transformação social” considerando-o uma importante ferramenta na construção da consciência humana e, portanto, ferramenta de transformação social (SAVIANI, 2003). Isso acontece, provavelmente pelo fato dos estudantes de camadas populares se situarem em realidades de exclusão social, motivando-os no engajamento da luta de classes e pela conquista/manutenção de direitos, sobretudo as políticas de inclusão e igualdade (SILVA, 2016). A transmissão de conhecimento aparece como o segundo maior motivo indicado pelos estudantes. Isso se deve basicamente ao sucesso em situações de ensino-aprendizagem no ambiente escolar. Processos de ensino-aprendizagem bem sucedidos levam o aluno a partir do professor a valorizar sua profissão, podendo até mesmo como mostram os dados, se sentir motivado em aventurar-se na carreira docente, tendo como principal motivação os conhecimentos que lhe foram transmitidos e a maneira com que foram adquiridos (TARTUCE; NUNES; ALMEIDA, 2010). Considerações Finais O objetivo deste artigo foi perceber como a carreira docente está construída no imaginário de estudantes de origem popular, haja vista que são os que majoritariamente irão se aventurar na carreira docente (GATTI e BARRETO, 2009). Logo, se atemos a uma amostra pequena de estudantes de camadas populares do PECS/UFES. Explanamos algumas considerações a seguir. Primeiramente foi observado que a maioria dos estudantes de camadas populares não se sentem atraídos pela docência, no entanto tem a mesma como segunda opção de carreira. Esses dados elucidam o problema que a carreira docente pode enfrentar daqui a alguns anos,

já que os futuros professores terão a profissão como segunda opção e, não necessariamente criarão vínculo e identidade com a carreira, o que possivelmente será um problema no futuro. Atores que não estarão empenhados em resolver, interpretar e provocar mudanças no sistema educacional (JESUS, 2004; TIBI, 1990; OLIVER, 1997). Depois observamos que a maioria dos estudantes, não optam pela carreira docente por conta

da

infraestrutura/local

de

trabalho

e

periculosidade

(33,3%)

e

baixo

salário/desvalorização (22,3%), isso se deve a realidade dos estudantes nas escolas públicas e situação de narcotráfico, criminalidade que estão inseridos. Também foi constatado que os principais fatores de atratividade da carreira são respectivamente: Potencial de mudança social da profissão (52,4%) e potencial de transmissão de conhecimento da profissão (36,5%). Essas amostras mostram que o fato de se situarem em camadas populares faz com que os estudantes tenham como premissa a transformação social, sobretudo o erigir de políticas que ascendam as camadas populares e as incluam na sociedade democrática (SILVA, 2016). Fica claro que a profissão docente vem sofrendo uma queda de atratividade e que normalmente é encarada como segunda opção por jovens de camadas populares. Isso aponta para uma reforma urgente que o modelo de educação precisa ter, a partir dos currículos, espaços, professores e carreiras, tendo em vista não só o sucesso escolar, mas também a atratividades de estudantes que desejam como mostram os dados, transformar a sociedade por meio da educação. Referências

BARBOUR, Rosaline. Grupos focais. Porto Alegre: Artmed, 2009. BLOCK, SilvioDuarte. A escolha profissional de sujeitos de baixa renda recémegressos do ensino médio.2008. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Unicamp, Campinas. CRUZ NETO, Otávio; MOREIRA, Marcelo Rasga; SUCENA, Luiz Fernando Mazzei.Grupos focais e pesquisa social qualitativa: o debate orientado como técnica de investigação. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTUDOS POPULACIONAIS. 13., ABEP, 2002, Ouro Preto. Disponível em: Acesso em: 07/09/2016.

GATTI, Bernadete Angelina. Grupo focal na pesquisa em ciências sociais e humanas. Brasília: Líber Livro, 2005. GATTI, Bernadete Angelina. Formação de professores no Brasil: características e problemas. Educação & Sociedade, v. 31, n. 113, p. 1355-1379, 2010. GATTI, Bernadete Angelina; BARRETTO, Elba Siqueira de Sá.Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009. Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0018/001846/184682por.pdf . Acesso em : 07/09/2016. GODIM, Sônia. Maria Guedes. (2002). Grupos focais como técnica de investigação qualitativa: desafios metodológicos. Paidéa ,12 (24), 149-161. LEITE, Janete Luzia. Política de cotas no Brasil: política social? Revista Katálysis, Florianópolis, v. 14, n. 1, p. 23-31, jan./jun. 2011.

MELO, Patrícia Sara Lopes; ARAÚJO, Waldirene Pereira. Grupo focal na pesquisa em educação. 2010. Disponível em: Acesso em : 07/09/2016. MORGAN, David L. The Focus Group Guidebook. Thousand Oaks: Sage, 1998. PINHEIRO, Juliene Saraiva Sena Peres. Desempenho acadêmico e sistema de cotas: um estudo sobre o rendimento dos alunos cotistas e não cotistas da Universidade Federal do Espírito Santo. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Espírito Santo, 2014. PUCCI, Bruno et. Al.O processo de proletarização dos trabalhadores em educação. Teoria & Educação, Porto Alegre, n. 4, p. 91-108, 1991. Revista Nova Escola, edição especial, maio/ago 2010, Brasil. SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 8. ed. Campinas: Autores Associados, 2003. SANTOS, Jocélio Teles dos. Ações afirmativas e educação superior no Brasil: um balanço crítico da produção. R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 93, n. 234, [número especial], p. 401-422, maio/ago. 2012. SILVA, Gustavo Santos. O acesso de estudantes de origem popular à Universidade Federal do Espírito Santo por meio do Projeto Educacional Compartilhando Saberes.Revs. Ext. Guará, Vitória, vol. 2. p. 21-26. 2016. TARTUCE, Gisela Lobo Baptista Pereira.; NUNES, Marina MunizRossa.; ALMEIDA, Patrícia CristinaAlbieride. Alunos do ensino médio e atratividade da carreira docente no Brasil. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 40, n.140, p. 445-477, maio/ago. 2010.

VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do magistério: uma escolha profissional deliberada? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 87, n. 216, p. 178-187, maio/ ago. 2006.

Lihat lebih banyak...

Comentarios

Copyright © 2017 DATOSPDF Inc.