\"ahnungslos\"

July 28, 2017 | Autor: Miguel Sousa Ribeiro | Categoría: Art, Exhibitions
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Descripción

Exposição de João Queiroz no CAPC, Coimbra. Na exposição ahnungslos – um ver que se desloca, João Queiroz apresenta-nos um conjunto de 36 desenhos – divididos por 3 espaços – estando 12 em cada um deles – realizados a aguarela de grafite, diga-se uma matéria nova no seu processo de investigação. Uma mostra regular e equilibrada, assente num ritmo constante e coerente, na medida em que as obras estão dispostas de forma repetida em cada espaço. O espaçamento (reduzido) entre elas indica-nos que há uma clara dessacralização da obra, realçando, com isso, o seu processo, a sua busca, e as obras no seu conjunto. Os desenhos encontram-se de forma linear, a uma mesma altura, com um ritmo constante e intervalos imperceptíveis. Isto não implica que algumas obras não exijam do espectador um movimento diferenciado e oscilante, pelo contrário, além de uma obra necessitar de uma recepção prolongada, há com certeza outra que exige um afastamento considerável (como na pintura), ou uma forte aproximação. Esta aproximação torna-se fundamental para termos a certeza que nada nos escapa, pelo facto do seu processo, além de conceptual, metódico ou racional ser tremendamente subtil e metafórico. João Queiroz vê no desenho a sua liberdade formal e gestual – que nos transporta ao movimento, a algo que se mexe sobre o suporte. Esse movimento é o pensamento que está no corpo, que é transformado em conhecimento, mediado pelo próprio corpo, físico e meta-físico, levando-nos assim ao grande paradoxo da arte conceptual, que nos diz que só conhecemos através do corpo. Através daquilo que experienciamos; vivemos; sentimos; ou constatamos. Sabemos assim, que temos em nós todos os sentidos e ainda o pensamento – como o conhecimento mediado por esse mesmo corpo (aisthesis). Partindo deste pressuposto, o seu trabalho passa por uma procura constante, onde a sua relação com o real despoleta essa procura assente numa lógica, ou meta-lógica, racional, metódica e continua. Queiroz representa esta informação de várias formas dicotómicas. Seja pela diferenciação do traço – metódico mas irregular e contraditório, dando equilíbrio ao desenho –; seja pela força e subtileza que emprega sobre o suporte, criando fortes contrastes de manchas e linhas brilhantemente conjugadas com vazios que nos permitem respirar e percorrer toda a liberdade não-formal envolvente. Estes desenhos de Queiroz remetem-nos para a possibilidade de relação a outros autores – se num momento nos leva a Cézanne, noutro, logo a seguir, podemos estar perante Rembrandt, ou até um desenho de garatuja – possibilitando-nos fazer estas analogias de acordo com o seu processo assente numa lógica tipológica onde nos mostra várias formas de representar as paisagens que cada individuo tem do mundo. Seja ele ocidental, ou oriental, pois em vários dos seus trabalhos remetem-nos para a pintura ou escrita oriental. E aqui questiona-nos se podemos encarar a escrita também como desenho? O artista tem particularidade de nos “pôr” a ver paisagens, de acordo com a percepção individual do espectador. Intencionalmente ou não o que é facto é que há essa forte analogia no seu trabalho. Leva-nos, assim, para questões perceptivas, explorando a nossa capacidade cognitiva e nunca, somente, a retiniana. Pelo contrário, o seu trabalho parece exigir que vejamos para além da imagem representada – levando-nos à metalógica das imagens –

evitando dar uma imagem como adquirida a priori. Assim, é necessário, parar em frente à obra, percorrê-la, para que possamos ver o que lá está e não o que parece estar. É deixada para o final uma reflexão sobre o interior/exterior. A relação do espaço expositivo (interior) e o espaço envolvente (exterior). O interior está confrontado com o exterior – um enorme jardim – visível através da fachada envidraçada que percorre toda a divisória ‘entreespaços’ (que podia ser evitada). Esta intencional abertura visual pode conduzir o espectador a relacionar (ou a comparar) ambas as “paisagens”. Todavia, esta abertura, intencional crê-se, é encarada como uma crítica ao sujeito – essencial para desconstruir os paradoxos e 'préconceitos' que problematizam a nossa relação com o objecto. Ele pede que estejamos livres e apartados de qualquer convenção e vejamos só o que está lá, em cada desenho. Miguel Sousa Ribeiro Out ‘14

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