Até onde a paciência aguentar

June 29, 2017 | Autor: F. Chagas-Bastos | Categoría: International Relations, International Political Economy, Russian Foreign Policy, World Politics
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quarta-feira, 10.09.2014

Fabrício H. CHAGAS BASTOS* Até onde a paciência aguentar

N

um mundo de faz de conta, que segundo alguns nasceu após o fim do Muro de Berlim, a Rússia de Putin busca reposicionar-se no globo a partir de uma revisão da ordem mundial e usando como estratégia as negociações multilaterais (afinal, é parte do bloco emergente conhecido como Brics) de amplo espectro, promovendo mudanças na composição das instituições globais. Tudo isso ocorre em um mundo no qual o recurso à violência é somente utilizado por grupos terroristas e ditaduras, jamais pelas democracias liberais. Quando Vladimir Putin disse ao presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, que se quisesse ocuparia “Kiev em duas semanas”, além de sugerir que Donetsk pode ser mais uma das sedes da Copa de 2018, o presidente russo mandou sinais claros de que a concepção de mundo criada pelos liberais norte-americanos e europeus havia encontrado o muro. Em cheio. As interpretações ocidentais usuais dão conta de que

o movimento geopolítico do Kremlin se baseia somente na estratégia de promover a “Grande Rússia” e de recuperar o moral internacional russo depois da implosão da União Soviética à força. Parafraseando o assessor do ex-presidente Bill Clinton, poderíamos dizer que “é a política de poder, estúpido!”. Num caminho bastante simples: uma Rússia humilhada se volta ao seu entorno próximo para demonstrar força ao mundo. Há mais do que isso a observar. Para o professor da Universidade de Chicago John J. Mearsheimer, a resposta russa envolve também alargamento da Aliança Militar do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em direção à Ucrânia. A aliança, apesar de ter perdido seu sentido de existir com o fim da ameaça comunista, ainda é o principal instrumento de pressão ocidental à Rússia e, por isso, não deveria ser surpreendente às elites europeias e norte-americanas que uma resposta ao melhor estilo realpolitik pudesse ser dada. É interessante notar que o erro de percepção do Ocidente foi utilizado por Putin para formular um intrincado mapa de ação regional. A tomada de Sebastopol e o avanço das tropas russas Ucrânia adentro alertou a OTAN sobre as linhas que não devem ser transpostas. Os testes de mísseis balísticos indicam a forma clássica de dissuasão realista. Putin vai continuar a dar sinais trocados, mentir e blefar, até que consiga criar uma fissura na ordem in-

quarta-feira, 10.09.2014

ternacional liberal que emergia de dentro do regime bipolar da Guerra Fria. Até lá, vai esticar a corda mais e mais, até que sua paciência termine... O Ocidente assiste perplexo à retomada russa no que seria “o século americano”.

Fabrício H. CHAGAS BASTOS é É Professor de Relações Internacionais Contemporâneas da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e Doutorando em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP)

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